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Nas últimas décadas, e principalmente em um contexto de recuperação econômica pós-pandemia e de urgência climática, o termo “bioeconomia” tem ganhado espaço e grande importância nos âmbitos nacional e global.
No Brasil, a bioeconomia tem sido uma aposta de diversos setores e atores, governamentais e privados, que visam a transição produtiva para um modelo sustentável. E a Amazônia está no centro desse debate devido à sua enorme sociobiodiversidade e à urgente necessidade de alterar o paradigma predatório de desenvolvimento na região e combater as mudanças climáticas.
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Considerando a grande diversidade de atividades que podem ser colocadas sob o guarda-chuva do termo “bioeconomia”, é fundamental qualificar esse debate, de forma a garantir a construção de uma bioeconomia próspera economicamente, inclusiva e sustentável.
Para que uma bioeconomia autêntica na Amazônia possa emergir, será necessário considerar o contexto amazônico existente e, o mais importante, reconhecer os saberes e modo de vida dos amazônidas. Afinal, já existe há séculos na região uma bioeconomia ativa e vibrante – só não havia sido batizada desse jeito ainda.
É também essencial considerar as especificidades regionais – os modos de vida, culturas, aptidões e conhecimentos locais. A bioeconomia amazônica só será justa e legítima, se construída com plena participação cidadã dos amazônidas, de maneira inovadora e com base nas diversas experiências ancestrais da região.
Propomos, portanto, o fortalecimento da bioeconomia amazônica como uma base para a transformação social e econômica, que promova uma cidadania plena e ajude a superar as desigualdades e marginalizações históricas que afetam os povos indígenas, tradicionais e comunidades locais amazônidas, conservando a biodiversidade, a floresta, os rios e os saberes locais.
Dessa maneira, o IPAM contribuiu com o livro Bioeconomia para quem?, lançado em junho de 2024 e organizado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) em parceria com outras organizações. A obra é assinada por 32 instituições que discutem as bases para um desenvolvimento sustentável na Amazônia. No capítulo “Bioeconomia Amazônica e Cidadania”, refletimos sobre as estruturas necessárias para a formação de uma bioeconomia cidadã na região.
Para ser propulsora de um novo paradigma de desenvolvimento na região, a bioeconomia deve buscar primordialmente a redução das desigualdades e combate às mudanças climáticas.
Buscando garantir um modelo econômica e socialmente equitativo, resiliente e alinhado à atual emergência climática, sugerimos 4 pilares fundamentais para uma bioeconomia amazônica autêntica:
o desmatamento zero;
a diversificação da produção;
a repartição equitativa de benefícios;
o reconhecimento, valorização e fortalecimento das práticas e culturas locais milenares das populações tradicionais da região.
A bioeconomia não deve ser apenas a comercialização de produtos da floresta, e deve considerar os processos produtivos e contextos ao redor destes insumos. Caso desperte em você a curiosidade do porquê da escolha desses pilares, explicamos de forma mais profunda no capítulo do livro e em coluna anterior aqui no JOTA.
Hoje quero destacar um outro aspecto essencial para a concepção e operacionalização de uma bioeconomia autêntica na Amazônia: a cidadania. Para além dos pilares sugeridos anteriormente, a bioeconomia amazônica e cidadã pressupõe outros elementos.
A premissa fundamental é a inclusão e protagonismo dos habitantes da Amazônia nos espaços de discussão e nas tomadas de decisão sobre o futuro da região. A inclusão plena dos povos indígenas e das populações tradicionais nas decisões sobre o uso dos territórios e em espaços de formulação de políticas públicas é primordial nesse processo.
Uma bioeconomia genuinamente amazônica e cidadã requer a implementação de um sistema que promova uma gestão eficiente dos recursos naturais e fortaleça os direitos humanos e territoriais das populações locais, reconhecendo as diferentes identidades e conhecimentos. Isso inclui assegurar sua participação nas decisões sobre o uso de territórios e recursos naturais, ampliando sua representação política e sua capacidade de influenciar políticas públicas.
O reconhecimento e respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente o direito à terra, e do papel central das mulheres como guardiãs do conhecimento são também elementos cruciais para o desenvolvimento de uma bioeconomia cidadã.
Ainda, para além da implementação de um sistema novo de governança, é preciso fortalecer as governanças territoriais já realizadas por povos indígenas e comunidades tradicionais. A governança biorregional só será plena quando essas comunidades puderem gerir autonomamente seus territórios, com a participação ativa de mulheres e jovens. Isso é necessário para promover uma economia da sociobiodiversidade baseada em conhecimentos tradicionais e em redes que promovem o bem-estar humano.
Os elementos acima são fundamentais para a criação de uma economia mais justa, sustentável e integrada, que contribua para o desenvolvimento econômico da Amazônia sem comprometer seu patrimônio natural e cultural.
Em suma, a bioeconomia não é apenas uma promessa de desenvolvimento, mas uma oportunidade de reescrever a história da Amazônia com justiça social e sustentabilidade. Sua construção passa pela cidadania amazônica e pelo reconhecimento do papel crucial das populações locais e tradicionais na conservação da floresta e na promoção de práticas sustentáveis.