No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

pensamento do dia

Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Reparação de danos ao proprietário de veículo de coleção

Spread the love

Fato tão cotidiano quando o nascer e o pôr do sol, a vida em sociedade sujeita os cidadãos a eventualidades desagradáveis. É o caso dos acidentes de trânsito e furtos e roubos de automóveis, acarretando uma série de situações jurídicas – entre elas a configuração da responsabilidade civil pelo dano ocasionado, acarretando o dever de indenizar pelos prejuízos sofridos.

Nos acidentes de trânsito, a aferição do elemento de culpa costuma ser vital para que se atribua a responsabilidade pela reparação dos danos ocasionados a um dos envolvidos – já no contexto dos furtos e roubos, por exemplo, observa-se a formação do nexo causal entre ação/omissão de fornecedor e o dano causado ao consumidor, atraindo a responsabilidade objetiva do primeiro, caso o veículo do último seja furtado nas dependências do estabelecimento.

Também se cogita de responsabilidade civil contratual: é o exemplo da eventual apólice de seguro contratada pelo causador do dano. Quando é ele o segurado, atrai ao segurador a responsabilidade pela reparação, na forma do art. 787 do Código Civil.

Não cabe a este trabalho exaurir as inúmeras manifestações da responsabilidade civil. Chama-se atenção tão somente para a aplicabilidade do conceito aos casos sob discussão, nos quais há uma repercussão do ato ou da omissão do agente sobre o patrimônio da vítima, originando o dever de indenizar.

A depender das circunstâncias, o reparo do veículo não é possível ou viável economicamente, conduzindo à chamada “perda total”. Representado o dano na medida do valor real do veículo, resta o desafio de mensurá-lo, na forma do art. 944 do codex supracitado.

Em tal hipótese, tornou-se prática convencional apurar o valor do automóvel para fins de indenização conforme a Tabela Fipe. Trata-se de um valioso recurso para homogeneizar as amostras disponíveis e verificar o valor real de mercado do bem, “(…) comumente utilizada para pesquisa do preço médio de veículos e (…) como balizador de valores dos veículos automotores terrestres, considerando, inclusive, os diversos fatores de depreciação existentes”[1].

Porém, essa referência técnica e objetiva nem sempre é apropriada quando se busca avaliar um automóvel; como proceder no caso em que, por força de características específicas, o seu valor de mercado não puder ser aferido com a mesma objetividade que um automóvel moderno?

É usual entre automóveis antigos que seu valor de mercado varie conforme fatores subjetivos – a exemplo do seu grau de originalidade e de sua relevância histórica. Em certos casos, até mesmo a cor original do veículo se torna um argumento por sua valorização, ante exemplares em tons mais mundanos[2].

Há ocasiões em que, por não haver exemplares à venda ou não existir histórico de negociações que permita averiguar com precisão o seu valor, a amostragem insuficiente torna virtualmente impossível precificar o modelo objeto da avaliação.

Tais fatores com potencial para elevar o automóvel ao status de “colecionável” não são observados pela Tabela Fipe, no que se busca apenas uma espécie de meio-termo na amostragem de veículos disponíveis.

O resultado dessa homogeneização é que os proprietários de veículos de coleção podem se encontrar “em maus lençóis”, quando vítimas de sinistros que ocasionem a perda total do automóvel – afinal, caso se adote um critério objetivo como a Tabela Fipe, não serão refletidos os elementos de sobrevalorização do veículo a patamar superior à média de mercado.

O Judiciário tem enfrentado tais situações com ceticismo, por vezes causando efetivo prejuízo ao proprietário do automóvel de coleção ao adotar critérios genéricos como a Tabela Fipe, em inobservância a questões subjetivas e específicas do objeto avaliado.

Um critério amplamente adotado para deduzir se o veículo é colecionável ou não – e que se faz muito conveniente para o julgador – é se ele está equipado com placas de coleção. Há casos da jurisprudência em que sua mera ausência foi encarada como critério excludente da sobrevalorização do automóvel[3], bem como outros em que o fato do veículo ser equipado com elas foi imperativo para tal finalidade[4].

