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A vedação à reeleição dos Chefes do Poder Executivo é uma tradição do constitucionalismo brasileiro[1] que só veio a ser rompida com o advento da Emenda Constitucional n. 06, de 1997, que alterou a redação do § 5º do art. 14 da Constituição de 1988 para introduzir a possibilidade de o presidente, governadores e prefeitos candidatarem-se à reeleição para um único mandato subsequente.[2]
Não foram poucos os debates travados à época da tramitação da proposta, seja na esfera política, seja entre os acadêmicos. Paulo Brossard, ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, chegou a afirmar que a emenda da reeleição significava um verdadeiro insulto à nação brasileira, classificando-a como uma deformação do presidencialismo. Segundo ele, bastou um presidente ambicioso “[…] e sem o senso de respeito à visão histórica nacional para que a Constituição mudasse a favor de seu intento”.[3] E, com a aprovação da medida, os debates se intensificaram. Um, em especial, ganhou fôlego: a necessidade, ou não, de desincompatibilização do cargo pelo candidato à reeleição.
E isso em razão do previsto no § 6º do art. 14 da Constituição: “Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito”. A controvérsia era a seguinte: alcançaria esse dispositivo somente a candidatura para outros cargos, como indica uma interpretação literal/gramatical; ou, por outro lado, considerando que ele está vocacionado a impedir que o candidato use de seu cargo para favorecimento próprio, e que foi pensado a partir de uma arquitetura constitucional que vedava a reeleição, uma interpretação teleológica nos leva a concluir que ele se aplica também à reeleição para o mesmo cargo?
A questão chegou ao Supremo Tribunal Federal nos autos da ADI n. 1.805/DF e, por maioria, os Ministros fixaram o entendimento de que não havia a necessidade de desincompatibilização. Prevaleceu a tese de que a exigência de renúncia prévia nos moldes previstos no § 6º do art. 14 poderia gerar graves prejuízos à continuidade administrativa. Nos termos do voto do Relator, Min. Néri da Silveira, se o constituinte quisesse exigir a desincompatibilização para a reeleição teria o feito, modificando o § 6º. Como não o fez, cumpre entender que levou em consideração “[…] a conveniência da continuidade administrativa, como valor relevante no instituto da reeleição”.[4]
A decisão do STF, contudo, não pôs fim a todos os problemas gerados tanto pela reeleição em si quanto pela permanência do Chefe do Executivo no cargo durante o período eleitoral. Na verdade, como apontado por parte da doutrina, a chancela do modelo inaugurado pela Emenda n. 06 trouxe mais problemas do que soluções: a) concretizou um tratamento desigual entre os candidatos;[5] b) tornou difícil traçar um limite entre o uso adequado da publicidade institucional e a promoção pessoal do candidato à reeleição;[6] c) facilitou o uso da máquina administrativa enquanto ferramenta eleitoral e meio oficial de propaganda;[7] d) potencializou os vícios e problemas do presidencialismo de coalização brasileiro;[8] e) implicou a personificação na pessoa do mandatário das qualidades da gestão de todo um grupo político; entre outros.
E nem se diga que tais riscos não existem ou são neutralizados pelas regras que regem a campanha eleitoral. A desnecessidade de desincompatibilização para a reeleição vai contra a própria racionalidade constitucional, afinal, não faz sentido afirmar que “[…] quando o candidato concorre a outro cargo, é admissível o uso indevido da máquina estatal e, quando disputa eleição para o mesmo cargo, tal possibilidade inexiste. Do mesmo modo, quando pleiteia outro cargo, necessita renunciar para fazer bem sua campanha, o que não se configura, na eventualidade de concorrer ao mesmo cargo”.[9]
Seja como for, o objetivo do presente artigo não é repisar todos esses argumentos, mas explorar um novo: o risco à ruptura democrática com a permanência do presidente[10] na Chefia das Forças Armadas durante o período eleitoral. As recentes candidaturas à reeleição de Donald Trump (2020) e Jair Bolsonaro (2022) nos demonstraram que a não exigência de desincompatibilização do cargo traz consigo o risco do uso das Forças Armadas e das Forças Policiais enquanto ferramenta de manipulação eleitoral e intimidação de adversários e opositores políticos, em prejuízo à lisura das eleições e à própria estabilidade democracia.
O caso Bolsonaro é sintomático. Não desconsiderando todo o seu histórico autoritário e de ataques constantes às eleições e às instituições democráticas, inclusive com o uso da máquina pública para assediar opositores políticos e monitorar suas ações,[11] o que presenciamos no período eleitoral de 2022 – no qual ele estava concorrendo à reeleição – foi algo nunca visto no Brasil desde a redemocratização. Contrariando determinação do Tribunal Superior Eleitoral, Bolsonaro se utilizou das forças policiais para impedir o acesso de eleitores às urnas durante as eleições de 2022.[12] Inclusive, a região Nordeste, onde segundo as pesquisas seu adversário possuía a maior parte das intenções de voto, foi a mais afetada, com quase 300 abordagens, o que denota o interesse espúrio que estava por trás das operações.
