Quatro formas de inovar no ecossistema jurídico

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“A simplicidade é o último grau de sofisticação”. A frase, atribuída ao gênio Leonardo da Vinci e talvez um dos homens mais inovadores da história da humanidade, não poderia ser mais verdadeira. Engana-se quem pensa que o pintor renascentista somente é famoso pela Mona Lisa. Ao enaltecer a simplicidade e buscar métodos eficientes sem grandes complexidades, o inventor é responsável por inúmeras criações.

O número de seus inventos é incerto, uma vez que naquela época não havia um controle preciso do produto da criatividade das pessoas. O período de 1452 a 1519 é marcado por uma Itália ainda não unificada – o registro era por cidade, no caso, Florença. O país italiano que conhecemos hoje era formado por pequenos reinos, vilarejos e cidades-estados independentes, cada qual com o seu próprio soberano. Existiam moeda e até leis diferentes.

Registrar algo naquela época era algo incomum, mas inúmeros estudos entram em consenso que é de Da Vinci[1] a previsão do surgimento de robôs, dos grandes centros urbanos, do helicóptero, do paraquedas, da roupa de mergulho, por exemplo.

Hoje, um pouco mais de 500 anos após sua morte, observamos uma verdadeira corrida no ambiente de inovação. Seja na inteligência artificial, mundo cripto ou na corrida para desbravar o espaço ou conquistar os céus com drones, a cabeça está nas nuvens, mas os pés estão no chão – quem conseguir mais espaço, pode vencer a corrida em área de atuação. No mundo jurídico não é diferente.

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A partir de uma matriz[2] com 4 formas de inovar desenvolvida pelo Piero Franceschi, surge a ideia de adaptá-la para o mundo jurídico. Essa matriz denota que, toda vez que uma discussão relacionada ao tema de inovação, na maioria dos clientes há a percepção que o conceito de que inovar é criar novos produtos. No mundo jurídico não poderia ser diferente, tem até quem diga que para inovar, a tecnologia é essencial – quando na verdade, são conceitos que ocorrem em paralelo.

Pensando nisso, adaptamos a matriz para tentar separar as 4 formas centrais que uma inovação pode apresentar. Inovação estruturada[3], estimulada por um processo criativo e que necessariamente seja originada de mentes criativas, sem amarras ao passado e capazes de unir experiências e olhares diversos para enfrentar, com coragem, problemas nunca antes vistos.

Reforçamos que a matriz abaixo não é um modelo definitivo ou perfeito. A ideia é apenas estimular o pensamento crítico, abrindo assim a cabeça para novas possibilidades ou formas de pensar. Enfim, apresentamos a imagem:

Modelo originalmente idealizado por Piero Franceschi e adaptado para a esfera jurídica por estes autores
Modelo originalmente idealizado por Piero Franceschi e adaptado para a esfera jurídica por estes autores

Perceba que a matriz possui dois eixos centrais. O eixo da orientação, na vertical representada pelo Y, revela o verdadeiro ambiente central em que a inovação ocorre. A inovação se dará para dentro ou para fora do jurídico? Abaixo, algumas ideias interessantes que guardam compatibilidade com a maturidade ou com a necessidade atual do jurídico:

  • Para dentro: mentalidade de mapeamento de processos internos para identificar a necessidade de agregação de dados, automação, sistemas inteligentes de acompanhamento de processos judiciais, jurimetria, formulação de novas formas de provisionamento, AI para atuar em conjunto com CLM e fluxo de cadastro, entre outros.
  • Para fora: uso de legaltechs que possam suportar a organização e todo o ecossistema que se relaciona com elas, como utilização de LLMs, inteligência artificial em chatbots, gamificação de treinamentos, sistemas de consultoria, Legal Design e Visual Law, e mais.

O eixo da intenção, na horizontal representada pelo X, indica o objetivo central da inovação, que é o de buscar a tão sonhada eficiência operacional ou uma desejada transformação estratégica. É o “fazer mais com menos” ou demonstração óbvia de utilidade, destravando mercados e possibilidades que antes nunca se imaginava (ou necessidades que não sabíamos que se tinha). Esse entendimento acaba, por consequência, gerar então as 4 formas da inovação:

