Minuta de decreto que libera cannabis para fins medicinais será apresentada em junho

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O Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, deve receber até o fim de junho uma minuta de decreto com regras que permitam o plantio de cannabis no Brasil para fins medicinais e de pesquisa.

O texto será apresentado pelo Grupo de Trabalho de Regulamentação da Cannabis, criado pelo Conad e que debate o tema desde o ano passado. As regras em análise pelo GT, contudo, serão concluídas depois de rodadas de discussões. O calendário foi acertado nesta semana: ciclos de debate têm início neste mês e se estendem até maio. 

“A ideia é propor uma regulamentação que indique onde, como e quem poderá cultivar a cannabis para fins medicinais e de pesquisa”, afirmou ao JOTA Rodrigo Mesquita, vice-presidente da Comissão Especial de Direito da Cannabis da OAB Nacional e relator do GT.

O destino da minuta preparada pelo GT será definido pelo plenário do Conad. Caso aprovado pelo conselho, o texto poderá ser transformado em decreto, abrindo, desta forma, caminho para o cultivo, hoje proibido no país.

Esta não é a primeira vez que o tema é debatido. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vetou, em dezembro de 2019, a possibilidade de plantio para fins medicinais. A própria agência, no entanto, dois anos depois, concedeu autorização para que a Universidade Federal do Rio Grande do Norte fizesse o plantio para fins de pesquisa. A autorização, contudo, era específica para a instituição.

Equilíbrio nos limites

A minuta do decreto está em construção. Mas Mesquita adiantou ao JOTA que uma das possibilidades é trazer requisitos distintos para associações de pacientes.

A ideia é fazer com que as regras não representem barreiras de acesso a esses grupos, que se formaram no país há quase uma década e que, graças a ações judiciais, garantiram o direito de cultivar a planta e preparar o extrato para pacientes. 

A estratégia adotada pelas associações tinha como objetivo ampliar o acesso ao tratamento: extratos preparados pelos grupos são mais baratos do que produtos importados ou adquiridos em farmácias.

Uma das possibilidades em análise pelo GT é a de que exigências para plantio em associações sejam semelhantes, por exemplo, àquelas que são dispensadas a programas como o Farmácia Viva. 

“Uma das preocupações é assegurar a segurança e qualidade do produto”, disse Mesquita. Ele observou, no entanto, que requisitos definidos na minuta precisam também levar em conta o acesso. “Exigências muito elevadas podem provocar o efeito inverso: uma barreira ao produto. Daí a necessidade de encontrarmos um equilíbrio.”

A intenção, completou, é que ela seja sustentável, também do ponto de vista jurídico. Nesse formato em discussão, empresas teriam critérios distintos daqueles fixados para as associações.

O relator do GT afirma que experiências de outros países estão em análise. Entre os modelos observados estão o da Nova Zelândia, da Argentina e do Uruguai. 

Mesquita está convicto de que o tema poderia ser definido por decreto. “A Lei Antidrogas já abre a possibilidade de plantio quando o objetivo é pesquisa ou uso terapêutico. Não é preciso outra lei. O que falta é a regulamentação”, garante.

O advogado acredita haver ambiente para que o tema seja debatido e aprovado no Conad, embora reconheça haver resistência entre alguns integrantes do pleno. “A ideia dessa rodada de debates é justamente essa. Identificar em quais pontos o texto pode ser aprimorado.” 

Em 2023, a secretária nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos do Ministério da Justiça, Marta Machado, apontou a regularização do plantio da cannabis para fins medicinais como um dos temas prioritários do Conad.

Estabilidade

O cronograma aprovado nesta semana pelo GT prevê, além das consultas dirigidas, a realização de um seminário na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em que será analisado o cenário internacional de regulação da cannabis para fins terapêuticos, as experiências no Brasil e estudos sobre o uso terapêutico da planta.

Para Mesquita, a edição do decreto dará mais estabilidade tanto para empresas quanto para associações. Estima-se que mais de 2.000 ações foram interpostas na Justiça para garantir o direito do plantio da cannabis para uso medicinal, disse o relator do GT. 

Em março de 2023, no entanto, as ações que estavam em curso foram suspensas por determinação da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), após a admissão de um recurso, o Incidente de Assunção de Competência, sobre o tema. O objetivo do IAC é trazer um entendimento convergente no tribunal para o tema, considerado pela relatora, Regina Helena Costa, relevante “em termos jurídicos, econômicos e sociais”. O STJ marcou para o próximo dia 25 de abril uma audiência pública sobre o assunto. Há expectativa, portanto, de que o tema seja retomado pela corte.

Empresas

A discussão sobre um decreto para regulamentar o plantio de cannabis com fins medicinais abre espaço para o plantio, mas, na avaliação da advogada e diretora-executiva da Associação Brasileira das Indústrias de Canabioides (BRCann), Bruna Rocha, não seria ideal. “Para garantir investimentos, produção, o melhor seria mesmo que a solução viesse do Legislativo.”

Para ela, a lei, acompanhada da harmonização das regulamentações, traria maior tranquilidade para atrair investimentos, aumentar a produção e, com isso, reduzir preços de produtos existentes no país com canabinoides.

Mesmo com as incertezas apontadas por Rocha, o mercado está em expansão. Ela afirma que em 2023 foram comercializadas 356,6 mil unidades de produtos. Em 2022, foram 157 mil unidades. O faturamento, no período 2022-2023, passou de R$ 65,2 milhões para R$ 150 milhões.

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