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O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a retomada de licitação, promovida pelo Ministério da Saúde, para a aquisição do medicamento Alfaepoetina — indicado para o tratamento de anemia e insuficiência renal. A determinação do ministro afasta uma decisão anterior do Tribunal de Contas da União (TCU). A liminar foi concedida no Mandado de Segurança (MS) 39592.
O TCU havia suspendido o andamento do processo licitatório e permitido a participação de uma empresa concorrente sem registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Em sua análise, Mendonça considerou ”indevida” a ingerência do TCU no âmbito do procedimento licitatório. Para ele, a dispensa de registro junto à Anvisa para fornecimento ordinário de medicação sem que haja uma situação excepcional, como no caso, além de oferecer risco à saúde pública, parece afrontar a legislação sanitária.
”Na aquisição de medicamentos para dispensação ao público prima-se pela proteção da saúde pública, com especial atenção na eficácia, segurança e qualidade dos fármacos comercializados no país. Soa redundante afirmar isso, mas justamente por essa razão que se exige o prévio registro na Anvisa tanto do medicamento como do seu fornecedor”, pontuou Mendonça.
O ministro também ressaltou que a jurisprudência do STF entende que o registro na Anvisa constitui o requisito previsto pelo legislador brasileiro para proteção à saúde pública, atestando a eficácia, segurança e qualidade dos fármacos comercializados no Brasil. Assim, assinalou que é por essa razão que as empresas que participam de processos licitatórios destinados ao fornecimento de medicações no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) necessitam desse registro.
Mendonça enfatizou, ainda, que a exigência desse registro pode ser dispensada em situações excepcionais ”devidamente regulamentadas pelas autoridades da área da saúde”, mas que isso não ocorre no caso concreto. Desse modo, de acordo com o ministro, o TCU inobservou os critérios técnicos da área da saúde, considerando apenas ”o preço razoável praticado no mercado financeiro”.
O MS 39592 foi apresentado pela Blau Farmacêutica S.A. sob o argumento de que a empresa chinesa Nanjing Pharmacare Co. Ltd., representada no Brasil pela Auramedi Farmacêutica Eireli, não possui registro sanitário do medicamento na Anvisa e, por isso, solicitou ao TCU uma medida cautelar para que fosse afastada a exigência do registro no edital, com o objetivo de viabilizar sua participação no ”pregão eletrônico”.
Assim, a Blau Farmacêutica argumentou que a decisão do TCU cria uma hipótese de exceção sanitária não prevista na RDC 203/2017 da Anvisa e afronta o marco legal brasileiro, uma vez que permitiu a participação de licitante sem registro sanitário do medicamento.
Menciona também que houve recurso dessa decisão, mas sem êxito, tendo sido mantida pelo TCU, mediante o Acórdão 121/2024-TCU-Plenário, ”a ilegal suspensão do pregão”.
O JOTA buscou a Auramedi Farmacêutica Eireli, representante da empresa chinesa Nanjing Pharmacare Co. Ltd. no Brasil, mas não conseguiu localizá-la.
Procurada, a Blau Farmacêutica S.A. enviou a seguinte nota:
”A Blau Farmacêutica S.A. informa que, em resposta ao processo licitatório conduzido pelo Ministério da Saúde (Pregão Eletrônico nº 90014/2024) para a aquisição do medicamento Alfaepoetina destinado aos pacientes do SUS, a empresa tomou medidas legais contra o acórdão nº 121/2024-TCU-Plenário que determinou alteração no edital para permitir a cotação do medicamento por fornecedores estrangeiros sem registro sanitário perante a ANVISA.
O Mandado de Segurança 39.592 (DF) perante o Supremo Tribunal Federal foi impetrado considerando uma potencial ofensa ao marco legal e regulatório do sistema sanitário nacional. A tutela de urgência foi concedida pelo STF, suspendendo imediatamente os efeitos do acórdão do TCU e determinando a retomada regular do certame sem a participação de empresas sem registro sanitário perante a ANVISA.
Neste Mandado de Segurança, todas as autoridades técnicas e jurídicas ouvidas (ANVISA, Ministério da Saúde, AGU) foram unanimemente contrárias à possibilidade de oferta e fornecimento de medicamentos desprovidos de Registro Sanitário na ANVISA, por entender que, além de não haver hipótese legal ou regime de excepcionalidade para a entrada de medicamentos desprovidos de Registro Sanitário, tal situação exporia os pacientes do SUS a risco, já que não há comprovação de segurança, qualidade e eficácia atestada pelo órgão sanitário.
Em relação à retomada do processo licitatório de Alfaepoetina ocorrida em 03 de abril corrente, o produto fabricado no Brasil pela Companhia e devidamente registrado na ANVISA foi escolhido por apresentar proposta de preço mais econômica em cada um dos respectivos lotes do certame. Atualmente, o processo encontra-se na fase de avaliação dos documentos de habilitação.
Adicionalmente, a Companhia informa que impetrou Mandado de Segurança perante o Supremo Tribunal Federal, contra acordão do TCU-Plenário que igualmente permitiu a cotação medicamento Imunoglobulina Humana 5g por fornecedores desprovidos de Registro Sanitário na ANVISA, em processo licitatório em andamento no Ministério da Saúde. A Companhia aguarda o julgamento do pedido de tutela de urgência no âmbito de tal processo, a fim de impedir que certames envolvendo a venda do medicamento imunoglobulina contem com a participação de empresas sem registro sanitário na ANVISA.”
Em nota, o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) ressaltou que a decisão do Supremo segue o entendimento da entidade, expresso pelo presidente Nelson Mussolini em artigo no jornal O Globo de fevereiro deste ano.
“[A decisão do TCU] traz prejuízos ao consumidor, estabelece uma concorrência desleal entre empresas e contraria a meta do governo de estimular a produção e a pesquisa de medicamentos no país, induzir investimentos privados e reduzir as vulnerabilidades do SUS. Isso porque permite que empresas estrangeiras sem qualquer representação no Brasil vendam para o país produtos não aprovados e registrados no país, produtos que não foram submetidos às modernas, rigorosas e imprescindíveis regras sanitárias estabelecidas pela Anvisa para proteger a população; as mesmas regras que garantem a segurança, a eficácia e a qualidade de todos os medicamentos e produtos para a saúde consumidos no Brasil”, escreveu na ocasião.
A Sindusfarma também destacou que “ingressou com ação judicial inibitória contra a União Federal, na qual busca obrigar o Ministério da Saúde a cumprir com a legislação sanitária sobre importação de medicamentos sem registros e o cumprimento da Lei de Licitações, em relação à participação de empresas estrangeiras”.