  1. Inovação de estrutura: a inovação estrutural pode ser um design inovador, um sistema tecnológico novo ou disruptivo e até mesmo um processo interno mais ágil e eficiente. De novo, perceba que não há a necessidade de ter tecnologia – a simples revisão de um processo para torná-lo mais eficiente é uma atitude de inovação estrutural;
  2. Inovação na cultura: a inovação cultural versa necessariamente pela gestão da mudança e a forma de afeiçoar a mentalidade das pessoas. É o despertar do comportamento criativo[4], culminando em uma nova política de alinhamento ao longo prazo, processo na formação de jovens profissionais jurídicos ou uma nova forma de atrair talentos para a sustentabilidade da operação;
  3. Inovação na cadeia: a inovação de forma encadeada certamente resulta em uma nova forma de se relacionar com escritórios de advocacia, legaltechs e consultorias (além de eventuais outros provedores de serviço). Historicamente, falando de serviços de advocacia, já se sabe que os modelos tradicionais de remuneração não funcionam mais como antes. Muitos inovam ao testar com provas de conceito em parceria com startups jurídicas a fim de testar novos produtos ou serviço; e
  4. Inovação de valor: a inovação valorizada pode ser definida como um novo produto ou serviço ou um novo modelo de negócio que coloque o jurídico não mais como um Legal Business Partner, mas sim um verdadeiro Legal Business Leader, liderando novas frentes e protagonizando verdadeiros projetos em benefício de toda a organização, não importa a área. Aqui está incluída a participação do jurídico como líder de squads multidisciplinares e seu assento em fóruns de tomada de decisão ou em Business Continuity Plan (BCP).

Entendemos que os quatro tipos de inovação dissertados acima estão altamente interconectados e, é claro, totalmente interdependentes. É uma verdadeira obra paradoxal. Convidamos os leitores a refletir sobre essa possibilidade para o mundo jurídico de modo que se tenha uma visão mais holística na identificação de oportunidades não tão exploradas quanto se deveria.

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Podemos começar a introduzir o conceito de Operações Exponenciais[5] – no mesmo sentido do conceito de Organizações Exponenciais. É válido, inclusive, questionar a intenção, a intencionalidade e o legítimo interesse do que se está fazendo nesse momento. Para onde você está indo? E por quê? Não espere uma resposta complexa nesta última pergunta – aliás, até agradeça se a resposta for simples.

Steve Jobs parece concordar com Da Vinci. Para atingir esse esperado grau de sofisticação, é necessário trabalho duro. A seguinte citação é atribuída a ele: “(…) Foco e simplicidade. O simples pode ser mais difícil do que o complexo: é preciso trabalhar duro para limpar seus pensamentos de forma a torná-los simples. Mas no final vale a pena, porque, quando chegamos lá, podemos mover montanhas.” E como pavimentar o caminho rumo à simplificação? Como ter foco?

Para focar, é necessário fazer boas escolhas. E para fazer boas escolhas, é importante que se tenha experiência. É aqui que começa: não se tem experiência sem fazer escolhas ruins. Para cada escolha, uma renúncia. Não podemos esquecer que quando um caminho é escolhido, outro é deixado de lado. Essa é a vida e ela acontece quando resolvemos tomar decisões corajosas. Ninguém inova ou dá o pontapé inicial no exercício criativo com receio ou medo de errar. Se houver uma trava, mude apenas uma variável. E teste!

E nesses testes, é possível equilibrar eficiência com inovação? Não temos dúvidas e esse conceito tem até um nome: ambidestria organizacional[6]. Ela ocorre quando se mistura o excesso de futuro e o pragmatismo do presente. A ambidestria garante eficiência operacional ao mesmo tempo em que a organização se aventura na inovação. É o famoso sonhar com os pés no chão, já comentado neste artigo.

Suas decisões podem ser baseadas em medo, ou ainda, no que todo mundo está fazendo. Inovação precisa ter um propósito e ser estruturada. Inovação não está necessariamente ligada à tecnologia. O destino – e sobretudo o resultado – dependerá das suas escolhas e das suas decisões. Você é encorajado o suficiente para ser o protagonista dessas ações?


[1] “Leonardo Da Vinci 500 anos: as 9 melhores invenções do gênio renascentista”, disponível em <https://www.tecmundo.com.br/ciencia/140890-leonardo-vinci-500-anos-9-melhores-invencoes-genio-renascentista.htm>. Acesso em 18/10/2024.

[2] “As 4 formas de uma Inovação”, imagem do perfil @pierofranceschi em collab com o perfil @startse, postado no Instagram em 19/04/2024, disponível em <https://www.instagram.com/p/C58nd-wrsmT/>. Acesso em 18/10/2024.

[3] O mais importante não é a chegada, mas o caminho e a maneira como a gente o percorre. Recomendamos a leitura de “Inovação é processo”, disponível em <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/inovacao-e-processo>. Acesso em 18/10/2024.

[4] A transformação jurídica que o ambiente de negócios requer só começa a partir de um comportamento criativo. Recomendamos a leitura de “Criatividade é comportamento”, artigo disponível no JOTA <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/criatividade-e-comportamento>. Acesso em 18/10/2024.

[5] Referência à obra Jurídico 5.0 e Operações Exponenciais.

[6] “Ambidestria organizacional: a chave do sucesso para a sua empresa” é um texto original publicado por Ana Julia Guimarães em 20/12/2022, disponível em <https://www.startse.com/artigos/ambidestria-organizacional>. Acesso em 18/10/2024.

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