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A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a União deve indenizar a família de Vanderlei Conceição de Albuquerque, vítima de uma bala perdida durante um confronto armado entre criminosos e militares do Exército no Complexo da Maré, nas operações de pacificação de comunidades no Rio de Janeiro, em 2015.
No entanto, os ministros não chegaram a um consenso sobre a tese em repercussão geral – ou seja, o entendimento que deve guiar as demais instâncias judiciais quando se depararem com casos similares que discutam a responsabilidade do Estado em indenizar famílias de vítimas de tiroteios entre agentes de segurança pública e criminosos quando a origem do disparo for inconclusiva.
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O julgamento do ARE 1385315 ocorreu em ambiente virtual e terminou na sexta-feira (8/7). Durante o depósito dos votos, teses distintas foram sendo construídas entre os ministros. Por isso, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, deve marcar uma sessão presencial para a discussão da tese que deve guiar o Judiciário brasileiro sobre o assunto.
Os ministros entenderam que Edite Maria da Conceição, José Jerônimo de Albuquerque e Sidnei Conceição de Albuquerque – pais e irmão de Vanderlei – devem receber indenização da União, sendo R$ 200 mil para cada um dos pais (espólio de Edite Maria de Conceição e José Jerônimo de Albuquerque) e R$ 100 mil para o irmão. Ainda, a União deve ressarcir a família pelas despesas com funeral e pagar pensão.
Em junho de 2015, Vanderlei foi atingido, em sua residência, no Complexo da Maré, por um projétil de arma de fogo oriundo de um tiroteio entre bandidos, militares do Exército e policiais militares, e acabou morrendo. A família entrou na Justiça pedindo indenização, alegou que a vítima possuía 34 anos, era trabalhador, dono de lava jato e que teve sua vida extirpada após chegar do trabalho. Na época, o Exército encontrava-se presente no Complexo da Maré, em razão da pacificação da comunidade.
Porém, o laudo da perícia foi inconclusivo sobre a origem do projétil e não se sabe se o tiro partiu da arma de um agente estatal ou de criminosos.
Como a perícia foi inconclusiva em relação à origem do disparo do projétil que atingiu a vítima, a 7ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no Rio de Janeiro, considerou ausente o nexo de causalidade, elemento para caracterizar a responsabilidade do Estado e, consequentemente, o seu dever de indenizar. Porém, a família recorreu e o caso chegou ao Supremo.
O julgamento no STF
O relator, ministro Edson Fachin, condenou solidariamente tanto a União quanto o estado do Rio de Janeiro ao pagamento da indenização. Ele foi acompanhado pelas ministras Rosa Weber (hoje aposentada) e Cármen Lúcia e pelo ministro Gilmar Mendes.
Para Fachin, o fato gerador do dano não é o projétil em si, mas sim a operação da Força de Pacificação do Exército. “Daí porque, para configurar o nexo de causalidade, não é necessário saber se o projétil proveio da arma dos militares do Exército ou dos confrontados, mas sim se houve operação da Força de Pacificação do Exército no momento e no local em que a vítima foi atingida por disparo de arma de fogo”, escreveu.
“Assim, os militares da Força de Pacificação, ao realizar operação em zona habitada e, a partir dela, desencadear intensa troca de tiros com os confrontados, descumpriu com o seu dever de diligência, a ensejar a responsabilidade objetiva do Estado”, justificou.
Fachin propôs a seguinte tese: “Sem perícia conclusiva que afaste o nexo, há responsabilidade do Estado pelas causalidades em operações de segurança pública”.
Uma segunda corrente foi aberta pelo ministro André Mendonça – ele acompanhou Fachin para condenar apenas a União, pois considera que a Polícia Militar do Rio de Janeiro não participou dos conflitos com os traficantes de drogas.
Mendonça propôs a seguinte tese:
“1 -O Estado é responsável por morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva, desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública.
2- Poderá o Estado se eximir da responsabilização civil, caso demonstre a total impossibilidade da perícia, mediante o emprego tempestivo dos instrumentos técnicos disponíveis, para elucidação dos fatos”.
Mendonça recebeu o apoio do ministro Dias Toffoli.
O ministro Cristiano Zanin trouxe uma terceira corrente sobre a questão. O magistrado também diverge do relator unicamente em relação à responsabilidade atribuída ao estado do Rio de Janeiro. Foi acompanhado pelo ministro Luís Roberto Barroso. Zanin propôs a seguinte tese:
“(i) a responsabilidade civil do Estado, na forma do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, opera sob a teoria do risco administrativo, cabendo a oposição, se o caso, de excludentes de responsabilidade pelo ente federativo;
(ii) a perícia inconclusiva sobre a origem de disparo fatal durante operações policiais e militares não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade civil do Estado.”
O ministro Alexandre de Moraes divergiu completamente de Fachin e negou provimento ao recurso. Moraes entende que não foi comprovada a participação dos agentes estatais no tiro que matou Vanderlei, portanto, a perícia é inconclusiva e o estado não deve ser responsabilizado, pois o nexo causal não está comprovado.
Moraes propôs a seguinte tese: “A responsabilidade estatal por morte de vítima, por disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, pressupõe a comprovação de que o projétil partiu dos agentes do Estado”. O ministro Luiz Fux acompanhou Moraes.