O valor do dólar não importa?

Título chamativo para discorrer sobre algo que acredito:

Penso que para você que investe no exterior, o valor, a cotação do dólar não importam e, tão ou mais importante quanto o valor que você pagou no dólar, é o que você faz com os seus dólares!

Sim, isso pode parecer extremamente contraintuitivo, mas vou discorrer os motivos de eu ter essa opinião.

 

DÓLAR EM ALTA CONTRA O REAL.

Na semana passada o dólar voltou a encostar no patamar de R$ 5,30 – os motivos vão além do escopo desse artigo, mas comentei de forma mais detalhada em nossa última live para falar do cenário macroeconômico (para quem não viu: Atualização de cenário, alta do Dólar e Ipca+ x Dólar+).

Além dos fatores externos, internamente a maior percepção a risco associada ao Brasil ajuda a explicar essa alta. Não por acaso vimos notícias como essa: Aposta dos estrangeiros contra o Real bate recorde, aponta B3 | Valor Investe.

A posição comprada em dólar contra o real via derivativos pelo investidor estrangeiro bateu máxima histórica na sessão de ontem, ao atingir US$ 73,5 bilhões, segundo dados divulgados pela B3. A posição é vista como uma aposta contra a valorização do real, ainda que essa leitura não seja totalmente precisa.

O que isso tem a ver com o título? Já explico.

 

Um conceito fundamental: o Real é um ativo de risco

O que gostaria eu que você percebesse aqui é um conceito fundamental que está por trás desse movimento: o de que o Real é um ativo de risco e se comporta como tal. Como assim? Quando o mercado se mostra avesso ao risco, ou se por qualquer fator (tanto interno quanto externo) cria-se a percepção de que a economia, ou o investimento no Brasil represente um risco elevado, isso é refletido na valorização do dólar frente à nossa moeda.

A moeda de um país reflete o desempenho e percepção de risco que você tem em relação àquela economia. Você pode não concordar com a ideia de que o Real é um ativo de risco, mas talvez a ideia de investir no Peso colombiano soe um tanto arriscado, ou ainda na Rúpia Indiana, o Dirham Marroquino, ou o Baht Tailandês. Pois bem, esses 4 países citados possuem um rating melhor que o Brasil e, portanto, são consideradas moedas menos arriscadas de se investir por investidores globais. As tabelas abaixo apresentam países com classificações de risco semelhantes aos EUA e do lado direito países com rating (percepção de risco) melhor que o Brasil.

 

PERFORMANCE DO REAL.

Ora, se Real é um ativo de risco ele tende a performar tal qual.

Em momentos de muito estresse de mercado, momentos como a crise de 2008, ou a pandemia, o que vimos foi um forte movimento de aversão ao risco no mundo, com bolsas caindo ao redor do globo e moedas de países emergentes performando mal – não é uma exclusividade do Real, é um comportamento dos ativos de risco. O mundo busca segurança em ativos como o dólar, o ouro ou Franco suíço por exemplo. Isso quer dizer que em movimentos de aversão aos riscos globais, o Real e as moedas desses países que citei, tendem a não performar bem. Isso quer dizer que o dólar tende a se valorizar frente a elas. Foi exatamente o que vimos nesses últimos 2 exemplos. Quando o dólar saltou em 5 meses ao final de 2008 ou ainda com a alta durante a pandemia, tal qual nos mostra a tabela abaixo.

Artigo Dilema Domestico: É hora de os investidores olharem para o mercado internacional | PIMCO (Março 5, 2021)

 

Portanto, se o Real é um ativo de risco ele tende a performar bem quando ativos de risco (por exemplo ações) performam bem, ou seja, nesses momentos o Dólar tende a se desvalorizar frente a eles.

Então, de uma forma geral esse conceito nos dá uma ideia do comportamento do Real em diferentes cenários globais – obviamente que existem fatores internos que se somam ao cenário externo e que também ajudam a explicar o comportamento da moeda.