As “placas pretas” são regulamentadas pela Resolução 957/2022 do Contran, destinando-se a identificar e diferenciar o chamado “veículo de coleção” (“aquele fabricado há mais de trinta anos, original ou modificado, que possui valor histórico próprio”, preservando “suas características de fabricação quanto à mecânica, carroceria, suspensão, aparência visual (…) e demais itens condizentes com a tecnologia e cultura empregada à época de sua fabricação” – a serem avaliadas “por entidade credenciada pelo órgão máximo executivo de trânsito da União”)[5].

Tal entidade credenciada (geralmente clube de veículos antigos) avalia os critérios acima, concedendo ou não o certificado de originalidade da placa de coleção.

Embora louvável o esforço na regulamentação das chapas de coleção, em relevante trabalho para a preservação histórica, é certo que o veículo não as possuir não deveria ser, por si só, um fator excludente para sua classificação como colecionável – em especial porque a sua obtenção é mera faculdade do proprietário; não há exigência normativa para que equipem todo automóvel com alto grau de originalidade e trinta anos ou mais.

Um veículo pode preencher os requisitos e mesmo assim não possuir a placa de coleção, não cabendo a conclusão de que ele não tem valor histórico e que, portanto, não mereceria tratamento especial – o que já foi reconhecido em juízo, no que o fato do veículo não possuir placa preta na ocasião do sinistro não implicou que “ele não poderia (obter) futuramente tal certificado de originalidade ou que não se destinaria à venda a aficionado por automóvel antigo, dada sua antiguidade e grau de conservação”[6].

De certa forma, a obtenção da placa de coleção se tornou uma espécie de “seguro contra terceiros”, ao corroborar a elevada valorização do exemplar – fator que passa despercebido para muitos proprietários.

Mesmo que o veículo sinistrado não as equipe, ainda assim é possível requerer avaliação coerente do bem – seja através de conjunto probatório pré-constituído, seja através de perícia avaliativa, voltada a apurar o real valor do automóvel conforme as circunstâncias particulares – que podem ou não o diferenciar da média do mercado.

O assunto como um todo, longe de pacificado na jurisprudência, não encontra menção na melhor doutrina, por ser confessamente específico – porém, mostra-se seguramente relevante para uma significativa parcela dos motoristas brasileiros.

[1] rBRASIL. 3ª Turma do STJ. REsp 1742897 PR 2018/0121614-7. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201801216147&dt_publicacao=16/09/2020. Acesso em: 12 mar. 2024

[2] HAGERTY GROUP, LLC. How color shades the collector car market, 18 dez. 2017. Disponível em: https://www.hagerty.com/media/archived/collector-car-color/. Acesso em: 04 mar. 2024

[3] BRASIL. 1ª Vara Cível do Foro da Comarca de Itatiba/SP. Proc. 1000394-54.2022.8.26.0281. Disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=16051184&cdForo=0. Acesso em: 12 mar. 2024.

[4] BRASIL. 1ª Câmara de Direito Civil do TJSC. AC 0043462-75.2012.8.24.0023. Disponível em: https://busca.tjsc.jus.br/jurisprudencia/html.do?q=&only_ementa=&frase=&id=321669579588631821948119554975&categoria=acordao_eproc. Acesso em: 12 mar. 2024.

[5] BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE TRÂNSITO. Resolução nº 957, de 17 de maio de 2022. Disponível em: https://www.gov.br/transportes/pt-br/pt-br/assuntos/transito/conteudo-contran/resolucoes/Resolucao9572022n2.pdf. Acesso em: 12 mar. 2024.

[6] BRASIL. 36ª Câmara de Direito Privado do TJSP. AC 1005279-25.2017.8.26.0625. Disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=11611422&cdForo=0. Acesso em: 12 mar. 2024.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *