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Advogado é um profissional liberal, graduado em Direito e autorizado pelas instituições competentes de cada país a exercer o jus postulandi, ou seja, a representação dos legítimos interesses das pessoas físicas ou jurídicas em juízo ou fora dele, quer entre si, quer ante o Estado.
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Autora:
Tainara Buri¹
Resumo: O presente trabalho aborda a relação entre mulheres vítimas de violência doméstica e o direito processual brasileiro, analisando a questão sob a perspectiva de gênero. A violência doméstica é uma grave violação dos direitos humanos e afeta a autonomia das mulheres, tornando-as vulneráveis em situações processuais, que muitas vezes não são adequadas para evitar a revitimização. Do mesmo modo, busca assegurar que o sistema judicial reconheça e respeite a autonomia das mulheres, promovendo um ambiente que proteja suas necessidades e garantias, em consonância com a normativa internacional, sendo o controle de convencionalidade um instrumento para se estabelecer procedimentos jurídicos mais justos e eficazes.
Palavras-chave: Violência doméstica. Controle de convencionalidade. Perspectiva de gênero. Direitos da Mulher. Revitimização.
Abstract: This paper addresses the relationship between women victims of domestic violence and Brazilian procedural law, analyzing the issue from a gender perspective. Domestic violence is a serious violation of human rights and affects women’s autonomy, making them vulnerable in procedural situations, which are often not adequate to prevent revictimization. Likewise, it seeks to ensure that the judicial system recognizes and respects women’s autonomy, promoting an environment that protects their needs and guarantees, in line with international regulations, with conventionality control being an instrument to establish fairer and more effective legal procedures.
Keywords: Domestic violence. Control of conventionality. Gender perspective. Women’s rights. Revictimization.
Sumário: Introdução. 1. O controle de convencionalidade como instrumento para assegurar os direitos das mulheres vítimas de violência doméstica. 2. Do modelo processual constitucionalizado: incorporação na legislação interna de normas para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher. 3. A perspectiva de gênero no direito brasileiro para elidir a discriminação múltipla e agravada das mulheres vítimas de violência e evitar a revitimização. Considerações Finais. Referências.
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1. Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade de Passo fundo – UPF. Advogada inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, subseção Passo Fundo/RS, sob nº 121.958. Especialista em Direito e Negócios Imobiliários pela Fundação do Ministério Público – FMP. Especialista em Advocacia Cível pela Fundação do Ministérios Público – FMP. Pós-graduanda em Direitos Humanos pela Faculdade CERS. Tem experiência na área de famílias e sucessões, além de cível e processual civil.
Introdução
A violência doméstica contra as mulheres é uma grave violação dos direitos humanos e está inserida em um contexto de desigualdade de poder entre os gêneros, sendo um reflexo de práticas discriminatórias enraizadas na sociedade, sendo que a participação das mulheres vítimas de violência não deve ser restrita ao simples acesso ao Poder Judiciário, mas sim, deve envolver um processo ativo na formulação das normas que regem a sociedade, com o objetivo de garantir a efetiva proteção de seus direitos. Neste cenário, o controle de convencionalidade emerge como um mecanismo crucial para assegurar que as normas infraconstitucionais estejam em conformidade com os tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979) e a Convenção de Belém do Pará (1994). A Lei Maria da Penha, nesse contexto, constitui uma das principais ferramentas para a proteção das mulheres, estabelecendo diretrizes claras de prevenção à violência de gênero e à revitimização das vítimas.
Contudo, o cumprimento das obrigações internacionais exige uma revisão constante das práticas judiciais e legislativas, a fim de que as normas e os procedimentos judiciários promovam um ambiente de justiça mais equitativo e respeitoso aos direitos humanos. O presente trabalho busca, assim, analisar a aplicação do controle de convencionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, destacando sua relevância na construção de um sistema de justiça que efetivamente proteja as mulheres e promova a igualdade de gênero.
- O controle de convencionalidade como instrumento para assegurar os direitos das mulheres vítimas de violência doméstica
A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, “tem inegáveis virtudes, dentre as quais seguramente a mais importante é o seu compromisso visceral com a promoção dos direitos humanos e a defesa da democracia” (Neto e Sarmento 2014 p. 29). Ela também define a dignidade da pessoa humana como fundamento da república e estabelece a igualdade entre homens e mulheres (art. 1º, inciso III e no art. 5º, inciso I, respectivamente).
Assim, é possível compreender que a supremacia constitucional resulta na invalidade dos atos normativos contrários à Constituição Federal. Nesse sentido, aspecto que reforça os direitos das mulheres é o bloco de constitucionalidade como parâmetro do controle de constitucionalidade. Isso porque ele contribui para a efetivação da promoção e proteção dos Direitos Humanos no país, visto que permite que normas internacionais de Direitos Humanos sejam usadas como parâmetro de controle de constitucionalidade, exigindo, ainda, que o os poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – as observem, sob pena de incorrerem em inconstitucionalidade por ação ou omissão.
Nesse sentido, o bloco de constitucionalidade na América Latina tem duas funções principais: 1) resolver a questão de hierarquia interna dos tratados internacionais de direitos humanos, estabelecendo um mecanismo horizontal de harmonização entre o Direito Constitucional e o Direito Internacional dos Direitos Humanos e; 2) consolidar o uso do Direito Internacional como reforço aos compromissos dos Estados em matérias de Direitos Humanos. No Brasil, por exemplo, o art. 5º, §2, da Constituição da República corrobora a escolha constituinte em prol do reconhecimento da força expansiva da dignidade humana e dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico brasileiro, haja vista que o citado dispositivo esclarece que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que o país seja parte (Normanton, 2021).
A discussão, entretanto, consiste em saber se as normas internacionais de Direitos Humanos presentes nos tratados que o Brasil é signatário, apesar de não estarem previstas no texto constitucional, possuem ou não estatura e natureza jurídica de normas constitucionais. A fim de resolver a polêmica, a Emenda Constitucional 45, de 8 de dezembro de 2004, introduziu um terceiro parágrafo ao artigo 5º, a dispor que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos, serão equivalentes às emendas constitucionais.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sobre a hierarquia interna dos tratados internacionais no direito brasileiro, prevê que: 1) tratados sobre direitos humanos aprovados pelo quórum qualificado da Constituição Federal “em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros” – Art. 5º, § 3º: equivalentes às emendas constitucionais; 2) Tratados sobre direitos humanos não aprovados pelo quórum acima: infraconstitucionais e supralegais (estão abaixo da Constituição, mas acima das leis ordinárias e complementares, por exemplo); 3) Tratados que não tratem de direitos humanos: status legal (equivalente às leis ordinárias, por exemplo).
Apesar da existência de tal classificação em sede jurisprudencial (seguida tanto pelo STF quanto pelo STJ), é importante destacar que há relevante doutrina de direitos humanos e de direito internacional que advoga de forma distinta em relação à hierarquia dos tratados internacionais que tratam sobre os direitos humanos, a qual, inclusive, defende-se.
Nessa perspectiva, Mazzuoli (2010, p. 196), descreve que todos os tratados de direitos humanos terão status constitucional: formal e materialmente constitucionais se aprovados conforme quórum especial ou apenas materialmente constitucionais, caso não aprovados pelo quórum qualificado, diante do disposto no art. 5º, § 2º, da Constituição Federal “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.
