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Enquanto Pablo Marçal adotava postura calma e era chamado de “lobo em pele de cordeiro” por Boulos no debate da quinta-feira (3/10), só bandeiras do candidato do PRTB eram balançadas em frente à sede da Globo em São Paulo. Entre as mais de cem pessoas, um ou outro apoiador que o conheceu por rede social ou que dizia dever a ele uma mudança de vida e mentalidade por meio de cursos. A maioria era de trabalhadores contratados, que nem se davam ao trabalho de escutar o debate por celular. Carros de som, panfletos, adesivos, bandeiras, micro-ônibus, toda uma estrutura bancada por recursos de uma campanha que ganhou corpo com doações e está longe da imagem de uma operação amadora, feita por celular.
A prestação de contas do candidato mostra mais de R$ 7 milhões em receitas, valor que, se está longe dos fundos eleitorais de Boulos (R$ 65 milhões) e Nunes (R$ 44 milhões), é o dobro do que o PSDB enviou para Datena. E, sem os custos do horário eleitoral, essa verba permitiu dar corpo a uma campanha de rua e investir em impulsionamento nas redes (R$ 662 mil já declarados com essa despesa).
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É com essa estrutura profissional que o candidato do PRTB apoiou o crescimento da campanha, baseado primariamente na força de uma mensagem que tomou de assalto os grupos bolsonaristas e colocou em risco a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) e, de quebra, a centralidade digital de Jair Bolsonaro.
Sem empolgar ninguém, o prefeito segurou a onda Marçal com o horário eleitoral, dando destaque a Tarcísio de Freitas e escondendo Bolsonaro antes de ser ignorado pelo ex-presidente. No fim, sob ataque incessante, Nunes se descontrolou nos debates e depois murchou diante das câmeras. Com o fim dos debates e do horário eleitoral, Nunes encara a vantagem de Marçal nas redes às vésperas da eleição e aposta tudo na continuidade de mobilização da ampla rede de candidatos a vereador, de líderes comunitários, subprefeitos e de toda a ramificação de interesses ligados à prefeitura.
Em um empate em que ele está caindo e Marçal subindo, o prefeito parece em desvantagem na disputa da vaga da direita contra Boulos, que aparece como mais seguro da passagem ao segundo turno. Na comparação com Boulos e Marçal, a participação — ou falta dela — em segmentos específicos do eleitorado pesa mais para Nunes.
Os cultos nas igrejas, as caminhadas finais e a fidelidade ou não de seus aliados formais podem fazer a diferença para Nunes, em uma disputa que ajuda a definir papéis no comando de uma direita crescente no país.
À direita
Partidos de direita dominam as disputas nas capitais e principais municípios do país, que serão decisivos nas eleições para governador, deputado federal, senador e presidente da República daqui a dois anos, segundo as pesquisas mais recentes.
O agregador de pesquisas do JOTA revela que o PL, do ex-presidente Bolsonaro, apresenta o maior crescimento de candidatos competitivos, liderando em 16 dos 103 colégios com maior densidade eleitoral. Esses municípios, que podem ter segundo turno, concentram 60,5 milhões de eleitores, ou 38,8% do eleitorado nacional.
O União Brasil aparece bem posicionado para vencer em 15 cidades, seguido pelo PP com 11, Republicanos com oito, e o Novo em um município.
Pelo centro político, o PSD lidera em 14 dos 103 municípios, e o MDB em 11. Já o PSDB está à frente em cinco cidades, Podemos em quatro, e Avante e Cidadania em dois cada. O Solidariedade lidera em um município.
Do lado da esquerda, o PT, partido do presidente Lula, lidera em sete cidades, enquanto o PSB está à frente em quatro, e o PDT em um.
Quem sobe e quem desce nos estados
Nessa disputa em cada estado, muitas vezes a força dos governadores se faz sentir de forma mais decisiva que a do presidente ou de um ex-presidente.
Um dos que mostraram mais capacidade de interferir no rumo das eleições foi Ronaldo Caiado (União), de Goiás. Ele testou vários nomes na pré-campanha de Goiânia e acabou tirando da cartola Sandro Mabel (União), que não figurava nas projeções de nenhum partido. Agora, o ex-deputado se encaminha para o segundo turno, deixando para trás nomes como o senador Vanderlan Cardoso (PSD) e, provavelmente, também o candidato bolsonarista. O embate pela direita com Bolsonaro também se repete em ao menos dez cidades relevantes, como Rio Verde e Aparecida de Goiânia, com vantagem para Caiado.
