Antes de adentrar no texto, gostaria de expressar toda a minha solidariedade ao povo do Rio Grande do Sul. Aos meus conterrâneos e irmãos, desejo muita força para atravessar esse momento difícil. Somos um povo de muitas virtudes, então é hora de mostrarmos valor e constância, para que nossas façanhas sirvam de modelo a toda terra, tal qual cantamos no hino do Rio Grande do Sul.
Todos os anos, milhares de pessoas voam até o meio dos EUA, para uma cidade que tem toda a cara de uma cidade americana de médio porte, chamada Omaha, no Nebraska. O que atrai essas pessoas? A sabedoria de um senhor de 93 anos, chamado Warren Buffett, conhecido como o Oráculo de Omaha. A “Woodstock capitalista”, como ficou conhecida a conferência da Berkshire Hathaway, é uma ode ao pensamento de longo prazo e à filosofia de investimento conhecida como value investing – em essência, investimentos em boas empresas com uma orientação de longo prazo. Mas talvez você já saiba disso.
Pois bem, eu e a Julia, do nosso time de Alocação e Estratégia, estivemos por lá neste final de semana e tivemos algumas impressões que queremos compartilhar aqui com vocês.
Esta foi uma reunião diferente e isso ficou muito claro desde o início. Charlie Munger faleceu em novembro de 2023, e esta foi a primeira reunião sem ele. Depois de décadas juntos, como um casal onde um sente a falta do outro, deu para notar que Buffett sentiu a ausência do companheiro de longa data. Praticamente todas as respostas ele citava ou mencionava o velho companheiro. Em certo ponto, ele passa a palavra para Greg Abel, atual CEO da Berkshire Hathaway Energy e vice-presidente de operações não relacionadas a seguros da Berkshire Hathaway. No entanto, Buffett se confunde e o chama de Charlie, arrancando algumas risadas da plateia. Buffett comenta que Charlie foi o grande arquiteto por trás da Berkshire, um grande amigo, curioso, interessado em entender como as coisas funcionavam e que ensinou muito a ele. O vídeo característico do início do evento ressaltou essa parceria de longa data, comparando sua amizade a célebres personagens como Batman e Robin, o Gordo e o Magro e até Beavis and Butt-head.
Indo além, também notei que havia muito mais pessoas do que nos últimos anos. Filas na feira, ginásio lotado, restaurantes e cafés lotados pela cidade. Esta, definitivamente, foi uma das conferências mais frequentadas da história da Berkshire. Penso que o vetor que catalisou isso também nos remete a Charlie Munger.
Muito se falou também sobre sucessão. O tema não é novidade e desde os anos 90 Buffett responde a perguntas a respeito. No entanto, este ano senti que houve maior ênfase nisso. Buffett buscou reforçar a cultura, o processo e a filosofia de investimentos da Berkshire, ressaltando que isso ultrapassa sua persona. A própria presença de Greg Abel ao lado de Buffett durante todo o evento denota isso.
Mas além das percepções acerca da feira, podemos tirar alguns aprendizados sobre o mercado.
Apple. A Berkshire reduziu sua exposição na empresa. De acordo com seu relatório de resultados do primeiro trimestre divulgado no sábado, fica implícito que a Berkshire reduziu em 13% sua participação na empresa, a qual permanece como a principal posição de carteira, somando um total de mais de US$ 135 bilhões. Buffett cita 2 motivos para a venda: (i) ajustar sua posição na carteira da Berkshire, dado que a valorização do papel fez com que ele alcançasse mais de 50% da carteira; (ii) receio de que, como forma de financiar o atual déficit americano, possa haver aumento de impostos para as corporações no futuro. Logo, ao vender agora, o lucro realizado é tributado à atual alíquota.