Ademais, Piovesan (2012, p. 139) entende que duas categorias de tratados internacionais de proteção dos direitos humanos surgiram após a introdução do parágrafo terceiro ao artigo 5º da Constituição brasileira, os materialmente constitucionais e os formal e materialmente constitucionais. Ela também defende que todos os tratados internacionais que versam sobre matéria de direitos humanos e que foram ratificados segundo o ordenamento jurídico brasileiro, possuíam e possuem status de norma constitucional, mesmo antes da promulgação da Emenda Constitucional 45/04,
“(…) sustenta-se que a hierarquia constitucional já se extrai da interpretação conferida ao próprio art. 5°, § 2°, da Constituição de 1988. Vale dizer, seria mais adequado que a redação do aludido § 3° do art. 5° endossasse a hierarquia formalmente constitucional de todos os tratados internacionais de proteção dos direitos ratificados, afirmando – tal como o fez o texto argentino – que os tratados internacionais de proteção de direitos humanos ratificados pelo Estado brasileiro têm hierarquia constitucional (Piovesan, 2008 p. 27)”.
Ao lado do controle de constitucionalidade, que é responsável pela análise da relação estabelecida entre a Constituição Federal e um comportamento ou ato que lhe é ou não compatível, em uma relação de caráter normativa e valorativo, tem-se o controle de convencionalidade, sendo ambos instrumentos de efetivação dos direitos e que devem ser realizados por todos os poderes e pela sociedade, não apenas pelo judiciário.
Conforme explica Sarmento e Neto (2021, p. 52):
“O status supralegal dos tratados internacionais sobre direitos humanos enseja, inclusive, a possibilidade de exercício do chamado controle de convencionalidade das leis, por todos os juízes e tribunais brasileiros no julgamento de casos concretos, fundado na aplicação do critério hierárquico para resolução de antinomias. O exercício deste controle impõe a não aplicação da legislação interna infraconstitucional sempre que ela se afigurar incompatível com tratados internacionais de direitos humanos, bem como o dever de interpretar as normas internas à luz não só da Constituição, como também dos tratados internacionais de direitos humanos de que o país seja parte. De acordo com Néstor Pedro Sagues, ao lado do controle destrutivo de convencionalidade, que envolve a invalidação das normas internas contrárias aos tratados internacionais de direitos humanos, deve-se empreender também o controle construtivo de convencionalidade, que consiste em buscar ajustar a legislação interna à normativa internacional pela via hermenêutica, no afã de construir interpretações da primeira que se compatibilizem com parâmetros internacionais de proteção dos direitos humanos”.
O controle de convencionalidade, por sua vez, consiste na realização da compatibilização da produção normativa interna com os tratados de direitos humanos ratificados pelo governo e em vigor no país. O instituto do controle de convencionalidade tem suas raízes na doutrina francesa, e pode se realizar tanto pela via difusa quanto pela concentrada, podendo e devendo ser realizado por qualquer juiz ou tribunal interno.
A inauguração formal da doutrina do controle de convencionalidade no continente americano remete ao ano de 2006, quando a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) analisou o Caso Almonacid Arellano e outros vs. Chile. A Corte adotou a expressão controle de convencionalidade no corpo da sentença, conforme trecho abaixo:
“A Corte tem consciência de que os juízes e tribunais internos estão sujeitos ao império da lei e, por isso, são obrigados a aplicar as disposições vigentes no ordenamento jurídico. Mas quando um Estado ratifica um tratado internacional como a Convenção Americana, seus juízes, como parte do aparato estatal, também estão submetidos a ela, o que os obriga a velar para que os efeitos das disposições da Convenção não se vejam diminuídos pela aplicação de leis contrárias a seu objeto e a seu fim e que, desde o início, carecem de efeitos jurídicos. Em outras palavras, o Poder Judiciário deve exercer uma espécie de “controle de convencionalidade” entre as normas jurídicas internas aplicadas a casos concretos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Nesta tarefa, o Poder Judiciário deve levar em conta não apenas o tratado, mas também a interpretação que a Corte Interamericana, intérprete última da Convenção Americana, fez do mesmo”. (Exceções preliminares, mérito, reparações e custas, §124)
Na visão de Ramos (2009, p. 245), o controle de convencionalidade também não pode meramente se liminar a citar o texto de determinada convenção ou tratado de direitos humanos, pois há necessidade no Brasil, por meio do seu tribunal maior – Supremo Tribunal Federal – exercite um controle de convencionalidade aplicado, que utilize a interpretação realizada pelos intérpretes finais de tais normas de Direitos Humanos, sendo esses os órgãos internacionais de Direitos Humanos instituídos pelos mencionados tratados, em especial pela Corte interamericana de Direitos humanos, criada pela Convenção americana de Direitos humano no ano de 1979.
Sobre isso, o citado autor, também frisa que o Direito Internacional dos Direitos Humanos desenvolveu o princípio da primazia da norma mais favorável ao indivíduo, a fim de buscar solucionar eventual conflito entre a norma interna e a norma internacional.
Corrobora desse entendimento, Paiva e Heemann (2020, p. 185), ao informar que são princípios reitores do controle de convencionalidade: a) princípio da presunção relativa de convencionalidade dos atos normativos internos; b) princípio da interpretação conforme os direitos humanos; c) princípio da progressividade: conhecido também como máxima integridade dos direitos humanos e impede que o controle de convencionalidade seja exercido para restringir a proteção dos direitos humanos; d) princípio da interpretação internacionalista; e) princípio da atipicidade dos meios de controle de convencionalidade e; e) princípio da interpretação pro persona, também conhecido como pro homine, o qual busca sempre a interpretação mais protetiva ou favorável ao indivíduo.
Assim, o princípio pro persona, que é verdadeiro dispositivo convencional internacional, já que é cláusula prevista em tratado internacional, defende a aplicação pelo intérprete, necessariamente da norma mais favorável ao indivíduo, o que leve a concluir que hora será a norma internacional e outrora a norma interna, conforme o caso concreto a ser analisado. O próprio Direito Internacional possibilita a aplicação da norma interna que for mais favorável ao indivíduo, pois a cláusula da primazia da norma mais favorável é comum em tratados de Direitos Humanos, nos quais se estabelece que as disposições mencionadas na convenção e/ou tratado não poderão ser utilizadas como justificativa para a diminuição ou eliminação de maior proteção oferecida por outro tratado.
Como exemplo, Ramos (2009, p. 255), retrata que tal cláusula é encontrada no art. 5. 2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP), no art. 5.o do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, no art. 60 da Convenção Européia de Direitos Humanos e no art. 29, b da Convenção Americana de Direitos Humanos. O art. 29, b, da Convenção Americana de Direitos Humanos é bem ilustrativo:
“Nenhuma disposição da presente Convenção pode ser interpretada no sentido de: b. limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos em virtude de leis de qualquer dos estados-partes ou em virtude de Convenções em que seja parte um dos referidos estados”.
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O caso versa sobre a execução extrajudicial do Sr. Luis Alfredo Almonacid Arellano, militante da esquerda chilena e integrante do Partido Comunista, por agentes do Estado do Chile no período ditatorial. Após a falta de investigação e punição dos responsáveis, os familiares da vítima peticionaram perante a CIDH em setembro de 1988. Fracassadas as tentativas de solucionar a demanda, a CIDH submeteu o caso à Corte Interamericana (Paiva, 2020, p. 181).
A Corte interamericana de Direitos humanos já reconheceu o princípio da norma mais favorável no parecer consultivo relativo à filiação compulsória de jornalistas em uma associação. No parecer, solicitado pela Costa Rica, estabeleceu-se que “En consecuencia, si a una misma situación son aplicables al Convención Americana y otro tratado internacional, debe prevalecer la norma más favorable a la persona humana”.
O princípio não é imune a críticas e alguns autores defendem a necessidade de releitura, de todo modo, a fim de não fugir do estudo em tela, apenas se ressalta a necessidade do Estado brasileiro em respeitar os compromissos internacionais assumidos e a ausência de qualquer óbice de direito interno, ainda que constitucional, para cumprir os comandos e aplicar o princípio da primazia da norma mais favorável ao indivíduo.
