PGR diz que cabe à Justiça Comum iniciar julgamento sobre vínculo em contratos de franquia

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A Procuradoria-Geral da República (PGR) concordou com o partido Novo na ação em que requer que a Justiça Comum — salvo cláusula arbitral — seja considerada o foro competente para processar e julgar demandas em que se alegue fraude, alguma irregularidade trabalhista ou outros vícios em contratos de franquia. Desta forma, apenas se a Justiça Comum considerar inválido o contrato é que seria possível discutir o vínculo empregatício na Justiça do Trabalho. O caso tramita como ADPF 1.149. A ministra Cármen Lúcia é a relatora. 

“Seguindo a evolução jurisprudencial da Corte, conclui-se competir à Justiça Comum decidir sobre a existência, a validade e a eficácia de pactuações de natureza cível de contratos comerciais de franquia, o que não obsta que, identificada a nulidade do contrato, os autos sejam remetidos à Justiça do Trabalho para decidir sobre eventuais consequências na esfera trabalhista”, afirma o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, que menciona os julgados na RCL 62.353 e RCL 69.376, por turmas diferente do STF.

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A ação foi ajuizada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Novo em maio. O partido requer que seja determinado, em caráter liminar, aos órgãos jurisdicionais de todas as instâncias da Justiça do Trabalho a necessidade de se abster de proferir decisões quando se discuta a validade do contrato de franquia. Caso a liminar não seja concedida, os advogados do Novo pedem ao menos que sejam suspensos todos os processos que discutam o reconhecimento de vínculo empregatício, nos casos em que as partes tenham celebrado prévio contrato de franquia.

A maioria dos ministros do STF têm decidido neste sentido em reclamações constitucionais que passaram a chegar em maior volume no STF desde meados do ano passado, mas ainda não houve um julgamento mais amplo da Corte sobre o tema, numa ação de controle concentrado de constitucionalidade, como a ajuizada agora, por exemplo.

AGU e tribunais regionais

A Advocacia-Geral da União (AGU) teve outro entendimento sobre o caso em parecer de junho deste ano. O advogado-geral da União, Jorge Messias, foi contrário à ação pela forma. Entendeu não existir uma ofensa direta à Constituição Federal e, o que não atende aos critérios para ser julgado em um tribunal superior. Para Messias, o autor da ação “pretende furtar-se dos recursos trabalhistas, os quais são dotados, via de regra, de efeito meramente devolutivo, bem como das demais medidas processuais ordinárias acessíveis às partes interessadas”

No mérito, contudo, Messias concordou parcialmente com o pedido da ação para que seja deferida medida cautelar com o objetivo de reconhecer que “a validade dos contratos de franquia só poderá ser afastada pela Justiça Trabalhista em situações nas quais esteja demonstrada, a partir de elementos concretos, a ocorrência de fraude à legislação trabalhista, não sendo possível presumir a ocorrência desse vício apenas pela forma ou estrutura do contrato de franquia”.

“Não se trata de afastar por completo a competência ampla da Justiça do
Trabalho (definida nos termos do artigo 114, inciso I, da CF) para julgar relações de trabalho e para conhecer de pretensões de reconhecimento de vínculo empregatício, mas apenas de estabelecer a necessidade de que a intervenção dessa instância judiciária exige a comprovação de ocorrência de fraude à legislação trabalhista, que não pode ser pressuposta apenas com fundamento no tipo de contrato avaliado (franquia)”, escreveu a AGU.

A relatora da ADPF 1.149, ministra Cármen Lúcia, solicitou aos tribunais regionais pareceres sobre processos em que franqueados buscam o reconhecimento de vínculo de emprego com a empresa. 

O Tribunal Regional Trabalhista (TRT) da 10ª Região, onde tramitam 11 processos sobre o tema, afirmou que os julgados reconhecem a existência de um vínculo empregatício. Mesmo os contratos sendo de franquia, foram observadas as características de emprego do vínculo, que justificaria a competência da Justiça do Trabalho.

Já o TRT da 2ª Região, por sua vez, declarou que, apesar de o Novo alegar que os contratos de franquia representam legítimas atividades empresariais, os casos analisados pela Corte mostraram um quadro diferente. 

Ação do Novo

O Partido Novo, argumenta que, embora tenham ocorrido decisões favoráveis aos franqueadores em reclamações constitucionais recentes propostas no STF contra decisões judiciais que reconheceram a competência da Justiça do Trabalho e declararam indevidamente o vínculo empregatício com ex-franqueados, as decisões não possuem efeito vinculante. “O impacto sistêmico foi prejudicial tanto para o setor de franquias quanto para a economia em geral”, dizem os advogados  Eduardo Antônio Lucho Ferrão, Luciano Benetti Timm, Luiz Felipe Bulus e Lucas Rabêlo Campos.

Ao defender a competência da Justiça Comum para julgar os processos que requerem a configuração de vínculo empregatício quando há contratos de franquia, o partido afirma que os magistrados da Justiça Estadual ou árbitros são “experientes em disputas envolvendo franquias e contratos comerciais diversos” e “certamente teriam maior familiaridade e facilidade para analisar os contratos de franquia, inclusive para decidir sobre sua validade e eficácia, o que diminuiria as chances de sucesso de demandas temerárias.”

Por outro lado, afirmam que a escolha de ex-franqueados pela Justiça do Trabalho “para propor essas demandas se deu com o intuito de aproveitar-se da parcialidade sistêmica da Justiça trabalhista, em nítida afronta ao preceito do juiz natural”.  

Em 60 casos, elencados no processo, em que os magistrados trabalhistas verificaram haver vínculo empregatício apesar da existência do contrato de franquia, o partido sustenta que não houve “análise ao atendimento à lei de franquia pelos contratos e pela relação vivenciada pelos contratantes. A Justiça Trabalhista, amparando-se em interpretação inconstitucional do princípio da primazia da realidade, passa direto à uma análise tendenciosa acerca dos requisitos estabelecidos na CLT como aptos a configurar a relação empregatícia”. O cenário, afirmam, é de “completa insegurança jurídica”.

De acordo com a petição do Partido Novo, a competência da Justiça Trabalhista, especializada, foi estabelecida pelo que preceitua o art. 114 da Constituição Federal e nesse dispositivo não há previsão para a resolução de controvérsias relacionadas ao Direito Empresarial. Desta forma, “ainda que as reclamações trabalhistas incluam pedido de reconhecimento de vínculo empregatício, a pretensão do ex-franqueado continua condicionada à declaração de nulidade da relação empresarial decorrente da Lei de Franquias”.

Não se ignora a possibilidade de o Poder Judiciário considerar que certos contratos foram inexistentes, ou que são inválidos, ou mesmo que não podem produzir efeitos, dizem os advogados. Mas eles defendem que essa avaliação deve ser feita anteriormente na Justiça comum, por juízes especializados em temas cíveis e mercantis, já que essa foi a opção do legislador.

Precedentes

Na ação é mencionado que o caso é análogo à ADC 48, na qual o STF firmou tese no sentido de que “uma vez preenchidos os requisitos dispostos na Lei 11.442/2007 [que regula o transporte rodoviário de cargas por terceiros e mediante remuneração], estará configurada a relação comercial de natureza civil e afastada a configuração de vínculo trabalhista”.

Os advogados também consideram que o pedido se relaciona com a razão de decidir do RE 606.003 (Tema 550 da repercussão geral), sobre contratos de representação comercial, no qual foi fixado a tese de que “preenchidos os requisitos dispostos na Lei 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes”.

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