Oportunidades, mercado e juros. Buffett refutou comparações com os anos 2000 e qualquer tipo de bolha no mercado. Segundo ele, o não uso dos US$ 189 bilhões de caixa da empresa decorre do fato de que potenciais aquisições para a empresa precisam ter um porte relevante e que eles não têm visto nada que tenha feito muito sentido, além de pequenas aquisições que tenham feito aqui e ali. Outro ponto necessário para tais aquisições é o alinhamento com o management de empresas investidas e o management da Berkshire, outro ponto por vezes difícil de conseguir alinhamento. Ele ressaltou que investem em empresas que conhecem e gostam e que tal decisão não deriva do fato dos juros estarem elevados atualmente e da Berkshire estar se aproveitando disso para fazer seu caixa render mais. No entanto, ele brincou: não conte isso ao Federal Reserve.
Powell e a economia americana. Buffett elogiou o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, pelo seu trabalho e por ter conseguido conduzir a redução da inflação com a manutenção da atividade econômica. Ele chamou Powell de “homem muito sábio”. Mas obviamente que nem tudo são flores e que o trabalho não se restringe a Powell. Para ele, os EUA precisam de legisladores para controlar o crescente déficit americano, afinal de contas, Powell não controla a política fiscal.
Inteligência Artificial. Buffett foi taxativo: “não sei nada sobre inteligência artificial”. No entanto, ele demonstra preocupação em como a humanidade irá lidar com o potencial da tecnologia. Ele comparou ao desenvolvimento da energia nuclear, o qual possibilitou a geração de uma energia limpa e renovável, mas ao mesmo tempo levou à construção da bomba atômica. Segundo ele, a inteligência artificial tem um potencial enorme… para o bem, e para o mal.
Dividendos. A Berkshire Hathaway não paga dividendos, embora possua US$ 189 bilhões em caixa. Segundo Buffett, existem formas melhores de utilizar seu capital. Para ele, uma recompra para devolver capital aos acionistas é muito mais eficiente. Porque distribuir dividendos se podemos buscar alternativas para investir esse capital com o objetivo de gerar maior valor aos acionistas. Ele disse que espera que continue assim, mesmo depois de sua eventual ausência no futuro, ou caso contrário, ele virá assombrar Greg Abel, arrancando mais risos da plateia.
China e Índia. Mais uma vez, Buffett foi questionado sobre investimentos em outros países. Ele ressaltou que acredita existirem boas oportunidades, especialmente na Índia, no entanto, como de praxe, ele respondeu que uma característica importante da Berkshire é concentrar seus investimentos nos EUA, onde a empresa possui mais conhecimento e pela pujança da economia americana, a qual cria grandes oportunidades de investimento.
Por fim, sempre com bom humor e carisma, ele comentou que conhece as tabelas atuariais, mas que ainda assim espera estar presente no ano que vem, ainda que seja possível que não esteja. Ele brincou: “eu não só espero que você venha no próximo ano, espero voltar no próximo ano”. Assim esperamos.
Vida longa ao Oráculo de Omaha!
E para quem quer saber mais, tem alguma pergunta ou ainda quer conversar sobre o tema, vamos fazer uma live para falar de tudo que vimos e ouvimos por lá nesta segunda-feira. Te convido a participar:
Berkshire Hathway Berkshire Hathaway pelo olhar Avenue: o oráculo de Omaha como você nunca viu
ENQUANTO ISSO NA ECONOMIA…
Mas indo além da conferência da Berkshire, a verdade é que a semana que passou foi bastante movimentada e com impactos importantes no mercado.
Juros. Primeiramente, na quarta-feira, dia 01 de maio, conforme esperado, o Banco Central americano manteve a taxa básica de juros americana em uma faixa entre 5,25% e 5,50%.
O que acho que vale a pena destacar:
No comunicado que acompanha a decisão, vimos algumas mudanças, sendo a mais importante aquela relacionada à falta de progresso no combate ou na busca pela queda da inflação nos últimos meses.
Luta contra inflação. O comitê de política monetária observou que houve o que eles chamaram de “falta de mais progresso” no sentido de fazer a inflação regressar ao seu objetivo de 2%, reiterando assim a linguagem já utilizada nas últimas duas reuniões. Além disso, na entrevista, Powell comentou que “a inflação ainda está muito alta” e que “progressos no combate à inflação não estão garantidos, e o caminho a seguir ainda é incerto”.
