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O alcance dos programas de conformidade tributária no PL 15/24

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No início de fevereiro desse ano, o governo apresentou ao Congresso Nacional, em regime de urgência, o PL 15/2024. Esse projeto contém três eixos: (1) os programas de conformidade tributária e aduaneira em nível federal; (2) disposições sobre o devedor contumaz; e (3) condições para fruição de benefícios fiscais[1].

O PL encontra-se atualmente em discussão na Câmara dos Deputados, tendo recentemente sido distribuído para análise de algumas de suas comissões[2]. Se aprovado, ainda precisará passar pelo Senado e depois sancionado pelo presidente para entrar em vigor. Mas, devido à solicitação de urgência, é possível que seu trâmite seja abreviado.

O projeto institui três programas de conformidade tributária e aduaneira diferentes:

Confia – Programa de Conformidade Cooperativa Fiscal;
Sintonia – Programa de Estímulo à Conformidade Tributária; e
OEA – Operadora Econômico Autorizado.

Cada um deles está regulamentado em uma seção específica com regramentos próprios.

O OEA consiste em um sistema de certificação para os operadores de comércio exterior que leva em conta a segurança da cadeia logística e o cumprimento de obrigações tributárias e aduaneiras[3]. O OEA prevê também a celebração de Acordos de Reconhecimento Mútuo (ARM).

A celebração desses acordos permite que sejam reconhecidas certificações emitidas pela Aduana de outro país e comprometimento recíproco da oferta de benefícios comparáveis[4]. O PL traz maior segurança e prevê benefícios adicionais, tal como o diferimento do pagamento de tributos. Mas, por ser esse programa um velho conhecido, iremos focar nos demais.

O Confia é um programa que visa a incentivar o cumprimento das obrigações tributárias pela melhoria da relação fisco-contribuinte. Trata-se de um verdadeiro programa de conformidade cooperativa nos moldes propostos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)[5].

As administrações tributárias vêm desenvolvendo programas de conformidade cooperativa ao longo das últimas décadas. Esse movimento intensificou-se a partir de 2013, depois que a OCDE lançou um guia com indicações para a construção de programas dessa natureza.

Esses programas visam estabelecer um novo paradigma na relação entre o fisco e os contribuintes, migrando de um controle a posteriori, com o emprego de auditorias e aplicação de sanções, para um relacionamento baseado em princípios como a boa-fé, a confiança justificada, a transparência e a segurança jurídica, no intuito de prevenir longos e caros litígios.

O Confia é aberto aos contribuintes que preencham alguns requisitos, como a existência de uma estrutura de governança corporativa tributária e um sistema de controle fiscal robusto, além de atender a determinados critérios quantitativos (e.g. patrimônio, receita bruta, folha de salários) e qualitativos (e.g. histórico de conformidade fiscal e perfil de litígio).

Essa estrutura de governança corporativa tributária, que internacionalmente se chama de Tax Control Framework, é uma característica recomendada para os programas de conformidade cooperativa. É ela que permite o tratamento e a correção prévia de riscos tributários que possam comprometer o cumprimento das obrigações.

Uma das características do Confia é a busca por um diálogo para resolver possíveis dúvidas ou divergências entre fisco e contribuintes por meio da maior transparência em troca de segurança jurídica. Para tanto, o PL prevê que os contribuintes que apresentarem voluntariamente seus atos e negócios com relevância fiscal, não se sujeitem à aplicação de multa, de ofício e de mora, dentro de condições específicas.

O Sintonia, por sua vez, também é um programa que visa a incentivar os contribuintes a adotarem boas práticas no cumprimento das obrigações tributárias por meio da concessão de benefícios para os bons contribuintes. Para tanto, utiliza um sistema de classificação com base em critérios como a regularidade cadastral, a entrega tempestiva de declarações e o pagamento dos tributos.

Para os contribuintes mais bem classificados, criam-se incentivos positivos, dos quais ele poderá usufruir conforme o seu grau de conformidade, como prioridade na análise de pedidos de restituição, ressarcimento ou reembolso perante a Receita Federal, na prestação de serviços de atendimento presencial ou virtual e na participação em seminários e fóruns promovidos pelo órgão fazendário. A RFB classificará todos os contribuintes dessa forma.

Portanto, diferentemente do Confia, importante frisar que o Sintonia não é um programa de conformidade cooperativa, de adesão voluntária, para um grupo de contribuintes que preencha determinados requisitos.

