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Publicado recentemente pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Secretaria Especial da Receita Federal, o Edital 6/2024 instituí a proposta de transação para débitos de IRRF, Cide e PIS/Cofins sobre remessas ao exterior, que tenham por origem discussão relativa à tese conhecida como split contratual.
Segundo o edital, fica facultado ao contribuinte incluir na referida transação débitos que estejam em discussão administrativa ou judicial, e que sejam decorrentes de cobrança em virtude “da bipartição do negócio jurídico pactuado em um contrato de afretamento de embarcações ou plataformas e outro de prestação de serviços, nos termos da Lei 9.481, de 13 de agosto de 1997”. Poderão ainda ser transacionadas as multas relacionadas à tese, inclusive as qualificadas, que aproveitarão dos mesmos descontos concedidos ao principal.
Caso o litígio envolva valores que já tenham sido depositados pelo contribuinte, tais montantes deverão ser transformados em pagamento definitivo, com a aplicação dos descontos apenas sobre o saldo remanescente.
Em relação as reduções que estão sendo oferecidas, o contribuinte dispõe de duas opções. Na primeira, pode optar por um desconto de 65% sobre o valor total do débito, mediante o pagamento de entrada mínima equivalente a 30% do valor da dívida, podendo o restante ser parcelado em até seis prestações mensais.
Alternativamente, o edital oferece a possibilidade de desconto de 35%, com entrada mínima correspondente a 10% do valor da dívida após a aplicação do desconto, e com a possibilidade de parcelamento do saldo remanescente em até 24 prestações mensais.
Em ambos os cenários, a transação poderá compreender a utilização de saldo de prejuízo fiscal (IRPJ) e base de cálculo negativa (CSLL), de titularidade do sujeito passivo, de pessoa jurídica controladora, controlada indireta ou direta, ou de sociedades que sejam controladas direta ou indiretamente por uma mesma pessoa jurídica, desde que o vínculo seja anterior a 31 de dezembro de 2023, até o limite de 10% do saldo remanescente da dívida após os descontos acima mencionados.
Para contextualizar o debate sobre split contratual, vale mencionar que historicamente o setor de óleo e gás se desenvolveu no país de forma que as empresas exploradoras utilizam-se de duas espécies contratuais executadas simultaneamente: afretamento de embarcações ou plataformas e prestação de serviços.
O contrato de afretamento, via de regra, é celebrado entre a concessionária, que explorará os campos concedidos pela União, e companhia constituída no exterior, que detém a propriedade da embarcação ou plataforma. Por sua vez, o contrato de prestação de serviços é usualmente celebrado pela concessionária diretamente com empresa sediada no Brasil, que pertence ao mesmo grupo econômico da empresa estrangeira detentora do bem afretado, com a finalidade operá-lo.
O entendimento das autoridades fiscais é no sentido de que tal contratação bipartida é artificial, e tem o intuito de obter redução indevida de carga tributária pela alocação da maior parte do valor da operação para remunerar o afretamento, em detrimento da prestação de serviços.
Sendo assim, a tese fazendária ensejava a desconsideração dos contratos de afretamento celebrados, sob o entendimento de que os dois contratos celebrados deveriam ser compreendidos como apenas um, de prestação de serviços.
Referido entendimento foi responsável por criar um grande contencioso, até o advento das Leis 13.043/14 e 13.586/17, que legitimaram a bipartição contratual, tendo sido estabelecidos limites objetivos para quanto do valor total da operação poderá ser empregado para remunerar o afretamento e quanto será destinado à prestação de serviços.
Analisando a jurisprudência do Carf, percebe-se, nos últimos tempos, que a maior parte dos julgados é favorável ao fisco. As decisões de maior repercussão sobre o assunto foram proferidas pela 3ª Turma da CSRF em desfavor da Petrobras, no começo do ano de 2024, para chancelar cobranças bilionárias de Cide (anos-calendário 2010 a 2012)[1] e PIS/Cofins (anos-calendário 2010 e 2013)[2], por maioria de votos.
No âmbito judicial, até o momento a jurisprudência permanece indefinida. Isso porque, em sua maioria os processos estão em fase incipiente. Algumas poucas decisões favoráveis[3] e desfavoráveis[4] aos contribuintes foram proferidas no primeiro grau de jurisdição.
Vale mencionar que tanto na esfera administrativa quanto judicial, dentre outros argumentos, os contribuintes têm defendido que o entendimento do fisco compromete a liberdade negocial das partes privadas, que celebram uma estrutura contratual válida, invalidando-a com base em presunções. Não caberia à Receita Federal alterar a forma e a substância desses contratos[5], ante as disposições dos artigos 109 e 110 do CTN.
De toda forma, fato é que, como mencionado, atualmente a jurisprudência sobre o tema é indefinida nos tribunais. Portanto, a decisão pela adesão ao programa de transação tributária, com o pagamento dos valores controvertidos de forma facilitada (com reduções, possibilidade de parcelamento e utilização de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa), é alternativa que deve ser ponderada de forma individualizada por cada contribuinte.
[1] Acórdãos 9303-014.560 e 9303-014.561, 9303-013.713 e 9303-013.714.
[2] Acórdãos 9303-013.711 e 9303-013.712.
[3] Sentença proferida no processo 5058443-20.2019.4.02.5101, mas que acabou sendo desfavoravelmente reformada pelo TRF2.
[4] Sentença proferida no processo 1025335-57.2019.4.01.3400.
[5] O STJ já decidiu que, tanto no afretamento a casco nu quanto no afretamento por tempo, prevalece o conteúdo de obrigação de dar, o que deveria afastar a tributação das remessas como pagamento por importação de serviços (RESP 792.444/RJ). Nessa ordem de ideias, também se extrai da Súmula Vinculante 31 que a existência de obrigações de fazer acessórias não desqualifica a preponderância da locação em contratos de arrendamento, para fins tributários.