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A decisão dividida do Copom pelo corte de 0,25 ponto porcentual na taxa Selic mostra que, para desespero do governo, Roberto Campos Neto ainda dá as cartas na autoridade monetária.
Mesmo a pouco mais de um semestre do fim do seu mandato, RCN liderou o processo de desaceleração do ritmo de corte da taxa básica. Ele conseguiu manter os outros quatro diretores indicados no governo Bolsonaro alinhados com sua posição, derrotando a ala dos quatro nomeados por Lula.
A piora no cenário internacional – que provocou desvalorização cambial e alta nas taxas no mercado de juros futuros –, o maior dinamismo do mercado de trabalho e as mudanças fiscais fizeram com que a divergência de concepção sobre o manejo da política monetária já aparecesse na reunião desta semana.
Não fosse isso, certamente esse placar de 5 a 4 apareceria em algum momento nos futuros encontros deste ano. Possivelmente na discussão para desacelerar o ritmo de cortes na reunião de junho (que havia sido sinalizada em março) ou, no mais tardar, no debate sobre qual seria a taxa terminal da Selic, agora em 10,5% ao ano.
A dúvida para a reunião desta quarta-feira (8) era se Carolina de Assis Barros (relacionamento, cidadania e conduta) e Otávio Damaso (regulação) se manteriam ao lodo de Campos Neto, como fizeram em agosto do ano passado. Diogo Guillen (política econômica) e Renato Gomes (organização do sistema financeiro) são dois notórios membros da ala conservadora do Copom e não trouxeram surpresa.
Guillen, aliás, é o principal formulador do time liderado por Campos Neto. Tem uma visão muito focada no comportamento das expectativas, a quem dá uma importância enorme (alguns dizem exagerada) na condução da política monetária. Recentemente, a piora das projeções para o IPCA, especialmente para 2025, somada à resistência do mercado em acreditar que o índice vai para 3% até 2026 reforçaram suas convicções de que estaria na hora de corrigir a rota. Ainda mais em um ambiente de incerteza exacerbada.
A lembrança do que ocorreu na decisão de agosto é importante neste momento. Ali, Campos Neto, que havia convencido o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a manter a meta de inflação em 3%, teve outra posição, liderando a defesa de um corte maior (de 0,50 ponto) e derrotando a posição da banda mais conservadora com a ajuda de Barros e Damaso – que mais uma vez se juntaram ao chefe.
Naquele momento, só havia dois indicados pelo presidente Lula: Gabriel Galípolo (política monetária) e Ailton Aquino (fiscalização). Agora, o governo Lula tem outros dois nomeados: Paulo Pichetti (assuntos internacionais) e Rodrigo Teixeira (administração), que se juntaram aos outros dois “lulistas” no voto por corte de 0,5 ponto.
A divisão que já se previa que em algum momento iria ocorrer ficou sacramentada. O grupo de Campos Neto tem uma visão de que é necessário manter um pé mais forte no freio da economia para que a inflação finalmente vá para os 3% da meta. O outro time, ainda que sua posição não tenha sido explicitada no comunicado do BC, tem a leitura de que o país está em um processo virtuoso de desinflação e precisa manter a atividade econômica mais próxima do seu potencial, até para viabilizar um cenário fiscal de menor risco.
Apesar disso, o Copom teve uma coesão na leitura de que o “cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade e expectativas desancoradas demandam maior cautela”. E que a política monetária deve se manter contracionista, ou seja, contendo o ritmo da economia, “até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”.
Em outras palavras, a divisão por enquanto é na dosagem, não na direção. De qualquer forma, o grupo novo em breve dará as cartas, certamente aumentando o peso para o desempenho da atividade econômica na execução do duplo mandato da autoridade monetária (inflação na meta e suavização dos ciclos econômicos).
Até lá, enquanto Lula não nomeia os novos diretores ou alguns do grupo de Campos Neto não mudam de posição, prevalecerá a maior cautela da ala “hawkish”. E o presidente do BC, com a decisão dividida desta quarta, fica ainda mais na linha de fogo do governo Lula. Serão meses de testes mais intensos da autonomia legal concedida à autoridade monetária.