Tal observação é importante, ainda mais quando se analisa o direito das minorias. Termo usado pelos autores Cauê Freire e Rafaela Martins (2024, p. 21) na obra Direito das Minorias e que traz importante reflexão. Isso porque o termo minorias representa, ao mesmo tempo, uma pequena parcela quantitativa da população, o que já gera em si vulnerabilidades, mas também representa uma parcela especificamente excluída da sociedade, alvo de preconceito, violência e intolerância. Ocorre que, os grupos sofrendo unicamente por serem histórica e socialmente excluídas, são gigantescos. São mulheres, sobretudo vítimas de violências cotidianas, pessoas transsexuais, pessoas pretas ou pessoas em situação de rua.
Tal premissa vai ao encontro do pensamento da socióloga e pesquisadora Nancy Fraser. Para ela “o fortalecimento do feminismo e a luta pela igualdade de gênero devem ser pautados pelas correções de assimetrias geradas nesses três fronsts, quais sejam, a distribuição, o reconhecimento e a representação” (Paiva 2020, p. 192).
Os problemas de relacionamento estão atrelados a questões culturais, pois retratam o modo como determinadas minorias são vistas no contexto social. Os problemas de distribuição se referem ao aspecto econômico, vez que decorrem de uma partilha não equitativa das riquezas e recursos, o que pode desencadear a estigmatização nos integrantes das minorias. Por fim, o problema da representação demonstra que, na ampla maioria dos casos, as minorias estigmatizadas não possuem representantes nos órgãos políticos, o que ocasiona uma sufocação das maiorias sobre as minorias (Paiva, 2020)
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Corte Interamericana de Direitos Humanos, Parecer Consultivo sobre a filiação obrigatória de jornalistas (arts. 13 e 29 da Convenção americana de Direitos humanos), Parecer n. 5/85 de 13 de novembro de 1985, Série a n. 5, § 52, p. 31 –
Nancy Fraser é uma filósofa e teórica crítica feminista estadunidense. Fraser nasceu em 1947 em Baltimore, Maryland, uma cidade marcada pelas leis Jim Crow de segregação racial que, nos anos 1960, foi palco das lutas que deram início aos movimentos por direitos civis nos Estados Unidos. (Bressiani, 2024).
O presente trabalho se debruça sobre o grupo das mulheres vítimas de violência doméstica, familiar e afetiva e nesse ínterim observa-se a importância do controle de convencionalidade para assegurar seus direitos e a aplicação do princípio pro persona, além da aplicação do bloco de constitucionalidade para que o intérprete utilize do maior arcabouço possível de normas para assegurar direitos e promover as mudanças necessárias no cenário brasileiro. Isso porque a lei não resume o direito e o direito não consegue prever e acompanhar todas as relações da vida e entre os indivíduos. Por isso a completude do direito interno com o internacional é tão importante. Cançado Trindade, ex-Presidente da Corte Americana de Direitos Humanos, reforça que não se pode legitimamente esperar que as disposições internacionais se subordinem às soluções de Direito Constitucional ou de Direito Público interno.
Assim, em que pese inovadora e programática no âmbito interno, a Constituição Brasileira de 1988, ainda é considerada jovem e exige interpretações constantes, o que reforça a necessidade dos intérpretes se socorrerem da normativa internacional. Não obstante, ela serve de parâmetro para interpretação e aplicação das demais normas do ordenamento brasileiro, no qual está inserido o Código de Processo Civil que desempenha um papel crucial na garantia dos direitos das mulheres, especialmente no Direito de Famílias. Acerca da normativa infraconstitucional, além de estar em consonância com o texto constitucional, precisa se adequar ao direito internacional.
- Do modelo processual constitucionalizado: incorporação na legislação interna de normas para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher
Segundo Neto e Sarmento (2021 p. 45), a constitucionalização tem provocado a releitura dos institutos mais importantes e tradicionais do direito civil brasileiro, tais como a propriedade, a posse, o contrato, o direito de famílias, entre outros, de modo a torná-los compatíveis com os valores humanitários da Constituição Federal. Há no país a formação da escola de “Direito Civil-Constitucional”, capitaneada por Gustavo Tepedino, Maria Celina Bodin de Moraes e Edson Fachin, os quais revisitam a dogmática civilista a partir da ótica constitucional.
Esse novo olhar envolve o reconhecimento da “eficácia horizontal” dos direitos fundamentais, bem como a personalização e a despatrimonialização. Trata-se de reconhecer a prioridade de valores existenciais sobre os valores meramente patrimoniais no âmbito jurídico-privado. Contudo, “a valorização excessiva da norma jurídica ainda é uma realidade que impede colocar sob proteção a família e seus conflitos, em razão da impossibilidade de o direito positivo regulamentar as singularidades de cada arranjo familiar” (Dias 2017, p. 72).
A proteção dos direitos das mulheres, em especial das vítimas de violência doméstica, no direito processual civil exige uma abordagem que considere as especificidades de gênero e o controle de convencionalidade. Ao integrar essas perspectivas, o sistema jurídico pode se tornar mais eficaz na prevenção e combate à violência, assegurando que as vítimas tenham acesso à proteção e à justiça. A construção de um ambiente jurídico mais sensível às questões de gênero não apenas beneficia as mulheres, mas também promove uma sociedade mais justa e igualitária.
Conforme ensina Dias (2017, p. 71),
“Como a finalidade da legislação é organizar a sociedade, a tendência é preservar as estruturas de convívio já existentes. O legislador não é afeiçoado a criar, inovar. Limita-se a estabelecer regras de conduta dotadas de sanção e não consegue se desapegar dessa função na hora de regular relações afetivas. A lei é retardatária, sempre vem depois. Daí a tendência de ser conservadora. Tenta impor limites, formatar comportamentos dentro dos moldes preestabelecidos pela sociedade, na busca de colocar molduras nos fatos da vida.
Quando não existe direito positivado, a função de apanhar o fato e conferir-lhe tutela jurídica, é delegada ao Poder Judiciário, que tem o dever de fazer justiça. Esse é o papel social mais significativo que, historicamente, lhe foi reservado. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturas e as relativas aos costumes, na qual a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. O desafio do juiz moderno está em julgar com justiça, valendo-se dos princípios ético-jurídicos num balanceamento dos interesses em conflito. Não lhe compete a simples aplicação das leis. É preciso aplicá-las de modo a encontrar o justo no caso concreto”.
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O juiz Trindade afirmou que, “no se pude legitimamente esperar que dichas disposiciones convencionales se ‘adapten’ o se subordinen a las soluciones de derecho constitucional o de derecho público interno” Corte interamericana de Direitos humanos, Caso el amparo – Reparação, sentença de 16 de abril de 1997. São José: Secretaría de la Corte, 1997. voto dissidente, § 14.
De acordo com Sandel (2022, p. 17), na perspectiva de Aristóteles, não se pode imaginar o que é uma Constituição justa sem antes refletir sobre a forma de vida mais desejável, pois a lei não pode ser neutra no que tange à qualidade de vida. Logo, é evidente que toda mulher possui o direito intrínseco de viver em uma sociedade sem violência e que cabe ao Estado desenvolver políticas para esse fim, consistindo a omissão em evidente afronta aos direitos humanos. Foi esse contexto de omissão estatal brasileiro que deu origem a lei que protege as mulheres vítimas de violência doméstica no Brasil, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha.
O nome popular da lei não se dá por acaso. Conforme Freire e Martins (2024, p. 117-118), no dia 29 de maio de 1983 aconteceu no Ceará um fato corriqueiro na rotina de muitas mulheres brasileiras, um crime contra a vida por parte de quem deveria, inclusive de forma legal – art. 1566 do CC – dar assistência e cuidar com respeito e consideração. Naquele dia, Marco Antônio Heredia Viveiros, na época marido de Maria da Penha Maia Fernandes, tenta, simulando um assalto, matar a esposa com um disparo de arma de fogo a queima roupa pelas costas.
Maria da Penha sobrevive a esse ataque e, após sofrer várias outras agressões, inclusive mais uma tentativa de feminicídio, através de uma descarga elétrica enquanto tomava banho de banheira, faz de sua vida uma luta constante pela própria vida. Em setembro de 1984 o Ministério Público do Estado do Ceará oferece denúncia contra Marco Antônio pelo fato praticado em maio de 1983. Todavia, apenas em 1991, 8 anos após a tentativa de feminicídio, Marcos é condenado pelo Tribunal do Júri a 8 anos de prisão. Recorreu, em liberdade, e aguardou mais 5 anos, por um novo julgamento. O novo júri aconteceu em 1996 e ele fora condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Novamente recorreu em liberdade.
Em 1998, 15 anos após o crime, a vítima percebendo que não teria resposta do Estado brasileiro, por meio de um coletivo de advogadas, acessa a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que recebe a denúncia em razão da demora e impunidade no julgamento de Marcos Antônio. No ano de 2001 a CIDH declarou o Estado brasileiro responsável pela violação do direito da vítima à proteção judicial e faz uma série de recomendações, dentre elas a aceleração da punição do agressor da vítima Maria da Penha, a apuração das razões para a morosidade do processo, além de iniciativas que ambicionassem o fim de comportamentos discriminatórios e violentos contra mulheres. Sendo assim, em 2006, é sancionada a Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha, entrando em vigor em 22/09/2006. Desde então a legislação brasileira avança para assumir uma política criminal mais rigorosa no campo da violência doméstica e familiar.
Recentemente, a Lei 14.994, de 9 de outubro de 2024, que entrou em vigência a partir da publicação, trouxe relevantes modificações para o cenário dos crimes de violência doméstica e familiar, no Brasil. Dentre as principais alterações estão: a criação da figura típica autônoma do delito de feminicídio (art. 121-A, CP); aumento das penas da lesão corporal, tanto do §9 como do §13; elevação da pena do delito de descumprimento de decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência em favor da mulher, no cenário da violência doméstica e familiar; aumento da infração de ameaça quando for cometida contra a mulher, por razões de sexo feminino, além de da ação penal torna-se pública incondicionada; a contravenção penal de vias de fato obteve aumento e a lei também teve reflexos na Lei de Execuções Penais.
Por último, como efeitos da condenação, obrigatórios e automáticos, figuram, agora, a incapacidade para o exercício do poder familiar, da tutela ou da curatela e a perda de cargo, função ou mandato eletivo. Durante o cumprimento da pena, o sentenciado não pode ser nomeado, designado ou diplomado para cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 92, II, e §§ 1º e 2º, CP).
Sobre a mencionada lei, Nucci (2024) destaca que não será com a modificação da lei penal que a violência contra a mulher será estancada em curto espaço de tempo, pois se trata de longo processo de reeducação da sociedade, visando eliminar o machismo e a concepção patriarcal ainda dominantes. Em analogia, adotar uma perspectiva de gênero no direito processual civil implica não apenas em considerar as particularidades da violência de gênero, mas também em transformar a forma como os processos são conduzidos.
Não desconsiderando a ideia de incompletude do sistema legislativo e a necessidade de se assegurar o pleno desenvolvimento e progresso das mulheres, o art. 5º da Lei Maria da Penha, define violência doméstica e familiar contra a mulher como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. O Instituto Maria da Penha (2024) explica que “estão previstos cinco tipos de violência doméstica e familiar contra a mulher na Lei Maria da Penha: física, psicológica, moral, sexual e patrimonial − Capítulo II, art. 7º, incisos I, II, III, IV e V”. O capítulo II da Lei 11.340/06, detalha as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher da seguinte forma:
“Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria”.
Na parte dos procedimentos, por sua vez, a lei prevê, no art. 14-A, que a ofendida tem a opção de propor a ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, sendo que se exclui de tal competência a pretensão relacionada à partilha de bens (art. 14-A, §1, da Lei 11.340/06). Sobre esse ponto, destaca-se que, segundo o Código de Processo Civil, art. 53, inciso I, alínea “d”, é competente o foro para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar. Já o artigo 1048, inciso III, do CPC estabelece que terão prioridade de tramitação, em qualquer juízo ou tribunal, os procedimentos judiciais em que figure como parte a vítima de violência doméstica e familiar.
Dito isso, nota-se, por consequência, que o direito processual civil, tradicionalmente focado em questões patrimoniais e de responsabilidade civil, também desempenha um papel crucial na proteção das mulheres vítimas de violência. A utilização de ações como a tutela provisória e as medidas cautelares são essenciais para assegurar a proteção imediata das vítimas, permitindo que a Justiça intervenha rapidamente para evitar novos episódios de violência.
Acerca do pedido de divórcio litigioso, por exemplo, a jurisprudência já entende que é possível o pedido de julgamento antecipado de mérito, com base nos artigos. 355, I ou 356, I do CPC, antes mesmo da citação do requerido, haja vista a desnecessidade de produção probatória e a natureza incontroversa do pedido. Tal argumento também é tese institucional aprovada pela Defensoria Pública do Paraná no VII Encontro Anual de Defensoras e Defensores Públicos no tocante à adoção de teses institucionais.
O Código de Processo Civil também enfatiza os princípios infraconstitucionais da boa-fé objetiva (nemo venire contra factum proprium; supressio e surrectio), primazia da resolução do mérito (solução do litígio) e cooperação entre as partes.
Além disso, conforme Farinhas (2016),
“O novo Código processual exsurge mais constitucionalizado e, portanto, afinado com o Estado Democrático de Direito destacando, implicitamente, desde o seu art. 1 e seguintes, a dignidade da pessoa humana (cláusula geral que denota a ideia do valor da vida intrínseco a cada processo), proporcionalidade/razoabilidade, publicidade, legalidade, eficiência, indispensável fundamentação das decisões, sob pena de nulidade, observância da concessão do contraditório às partes, devido processo legal, juiz natural, necessária motivação das decisões judiciais, dentre outros princípios fundamentais garantidos pela Constituição brasileira”.
Não obstante, sabe-se que o ordenamento jurídico brasileiro prioriza a prática de soluções consensuais dos conflitos, especialmente a mediação e a conciliação, para obter a resolução do mérito de forma mais célere e com a participação das partes, pois “a transformação social impôs um volume maior de disputas, a crise dos Estados nacionais abriu espaço para novas arenas de litigância e o perfil variado dos litígios exige adequados métodos para resolvê-las” (Silva 2019, p. 17). Tais institutos são utilizados com destaque nas ações de família.
Ocorre que o sistema multiportas de resolução de conflitos nem sempre será a melhor opção frente ao caso concreto, especialmente em situações envolvendo violência doméstica e direito de famílias. O Código de Processo Civil, por exemplo, condiciona o cancelamento das sessões de mediação e conciliação à manifestação de ambas das partes, conforme disposto expressamente no art. 334, §4, inciso I. Assim, pela regra, ambas as partes precisam se manifestar pelo cancelamento.
No mesmo sentido é o artigo 694 do CPC, que destaca que nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia. Segundo a legislação, a audiência de conciliação e de mediação é obrigatória nas ações de família, não podendo ser dispensada. Tal disposição está prevista no artigo 695 do CPC/15, constando do Capítulo que regulamenta as ações de família, nos seguintes termos: “Recebida a petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências referentes à tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação, observado o disposto no art. 694”. Todavia, tal dispositivo legal mostra-se imperativo e inconvencional, pois retira da vítima a possibilidade de aderir ou não ao ato, especialmente em demandas sensíveis que envolvem questões existenciais, tais como guarda, visitas e alimentos.