Para além disso, no início de fevereiro de 2024 foi divulgado o vídeo de uma reunião ministerial ocorrida em julho de 2022, na qual o então Presidente e alguns de seus mais fiéis apoiadores, incluindo Ministros de Estado e representantes das Forças Armadas, estavam planejando um “plano B” caso o resultado das eleições não fosse o esperado. Em um dos trechos do encontro, Bolsonaro ordena que seus ministros atuem para questionar o processo eleitoral e enfatiza que eles precisam “fazer alguma coisa antes” das eleições. O comandante do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o General Augusto Heleno, chega a afirmar que, “se tiver que virar a mesa, é antes das eleições”. Em outro dos trechos, Bolsonaro deu a entender que o resultado das eleições já estava previamente definido, como se houvesse uma grande conspiração para tirá-lo do poder. E, então, diz: “Ninguém quer virar a mesa, ninguém quer dar o golpe. Ninguém quer botar a tropa na rua, fechar isso, fechar aquilo. Mas nós estamos vendo o que está acontecendo. Vamos esperar o quê?”.
A reunião inteira foi marcada por ameaças de golpe previamente às eleições de 2022. Bolsonaro propôs que os presentes participassem da redação de um documento que afirmasse ser impossível “definir a lisura das eleições” e incluísse elementos externos de validação, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Tudo isso para preparar o terreno para o tal “plano B”. Ainda na reunião, Bolsonaro acusa os ministros do Supremo Tribunal Federal de não serem isentos: “Porque os caras tão preparando tudo, pô! Pro Lula ganhar no primeiro turno, na fraude. Vou mostrar como e porquê. Alguém acredita aqui em Fachin, Barroso, Alexandre de Moraes? Alguém acredita? Se acreditar levanta o braço!”. Isso nos demonstra que o compromisso de Bolsonaro com a democracia estava condicionado à sua permanência no poder; permanência essa que ele queria manter a qualquer custo, inclusive com a implementação de um Golpe de Estado.
E aí está o perigo para o qual queremos chamar atenção neste artigo. Um presidente que segue no cargo durante a sua reeleição, mantendo todas as prerrogativas que lhe são inerentes, possui à sua disposição mecanismos e ferramentas que podem ser utilizadas para comprometer a legitimidade das eleições e a própria estabilidade democrática. Por exemplo, ele está em posição para (i) intimidar opositores, (ii) coagir adversários, (iii) impedir o acesso de eleitores às urnas, e claro (iv) a depender do alinhamento ideológico dos representes do alto escalão do Exército, planejar um Golpe de Estado caso o que se avizinha seja uma derrota eleitoral.
Vimos esse roteiro acontecer nas eleições brasileiras de 2022, com a tentativa de Golpe não ocorrendo por mero detalhe, por falta de apoio do Exército. Hoje, olhando em retrospectiva, não há a menor dúvida de que o Brasil vivenciou uma expectativa de Golpe entre o fim das eleições em outubro de 2022 e o ataque às sedes dos Três Poderes em 08.01.2023. E isso foi reconhecido pelo próprio Comandante do Exército à época, General Marco Antônio Freire Gomes, que em recente depoimento à Polícia Federal afirmou que Jair Bolsonaro lhe apresentou um documento que tinha por objetivo declarar estado de sítio no País, seguido por um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).[13]
Com a divulgação do vídeo da reunião ministerial e das várias minutas de Golpe que circularam entre os altos escalões do governo, ficou claro que estava em curso uma investida contra a democracia brasileira, apoiada pelo então Presidente Bolsonaro, seus Ministros e alguns representantes das Forças Armadas – dentre eles, o comandante da Marinha, Almirante Almir Garnier, que colocou suas tropas à disposição do ex-presidente. Novamente: as investigações demonstram que a intenção de Golpe existia e era intensa, e somente não houve uma tentativa por falta de apoio dos Comandantes do Exército e da Aeronáutica.
Isso pode acontecer ainda que seja vedada a reeleição ou, caso permitida, que seja obrigatória a desincompatibilização do presidente? Evidente que sim. Mas o mero fato de o modelo atual facilitar esse tipo de articulação golpista nos parece suficiente para acender um sinal de perigo. Como observa o cientista político Adam Przeworski, para a preservação da democracia é importante que o sistema político esteja estruturado de forma a compelir as forças políticas a agir dentro do quadro institucional mesmo quando insatisfeitas. O sistema precisa oferecer incentivos para que as forças políticas atuem dentro da institucionalidade e desincentivos para evitar que elas atuem fora dele.[14]
O modelo de reeleição vigente no Brasil faz exatamente o contrário disso, e a experiência Bolsonaro demonstrou o risco que enfrentamos ao permitir a permanência de um presidente no cargo durante sua busca pela reeleição. Não podemos generalizar, é verdade; mas, pensando na lógica dos incentivos e desincentivos descrita por Przeworski, o sistema precisa ser desenhado de forma a não conferir aos atores políticos mecanismos que facilitem a atuação fora da institucionalidade. Trata-se, sobretudo, da construção de uma arquitetura político-institucional que seja capaz de coibir, na medida do possível, arroubos autoritários de quem quer que esteja no poder.