Em Belém, enquanto o PT manteve o apoio ao prefeito Edmilson Rodrigues (PSOL), que faz uma das gestões mais impopulares das capitais, coube ao governador Helder Barbalho evitar que a sede da COP fique nas mãos de um bolsonarista. O ex-secretário Igor Normando (MDB) deixou para trás o deputado Éder Mauro (PL), que liderou todas as pesquisas até julho. Fortalecido por um índice de aprovação inédito no estado, Barbalho também tenta conter o avanço bolsonarista, com candidaturas competitivas em cidades que votaram no ex-presidente, como Santarém.
Os governadores do Amazonas e Ceará não emplacaram favoritos ainda, mas encaminham candidatos com o perfil do “sistema” para o segundo turno nas capitais. Nos dois casos, os presidentes das Assembleias saíram de um dígito e ultrapassaram adversários para chegarem com grande chance de passar para a rodada final. Em Manaus, Roberto Cidade (União) está tão seguro de que ficará em segundo lugar que nem foi ao debate da Globo, depois que o líder, o prefeito David Almeida (Avante) anunciou que desistira de participar. Em Fortaleza, Evandro Leitão (PT) repete o roteiro do próprio governador Elmano de Freitas, carregado pela máquina estadual do governo Camilo Santana, que agora, como ministro, também está engajado para conquistar para o partido o comando da capital cearense.
Mas nem todos foram tão decisivos.
No Sudeste, só Tarcísio de Freitas pode ainda ter como cantar vitória, se seu apoio inabalável ajudar a segurar Nunes nas duas primeiras posições. Caso contrário, o governador terá um concorrente a herdeiro da direita bolsonarista se impondo contra ele na disputa em que mais se empenhou. Para não se comprometer nas disputas entre os partidos de sua base, em especial PL e PSD, Tarcísio se manteve distante da maior parte das campanhas do interior, em papel coadjuvante muito diferente do adotado pelos governadores nas duas décadas de hegemonia tucana no estado.
No Rio, Claudio Castro foi um peso para Alexandre Ramagem. Delegado, o candidato do PL tentou fazer da segurança a bandeira programática contra o favoritismo de Eduardo Paes (PSD), mas ficou sem resposta convincente nas muitas vezes em que o prefeito apontava que a PM e Polícia Civil estavam subordinadas ao governador. O incômodo foi tanto que Ramagem no fim já não disfarçou: chamou a gestão do governador de “medíocre” no debate final, na Globo.
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema, tentou fazer uma aposta segura: negociou a retirada da candidatura do seu partido e compôs com o líder das pesquisas em BH, Mauro Tramonte (Republicanos). Desde então, Zema manteve-se distante, com apoio regulamentar, e Tramonte só caiu, ao ponto de correr o risco de ficar de fora do segundo turno. No interior, o apoio do governador é mais solicitado, mas em menor grau do que o seu entorno projetava há alguns meses.
No Espírito Santo, Renato Casagrande lavou as mãos em Vitória, alegando haver mais de um nome de sua base, com candidaturas do PT e PSDB, o que ajudou a consolidar o favoritismo do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos). No interior, declarou apoio mesmo em alguns casos de base dividida, mas sem fazer diferença significativa em cidades como Serra e Cariacica.
No Sul, Ratinho Jr. (PSD) montou um cinturão de apoio para eleger Eduardo Pimentel em Curitiba que tem poucos similares: governo do estado, prefeitura, Assembleia, meios de comunicação e entidades empresariais. O empenho levou o atual vice-prefeito de Rafael Greca ao primeiro lugar das pesquisas, mas na última semana tem se mostrado insuficiente para garantir a vitória no primeiro turno. Em Florianópolis, Jorginho Mello (PL), que começou como coadjuvante na campanha à reeleição de Topázio Neto (PSD), tornou-se mais presente ao longo das semanas, o que reforça a chance de migração do prefeito para o PL.
Um caso particular é o do Rio Grande do Sul, em que o governador Eduardo Leite, embora tenha bancado a aliança do PSDB com Juliana Brizola (PDT), esperou até esta sexta para dizer que “torce” por ela. Ele prometeu mais participação no segundo turno, reforçando a mensagem da candidata do PDT, que apela ao voto útil dos apoiadores de Maria do Rosário ao apontar que, pelas pesquisas, é a única com chance de derrotar Sebastião Melo (MDB). Seria uma aliança da antiga terceira via com a esquerda para derrotar um político do centrão local aliado ao bolsonarismo.