Representante exigido por Moraes ao X tem previsão legal, mas aplicação limitada

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A determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), para que o X (antigo Twitter) indique um representante legal no Brasil tem fundamento em lei, mas a aplicação da regra tem limitações práticas, conforme advogados consultados pela reportagem.

Na noite da última quarta-feira (28), o magistrado intimou Elon Musk, dono da rede social, a indicar, em 24 horas, um representante legal da empresa no Brasil. O mandado foi encaminhado ao bilionário pela própria plataforma.

O empresário é investigado no âmbito do STF por supostos crimes de obstrução à Justiça, inclusive em organização criminosa, e incitação ao crime.

Nesta sexta-feira (30), Moraes determinou a suspensão do X até a empresa cumprir todas as ordens judiciais e pagar as multas que lhe foram aplicadas. Pelas contas de funcionários da rede social ouvidos pela reportagem, os valores já superam R$ 20 milhões.

De acordo com Alexandre Pacheco da Silva, professor da FGV Direito SP, a regra geral é a de que todas as empresas estrangeiras com operação no país são obrigadas a manter um representante legal, por força do Código Civil.

A lei diz que “a sociedade estrangeira autorizada a funcionar é obrigada a ter, permanentemente, representante no Brasil, com poderes para resolver quaisquer questões e receber citação judicial pela sociedade”.

Pacheco afirma que a regra foi pensada para um tempo pré-internet, quando o padrão era uma multinacional abrir escritório no país para vender produtos como refrigerantes ou carros -não colocar no ar uma plataforma de mídia social.

Muitas empresas oferecem de fora do país serviços na internet, mantendo operações no Brasil, mas sem representantes legais. Elas não cumprem a regra, mas a consequência prática é limitada, por exemplo, no caso de um joguinho de celular.

“Existe uma regra. Ela é aplicável para empresas de internet. Ponto. O problema é: existem limitações práticas no sentido de que muitas empresas de internet não cumprem essa regra”, afirma Pacheco.

O professor diz que, para obrigar alguém, o Judiciário pode “multar, prender e assim por diante”. Mas, “quando toda a operação está fora do Brasil, o último remédio possível é bloqueio do acesso ao aplicativo”.

O Marco Civil da Internet prevê, entre as penas possíveis de serem aplicadas, a advertência, a multa, a suspensão temporária das atividades e, no limite, a proibição do exercício delas. “Só que bloqueio”, como afirma Pacheco, “pega muito mal para o Judiciário”.

Existe uma razão para a suspensão e a derrubada permanente figurarem como últimos recursos. Elas penalizam de tabela os usuários, que em geral não têm culpa de a empresa não querer cumprir ordem judicial.

A decisão desta sexta, a exemplo disso, estabelece uma multa diária de R$ 50 mil a pessoas e empresas que utilizarem “subterfúgios tecnológicos” para manter o uso do X .

Marco Sabino, doutor pela USP e sócio de Mannrich e Vasconcelos Advogados, classifica a situação como uma “contenda política entre um empresário turrão e o Supremo, personificado na pessoa do ministro Alexandre de Moraes”.

Mas o advogado diz entender “o lado do ministro”.

“Ordem judicial se cumpre. Este é um país soberano. Você tem que cumprir a ordem da Suprema Corte, de qualquer órgão jurisdicional.”

O Marco Civil estabelece que a legislação brasileira e a garantia a direitos deverão ser obrigatoriamente respeitadas em qualquer operação que ocorra em território nacional.

“Como fazer alguma coisa com o sujeito domiciliado na Itália, na França, no Japão?”, questiona Sabino.
“Do ponto de vista da responsabilidade, é muito relevante que tenha alguém no país para poder responder.”

No passado, a Justiça brasileira teve problemas com o Telegram, empresa com a qual tentava contato, mas não obtinha sucesso. A dificuldade também decorria do fato de o aplicativo de mensagens não ter representante judicial no país.

A situação só foi se resolver quando a empresa indicou um escritório de advocacia após Alexandre de Moraes cobrar a nomeação, também sob a ameaça de suspensão do aplicativo em caso de descumprimento.

Ana Bárbara Gomes, diretora do Instituto de Referência em Internet e Sociedade, diz ver com preocupação a escalada de acontecimentos, principalmente sobre como impor respeito à soberania.

Segundo ela, a questão do bloqueio é um desafio por envolver também os milhões de usuários que serão impactados. Ainda assim, afirma que as leis precisam ser cumpridas.

“Liberdade de expressão é um tópico caro, que deve ser prioridade quando falamos de regulação de plataformas, mas não podemos deixar de observar a nossa soberania, a manutenção das nossas instituições, da nossa democracia.”

Por Arthur Guimarães 

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