No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

pensamento do dia

Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

A prevenção ao bullying como política de segurança pública

Spread the love

A discussão sobre o bullying escolar ganha uma dimensão particularmente importante no mês de abril, marcado pela lembrança do trágico episódio do massacre de Columbine, ocorrido em 1999 nos Estados Unidos. Este evento não apenas chocou o mundo pela violência extremada perpetrada dentro de um ambiente educacional, mas também levantou questões profundas sobre a cultura columbiner, que glorifica ou romantiza atos de violência perpetrados por jovens em escolas.

A reflexão sobre o bullying escolar nesse período é crucial para compreendermos como a intimidação e o assédio entre pares podem contribuir para ambientes escolares tóxicos, potencialmente desencadeando reações extremas em indivíduos vulneráveis. Discutir abertamente o bullying e suas consequências, promovendo políticas de prevenção e intervenção, torna-se uma ferramenta vital para evitar a repetição de tais tragédias, ao mesmo tempo que homenageia as vítimas e promove uma cultura de paz e respeito mútuo nas escolas.

A pesquisa sobre a vitimização causada pelo bullying ganhou destaque no cenário acadêmico a partir dos anos 1970, motivada principalmente por casos trágicos de suicídios juvenis ligados ao assédio contínuo entre colegas. Desde então, a área de estudo sobre o bullying, especialmente em ambientes escolares, expandiu-se significativamente. Segundo Olweus (1993), o bullying é definido como uma forma de opressão reiterada, seja psicológica ou física, exercida por um indivíduo ou grupo sobre outro menos poderoso, caracterizando-se pela intenção de causar dano, repetição dos atos agressivos ao longo do tempo e um desequilíbrio de poder que dificulta a defesa da vítima.

Essa definição ressalta três aspectos centrais: a natureza intencionalmente agressiva do bullying, a persistência desses comportamentos agressivos e a relação de poder desigual entre agressor e vítima. A investigação acadêmica tem se concentrado majoritariamente no bullying ocorrido no ambiente escolar, embora reconheça-se que o bullying possa acontecer em diversos contextos. A obra de Olweus (1993) é frequentemente citada como um marco no campo, dada a posição de Olweus como um dos primeiros a explorar profundamente o bullying escolar, incluindo o desenvolvimento do Programa de Prevenção ao Bullying de Olweus.

No clássico texto de David Farrington (1993) o bullying é definido como uma opressão repetida, seja psicológica ou física, de uma pessoa menos poderosa por outra mais poderosa. A prevalência de bullying entre crianças escolares é alta, com estudos mostrando que cerca de metade das crianças se envolve em bullying, seja como agressores ou vítimas. Meninos praticam bullying mais do que meninas, mas ambos os gêneros são vitimizados em proporções semelhantes.

Geralmente, os agressores são descritos como agressivos, fortes, confiantes e impulsivos, enquanto as vítimas são impopulares, solitárias, rejeitadas, ansiosas, deprimidas, relutantes em retaliar e com baixa autoestima. O bullying ocorre especialmente em locais e momentos com mínima supervisão adulta. Existe uma certa continuidade ao longo do tempo entre o comportamento de bullying e a criminalidade violenta (Farrington, 1993).

Jimerson et al. (2010) apresentam uma perspectiva internacional sobre o bullying, abordando conceitos chave, métodos de medição e estratégias de intervenção e prevenção baseadas em evidências. Rigby (2008) propõe um guia prático destinado a educadores e pais para o tratamento do bullying. Além disso, artigos acadêmicos como Arseneault et al. (2010), que discute o impacto do bullying na saúde mental infantil, e Salmivalli (2010), que examina o fenômeno do bullying como uma dinâmica de grupo, contribuem significativamente para a compreensão geral sobre o tema.

Connell et al (2015) investigaram os mecanismos e processos pelos quais as experiências negativas na infância podem aumentar o risco de comportamento de bullying na adolescência. Os resultados indicam que experiências adversas na infância, especialmente aquelas ocorridas dentro do domínio familiar e escolar, podem alterar as trajetórias de vida e atuar como preditores de bullying na adolescência. Isso destaca a importância potencial que experiências relativamente menores podem ter a longo prazo. O estudo enfatiza a necessidade de uma compreensão mais profunda dos fatores que contribuem para o bullying, além de investigar explicações concorrentes para esse tipo de comportamento.

Intervenções precoces, especialmente focadas no ambiente familiar e escolar, podem ser cruciais para prevenir o bullying na adolescência, sugerindo que as experiências negativas na infância não apenas afetam o bem-estar imediato das crianças, mas também têm implicações duradouras que podem levar a comportamentos de bullying (Connell et al., 2015)

A pesquisa de Ttofi & Farrington (2012) sobre programas de prevenção ao bullying destaca que estratégias que incluem a “intervenção de pares” e “métodos disciplinares”[i] não garantem automaticamente a redução de casos de bullying e vitimização. Os achados indicam que, enquanto programas baseados em apoio entre colegas muitas vezes não afetam ou até aumentam o bullying, métodos disciplinares aplicados de maneira justa e em um ambiente acolhedor podem ser eficazes na diminuição do bullying e da vitimização. Além disso, a pesquisa revela que a eficácia desses programas pode variar conforme a idade dos estudantes, necessitando de mais estudos, especialmente experimentos randomizados, para determinar as abordagens mais eficazes para diferentes grupos etários.