Novos aumentos de juros? Questionado sobre uma mudança de rumo e um eventual aumento de juros, Powell disse que seriam necessárias provas convincentes de que a atual política monetária não é suficientemente restritiva para reduzir a inflação de forma sustentável para 2% ao longo do tempo e que esse não é o cenário base do Banco Central americano.
Quantitative tightening. Questão importante, o Fed anunciou que, a partir de junho, irá reduzir o seu ritmo de vendas de títulos, conhecido como aperto quantitativo. O Fed vende títulos ao mercado e, com isso, reduz a liquidez do sistema, reduzindo seu balanço e retirando dinheiro de circulação. O volume de vendas irá se reduzir de um limite de US$ 60 bilhões para US$ 25 bilhões por mês. O programa de vendas de títulos lastreados em hipotecas (MBS) segue inalterado em US$ 35 bilhões ao mês. A venda de ativos permitiu ao Fed reduzir seu balanço para cerca de US$ 7,4 trilhões, ou cerca de US$ 1,5 trilhão a menos do que o seu pico em meados de 2022.
E na sexta-feira tivemos o relatório de emprego de abril, que trouxe uma grata surpresa ao mercado: o mercado de trabalho deu sinais de algum arrefecimento, com a criação de postos de trabalho ficando aquém do esperado, salários crescendo menos e a taxa de desemprego levemente acima do esperado. Não obstante, o Bureau of Labour Statistics também revisou os números anteriores de fevereiro e março, com um impacto líquido de 22 mil postos de trabalho a menos tendo sido criados nesses meses. Ainda que isso denote também uma diminuição no ritmo de atividade da economia, a interpretação positiva decorre da visão de que um mercado de trabalho menos pujante, com salários crescendo menos que o esperado, abra espaço para que o Fed comece a realizar uma política de afrouxamento monetário e corte os juros.
Fonte: Bureal of Fabour Statistics – 03/mai/2024
IMPACTO E CONCLUSÃO
Como reflexo de ambos os eventos citados acima, vimos os juros cederem nos EUA e o mercado voltar a especular a possibilidade de termos 2 cortes de juros ao longo de 2024 – abaixo, a ferramenta do CME mostra que o mercado atribui uma maior probabilidade de cortes de juros em setembro e dezembro.
Fonte: CME FedWatch Tool – 04/mai/2024
A decisão sobre os juros, os comentários do comunicado e a entrevista de Jerome Powell após o evento reforçaram a visão da necessidade de diligência e cuidado no combate à inflação. No entanto, os dados da semana (Payroll e outros divulgados), a decisão sobre os juros e a redução do quantitative tightening afastaram os receios de novos aumentos de juros. A mensagem do presidente do Fed foi a de reforçar a confiança de que o FOMC está no caminho certo e que a política monetária continua restritiva. A ideia é que não é preciso fazer nada, basta aguardar que a política monetária faça o seu trabalho e esperar os próximos dados para definir o rumo das decisões. Diante disso, e ainda na dependência dos dados e de uma evolução favorável da inflação, os eventos da semana passada indicam que o Fed pode estar abrindo espaço para suavizar sua política monetária e eventualmente cortar juros no futuro. Não é por acaso que o mercado ajustou suas expectativas em relação aos juros.
LIVE.
Vale lembrar que, em se tratando do cenário macroeconômico, fizemos nossa live mensal na quarta-feira passada. Se você não pôde assistir ao vivo, não tem problema, pois ela ficou gravada aqui:
Conexão Avenue: Cenário Macroeconômico – maio 2024
E PARA TERMINAR… RESULTADOS
As maiores empresas dos EUA já divulgaram seus números, mas a safra de balanços continua acontecendo. Para acompanhar esses resultados, temos uma página onde comentamos os números dos principais nomes. Acesse pelo seguinte link:
Resultados Trimestrais: Temporada de balanços nos EUA
E abaixo, a agenda desta semana:
E ao longo do mês:
E para quem quiser, sempre deixo aqui o convite para me seguir nas redes sociais – @willcastroalves tanto no Twitter quanto no Instagram – e diga o que achou.
Aquele abraço!
William Castro Alves
Estrategista-chefe da Avenue Securities
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