Tendo em vista a vulnerabilidade das mulheres vítimas de violência, bem como as previsões internacionais, a jurisprudência vem mitigando essa obrigatoriedade em casos excepcionais, como nas situações de violência doméstica. Assim, caso haja medida protetiva (artigos 22, II, 23, II, III, da Lei11.340/2006) ou determinação judicial específica que indique sério conflito entre as partes ou qualquer outra ordem judicial análoga em sede de tutela específica (artigos 139, IV, 497, CPC), a audiência poderá ser dispensada.
Importa frisar, que o cancelamento não deve ficar atrelado unicamente ao deferimento das medidas protetivas, sendo que a doutrina especializada defende que basta a manifestação da vítima na petição inicial, por meio de tópico em que ela manifesta seu desejo em não participar do ato. Sem dúvida essa é a melhor interpretação, já que a aproximação das partes não convém pelo histórico de violência doméstica ou possibilidade de revitimização da mulher, oportunizando, nessa lógica, a citação do art. 334, §4, do Código de Processo Civil: “a audiência não será realizada […] quando não se admitir a autocomposição”. Tal entendimento está presente no enunciado 639 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC), o que preceitua que “o juiz poderá, excepcionalmente, dispensar a audiência de mediação ou conciliação nas ações de família, quando uma das partes estiver amparada por medida protetiva”.
Outrossim, é de se ressaltar que a mediação é ato que pressupõe um mínimo de consenso entre as partes, inexistente, muitas vezes, nos casos que envolvem violência doméstica, em especial quando há medidas protetivas deferidas em face do agressor. Além disso, importa ressaltar que mediação e conciliação não se confundem. Isso porque,
“A mediação busca transformar uma situação adversarial em um processo colaborativo, estimulando o diálogo e a construção criativa da solução pelas próprias partes. É uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira pessoa, neutra e imparcial, facilita o diálogo para que os mediadores construam, com autonomia e solidariedade, uma melhor solução. Já na conciliação o terceiro facilitador pode adotar uma posição mais ativa, porém neutra e imparcial com relação ao conflito. É um processo consensual breve, que busca uma efetiva harmonização social e a restauração, dentro dos limites possíveis, da relação social das partes” (Dias 2017, p. 75).
Na esfera penal, por exemplo, em novembro de 2021, entrou em vigor a Lei nº 14.245, conhecida como Lei Mariana Ferrer, que visa coibir a prática de atos atentatórios à dignidade de vítima e testemunhas, em especial nos crimes contra a dignidade sexual, além de almejar coibir a vitimização das vítimas pelas instituições. As alterações trazidas pela citada legislação buscam reprimir a chamada vitimização secundária ou revitimização, a qual se refere às agressões sofridas pelas vítimas no âmbito público, praticadas por agentes públicos ou pela própria sociedade.
Já a Lei Maria da Penha, no art. 10, §1, incisos I, II e III, estabelece que a inquirição de mulher em situação de violência doméstica e familiar obedecerá as seguintes diretrizes: I – salvaguarda da integridade física, psíquica e emocional da depoente, considerada a sua condição peculiar de pessoa em situação de violência doméstica e familiar; II – garantia de que, em nenhuma hipótese, a mulher em situação de violência doméstica e familiar, familiares e testemunhas terão contato direto com investigados ou suspeitos e pessoas a eles relacionadas e III – não revitimização da depoente, evitando sucessivas inquirições sobre o mesmo fato nos âmbitos criminal, cível e administrativo, bem como questionamentos sobre a vida privada.
Além disso, a própria ementa da lei menciona a Constituição Federal da República, indicando o §8, do art. 226, que dispõe que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações” (Brasil, 1998).
No que diz respeito aos direitos das mulheres no âmbito internacional de proteção, destaca-se as previsões da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – Convenção de Belém do Pará, promulgada em 9 de junho de 1994 (Decreto 1.973/96). A Convenção, especialmente no artigo 7, alínea “c” prevê que os Estados Partes devem incorporar na sua legislação interna normas penais, civis, administrativas e de outra natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como adotar as medidas administrativas adequadas que forem aplicáveis.
Também devem adotar, conforme alínea “d”, medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha de perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que danifique ou ponha em perigo sua vida ou integridade ou danifique sua propriedade, além de estabelecer, segundo a alínea “f”, procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher sujeitada a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, juízo oportuno e efetivo acesso a tais processos. Não obstante, toda medida deverá levar especialmente em consideração a situação da mulher vulnerável a violência, por sua raça, origem étnica ou condição de migrante, de refugiada ou de deslocada, entre outros motivos (art. 9 da Convenção de Belém do Pará).
A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (Decreto 4.377/02), reafirma a necessidade de medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para assegurar o pleno desenvolvimento e o progresso da mulher, sendo tais medidas de caráter temporário e usadas para acelerar a igualdade de fato e alterar os padrões socioculturais de conduta, a fim de eliminar preconceitos e práticas consuetudinárias ou de outra índole baseadas na ideia de superioridade ou inferioridade de qualquer dos sexos e para garantir que a educação familiar inclua a compreensão adequada da maternidade como função social e o reconhecimento da responsabilidade comum entre homens e mulheres quanto ao desenvolvimento dos filhos (arts. 3 a 5 da citada Convenção).
Especificamente sob o direito subjetivo ao cancelamento da audiência de mediação, consta a Recomendação n° 33 do Comitê CEDAW, itens 57 e 58, vinculado à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Sistema ONU):
“O Comitê recomenda que os Estados partes: a) Informem às mulheres sobre seus direitos de utilizar mediação, conciliação, arbitragem e resolução colaborativa de disputas; b) Assegurem que procedimentos alternativos de resolução de disputas não restrinjam o acesso pelas mulheres a remédios judiciais e outros em todas as áreas do direito, e não conduzam a novas violações de seus direitos; c) Assegurem que casos de violência contra as mulheres, incluindo violência doméstica, sob nenhuma circunstância sejam encaminhados para qualquer procedimento alternativo de resolução de disputas”.
Tal comentário reforça a visão emancipatória da vítima, em respeito à autonomia em escolher por se ausentar ou não ser submetida a procedimentos alternativos que lhe conduzam a novas violações de direitos. Há que se considerar também a proteção à integridade psíquica da mulher, igualmente tutelada pela Lei 11.340/06 e pela Convenção de Belém do Pará (Sistema Interamericano), e que restará comprometido em caso de negativa do pedido por parte do Poder Judiciário.
É visível que impor à vítima de violência doméstica a sua participação na audiência de conciliação com o agressor, significará expor a risco sua integridade física e psíquica, além de compreender que eventual manifestação de vontade pode estar corrompida pelo medo de se proteger e proteger a família. Importa revitimizar ou reviver a violência.
Dito isso, percebe-se a vontade do legislador em adotar medidas para proteger os direitos das mulheres e concretizar a igualdade material, contudo, a aplicação das medidas processuais cíveis, muitas vezes esbarra em preconceitos de gênero e na falta de sensibilidade dos operadores do direito. A perspectiva de gênero deve ser incorporada ao processo para que as especificidades das situações enfrentadas pelas mulheres sejam reconhecidas e tratadas adequadamente. As influências do patriarcado, do machismo, do sexismo, do racismo e da homofobia são transversais a todas as áreas do direito, produzindo efeitos na sua interpretação e aplicação, por isso torna-se fundamental o controle de convencionalidade, como instrumento que permite verificar se as normas infraconstitucionais estão em conformidade com os tratados internacionais de direitos humanos.
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Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: I – fidelidade recíproca; II – vida em comum, no domicílio conjugal; III – mútua assistência; IV – sustento, guarda e educação dos filhos; V – respeito e consideração mútuos.