O gráfico abaixo compara o desempenho da bolsa americana com a cotação do dólar frente ao Real nos últimos 20 anos. Pode parecer uma comparação um tanto quanto esdrúxula, no entanto a ideia aqui é demonstrar o comportamento do Real como um ativo de risco. As áreas circuladas abaixo foram momentos de estresse e aversão ao risco do mercado de ações (quedas na bolsa americana) e veja como essas coincidem com altas na cotação do dólar frente ao Real. Da mesma forma momentos de recuperação da bolsa americana (alta nas ações), coincidem com uma performance favorável ao Real, ou seja, confirmando esse conceito que quero passar para vocês.

Fonte: tradingview.com – 06/jun/2024

 

ENTÃO PRESTE MUITA ATENÇÃO NISSO:

Isso quer dizer que o investidor que busca uma cotação melhor do dólar frente ao Real, tende a incorrer em preços mais elevados ao investir em ações. Ele economiza no câmbio comprando um dólar “mais barato”, mas ao investir vai encontrar preços muito mais elevados nas ações.

 A inflexão do seu investimento pode ser muito maior do que a inflexão da moeda. Dito de outra forma, o que você faz, ou onde você investe seus dólares é tão ou mais importante do que a cotação do dólar.

Quer ver como isso é verdade? Vejamos exemplos práticos.

 

Exemplo 1: investidor pagou a máxima histórica no dólar e investiu em Microsoft.

No dia 08 de maio de 2020 a cotação do dólar alcançou sua máxima histórica de R$ 5,99. Atualmente (fechamento de 06/jun/2024) o dólar está em R$ 5,25.

No mesmo dia as ações da atual maior empresa dos EUA, a Microsoft, encerraram cotadas a US$184,68. Atualmente (fechamento de 06/jun/2024) elas estão cotadas a US$ 424,52.

Ou seja, o investidor que ignorou o câmbio e realizou tal investimento, percebeu uma valorização de 130% nos seus investimentos, o que mais que compensou a queda de 12% percebida na cotação do dólar frente ao real.

 

Exemplo 2: investidor esperou e comprou dólar na “melhor” cotação dos últimos 5 anos e investiu em Microsoft.

No dia 04 de abril de 2022 a cotação do dólar atingiu R$ 4,58.

No mesmo dia as ações da atual maior empresa dos EUA, a Microsoft, encerraram cotadas a US$314.97. Atualmente (fechamento de 06/jun/2024) elas estão cotadas a US$ 424,52.

Ou seja, o investidor que “acertou” na compra do câmbio e realizou tal investimento, percebeu uma valorização de 35% nos seus investimentos e 14% na moeda, um retorno composto de 54%.

Veja que nesses dois exemplos usei de propósito a “pior” taxa de câmbio possível, a máxima histórica do dólar frente ao real. O gráfico abaixo mostra na linha verde a cotação do dólar e na linha azul as ações de Microsoft.

Fonte: tradingview – 07/jun/2024

 

Exemplo 3: investidor pagou a máxima histórica no dólar e investiu no S&P500.

Supondo que o investidor não sabia onde investir e apenas buscava uma exposição ao principal índice da bolsa americana o S&P500.

Ele comprou dólar a R$ 5,99 e investiu no índice através de um ETF por exemplo. No dia 08 de maio o S&P500 encerrou em 2.930 pontos e atualmente está em 5.353 pontos (fechamento de 06/jun/2024).

Ou seja, o investidor que ignorou o câmbio e realizou tal investimento, percebeu uma valorização de 83% nos seus investimentos, o que mais que compensou a queda de 12% percebida na cotação do dólar frente ao real.

Para fins de comparação, o investidor que entendeu que o momento parecia interessante para investir em ativos de risco, mas optou por investir no Ibovespa exatamente nas mesmas datas, obteve um retorno de 53% em seus investimentos.

 

Exemplo 4: investidor esperou e comprou dólar na “melhor” cotação dos últimos 5 anos e investiu no S&P500.

No dia 04 de abril de 2022 a cotação do dólar atingiu R$ 4,58.

No dia 04 de abril de 2022 o S&P500 encerrou em 4.583 pontos e atualmente está em 5.353 pontos (fechamento de 06/jun/2024).

Ou seja, o investidor que “acertou” na compra do câmbio e realizou tal investimento, percebeu uma valorização de 17% nos seus investimentos e 14% na moeda, um retorno composto de 34%.

E veja como a questão do risco associado ao Real é verídica. O investidor que, ainda assim, ignorou a queda do dólar e optou por investir no Ibovespa nessas mesmas datas teria obtido um retorno de 1% desde então!

O gráfico abaixo mostra na linha verde a cotação do dólar e na linha preta o S&P500.

Fonte: tradingview – 07/jun/2024

 

Deu para perceber como muito mais importante do que a cotação do dólar ou em “acertar no câmbio” é o que você faz com os seus dólares?!

  

E COMO FICA NA RENDA FIXA?

Para a renda fixa esse conceito funciona da mesma forma.

Em momentos de estresse de mercado, vemos alguns bonds (títulos de renda fixa) de instituições ou países de mais risco se desvalorizarem e, consequentemente apresentarem yields mais elevados. E quando as coisas se acalmam, os yields tendem a ceder.

O investidor que busca uma cotação melhor no dólar frente ao Real, tende a incorrer em preços mais elevados nos bonds, contratualizando yields menores. Ou seja, ele economiza no câmbio comprando um dólar “mais barato”, mas ao investir tende a encontrar yields menores na renda fixa.

Pois bem, tal qual comentamos recentemente (IPCA +6% é bom, mas Dólar +6% é melhor ainda?) no Insights da semana passada, atualmente as taxas de remuneração na renda fixa americana se encontram no maior patamar dos últimos anos. Isso quer dizer que você consegue contratualizar taxas de retorno bem maiores que nas últimas décadas.

Não sabemos nem temos como garantir qual será o comportamento do dólar nos próximos anos. No entanto, no artigo acima, mostramos como, nos últimos 10 anos, um investimento lastreado em Dólar+6% apresentou desempenho superior ao IPCA+6%, por exemplo.

Abordamos o assunto em nossa última live, que ficou gravada e você pode assistir neste link: Atualização de cenário, alta do Dólar e Ipca+ x Dólar+ | Conexão Avenue (05/06/24)

Vale ainda destacar que atualmente em nossa plataforma existem bonds que oferecem remunerações como Dólar+6%, Dólar+7% ou até Dólar+8%. Se você se interessou e quer saber mais, convidamos você a acessar nossos reports chamados ‘Bonds Lists’ na área logada de clientes.

Então vejamos outros 2 exemplos.

  

Exemplo 5: investidor comprou um bond (título de renda fixa) de 3 anos com yield de 4,5%.

O investidor ignorou o câmbio, comprou dólares à cotação atual de R$ 5,25 e investiu em um título de dívida do governo americano de 3 anos por exemplo, contratualizando uma taxa de retorno (yield) de 4,5% ao ano. Com isso ele alcançou uma taxa de retorno composta no período de 14%.

Não sabemos qual será a cotação do dólar daqui a 3 anos. Mas para que o investidor perdesse dinheiro em tal investimento, a cotação do dólar teria que estar abaixo de R$ 4,60 daqui a 3 anos.

  

Exemplo 6: investidor comprou um bond (título de renda fixa) de 10 anos com yield de 6%.

Conforme comentamos no Insights citado acima, atualmente o investidor consegue contratualizar taxas de retorno de 6% por 10 anos em títulos com risco semelhante ao do risco Brasil.

Portanto o investidor que ignorou o câmbio, comprou dólares a cotação atual de R$ 5,25 e investiu em um bond com vencimento de 10 anos, contratualizando uma taxa de retorno (yield) de 6% ao ano. Com isso ele alcançou uma taxa de retorno composta no período de 79%.

Não sabemos qual será a cotação do dólar daqui a 10 anos. Mas para que o investidor perdesse dinheiro em tal investimento, a cotação do dólar teria que estar abaixo de R$ 2,93 daqui a 10 anos.

 

Tais exemplos desconsideram o custo de oportunidade de eventualmente você ter investido no Brasil e ter visto seus reais se valorizar. Mas, ao mesmo tempo, em nenhum momento considerei a valorização média do dólar que foi cerca de 10% nos últimos 10 anos por exemplo. Dito de outra forma, se o dólar repetir o desempenho dos últimos 10 anos, o retorno composto dos investimentos dos exemplos seria significativamente maior.  

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ENQUANTO ISSO NA ECONOMIA…

Juros caem na Europa.

