PL do mercado de carbono pode ser aprovado ainda em novembro

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Sob expectativa de ser aprovado no Congresso até o fim do ano, o PL 182/2024 que regulamenta o mercado de carbono foi tema de discussão na Casa JOTA, em Brasília, nesta sexta-feira (1/11). O evento “Mercado de carbono como instrumento da transição climática”, patrocinado pelo Itaú, reuniu gestores públicos e especialistas para debater a importância da iniciativa para o país — um dos maiores emissores de gases de efeito estufa no mundo.

Um dia antes, senadores, deputados federais e representantes do governo federal se reuniram na residência oficial do Senado para tentar superar as divergências entre as duas Casas em relação ao texto. O encontro, no entanto, não fortaleceu a expectativa de que o projeto seja aprovado antes da Conferência das Partes, da COP 29, marcada para os dias 11 e 22 de novembro, em Baku, no Azerbaijão. 

Tal possibilidade foi reduzida pelo deputado federal Aliel Machado (PV-PR), relator do PL na Câmara, em razão do tempo “escasso”. Machado disse durante o evento na Casa JOTA, que, para ser aprovado antes da COP, seria necessário que o texto fosse apreciado no Congresso entre segunda e terça-feira, um tempo curto que depende das agendas dos presidentes Rodrigo Pacheco e Arthur Lira e de um acordo entre os parlamentares. 

O parlamentar disse da possibilidade de os líderes pedirem mais tempo para apreciação nos próximos dias, devido à complexidade do assunto. Apesar disso, Aliel Machado afirma que haverá tempo hábil para aprovação durante ou até mesmo em seguida da COP. “Mais importante que a simbologia da COP é a questão prática dos prazos da Europa, do impacto para a indústria brasileira, da necessidade do tempo de regulação e da importância de aprovar no exercício de 2024, ou seja, entrarmos em 2025, ano em que a COP será realizada no Brasil, com o texto aprovado. Ainda há tempo, muito pequeno, muito escasso, mas ainda há. Quando tem vontade política, tem acordo, as coisas acontecem muito rapidamente”, acrescentou.

Cristina Reis: “Se o crédito de carbono for mais interessante economicamente, a gente vislumbra o amadurecimento dos produtores nesse sentido.”
Foto: Rômulo Serpa

Ainda há alguns pontos de divergência, no entanto, entre Câmara e Senado sobre o texto, principalmente entre o mercado voluntário de carbono dos estados, a transferência de lucros com a venda de créditos a comunidades indígenas e a definição do conceito de fruto civil. “Mas nós estamos bem avançados. Nesse momento, conseguimos chegar próximos de um acordo, o que é importante não apenas em relação ao texto que será votado, mas na ajuda para resolver um problema maior que é o procedimental. Então, ficará mais fácil a gente avançar”, disse. Depois de apreciado no Senado, o PL deverá retornar à Câmara por causa das mudanças de mérito no texto.

Especificamente sobre fruto civil, o parlamentar destaca o trabalho da Câmara na construção do conceito. Isso porque o projeto de lei aprovado na Casa define o crédito de carbono como um ativo de natureza de fruto civil. “Não abrimos mão da implementação disso porque garante o direito à propriedade privada. O governo tinha um receio de que o crédito de carbono gerado a partir de soluções que não sejam da natureza fossem prejudicados com isso, mas nós já resolvemos”, contou. 

O deputado ainda acrescentou que uma outra preocupação do governo é que o fruto civil poderia inviabilizar o desenvolvimento de programas jurisdicionais. “Já deixamos uma exceção com o programa jurisdicional. Entendo que ele é importante porque é um mecanismo para arrecadação e cuidado com as nossas florestas e a preservação. Então, estamos [discutindo] alguns detalhes voltados a isso”, completou. O parlamentar ainda frisou que o texto se preocupou em não permitir a venda de “crédito futuro” nos programas jurisdicionais — que têm autorização para venda de crédito de carbono de propriedade alheia.

Nesse caso, o texto afirma que a partir do momento que o proprietário, de uma comunidade indígena, por exemplo, ou quilombola, solicita a retirada da própria área para desenvolver um projeto, apenas um comunicado servirá. “Dito isso, não será possível a venda futura de crédito de carbono, até porque crédito de carbono é resultado obtido. Mas, no texto, ainda tem a possibilidade da promessa de venda futura. Ou seja, não é o crédito em si, mas a promessa”, concluiu. Ainda assim, o parlamentar frisou que o debate está avançado e que os três entes — Câmara, Senado e governo federal — estão próximos a um acordo. Depois de apreciado no Senado, o PL deverá retornar à Câmara por causa das mudanças de mérito no texto.

Além do deputado, participaram do encontro Cristina Reis, subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda; Maria Belen Losada, superintendente de Produtos Carbono no Itaú Unibanco e Juliana Falcão, gerente de Clima e Energia da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Cristina Reis ressaltou a importância do projeto de lei como instrumento para transição climática e transformação ecológica, e afirmou que o mercado de carbono é um dos instrumentos da Contribuição Nacional Determinada (NDC) — um plano de ação climática feito por países para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE). 