- A perspectiva de gênero no direito brasileiro para elidir a discriminação múltipla e agravada das mulheres vítimas de violência e evitar a revitimização
“A presença da mulher é uma história de ausência”. Sua voz, até pouco tempo, não era ouvida e seu pensamento não era convidado a participar, sendo que a ela era imposta a submissão, e aos filhos a obediência. (Dias 2017, p. 111). Sem dúvida, muito se evoluiu nos direitos das mulheres, seja pela possibilidade de votar, estudar, assumir cargos políticos, planejar sua família e exercer seus direitos sexuais e reprodutivos. Tal evolução, está atrelada ao feminismo, termo derivado do francês – “feminisme” – e foi cunhada por Charles Fourier. “O feminismo é um movimento social e político que possui como sua principal causa ideológica a luta pela igualdade de gênero e seus consectários, como, por exemplo, o combate à violência de gênero” (Paiva 2020, p. 191).
Ao longo da história do movimento, de acordo com Paiva (2020), costuma-se distinguir três ondas do feminismo. A primeira teria se originado do movimento sufragista, durante o século XIX e início do século XX, em todo o mundo, mas, especialmente na França, Reino Unido, Canadá, Países Baixos e Estados Unidos; a segunda remete à década de 1960 e ampliou a discussão sobre sexualidade, família, mercado de trabalho, direitos sexuais e reprodutivos, bem como igualdade de gênero. Iniciada nos EUA e se espalhou pelo ocidente, sendo que reforçou o problema do estupro conjugal e da violência doméstica e familiar contra a mulher; a terceira onda teve início no começo dos anos 1990 e expande as questões abordadas pelas anteriores para incluir um grupo diversificado de mulheres com um conjunto de identidades variadas e não mais apenas mulheres brancas e mais avantajadas financeiramente.
Isso posto, nota-se que desde meados de 1960 já se discutia a violência doméstica e familiar contra a mulher. Contudo, a edição 2024 do Relatório Atlas da Violência mostra que, de acordo com os registros de óbitos, 34,5% dos homicídios de mulheres ocorreram em domicílios, totalizando 1.313 vítimas em 2022, sendo que esse percentual se aproxima da proporção de feminicídios identificados pelas polícias brasileiras em relação ao total de homicídios femininos, que em 2022 chegou a 36,6% (FBSP, 2023b). Tais dados comprovam que, ainda hoje, século XXI, persiste a violência doméstica e familiar contra a mulher, em que pese a evolução legislativa e a ampliação de direitos, demonstrando que o problema deve ser discutido por toda a sociedade brasileira, pois não se trata de casos isolados, mas de problema estrutural.
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CERQUEIRA, Daniel; BUENO, Samira (coord.). Atlas da violência 2024. Brasília: Ipea; FBSP, 2024. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/14031 Acesso em 03/11/2021.
Nessa linha, segundo dados divulgados pela ONU Mulheres, a América Latina tem despontado no ranking das regiões mais violentas para as mulheres, especialmente quanto aos índices de feminicídio e violência doméstica. A fim de eliminar o tratamento discriminatório nas respostas judiciais contra às mulheres, e, principalmente, de evitar que a violência de que são vítimas no âmbito privado ou público seja seguida de uma violência institucional, foi lançado, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, o qual cumpre uma das Recomendações do Comitê da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Cedaw), que orienta os estados-partes a adotarem medidas, incluindo programas de conscientização e capacitação dos agentes do sistema de Justiça e dos estudantes de direito, para eliminar os estereótipos de gênero e incorporar a perspectiva de gênero em todos os aspectos do sistema.
Também cumpre uma das determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Marcia Barbosa de Souza e Outros vs. Brasil, no qual o Brasil foi condenado a adotar e implementar um protocolo nacional que estabeleça critérios claros e uniformes para a investigação dos feminicídios, dirigido ao pessoal que, de alguma maneira, intervenha na investigação e na tramitação de casos de mortes violentas de mulheres.
A Recomendação 128/2022 do CNJ orienta acerca da adoção do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, a fim de estabelecer o aspecto gênero como metodologia de julgamento. Depois, a Resolução CNJ 429/2023 estabeleceu a obrigatoriedade das diretrizes da norma em âmbito nacional. Isso porque o protocolo foi concebido em três partes e traz informações sobre questões de gênero, um guia para a magistratura e questões específicas sobre ramos da Justiça, com destaque para temas transversais. O Protocolo diferencia sexo biológico, gênero, sexualidade e identidade de gênero, defendendo que o gênero é o conceito mais adequado para se estabelecer diferenciações sociais entre as pessoas, pois:
“Utilizamos a palavra gênero quando queremos tratar do conjunto de características socialmente atribuídas aos diferentes sexos. Ao passo que sexo se refere à biologia, gênero se refere à cultura. Quando pensamos em um homem ou em uma mulher, não pensamos apenas em suas características biológicas; pensamos também em uma série de construções sociais, referentes aos papéis socialmente atribuídos aos grupos: gostos, destinos e expectativas quanto a comportamentos. Da mesma forma, como é comum presentear meninas com bonecas, é comum presentear meninos com carrinhos ou bolas. Nenhum dos dois grupos têm uma inclinação necessária a gostar de bonecas ou carrinhos, mas, culturalmente, criou-se essa ideia – que é tão enraizada que, muitas vezes, pode parecer natural e imutável. A atribuição de características diferentes a grupos diferentes não é, entretanto, homogênea. Pessoas de um mesmo grupo são também diferentes entre si, na medida em que são afetadas por diversos marcadores sociais, como raça, idade e classe, por exemplo. Dessa forma, é importante ter em mente que são atribuídos papéis e características diferentes a diferentes mulheres” (Conselho Nacional de Justiça, 2024).
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No dia 7 de setembro de 2021, o Brasil foi declarado internacionalmente responsável pelo feminicídio de Márcia Barbosa de Souza, praticado por um parlamentar que se beneficiou indevidamente de sua imunidade parlamentar, para não ser responsabilizado no plano interno. Embora não seja a primeira vez que a Corte IDH julga Estados partes da CADH por feminicídio praticados por particulares, é uma jurisprudência que traz importantes aportes sobre as consequências para o Estado que deixa de cumprir com a devida diligência para prevenir, investigar e punir a violência contra a mulher, em razão da aplicação indevida de imunidade parlamentar. (Magno, 2022).
O Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero é obrigatório desde março de 2023 e está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5 – Igualdade de gênero para alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas – e 16 – Paz, Justiça e Instituições Eficazes para promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas a todos os níveis – da Agenda 2030 da ONU, por conseguinte, a atuação do defensor público e advogados em um processo do direito de família (direito de guarda e visitas, por exemplo) deve observar a existência ou não de uma situação de violência de gênero de modo interseccional, além do referido protocolo de julgamento de gênero, independentemente do polo – ativo ou passivo – defendido.
A interseccionalidade revela que as experiências das mulheres não são homogêneas, sendo influenciadas por diversas dimensões sociais. Sobre isso, sabe-se que, quanto maior o número de marcadores (a exemplo de gênero, raça, classe, em situação de privação de liberdade, migração, entre outros), em maior situação de vulnerabilidade estará a mulher, mais discriminada e excluída socialmente ela estará e serão necessários maiores esforços do Estado para assegurar os direitos humanos.
Assim, há necessidade de uma abordagem que considere a diversidade das experiências femininas para promover uma justiça verdadeiramente equitativa. A interseccionalidade também é um dos elementos essenciais à defesa adequada da mulher em situação de violência e é corroborada pelo conceito de discriminação múltipla ou agravada, a qual é prevista na Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e as Formas Correlatas de Intolerância que tem status equivalente aos das emendas constitucionais (Artigo 5º, §3º, CRFB/1988) como se vê:
“Discriminação múltipla ou agravada é qualquer preferência, distinção, exclusão ou restrição baseada, de modo concomitante, em dois ou mais critérios dispostos no Artigo 1.1, ou outros reconhecidos em instrumentos internacionais, cujo objetivo ou resultado seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes, em qualquer área da vida pública ou privada”.
