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Em artigo recente no jornal Valor Econômico, o professor Naércio Menezes Filho, titular da Cátedra Ruth Cardoso no Insper e professor associado da FEA-USP, que eu já tive a oportunidade de entrevistar no podcast Direito e Economia, aproveitou a contribuição dos ganhadores do Prêmio Nobel de Economia deste ano – Acemoglu, Robinson e Johnson – para formular a seguinte pergunta: “Por que o Brasil não ficou rico?”.
Em busca de uma resposta, o autor lembra que Acemoglu, Robinson e Johnson ressaltam que determinantes do crescimento econômico – como poupança, educação e produtividade – são fatores endógenos determinados pelas instituições de cada país. Assim, países que, como o Brasil, foram construídos com base em instituições extrativistas, tendem a se manter assim ao longo do tempo.
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Logo, conclui o professor Náercio que, na medida em que a evolução das instituições depende da luta pelo poder entre as elites e o restante da população, “os países com instituições extrativas permanecem pobres porque as elites locais, que detêm o poder de fato, não têm interesse que a maioria da população seja efetivamente incluída na sociedade, com acesso à educação, justiça, direitos de propriedade e ao voto, para não perderem poder”.
Prosseguindo em sua análise, o professor Naércio destaca que as elites não têm incentivos para mudar esse estado de coisas, “pois sabem que, se mudanças democráticas realmente acontecerem, o povo mais educado e com direito a voto irá expropriá-las (…)”. Entretanto, com a ausência de investimento em educação, impede-se a absorção dos avanços tecnológicos necessários para o crescimento e aumento de renda per capita, razão pela qual “os países com instituições ruins vão ficando cada vez mais para trás, enquanto suas elites vão se encastelando, concentrando dinheiro e poder”.
A ausência de investimentos em educação é, portanto, uma das chaves para compreendermos a persistência das instituições extrativistas no Brasil, especialmente por impossibilitar qualquer tipo de meritocracia, o que apenas poderia ocorrer caso houvesse minimamente uma certa igualdade de oportunidades.
Não é sem razão que o professor Náercio aponta o nosso déficit educacional como a principal razão pela qual o Brasil não ficou rico. Segundo ele, “o reflexo mais evidente das instituições extrativas no Brasil é a falta de oportunidades provocada pela lenta evolução educacional que ocorreu por aqui até o final do século 20″.
Não é mera coincidência que, ainda segundo o professor, “ao invés de investir na massificação do ensino básico, o Estado brasileiro privilegiou a construção de universidades públicas gratuitas e políticas regionais e industriais para beneficiar as elites locais”.
Para o professor, são notas da história brasileira as inúmeras formas pelas quais os mais pobres foram excluídos da educação, valendo lembrar que o analfabetismo tinha uma importante dimensão política, já que analfabetos só adquiriram o direito ao voto mais recentemente. Daí a conclusão final de que, no Brasil, “as elites evitaram investir nos direitos da população mais pobre para não perderem sua posição dominante na sociedade”.
Apesar da importância de tais reflexões, embasadas nas contribuições dos ganhadores do Prêmio Nobel, há uma narrativa neoliberal que, ignorando o papel das instituições extrativistas, procura ocultar as desigualdades estruturais brasileiras, apostando no livre mercado como um espaço justo e eficiente para que cada qual receba os frutos de seus esforços e talentos.
Ocorre que, sem assegurar a igualdade de oportunidades, endereçando minimamente os efeitos de instituições extrativistas, não é possível assegurar eficácia nem mesmo à própria liberdade econômica. Afinal, em um país desigual como o nosso, em que o pequeno empreendedorismo poderia ser uma excelente solução para a questão da redução da pobreza, parcela substancial da população brasileira não tem acesso aos mercados porque lhe faltam as condições mínimas de sobrevivência – incluindo comida, saúde e educação – e, com maior razão, as condições mínimas para empreender – incluindo acesso ao crédito.
Dessa maneira, em relação à parte expressiva da população brasileira, não se faculta a opção entre empreender – correndo o risco mediante a remuneração respectiva, ou seja, o lucro – ou oferecer a sua força de trabalho – abrindo mão do risco em nome da segurança e do salário. Para essa parte da população, resta apenas a opção de oferecer sua força de trabalho em condições cada vez mais precarizadas.
Tais circunstâncias mostram que, para conferir plena eficácia à liberdade econômica, há necessidade de intervenção do Estado para, superando o legado nefasto das nossas instituições extrativistas, assegurar o acesso aos mercados, o que somente pode ocorrer com a redução da desigualdade, com a efetiva existência de oportunidades minimamente equitativas para o empreendedorismo – o que obviamente inclui acesso à educação de qualidade – e com a preservação das condições concorrenciais.
A superação de instituições extrativistas e a redução da desigualdade são vistas hoje como medidas não apenas moralmente justas, mas também como necessárias para o próprio crescimento econômico, já que a excessiva desigualdade, além de levar a uma grande perda de talentos, tem comprometido as perspectivas de prosperidade econômica dos países que a vivenciam.
Dessa maneira, fica claro que, tal como enfatizou o professor Naércio, o problema brasileiro é muito mais político do que econômico, porque a manutenção do status quo se justifica muito em razão da luta pela manutenção de antigas estruturas de poder do que propriamente por evidências científicas.
Assim, é preciso entender que uma das principais contribuições dos ganhadores do Prêmio Nobel de 2024 é a de que as instituições importam e são difíceis de mudar. Logo, dificilmente ocorrerão mudanças se não houver um esforço concentrado da sociedade e do Estado.
Embora as mudanças institucionais não dependam apenas do Estado, podem ter nele – por meio de políticas públicas, incentivos e criação de regras jurídicas que atenuem os efeitos de instituições extrativistas – uma excelente mola propulsora das mudanças estruturais no plano social, político e econômico.