Cada país tem uma meta e compromissos específicos, que, juntos, podem manter o aquecimento global abaixo de 1,5ºC. Para Cristina, é importante dar atenção ao mercado regulado, que se comprometerá a reduzir anualmente as emissões até o Brasil se tornar carbono neutro em 2050, e também ao mercado voluntário, que pode gerar um grande incentivo econômico para evitar o desmatamento. 

“E aí conseguimos resolver um problema crucial que é: para o produtor, para os que estão nessa área de arco de desmatamento, a oportunidade de crédito de carbono se torna mais interessante do que, comumente, se costuma praticar, relacionada a abertura de pastagem ou de garimpo”, disse. “Se o crédito de carbono for mais interessante economicamente, a gente vislumbra então cada vez mais o amadurecimento dos produtores nesse sentido e isso passa a ser um negócio importante”, completou Cristina.

“Nesse momento, conseguimos chegar próximos de um acordo, o que é importante não apenas em relação ao texto que será votado, mas na ajuda para resolver um problema maior que é o procedimental”, deputado federal Aliel Machado (PV-PR), relator do PL na Câmara.

A subsecretária também destacou a importância de um órgão gestor para o mercado de carbono. De acordo com Cristina, o melhor cenário seria uma nova agência regulatória para o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que tivesse competência de registro, fiscalização e monitoramento, e com um corpo técnico robusto. 

“Não é trivial esse trabalho. Essa agência reguladora terá que ser muito competente, para garantir a integridade do mercado de carbono, que essa precificação seja bem-feita e não desvalorize nosso mercado por falta de competências regulatórias. É um desafio gigantesco”, frisou. Ela completou que a tendência é que esse órgão gestor esteja atrelado ao Ministério da Fazenda.

Juliana Falcão, gerente de Clima e Energia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), destacou o atraso do Brasil em relação a outros países quando o assunto é precificação de carbono. “Como que a indústria entra nessa? A indústria começou a avaliar outros mercados e entender como se faz um mercado equilibrado, onde você não cria regras tão restritivas, que você vai acabar com a competitividade, e nem tão frouxas que não entrega o que precisa. Todos os elementos dessa discussão constam no PL”, disse. A regulamentação, para ela, no entanto, será chave para isso. “Se não regulamentar de forma a proteger a competitividade, ele pode ser um instrumento de impacto negativo para a indústria”, assegurou.

Já Maria Belen Losada, superintendente de Produtos Carbono no Itaú Unibanco, apontou a importância da aprovação da PL e da regulamentação do texto para as instituições financeiras. O setor financeiro, incluindo os maiores bancos que operam no Brasil, se comprometeram com o Net Zero Banking Alliance — uma iniciativa global que visa combater as mudanças climáticas e alcançar a descarbonização das emissões até 2050. Como o Itaú se propôs a ser um banco da transição climática, eles defendem a regulamentação do mercado de carbono. 

Mercado de Carbono como Instrumento da Transição. Foto: Rômulo Serpa

“Podemos apoiar nossos clientes, financiar a transição, mas não podemos forçar a transição climática. Precisamos de uma regulamentação, de um preço do carbono para que o cliente se mexa organicamente e o banco acompanhe”, explicou. Ela ainda ressaltou ser importante esperar a negociação das emissões e as consequências da regulamentação. 

“Nessa negociação ainda existe toda uma série de instrumentos financeiros de cobertura para as companhias que os bancos precisam desenvolver. Quanto antes tivermos clareza do mercado, mais rápido vamos conseguir trabalhar, fazer nosso papel, tanto no financiamento da transição quanto na negociação e cobertura desses riscos para as companhias”, concluiu.

 Mercado de carbono

O mercado de carbono é um sistema que tem como objetivo diminuir a poluição por gases de efeito estufa (GEEs), e que funciona no princípio cap-and-trade. Ou seja, o mercado estabelece um teto para as emissões desses gases, e as empresas que cumprirem as metas de redução de poluentes podem vender esses créditos de carbono excedentes para aqueles que não atingiram, como títulos de compensação. A iniciativa é considerada uma das alternativas para compensar as emissões de gás, já que são eles os responsáveis pelo aquecimento do planeta. Hoje, o mercado de carbono funciona de maneira voluntária, mas o texto do PL 2.148/2015 no Senado Federal quer regulamentar a iniciativa no Brasil.

O texto está sendo analisado atualmente pelos senadores. A senadora Leila Barros (PDT-DF), que será a relatora na Casa, escreveu pelo X (antigo Twitter) nesta quinta-feira (31/10) que os parlamentares estão “perto de um acordo importante” para aprovação do Mercado de Créditos de Carbono. “Em reunião com o presidente do Senado, senadores, ministros do governo e o relator do projeto na Câmara, avançamos para o consenso necessário à votação nos próximos dias. Estamos muito perto do acerto final.”

Assista ao evento na íntegra

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