Será que realmente precisamos de uma nova lei de seguros?

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Após 20 anos de tramitação, o Brasil terá uma lei dedicada aos contratos de seguros, que depende apenas da sanção presidencial. Mas a pergunta que fica é se, de fato, o arcabouço legislativo e regulatório existente até o momento era insuficiente para regular um mercado que é essencial para o desenvolvimento do país. Ao longo dos últimos anos, vimos o órgão regulador ativo, editando resoluções modernas e adequadas ao princípio da liberdade econômica, permitindo uma maior flexibilização e autonomia nos contratos de seguros em geral e, em especial, os de grandes riscos. Para o consumidor em geral, a leis protetivas sempre se mostraram suficientes para regular esse tipo de relação, não parecendo ser necessária meras repetições legislativas.

O novo marco legal de seguros, nesse ponto, equipara contratos securitários de natureza e complexidades com diferenças abissais, como se fossem a mesma coisa, assegurando sempre a interpretação mais favorável ao segurado, ainda que se trate de contratos complexos e de grandes riscos. Outro exemplo é a flexibilização do dever de informação do segurado, atribuindo um ônus excessivo à seguradora no conhecimento do risco, mesmo em casos complexos nos quais, por razões óbvias, é o segurado que detém o conhecimento completo do risco que será subscrito.

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Sob o ponto de vista da regulação do sinistro em si, a nova lei simplesmente atribui ônus processuais à seguradora que vão de encontro ao entendimento da jurisprudência. De um lado, a seguradora agora ficará obrigada a compartilhar todos os documentos produzidos e obtidos durante a regulação ao segurado, sendo que o entendimento mais recente da jurisprudência era no sentido de que a exibição desses documentos ocasiona desequilíbrio concorrencial e custos administrativos exclusivos para a seguradora. De outro lado, haverá também uma vinculação da seguradora, na fase judicial, aos argumentos usados na regulação administrativa do sinistro. Sem  adentrar no mérito de eventual inconstitucionalidade dessa obrigação, não se mostra razoável impor esse ônus apenas à seguradora, sob pena de violação à paridade de tratamento das partes em um processo judicial.

Na mesma linha, ao modificar a forma de contagem dos prazos prescricionais, o novo marco legal de seguros não só altera o que já vinha sendo aplicado pelos Tribunais, mas também abre um flanco de discussões quanto ao provisionamento de eventuais passivos pelas seguradoras. Enquanto a regra atual vigente estabelecia que o prazo de prescrição para requerer o pagamento de indenização securitária nascia com a ocorrência do sinistro, o novo marco legal prevê que o início desse prazo somente ocorrerá com a recusa expressa e motivada da seguradora. Com isso, é possível que sinistros venham a ser avisados após o prazo de um ano da sua ocorrência, criando, além de insegurança jurídica — a função principal do instituto da prescrição — um cenário de incerteza quanto ao prazo de provisionamento pelas companhias seguradoras.

Em matéria de solução de controvérsias, a nova lei estabelece que, em casos de disputas decorrentes dos contratos de seguro sujeitos a essa lei, a resolução de litígios por meios alternativos deverá será feita no Brasil e submetida às regras do Direito brasileiro, o que vai na contramão do direito de livre escolha das partes em caso de uso, por exemplo, da arbitragem.

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Por fim, a lei ainda dedica um capítulo ao resseguro, com mecanismos automáticos de aceitação de risco que inexistem na prática deste mercado, gerando ainda potenciais inconsistências em decorrência da de sua coexistência com a lei complementar 126/2007.

Dessas breves notas, o que se conclui é que o novo marco legal de seguros já gera, no seu nascimento, discussões relevantes a respeito da necessidade e atualidade do regramento. É certo que o órgão regulador terá trabalho intenso durante a vacatio para (des)atualizar os seus normativos, assim como os advogados e o Judiciário enfrentarão novos desafios na aplicação da lei.

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