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Enquanto a sociedade brasileira debate a regulamentação de redes sociais e apostas online, importantes lições podem ser extraídas do conhecimento que acumulamos no campo de estudos sobre uso e dependência de drogas.
A abordagem antiproibicionista, que vai além da simplista visão de que a dependência seja uma doença do cérebro, reconhece que fatores sociais, de saúde mental e de acesso a direitos fundamentais são tão determinantes quanto as reações químicas de determinadas substâncias no organismo.
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Surpreendentemente, este mesmo modelo analítico oferece conclusões valiosas para compreender e enfrentar os desafios contemporâneos do uso de redes sociais e apostas online que, mesmo sem envolver substâncias psicoativas, geram padrões de dependência com danos significativos aos usuários e seu entorno.
A política proibicionista, focada no combate às substâncias e seus usuários através de repressão policial e encarceramento, já se demonstrou ineficaz. O consumo e comércio de drogas aumentam, o tráfico se fortalece e os danos se agravam.
A crítica antiproibicionista questiona a arbitrariedade da proibição e propõe tratar os fatores contextuais do consumo problemático de drogas, focando na redução de danos. A regulação estabelece regras claras sobre compra, venda, produção, fiscalização, prevenção e tratamento similar à bem sucedida política que reduziu o uso do tabaco no país.
As redes sociais introduziram novos desafios ao campo das dependências. Pesquisas da Universidade de Chicago revelaram que é mais provável que as pessoas cedam ao desejo de verificar mídias sociais do que ao desejo de consumir álcool ou cigarro. Entre jovens britânicos, 40% relatam dependência de redes sociais. Estudos correlacionam seu uso com depressão, ansiedade, ideação suicida e comportamentos violentos, especialmente entre adolescentes.
As apostas online agravaram problemas tradicionais dos jogos de azar. Transações eletrônicas via Pix, cartão de crédito e de benefícios sociais reduzem a percepção do gasto real, afetando até a segurança alimentar familiar entre pessoas de baixa renda.
A grande questão quando falamos da dependência de drogas e de novas tecnologias é que a substância que age no nosso organismo provocada por estes usos é impossível de proibir. Doses de dopamina geradas pelo nosso próprio corpo, são superestimuladas a cada vez que usamos drogas, vemos um vídeo satisfatório, ganhamos algum like nas redes sociais, ou nos imaginamos com um bom dinheiro ao ganharmos uma aposta.
Uma representação gráfica muito conhecida no campo antiproibicionista, elaborada pelo ativista inglês Steve Rolles, da Transform Drug Policy Foundation, mostra um eixo de danos e um eixo que vai da liberação total de substâncias até a proibição total. A linha formada é a letra U, apontando que tanto a liberação total em um extremo quanto a proibição total no outro são os padrões que mais causam danos. Ou seja, o ponto médio entre os dois é o modelo que resulta em menos problemas.
A regulação deve considerar o impacto social específico de cada tecnologia. Para redes sociais e apostas, exige-se transparência sobre algoritmos, controle de conteúdo e propaganda, além de classificação etária apropriada. Escolas brasileiras já restringem o uso de celulares, respondendo a danos observados no desempenho acadêmico e saúde mental dos estudantes
O Estado deve assumir responsabilidade no enfrentamento destes desafios, implementando regulamentação eficaz para tecnologias com potencial de dependência. A colaboração entre especialistas em tecnologia e políticas sobre drogas é essencial para desenvolver estratégias efetivas, permitindo compreensão aprofundada dos mecanismos de dependência e fatores sociais envolvidos.
Uma abordagem proativa baseada em evidências possibilita minimizar danos associados a tecnologias e substâncias, promovendo bem-estar individual e coletivo. Apenas através do compromisso conjunto entre poder público, especialistas e sociedade civil construiremos um futuro mais seguro e saudável para todos.