Também a interseccionalidade demonstra que há diversos fatores de vulnerabilidades que podem se sobrepor em uma questão de violência de gênero (como a idade, a etnia, ser pessoa com deficiência, ser mulher periférica, ser imigrante, grau de dependência econômica etc.), em conjunto com outros fatores estruturais para além do patriarcado (como a pobreza, o acesso à instrução formal – escolaridade) que criam diferentes graus de desigualdades em uma questão que, a princípio, envolveria “apenas” a violência de gênero. O art. 9º da Convenção de Belém do Pará, por exemplo, estabelece que os Estados partes devem levar em consideração a multiplicidade de fatores de vulnerabilidade (como raça, origem étnica ou condição de migrante) na adoção de medidas de proteção. A interseccionalidade tem sido debatida também na jurisprudência da Corte Interamericana e do Comitê CEDAW.
Não obstante, estão entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) constantes na Agenda 2030 – Objetivo 5. Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. 5.1 Acabar com todas as formas de discriminação contra todas as mulheres e meninas em toda parte. […] 5.3 Eliminar todas as práticas nocivas, como os casamentos prematuros, forçados e de crianças e mutilações genitais femininas […].
A própria existência da Defensoria Pública é uma fórmula reforçada para se garantir acesso à justiça aos que se encontrem em situação de vulnerabilidade, conforme previsto nas 100 Regras de Brasília. O documento, na secção 3, prevê que são destinatários do conteúdo das Regras:
(24) Serão destinatários do conteúdo das presentes Regras:
- a) Os responsáveis pela concepção, implementação e avaliação de políticas públicas dentro do sistema judicial;
- b) Os Juízes, Fiscais, Defensores Públicos, Procuradores e demais servidores que laborem no sistema de Administração de Justiça em conformidade com a legislação interna de cada país;
- c) Os Advogados e outros profissionais do Direito, assim como os Colégios e Agrupamentos de Advogados;
- d) As pessoas que desempenham as suas funções nas instituições de Ombudsman (Provedoria).
- e) Polícias e serviços penais.
- f) E, com carácter geral, todos os operadores do sistema judicial e quem intervém de uma ou de outra forma no seu funcionamento.
O conceito de pessoas em situação de vulnerabilidade, por sua vez, consta na secção 2, itens 3 e 4, sendo que, engloba pessoas que por razão da sua idade, gênero, estado físico ou mental, ou por circunstâncias sociais, econômicas, étnicas e/ou culturais, encontram especiais dificuldades em exercitar com plenitude perante o sistema de justiça os direitos reconhecidos pelo ordenamento jurídico. Outrossim, podem consistir em causas de vulnerabilidade: a idade, a incapacidade, a pertença a comunidades indígenas ou a minorias, a vitimização, a migração e o deslocamento interno, a pobreza, o género e a privação de liberdade.
A partir da análise de tais conceitos, se verifica que a Defensoria Pública configura, a um só tempo, direito e garantia fundamental, pois é voltada à implementação do acesso à justiça, conforme artigos 134 e 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal de 1988 e garante a defesa dos vulneráveis, grupo que envolve as mulheres vítimas de violência doméstica. Assim como ela, advogados também são destinatários da norma e devem atuar de modo a efetivar o direito das mulheres e não causar revitimizações.
Sobre isso, o Supremo Tribunal Federal, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 779, em decisão unânime, proibiu o uso da tese da legítima defesa da honra em crimes de feminicídio. Segundo o tribunal superior, a tese contraria os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção à vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF). Constou na decisão:
“O Tribunal, por unanimidade, julgou integralmente procedente o pedido formulado na presente arguição de descumprimento de preceito fundamental para: (i) firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção à vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF); (ii) conferir interpretação conforme à Constituição aos arts. 23, inciso II, e 25, caput e parágrafo único, do Código Penal e ao art. 65 do Código de Processo Penal, de modo a excluir a legítima defesa da honra do âmbito do instituto da legítima defesa e, por consequência, (iii) obstar à defesa, à acusação, à autoridade policial e ao juízo que utilizem, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza à tese) nas fases pré-processual ou processual penais, bem como durante o julgamento perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento; (iv) diante da impossibilidade de o acusado beneficiar-se da própria torpeza, fica vedado o reconhecimento da nulidade, na hipótese de a defesa ter-se utilizado da tese com esta finalidade. Por fim, julgou procedente também o pedido sucessivo apresentado pelo requerente, de forma a conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 483, III, § 2º, do Código de Processo Penal, para entender que não fere a soberania dos vereditos do Tribunal do Júri o provimento de apelação que anule a absolvição fundada em quesito genérico, quando, de algum modo, possa implicar a repristinação da odiosa tese da legítima defesa da honra. Tudo nos termos do voto reajustado do Relator. Presidência da Ministra Rosa Weber. Plenário, 1º.8.2023” (Brasil, 2024).
Nesse contexto de violência estrutural e deficiências legislativas, debate-se a figura da assistência qualificada à vítima. Tal premissa é assegurada pela doutrina ao defender que o instituto da assistência qualificada à vítima foi criado pelo artigo 27 da Lei Maria da Penha e que está de acordo com o previsto na Recomendação Geral número 33 do Comitê da CEDAW da ONU, que traz orientações para melhorar o acesso das mulheres à justiça, tanto de maneira judicial quanto extrajudicial. O objetivo é proteger os direitos fundamentais e interesses das mulheres vítimas de violência doméstica durante os procedimentos legais, a fim de preservar a sua dignidade de evitar a revitimização, sendo que
“O conceito de revitimização tem sido aplicado para descrever a situação enfrentada por mulheres, crianças e adolescentes vítimas de violência, quando seu sofrimento é prolongado pelo atendimento inadequado nos serviços onde tenham buscado atendimento. A revitimização expressa-se como o atendimento negligente, o descrédito na palavra da vítima, o descaso com seu sofrimento físico e/ou mental, o desrespeito à sua privacidade, o constrangimento e a responsabilização da vítima pela violência sofrida. A Criminologia também trata de formas de revitimização considerando, além da vitimização primária (o crime ou violação de direito sofrida), a vitimização secundária, como resultado da intervenção das chamadas instâncias de controle social – polícia e judiciário – especialmente durante os procedimentos de registro e investigação policial e do processo criminal; e a vitimização terciária, quando a vítima é discriminada e/ou culpabilizada por aqueles indivíduos e/ou grupos que deveriam constituir sua rede apoio – familiares, amigos, entre outros” (Brasil, 2016, p. 60).
O instituto garante que, assim como o réu, a vítima possa ter direito à defesa gratuita, integral e multidisciplinar em todos os atos do processo, englobando o âmbito jurídico e psicossocial, promovendo a assistência jurídica, o direito à informação e o encaminhamento para serviços de saúde e da assistência social. A assistência qualificada pode, e deve, ser exercida por advogados ou defensores públicos, abrangendo a vítima e seu familiares. (Goes, 2023)
Adotar uma perspectiva de gênero no direito processual brasileiro implica não apenas em considerar as particularidades da violência de gênero, mas também em transformar a forma como os processos são conduzidos. Isso inclui: a formação de servidores e a capacitação de promotores e advogados para entender as dinâmicas da violência doméstica e como elas afetam o acesso à justiça; implementação de protocolos sensíveis que que garantam um tratamento respeitoso e adequado às mulheres durante todo o processo judicial e a facilitação do acesso à justiça que considera as diversas interseccionalidades dos direitos das mulheres vítimas de violência.
Não basta assegurar direitos, é necessário torná-los acessíveis e considerar as particularidades das partes envolvidas. O sistema de Justiça tem de promover políticas de participação feminina no Poder Judiciário e de combate à violência contra a mulher.
Sobre isso, recentemente, no dia 24 de outubro do corrente ano, o Comitê das Nações Unidas para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), comunicou à imprensa acerca da publicação de orientações sobre a representação igualitária e inclusiva das mulheres na tomada de decisões. Reconhecida oficialmente como Recomendação Geral 40 (GR 40), o Comitê explica que a “representação igualitária e inclusiva” exige uma paridade não inferior a 50-50 entre homens e mulheres. Esse padrão garante acesso igualitário a todas as mulheres e meninas em qualquer sistema de tomada de decisão, devendo-se incluir os setores público, privado, político, econômico e digital. (Brasil, 2024).
A recomendação também indica sete pilares da representação igual e inclusiva das mulheres nos sistemas de tomada de decisão, quais sejam:
“1) Paridade entre mulheres e homens nos sistemas de tomada de decisão como ponto de partida e norma universal; 2) Liderança eficaz dos jovens condicionada pela paridade; 3) Interseccionalidade e inclusão das mulheres em toda a sua diversidade nos sistemas de tomada de decisão; 4) Uma abordagem abrangente para sistemas de tomada de decisão em todas as esferas; 5) Igualdade de poder e influência das mulheres nos sistemas de tomada de decisão; 6) Transformação estrutural para uma representação igual e inclusiva das mulheres nos sistemas de tomada de decisão; e 7) Representação da sociedade civil nos sistemas de tomada de decisão”. (Ministério Público do Paraná, 2024).
A meta é alcançar a paridade até 2030, recomendando-se aos Estados Partes a adoção de Planos Nacionais de Ação, além da necessidade de abordar barreiras estruturais, incluindo estereótipos de gênero, violência contra mulheres, distribuição desigual de responsabilidade de cuidado e garantia de direitos iguais.
Sob essa perspectiva, nota-se que a recomendação se preocupa com a representatividade feminina e entende que a paridade 50-50 poderá reduzir problemas estruturais, ligados diretamente a estereótipos de gênero. Por isso, o acesso à justiça justa e imparcial é visto como direito humano básico de um sistema jurídico que pretende ser moderno e igualitário. Ademais, o conceito de vulnerabilidade não mais está atrelado apenas ao critério financeiro, pelo contrário, a sua relação está atrelada a grupos que necessitam do atendimento de suas necessidades básicas, tais como: crianças, populações indígenas, mulheres, idosos, imigrantes, pessoas com deficiência, dentre outros.
Outrossim, a violência contra a mulher é estrutural, logo, reproduzida em muitos procedimentos judiciais e extradicionais, assim, a Recomendação Geral nº 40 do CEDAW vem ao encontro do presente trabalho, a fim de corroborar que não basta o acesso à justiça, mas também se exige a paridade na tomada de decisões. Tal economia e autonomia das mulheres é fundamental para que elas tenham acesso aos seus direitos fundamentais, mas, também, principalmente, para que a sociedade evolua e elimine a ideia da submissão feminina.
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A interseccionalidade consiste na pluralidade de fatores de vulnerabilização. Tal conceito foi desenvolvido a partir dos estudos da professora Kimberlé Crenshaw que almejava investigar, principalmente, a situação da mulher negra, que sofre mais machismo que a mulher branca e mais racismo que o homem negro.
Atualmente, existem quatro tratados internacionais de direitos humanos que possuem status de emenda constitucional no Brasil. Eles são: Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova York); Protocolo Facultativo da Convenção de Nova York; Tratado de Marraquexe, para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas, com eficiência Visual ou com Outras Dificuldades e a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância.
CONFERÊNCIA JUDICIAL IBERO-AMERICANA. Regras de Brasília sobre acesso à Justiça das pessoas em condição de vulnerabilidade. Projeto Eurosocial Justiça, Associação Ibero-americana de Ministérios Públicos (AIAMP), Associação Interamericana de Defensores Públicos (AIDEF), Federação Ibero-americana de Ombudsman (FIO) e União Ibero-americana de Colégios e Agrupamentos de Advogados (UIBA). Brasília: Instituto Ibero-americano de Justiça, 2023. Disponível em: https://www.anadep.org.br/wtksite/100-Regras-de-Brasilia-versao-reduzida.pdf. Acesso em: 9 nov. 2024.
- Considerações finais
Conforme ensina a pesquisadora Hannah Arendt (1989), a essência dos Direitos Humanos está, justamente, no direito a ter direitos e é assim que deve ser entendida a participação dos grupos vulnerabilizados, em especial das mulheres vítimas de violência doméstica, na produção das normas de regência, não estando a participação reduzida e subsumida a tão somente acessar o Poder Judiciário quando da ofensa aos seus direitos, conforme trabalhado pela recente Recomendação Geral nº 40 do CEDAW.
Sendo assim, é necessário (re) interpretar o ordenamento jurídico brasileiro à luz da Constituição Federal, mas não só, sendo necessária adoção do controle de convencionalidade como instrumento para observar se as normas infraconstitucionais estão em conformidade com os tratados e demais normas de direitos humanos. No contexto da violência doméstica, a Lei Maria da Penha e as Convenções para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979) e de Belém do Pará (1994), além de outros tratados ratificados pelo Brasil, impõem obrigações claras ao Estado de proteger as mulheres, prevenir a violência de gênero e evitar a revitimização.
O controle de convencionalidade é fundamental, especialmente quando se considera que as normas processuais podem, inadvertidamente, perpetuar práticas discriminatórias, seja pela falta de atualização legislativa ou pelo preconceito enraizado na sociedade brasileira, que possui fortes influências do patriarcado, do machismo, do sexismo, do racismo e da homofobia, que, inclusive, são transversais a todas as áreas do direito, produzindo efeitos na sua interpretação e aplicação. O reconhecimento de que o direito deve ser interpretado à luz da proteção dos direitos humanos é um passo essencial para garantir que as mulheres tenham acesso a uma justiça efetiva e para se ressaltar que a violência doméstica não deve ser encarada como algo “natural” ou “inerente” à estrutura social. A luta pela erradicação da violência doméstica é, consequentemente, também uma luta pela mudança de mentalidade, que exige o engajamento de toda a sociedade na defesa dos direitos das mulheres, rompendo com estigmas e preconceitos que dificultam o acesso das mulheres à justiça e à proteção.
O advento do Protocolo para Julgamento na perspectiva de Gênero elaborado pelo CNJ e as 100 Regras de Brasília constituem importantes conquistas nesse campo ao reconhecer a necessidade de uma compreensão por parte do Judiciário, da questão de gênero e convocando seus integrantes a uma atuação ativa na desconstrução e superação das desigualdades e discriminações de gênero. A violência doméstica, ao ser uma violação estrutural e sistemática dos direitos humanos, exige que o sistema judiciário se adapte de maneira a reconhecer e proteger as especificidades das vítimas, respeitando sua autonomia e garantindo um ambiente de justiça mais equitativo. A análise do controle de convencionalidade como instrumento jurídico possibilita a construção de um processo mais justo, alinhado com os princípios da dignidade humana e dos direitos fundamentais das mulheres.
Contudo, o reconhecimento de que a violência doméstica é uma questão de poder e desigualdade, exige uma constante revisão das práticas judiciais e legislativas, de modo a assegurar que as mulheres não sejam revitimizadas no processo judicial. Somente por meio de uma integração mais efetiva entre a legislação nacional e os compromissos internacionais será possível oferecer um sistema de justiça verdadeiramente protetivo e transformador para as mulheres em situação de vulnerabilidade e que considere as diferentes interseccionalidades dos seus direitos, além da necessidade de articulação com as demais áreas, a fim de que as vítimas recebam o apoio necessário, incluindo proteção, cuidados psicológicos, apoio social e o acompanhamento constante durante e após o processo judicial.
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