As fases de análise do recurso especial no STJ: um tribunal em transformação

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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou, passa e ainda passará por transformações em relação ao iter processual do seu recurso especial. O passeio verbal é proposital. 

Passou, em relação aos recursos especiais repetitivos, criado em 2008 e com a sua sistematização no Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Passa, com a expansão das classes que serão julgadas no plenário virtual, aprovada pela Emenda Regimental 45 de 2024, ainda não implementada. E ainda passará, com a regulamentação legal da exigência constitucional da relevância para o recurso especial, aprovada em 2022 por emenda à Constituição. 

Mas antes da implementação do novo plenário virtual e da exigência da relevância, é preciso entender o iter processual atual do recurso especial no STJ: sistematizo a análise em cinco fases. 

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A primeira fase é a de conhecimento, é a que notoriamente diferencia os recursos de natureza ordinária dos recursos de natureza extraordinária. 

É a fase da incidência das conhecidas súmulas obstativas de conhecimento de recurso, podem sem citadas as conhecidas Súmulas 5 e 7 do STJ (de impossibilidade de reexame da matéria fática e contratual), as Súmulas 283 e 284 do STF (de impugnação insuficiente e de deficiência de fundamentação recursal), e as Súmulas 182 e 211 do STJ (de dialeticidade recursal e de exigência de prévia manifestação do tribunal de origem).  

Esta fase pode ser analisada tanto pela presidência do STJ, por força da previsão do art. 21-E, inciso V, do RISTJ, o que implica na decisão de não conhecimento do recurso antes da própria distribuição, ou mesmo pelo próprio relator após a distribuição do processo. 

Como é possível imaginar, a fase de não conhecimento é a de maior incidência no tribunal, como ilustrado na estatística da classe agravo em recurso especial, que é a classe mais distribuída anualmente no tribunal (representou 58,70% do total do acervo para 2023), sendo que o percentual de não conhecimento da classe para o mesmo ano, segundo o boletim estatístico do tribunal, foi de 59,6%. 

Há inúmeros motivos para esse alto percentual de não conhecimento, mas entendo que o principal é a falta de conhecimento prático e especializado dos advogados de origem que pensam no recurso especial apenas quando o tribunal já negou provimento ao seu principal recurso. 

A oposição de embargos de declaração contra o acórdão do tribunal de origem, por si só, não viabiliza processualmente o recurso especial. 

Esse é um dos vários mitos que ainda pairam sobre a atuação perante o STJ e que alimentam de maneira infundada a ideia da jurisprudência defensiva, como se a exigência de prequestionamento não estivesse prevista constitucionalmente: causa decidida. 

Se a questão jurídica tem potencial para ser direcionada para o STJ, isso deve ser projetado desde logo na ação e principalmente no início da fase recursal ordinária, momento em que se deve (i) pensar na objetivação do recurso especial, com a indicação clara e suficiente do dispositivo legal pretensamente violado, bem como na (ii) a demonstração da relevância da questão federal para a unidade do direito. 

Assim, caso proferida a decisão de não conhecimento pela presidência, o eventual agravo interposto será distribuído a um relator competente, que pode incluir o recuso no plenário virtual (art. 184-A do RISTJ), juntos com os demais agravos internos ou regimentais interpostos contra as suas decisões monocráticas. 

A segunda fase é a de incidência dos precedentes de observância obrigatória, prevista no art. 927, que foi sistematizada pelo CPC de 2015 com um rol de julgados vinculantes para juízes e tribunais. 

É nesta fase que a garantia do livre convencimento motivado do julgador foi mitigada pelo legislador, conforme a exposição de motivos do código:

Se todos têm que agir em conformidade com a lei, ter-se-ia, ipso facto, respeitada a isonomia. Essa relação de causalidade, todavia, fica comprometida como decorrência do desvirtuamento da liberdade que tem o juiz de decidir com base em seu entendimento sobre o sentido real da norma.

Esse entendido desvirtuamento da liberdade foi objeto de preocupação por parte do legislador quando inaugurou o Livro III dos CPC para dizer que: “os tribunais devem uniformizar a sua jurisprudência e mantê-la integra, estável e coerente” (art. 926). 

É a integralidade, a coerência e a estabilidade que o nosso sistema jurídico exige para que a lei federal seja federal também na sua aplicação pelos juízes e tribunais espalhados por todas as unidades da federação. 

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Desse modo, caso conhecido o recurso especial, o relator deve verificar se já há uma reposta vinculante do Poder Judiciário prevista no art. 927 do CPC:

  1. decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade;
  2. enunciados de súmula vinculante;
  3. acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
  4. enunciados das súmulas do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional; e
  5. a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Assim, ultrapassada fase de conhecimento do recurso, o julgador pode aplicar monocraticamente (art. 932 do CPC) a resposta vinculante, de acordo com o disposto no art. 10 e 489 do CPC (§ 1º do art. 927), sendo que a decisão pode ser objeto de agravo, que igualmente pode ser incluído no julgamento virtual. 

A terceira fase é a de incidência do “entendimento dominante”, conforme o enunciado da Súmula 568 do STJ, assim redigido: “o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema”. 

É a fase que resgatou o poder do relator previsto no art. 557 do CPC de 1973, que autorizava o relator a decidir de forma monocrática quando o recurso estivesse “em confronto com a jurisprudência dominante do Tribunal”. 

Mas o que caracteriza “entendimento dominante”, de modo a autorizar o julgamento monocrático pelo relator ?  

De fato, é um conceito ainda em aberto tanto na doutrina quanto no tribunal, é algo que acontece de modo prático na realidade do tribunal, até com poucas citações no dispositivo da decisão monocrática do relator. 

Aqui a justificativa para o ainda do parágrafo anterior é que: embora a ideia de entendimento dominante não tenha sido recepcionada pelo art. 932 do CPC de 2015, o legislador resolveu “promovê-la” em 2022 ao patamar constitucional quando a considerou como hipótese de relevância presumida: “quando o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça” (EC 125 de 2022). 

Assim, ainda de que de conceito aberto, observo que a ideia de entendimento dominante é utilizada na prática do tribunal quando o órgão julgador a que está vinculado o relator já decidiu aquele mérito (não vinculante), de modo a afastar a exigência de nova pauta para o órgão colegiado decidir a mesma questão. 

De igual modo, a decisão monocrática do relator que aplica o entendimento dominante pode ser objeto de agravo e ser incluído no ambiente virtual para julgamento. 

A quarta fase é a de julgamento originalmente colegiado, momento em que o relator inclui o recurso especial em pauta presencial (não pode ser virtual) para análise e votação pelo órgão julgador com a possibilidade de sustentação oral pelos advogados. 

É a fase que representa menos de 1% dos processos que são julgados pelo tribunal, isto é, mais de 99% dos processos decididos no STJ são de forma monocrática, nas três fases passadas, com a possível confirmação da decisão no plenário virtual. 

A quinta fase é a da majoração dos honorários recursais, caso o recurso não seja conhecido ou provido na sua totalidade, conforme decidido pelo STJ no Tema 1.059, diante da leitura do § 11 do art. 85 do CPC. 

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É uma novidade do CPC de 2015 a majoração dos honorários na fase recursal, pois antes a despesa acabava invariavelmente na sentença e não havia desestímulo legal para não recorrer. 

Essas são, portanto, as cinco fases de análise do recurso especial no STJ hoje, com o consequente uso do plenário virtual, antes da implementação da Emenda Regimental 45 de 2024 (que vai permitir a inclusão da fase quatro no plenário virtual), e da regulamentação da Emenda Constitucional 125 de 2002, que vai exigir a relevância para o apelo especial (uma nova fase ?)

O ano de 2025 pode (e deve) ser transformador para o STJ. 

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