Silva et. al (2016) analisaram detidamente as conexões entre bullying na escola e comportamentos infracionais ou criminosos na adolescência e na idade adulta. O estudo oferece evidências sistemáticas e longitudinais que demonstram como o bullying não é apenas um problema isolado de comportamento agressivo entre pares, mas um fator de risco significativo para o desenvolvimento de condutas infracionais.

A revisão sistemática destaca a associação estatisticamente significativa encontrada na maioria dos trabalhos entre experiências de bullying (seja como vítima, agressor ou ambos) e a ocorrência subsequente de atos contrários à lei, tanto na adolescência quanto na idade adulta. Este vínculo persiste mesmo após o controle de outros fatores de risco na infância, o que sugere que o bullying pode funcionar como um fator de risco independente para comportamentos infracionais.

Este achado reforça a necessidade de intervenções precoces e direcionadas no ambiente escolar para prevenir e abordar o bullying, não apenas para proteger o bem-estar das crianças e adolescentes, mas também como uma estratégia potencial para prevenir a delinquência juvenil e a criminalidade futura. Além disso, o artigo fornece uma base para argumentar a favor de políticas educacionais e sociais mais amplas que visam a redução do bullying e suas consequências a longo prazo.

No mesmo sentido, após Sobko (2023) observou a correlação entre a violência mental severa sofrida por adolescentes, principalmente aquela perpetrada por pais ou substitutos, e a manifestação subsequente de comportamentos criminais na idade adulta. O estudo evidencia como o bullying, especialmente quando envolve figuras de autoridade como educadores, pode ter um impacto duradouro e negativo no desenvolvimento psicológico e social dos jovens. Essa exposição ao bullying não apenas afeta a formação da personalidade dos jovens, mas também pode predispor a comportamentos que incluem a dominação e subjugação dos outros, refletindo-se em atos criminosos posteriormente na vida.

Do exposto, resta claro que o bullying escolar não é um problema isolado, mas um indicador e potencial catalisador de comportamentos disruptivos e criminosos. A incorporação de estratégias de prevenção e intervenção eficazes, enfatizando o envolvimento da comunidade escolar, o apoio familiar e a responsabilização dos agressores, emerge como um caminho fundamental para mitigar os impactos negativos do bullying. Ao mesmo tempo, reconhece-se a importância de uma abordagem holística que transcenda o ambiente escolar, integrando políticas de segurança pública e estratégias sociais mais amplas para promover o bem-estar e a resiliência das crianças e adolescentes.

[1] A intervenção de pares envolve capacitar estudantes selecionados para identificar e intervir em situações de bullying, promovendo um ambiente escolar positivo e inclusivo. Já os métodos disciplinares referem-se à implementação de regras e sanções claras e justas, focando na reabilitação e na conscientização dos envolvidos, ao invés de apenas puni-los. Ambas as estratégias visam não só reduzir a incidência do bullying, mas também cultivar uma cultura de respeito e empatia entre os estudantes.

Arseneault, L., Bowes, L., & Shakoor, S. (2010). Bullying victimization in youths and mental health problems: “Much ado about nothing”? Psychological Medicine, 40(5), 717–729. https://doi.org/10.1017/S0033291709991383

Connell, N. M., Morris, R. G., & Piquero, A. R. (2016). Predicting Bullying: Exploring the Contributions of Childhood Negative Life Experiences in Predicting Adolescent Bullying Behavior. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 60(9), 1082-1096. https://doi.org/10.1177/0306624X15573760

Farrington, D. P. (1993). Understanding and Preventing Bullying. Crime and Justice, 17. https://doi.org/10.1086/449217.

Jimerson, S. R., Swearer, S. M., & Espelage, D. L. (Eds.). (2010). Handbook of bullying in schools: An international perspective. Routledge.

Olweus, D. (1993). Bullying at school. Blackwell.

Rigby, K. (2008). Children and bullying: How parents and educators can reduce bullying at school. Blackwell.

Salmivalli, C. (2010). Bullying and the peer group: A review. Aggression and Violent Behavior, 15, 112–120. https://doi.org/10.1016/j.avb.2009.08.007

Siena, D. P. B. de. (2023, Maio 23). Por que ataques a escolas se repetem? Abordagem criminológica do mass attack. Consultor Jurídico. https://www.conjur.com.br/2023-mai-23/david-siena-ataques-escolas-repetem/

Silva, J. L. da, Oliveira, W. A. de, Bono, E. L., Dib, M. A., Bazon, M. R., & Silva, M. A. I. (2016). Associações entre Bullying Escolar e Conduta Infracional: Revisão Sistemática de Estudos Longitudinais. Psicologia: Teoria E Pesquisa, 32(1), 81–90. https://doi.org/10.1590/0102-37722016012241081090

Sobko, G., Topchii, V. V., Bugera, O. I., Ivanii, O. M., & Yavorska, T. (2023). Bullying: Criminological and Criminal Law Aspects. Journal of Forensic Psychology Research and Practice, 23(3), 227-245. https://doi.org/10.1080/24732850.2022.2026787

Ttofi, M. M., & Farrington, D. P. (2012). Bullying prevention programs: the importance of peer intervention, disciplinary methods and age variations. Journal of Experimental Criminology, 8(4), 443–462. https://doi.org/10.1007/s11292-012-9161-0

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *