‘Vacinação nas escolas é o melhor caminho’, diz vice-presidente da SBIm

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A decisão do Ministério da Saúde de alterar a recomendação da vacina de HPV para uma dose pode ter um impacto positivo nas taxas de imunização, afirmou ao JOTA Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). A mudança da estratégia foi anunciada nesta segunda-feira (1/4) pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, após consulta feita à Câmara Técnica de Imunização, da qual Kfouri faz parte.

“Essa é uma ação que deve otimizar os recursos, uma vez que estudos demonstram que desfechos de proteção são muito semelhantes para pessoas que tomam uma, duas ou três doses da vacina”, disse.

Embora a mudança na recomendação possa auxiliar na ampliação das taxas de vacinação, Kfouri está convicto de que os indicadores somente chegarão em patamares considerados bons quando houver uma política estabelecida de vacinação nas escolas. E isso vale não apenas para HPV, mas para sarampo, meningite e dengue.

Ao JOTA, Kfouri afirmou haver expectativas de que uma mudança neste sentido seja concretizada ainda este ano.

A seguir, trechos da entrevista concedida por telefone no fim da manhã desta terça (2/4).

Qual a razão dessa mudança?

Temos muitas evidências de dados para o câncer de colo de útero (que é o principal objetivo da vacinação contra HPV) demonstrando haver poucas diferenças de desfechos em segmentos de meninas e mulheres vacinadas.

Estes resultados levaram à Organização Mundial de Saúde sugerir aos países uma mudança na estratégia. Em vez de vacinar 100 meninos ou 100 meninas com duas doses, usar os recursos para vacinar 200 pessoas. Isso torna a ação mais ágil, reduz a circulação do vírus num período mais curto.

A discussão já vinha há algum tempo. No caso do Brasil, como nunca houve restrição de doses, em virtude de um acordo para a produção no Instituto Butantan, o debate levou mais tempo para ganhar corpo. Mas o fato é que a mudança traz uma redução importante de custos.

Onde a estratégia já foi adotada?

A mudança já foi feita no Reino Unido e na Austrália, com bons resultados. Há uma tendência natural de que outros países sigam o mesmo exemplo. Sobretudo com as evidências demonstrando os bons resultados.

A redução do esquema para apenas uma dose pode incentivar a ampliação da adesão à vacina, que não é alta?

Essa é uma impressão. Em geral, quando você tem esquema reduzido, a adesão é maior. A tendência na aceitação é muito melhor. Também na questão logística há um avanço importante. Porque a organização passa a ser para aplicar uma dose, é metade do trabalho inicialmente existente… A adesão, portanto, pode aumentar, por fatores diretos e indiretos.

Qual é a cobertura atual da vacina de HPV e o que seria considerado ideal?

Em números arredondados, a cobertura vacinal para primeira dose entre meninas está em 75% e, entre meninos, em 50%. No Brasil, para a vacina contra HPV a cobertura vacinal desejada é de 80%.

O que mais seria importante para melhorar os indicadores?

A cobertura de vacinação de adolescentes, seja contra HPV, seja contra outras doenças, só tem um jeito de dar certo: vacinar nas escolas. Não há outro país que tenha tido sucesso na imunização de adolescentes que não tenha utilizado a base escolar. Imagina uma sala de vacinação em um bairro com a meta de vacinar 100 adolescentes. Profissionais ficam ali esperando a agenda do adolescente coincidir com a agenda da família: é preciso acertar o dia em que o responsável terá de faltar ao trabalho, a vontade de sair naquele dia para vacinar, a presença do adolescente… Uma estratégia que demanda toda uma organização. É muito difícil. Se você, por outro lado, leva a vacina na escola é muito mais simples. Em uma tarde é possível vacinar 100 adolescentes.

As pessoas não vão se vacinar, em sua maioria, não é por medo. É porque isso não está na sua prioridade. As pessoas não enxergam o benefício a curto prazo. Por outro lado, se você melhora o acesso e leva essa vacina onde o adolescente está, a recusa será muito baixa. Esse é o caminho, você pode fazer campanha, fazer o que for… Se não levar vacina para escolas, infelizmente a gente não vai conseguir reverter esse quadro

Por que a gente não leva?

Por várias razões. A escola às vezes não está preparada, não quer assumir mais um problema. A equipe de saúde que sai para vacinar nas escolas, por sua vez, pode desfalcar a unidade de saúde — porque em muitos casos não há duas equipes disponíveis… Tem municípios que acabam adotando essa estratégia, mas é preciso uma política nacional. O Ministério da Saúde e o Ministério da Educação atuarem de mãos juntas, estabelecendo normas de vacinação em bases escolares.

Estamos caminhando para isso. Depois de tanto tempo, a gente vem conseguindo que essa conversa se estabeleça entre os ministérios.

Alguma notícia ainda este ano?

É nosso pleito, da sociedade científica junto ao Programa Nacional de Imunizações. Não enxergamos outra solução para vacinar contra meningite, sarampo , HPV e agora, contra a dengue. O calendário do adolescente é repleto de vacinas, mas está subutilizado.

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