A indevida ampliação do fato gerador do IBS e da CBS trazida pelo projeto de regulamentação

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Ao que parece, o projeto de lei complementar (PLP) 68/2024 que regulamenta o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) voltará a tramitar no Senado, após a definição de um plano de trabalho proposto pelo relator, senador Eduardo Braga. Há muitas questões controvertidas no projeto aprovado pela Câmara dos Deputados, e as audiências públicas adicionais propostas no Senado poderão contribuir para o aperfeiçoamento da regulamentação do IBS e CBS.

De fato, um dos pontos que tem chamado muita atenção no projeto submetido pelo Executivo e aprovado pela Câmara dos Deputados está na previsão de incidência de IBS e CBS sobre uma série de operações que não guardam qualquer relação com as hipóteses de incidência trazidas pela emenda constitucional 132/2023 para esses tributos (o novo art. 156-A da Constituição Federal).

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Refiro-me especificamente, nesse caso, à possibilidade de se cobrar IBS e CBS sobre os benefícios concedidos pelas empresas aos seus colaboradores, como moradia, transporte, alimentação, instrumentos e meios de comunicação, serviços de saúde e de educação (art. 5º, I, alínea “c” combinada com o art. 39, § 1º, I a VII, do PLP 68/2024), notadamente os chamados fringe benefits.

Ora, o dever de pagar tributo surge com a ocorrência do fato gerador. Em outras palavras, é nesse momento que se instaura a relação jurídica tributária entre aquele que realizou o fato gerador (o contribuinte) e o ente tributante, tendo por objeto o pagamento do tributo.

Pode-se dizer, com isso, que o fator gerador do tributo constitui o elemento central dessa nova relação jurídica e, como esta possui natureza pecuniária (o dever de pagar tributo), é evidente que as hipóteses de incidência previstas na legislação deverão denotar, em um primeiro momento, conteúdo econômico para aquele que as realizou (o contribuinte).

Mais que isso: o conteúdo econômico da relação jurídica subjacente ao nascimento da obrigação tributária há de ser de tal grandeza que configure efetiva capacidade contributiva do contribuinte, isto é, que seja suficiente para viabilizar o pagamento do tributo no montante apurado a partir de critérios legais, sem que isto o coloque em situação econômica pior àquela que possuía antes de sua ocorrência.

Daí porque se tem, em matéria tributária, dois princípios constitucionais fundamentais a nortear a relação jurídica que se instaura entre o contribuinte e o ente tributante: de um lado, o princípio da capacidade contributiva (art. 145, § 1º) e, de outro o princípio do não confisco (art. 150, IV).

O princípio da capacidade contributiva, é bom que se diga, não se refere apenas à devida mensuração do tributo em razão do potencial econômico do contribuinte. Em sua acepção mínima, como visto acima, ele representa também a garantia de que não há como se ter incidência tributária sem que o fato gerador contenha conteúdo econômico para o contribuinte, ou seja, que represente ou lhe gere algum tipo de riqueza.

Assim, se estamos diante de tributos que incidem sobre “operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou com serviços” (art. 156-A, § 1º, inc. I, da Constituição Federal), é certo que o desempenho dessas operações deverá gerar riqueza (proveito econômico) para aquele que as realizam, sob pena de onerar (tributar) qualquer outra coisa que não a hipótese legalmente considerada para instaurar a obrigação tributária.

É exatamente esse o caso dos fringe benefits concedidos pelas empresas a seus colaboradores, cujo texto atual da PLP 68/2024 pretende tributar por IBS e CBS.

As empresas oferecem esses benefícios aos seus colaboradores em razão da relação de emprego existente entre eles. A atividade econômica desempenhada pelas empresas não é fornecer planos de saúde, equipamentos de telecomunicação, alimentação, nem locação de imóveis. Consequentemente, é notório que essas operações não constituem fato gerador de IBS e CBS, nos termos estabelecidos pelo art. 156-A, § 1º, I, da Constituição Federal.

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Vale dizer, pois, que essas empresas serão contribuintes do IBS e da CBS no exercício de sua atividade empresarial se fornecerem bens (materiais ou imateriais ou direitos) ou serviços aos seus clientes. Entretanto, o fornecimento de moradia, planos de saúde, alimentação e equipamentos de telecomunicação aos seus colaboradores pode até trazer reflexos pecuniários à relação trabalhista existente entre as partes, mas jamais poderá estar na alça de mira do IBS e da CBS.

Consequentemente, não temos como deixar de apontar que, se aprovado com a redação que lhe deu a Câmara dos Deputados, a incidência de IBS e CBS prevista no art. 5º, I, c/c art. 39, § 1º, I a VII, do PLP 68/2024, sobre a concessão de fringe benefits pelo empregador aos seus colaboradores poderá ser questionada judicialmente pelos contribuintes, frustrando desde logo um dos fins principais da reforma tributária, particularmente o de evitar judicialização e trazer segurança jurídica.

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