O Sintonia se assemelha muito ao programa Nos Conformes, instituído em 2018 pelo estado de São Paulo. Nele, a partir de um sistema de classificação que vai de A+ a E e N/C (não classificados), são concedidos benefícios, tais como o procedimento simplificado para apropriação e transferência de crédito acumulado de ICMS e renovação de regimes especiais[6].

Outra semelhança entre o Sintonia e o Nos Conformes é que caso os contribuintes não concordem com a classificação que lhes for atribuída, poderão impugná-la. Além disso, a classificação poderá também ser divulgada, em regra, mediante concordância do contribuinte, gerando um benefício reputacional.

A ideia de conceder benefícios atrelados à classificação dos contribuintes não é nova na administração tributária federal. Ainda em 2018, a Receita Federal do Brasil abriu para consulta pública uma minuta de portaria com as diretrizes de um programa parecido com o Sintonia, o programa Pró-Conformidade. Mas o programa não chegou a se concretizar[7].

Além dos benefícios específicos do Confia e do Sintonia, existe a previsão de atribuição de selos de conformidade aos contribuintes. Aqueles que obtenham o selo Confia (todos os admitidos) ou Sintonia (apenas os classificados com maior grau de conformidade), terão benefícios adicionais que incluem um bônus de adimplência fiscal, com a redução gradativa de 1 a 3% da CSLL a pagar, a vedação de arrolamento de bens e possibilidades de informação e orientações prévias, com opção de autorregularização, sem incidência da multa de mora.

Em síntese, o PL 15/2024, recentemente apresentado pelo governo, traz um arcabouço legal para os programas de conformidade tributária em nível federal, com destaque para o Confia e o Sintonia. A principal diferença entre eles é que o Confia busca aprimorar as relações fisco-contribuinte, com critérios de entrada e voluntariedade para participação, enquanto o Sintonia alcança todos os contribuintes e propõe oferecer benefícios de acordo com a classificação dos contribuintes. Assim, busca-se observar o princípio da isonomia, tratando cada um na medida de suas inclinações e aptidões para a observância das obrigações tributárias.

[1] Sobre os três eixos do PL 15/2024, conferir: Receita Federal detalha projeto sobre conformidade tributária e aduaneira – JOTA.

[2] O trâmite e conteúdo do PL 15/2024 pode ser conferido em: PL 15/2024 — Portal da Câmara dos Deputados – Portal da Câmara dos Deputados (camara.leg.br).

[3] Esse regime foi gradualmente implementado na última década no Brasil tendo por base as diretrizes da Organização Mundial de Aduanas (OMA), em inglês World Customs Organization (WCO). Para maiores informações sobre a organização, conferir: World Customs Organization (wcoomd.org). Sobre a experiência brasileira com o OEA, conferir: Cooperative Compliance in Brazil: What does the Future Hold, Technical Note n. IDB-TN-2793, Inter-American Development Bank (IADB), p. 16-17. Disponível em: Cooperative Compliance in Brazil: What Does the Future Hold? (iadb.org).

[4] Sobre os acordos de reconhecimento mútuo no âmbito do programa OEA, conferir: Acordos de Reconhecimento Mútuo — Receita Federal (www.gov.br).

[5] OCDE (2013), Co-operative Compliance: A Framework: From Enhanced Relationship to Co-operative Compliance, OECD Publishing: Paris, https://doi.org/10.1787/9789264200852-en. Para mais informações sobre as diversas facetas dos programas de conformidade cooperativa, conferir: OWENS, Jeffrey; LEIGH PEMBERTON, Jonathan. Cooperative Compliance: A Multi-stakeholder and Sustainable Approach to Taxation. Philadelphia: Wolters Kluwer, 2021.

[6]  Para mais detalhes sobre o sistema de classificação e as contrapartidas para os contribuintes do programa “Nos Conformes” do Estado de São Paulo, ver: Perguntas Frequentes (fazenda.sp.gov.br). Para uma análise crítica da efetiva implementação das contrapartidas, conferir: A regulamentação do Nos Conformes e os créditos acumulados de ICMS (jota.info).

[7] Sobre a tentativa de implementar o programa “Pro-Conformidade”, conferir: Conformidade cooperativa: o programa Confia e o PL n° 2.384/2023 (jota.info).

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