Enfim, seja reformando o instituto da reeleição, com a exigência de desincompatibilização do cargo, seja abolindo-o, fato é que precisamos repensá-lo urgentemente. Preservar a democracia não é uma tarefa fácil, mas um primeiro passo para tanto é avaliar o nosso passado recente e aprender com ele, aprimorando as instituições e mecanismos de controle e fiscalização do poder. Definitivamente não podemos ficar refém da boa vontade do Presidente e dos Comandantes das Forças Armadas.
[1] Como afirma José Jairo Gomes, “A reeleição no Poder Executivo não pertence à história do sistema político brasileiro, haja vista que desde a primeira Constituição Republicana, de 1891, esse instituto jamais foi contemplado”. Em GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 159.
[2] Em sua redação original, previa o dispositivo que “São inelegíveis para os mesmos cargos, no período subseqüente, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído nos seis meses anteriores ao pleito”.
[3] BROSSARD, Paulo. A reeleição é um insulto à nação. In.: NERY, Sebastião. A eleição da reeleição: estado por estado. São Paulo: Geração Editorial, 1999, p. 09-10.
[4] O mérito da ADI foi julgado recentemente, em 2020, com a confirmação da medida cautelar concedida em 1998 e o reconhecimento da “[…] constitucionalidade da previsão de reeleição dos Chefes do Executivo para um único mandato subsequente, sem desincompatibilização do cargo, uma vez resguardados os princípios republicano e democrático, bem assim garantida a igualdade na disputa dos cargos e a continuidade administrativa”.
[5] Há certo consenso de que a reeleição privilegia o titular do cargo no processo eleitoral. E isso por inúmeros fatores, como as vantagens informacionais, a propaganda gratuita de seus “feitos” e, claro, maior facilidade na obtenção de financiamentos. Em análise histórica sobre a reeleição entre presidentes norte-americanos, verifica-se que entre 1900 e 2009, 73,7% venceram a reeleição. No caso da América Latina, dos 18 presidentes que concorreram à reeleição entre a década de 1980 e 2013, somente 2 foram derrotados. Entretanto, a taxa depende da modalidade de reeleição: em reeleições consecutivas os titulares do cargo venceram em 90% dos casos; sob eleições indefinidas, em 83%; sob eleições não consecutivas, em 40%.
[6] BERNARDELLI, Paula; SALGADO, Eneida Desiree. A adoção da reeleição para o Poder Executivo no Brasil e suas incoerências com o sistema constitucional e eleitoral. In.: SANTANO, Ana Claudia (org.). Reeleição presidencial nos sistemas políticos das Américas. Curitiba: Íthala, 2015, p. 103-104.
[7] LUCON, Paulo Henrique dos Santos. A importância da propaganda eleitoral na renovação da política nacional e os efeitos da propaganda institucional na reeleição. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, v. 17, n. 33, jan./jul. 2014.
[8] BANHOS, Pedro Paes de Andrade. A reeleição no presidencialismo brasileiro. Dissertação (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2020, p. 127-142.
[9] JUNIOR, Marcus Vinicius Filgueiras. Enfrentando a polêmica da desincompatibilização dos chefes do executivo para a reeleição: a contribuição da hermenêutica jurídica. Revista de Direito Administrativo, v. 229, jul./set. 2022, p. 238. Disponível em <https://periodicos.fgv.br/rda/article/view/46440>. Acesso em 10 mar. 2024.
[10] Aqui, focaremos na figura do presidente, deixando de lado governadores e prefeitos.
[11] O Ministério da Justiça, a pedido do Bolsonaro, elaborou relatórios de inteligência com o fim de monitorar as ações de opositores do governo (o chamado “dossiê antifascista”). Tal medida veio a ser declarada inconstitucional pelo STF. Ver BENITES, Afonso. STF proíbe Governo de monitorar opositores e fecha cerco sobre setor de inteligência de Bolsonaro. El País, ago. 2020. Disponível em <https://brasil.elpais.com/brasil/2020-08-21/stf-proibe-governo-de-monitorar-opositores-e-fecha-cerco-sobre-setor-de-inteligencia-de-bolsonaro.html>. Acesso em 10 mar. 2024.
[12] SCHREIBER, Mariana. O que se sabe sobre as ações da PRF que contrariaram proibição do TSE? BBC, 30 out. 2022. Disponível em<https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63451402>. Acesso em 10 mar. 2024.
[13] LORRAN, Tácio. Veja a íntegra da minuta de golpe que Bolsonaro apresentou às Forças Armadas, segundo ex-comandante. Estadão, 15 mar. 2024. Disponível em <https://www.estadao.com.br/politica/veja-a-integra-de-documento-golpista-de-bolsonaro-que-decretava-estado-de-sitio/>. Acesso em 16 mar. 2024.
[14] PRZEWORSKI, Adam. Crises of democracy. New York: Carmbridge University Press, 2019, p. 150-156.