Tal qual era esperado, o Banco Central Europeu (ECB – European Central Bank) reduziu sua taxa básica de juros para 3,75% ao ano. O ECB começou a elevar as taxas de juros após o Fed, mas se antecipou no movimento de cortes, aumentando o número de bancos centrais que começaram a reduzir os juros – o Canadá foi o primeiro país do G7 a cortar as taxas de juro e os bancos centrais da Suécia e da Suíça já anunciaram as reduções de taxas em 2024.

Fonte: The New York Times – 06/jun/2024

 

Olhando a frente, o mercado ainda espera mais um corte esse ano, mas não na próxima reunião de julho. O impacto no mercado foi limitado, uma vez que a decisão já foi antecipada e era amplamente esperada.

Mas e nos EUA? Tivemos alguns dados que mexeram com as expectativas de juros.

JOLTS. A pesquisa de vagas de emprego e rotatividade de trabalho (JOLTS) é um relatório mensal do Bureau of Labor Statistics (BLS) do Departamento de Trabalho dos EUA que conta vagas de emprego nos EUA (fonte). O report trouxe os números do mês de abril, mostrando que o volume de vagas de emprego caiu para 8,06 milhões, uma queda de quase 300 mil ante março e quase 19% menor do que há um ano – o mercado esperava que fossem anunciados 8,370 milhões de vagas. Esse foi o menor número desde fevereiro de 2021. A proporção entre vagas de emprego e trabalhadores disponíveis caiu de 1,2 para 1, depois de ter sido cerca de 2 para 1 em março de 2022.

 

ADP. O Relatório Nacional de Emprego da ADP é um relatório mensal que apresenta os números da criação de postos de trabalho no segmento privado não-agrícola nos EUA. O dado mostrou que foram criados 152 mil postos de trabalho, número esse bem menor do que os 188 mil do dado revisado para baixo em abril, menor também que o esperado pelo mercado (173 mil) e, ainda, o menor número de criação de postos de trabalho desde janeiro.  Além disso, o aumento dos salários ficou em 5%, em linha com os últimos 3 meses.

 

Payroll. No entanto, o principal dado da semana surpreendeu a todos. O relatório de emprego de maio trouxe números bem acima do esperado (272 mil vs.182 mil projetados), com uma criação de postos de trabalho também acima da média dos últimos 12 meses (232 mil) e bem acima do mês anterior (165 mil).

No entanto, é importante chamarmos a atenção a dois pontos.

Primeiro, que os dados dos meses anteriores de março e abril foram revisados para baixo gerando um efeito líquido de 15 mil postos de trabalho a menos tendo sido criados nos 2 meses. Essas revisões têm sido comuns nas últimas divulgações. Então, apesar da primeira leitura ser bastante forte, fica a dúvida a respeito da possibilidade futura de revisão de um número tão forte de criação de postos de trabalho.

Segundo, que a qualidade dos postos de trabalho também pode ser questionada, com um aumento expressivo de trabalhos part time (meio turno) e redução da criação de postos de trabalho full time (período completo).

 

Fonte: CNBC.com – 07/jun/2024

 

E O IMPACTO NO MERCADO

O resumo da ópera dessa semana foi que a decisão do banco central europeu e os dados mais fracos do mercado de trabalho no início da semana, jogaram certa pressão no Fed para mudar o direcionamento de sua política monetária.

No entanto, o Payroll na sexta mudou isso. O dado forte vem após números fracos do mercado de trabalho anunciados ao longo da semana (ADP e JOLTS), surpreendendo, assim, o mercado, e trazendo impactos nas curvas de juros, dólar e bolsa. A leitura é de que o mercado de trabalho segue resiliente, com aumentos de salários acima da inflação e, sendo assim, tenderia a manter o consumo aquecido, dificultando o controle da inflação e, portanto, cortes de juros se tornariam menos viáveis.

Então vimos novamente as curvas de juros abrindo (yields subindo) e mais uma vez as apostas de cortes de juros logo cedendo. É como se tivéssemos voltado aonde iniciamos a semana em termos de expectativas em relação aos juros.

 

E OS RESULTADOS…

Como comentamos semana passada, grande parte da divulgação de resultados já aconteceu, e o mês de junho nos reserva poucos números a serem divulgados. Para esta semana, temos as seguintes empresas divulgando:

 

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