No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Motoristas por aplicativo não são empregados das plataformas em nenhum país

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Ao convocar audiência pública no Supremo Tribunal Federal para discutir a relação jurídica entre “motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa administradora de plataforma digital”, o ministro Edson Fachin, relator do tema de repercussão geral, formulou 12 perguntas para nortear a discussão no próximo dia 9 de dezembro.

É importante ressaltar que o tema tem movimentado o debate regulatório e jurídico em todo o mundo nos últimos anos. Dentre as questões formuladas pelo ministro Fachin, duas buscam avaliar como o assunto vem sendo tratado em outros países.

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A experiência internacional mostra claramente que, nos mais de 70 países de atuação dos maiores aplicativos, em que pese diferentes estágios regulatórios e as especificidades dos respectivos sistemas jurídicos, em nenhum lugar os motoristas parceiros são empregados das plataformas, independentemente do modelo de operação.

Como sempre temos defendido, o debate aqui no Brasil precisa sempre ser subsidiado por informações precisas, e as principais plataformas em operação no país, por meio de sua entidade representativa, pautaram-se sempre pela qualificação das discussões.

Reino Unido

Em fevereiro de 2021, a Suprema Corte decidiu que um grupo de motoristas que dirigiam com o app da Uber em Londres deveriam ser classificados como “workers”, definição específica da legislação britânica. Os profissionais nessa categoria não são empregados, podem trabalhar com flexibilidade (inclusive permanecem autônomos para fins tributários), mas têm acesso a certas proteções, como salário mínimo por hora e plano previdenciário.

No mês seguinte à decisão, quando ficou claro que a corte definiu que a hora de trabalho deveria ser calculada a partir do aceite de uma corrida até o destino, a Uber anunciou que não recorreria da sentença e estendeu as proteções da categoria para todos os motoristas parceiros do país.

Estados Unidos

No sistema americano, cada estado tem grande autonomia para fins trabalhistas, e embora na maioria deles a própria legislação estadual classifique os motoristas de aplicativos como autônomos, as particularidades dessa definição variam de local para local.

A Califórnia, por exemplo, realizou um plebiscito popular (Prop 22) em 2020 aprovado por 59% dos eleitores que classificou os motoristas e entregadores como trabalhadores independentes e concedeu direitos como piso de ganhos mínimos e plano de saúde proporcional.

Em 2022 o estado de Washington aprovou a lei HB 2076 que preserva a autonomia dos motoristas e confere novos benefícios, como ganhos mínimos e seguro para acidentes. Já em Nova York, foi estabelecido acordo com a Procuradoria-Geral em 2023 que garantiu aos motoristas manter a flexibilidade de trabalhadores independentes ao mesmo tempo que criou novos benefícios, como licença remunerada em caso de adoecimento e revisão para desativações.

França

Com as modernizações na legislação trabalhista decorrentes da Lei 2016-1088, em 2021 o governo francês instalou a ARPE (Autoridade de Relações Sociais das Plataformas de Trabalho), entidade pública responsável pelo gerenciamento do diálogo social entre plataformas e motoristas/entregadores, com o objetivo de manter a atividade como trabalho independente e ao mesmo tempo proporcionar mecanismo de representação em busca de melhores condições aos trabalhadores. A negociação é feita por entidades eleitas nacionalmente em turno único.

Entre os avanços já obtidos pelo sistema francês estão acordos de ganhos mínimos por corrida e regras de transparência para desativações. Na esfera judicial, embora o debate ainda não tenha se esgotado, decisões recentes proferidas pela Corte de Apelações de Paris têm confirmado a natureza independente do trabalho por plataformas: em maio de 2023, por exemplo, foi negada a existência de um contrato de emprego devido à liberdade do motorista em escolher quando e quanto trabalhar; já em setembro de 2023, decisão no mesmo sentido declarou a “total liberdade de um entregador no que diz respeito à possibilidade de trabalhar ou não, sem qualquer tipo de controle por parte da empresa Uber”.

Chile

O Congresso Nacional chileno aprovou em 2022 a Lei 21.431, que incorporou motoristas de aplicativo ao sistema de saúde e seguridade social, o que concede acesso a benefícios como aposentadoria, seguro para acidentes e ganhos mínimos.

A lei também estabelece requisitos para as plataformas, como oferecimento de capacitação e cobertura de seguro, deixando claro que o cumprimento das obrigações “não constituirá um indício de subordinação e dependência para os trabalhadores independentes de plataformas digitais”. Uma norma complementar (Lei 21.553) aprovada em 2023, que estabeleceu as regras de funcionamento do serviço de transporte remunerado de passageiros, ainda está pendente de regulamentação pelo Ministério dos Transportes.

Austrália

O Parlamento australiano aprovou em 2024 uma legislação que define que os trabalhadores por plataforma não são empregados e concede à Comissão de Trabalho Justo (um tribunal independente de relações de trabalho) o poder de estabelecer ordens de padrões mínimos obrigatórios para esses trabalhadores em diversos assuntos, como remuneração, tempo de trabalho, representação coletiva, seguro, entre outros.

Portugal

O serviço de corridas por aplicativo, chamado de TVDE (transporte em veículo descaracterizado a partir de plataforma eletrônica), foi regulamentado pela Lei 45/2018, que definiu as regras e condições da relação entre as três entidades que compõem a atividade: motoristas, operadores e plataformas.

A lei incorporou os requisitos de presunção de contrato de trabalho do Código do Trabalho português, mas manteve a opção do trabalhador ser “motorista independente”. Em 2023, foi aprovada alteração na legislação trabalhista que deu início à disputas judiciais no setor de delivery – desde então a maioria das decisões dos Tribunais do Trabalho do país têm rejeitado reconhecer entregadores como empregados e juízes criticam a abertura de processos por serem “totalmente infundados”.

União Europeia

Após dois anos de discussões, a União Europeia conseguiu acordo para aprovar uma Diretiva sobre trabalho em plataformas que passará a ter efeitos em dezembro de 2026, data-limite para os 27 países incorporarem as disposições em sua legislação nacional.

A Diretiva 2024/2831 manteve uma presunção legal de vínculo empregatício caso exista controle da plataforma sobre o trabalhador, mas o texto final abandonou o objetivo inicial de estabelecer uma lista de critérios válida para todo o bloco, deixando para cada país estabelecer seus próprios critérios no processo de implementação. Dessa forma, a Diretiva manteve o cenário de incerteza jurídica e a definição da existência ou não de relação de emprego continuará sendo decidida país a país e tribunal a tribunal.

Japão

Entrou em vigor em novembro de 2024 a Lei de Proteção ao Freelancer, que introduziu uma série de proteções aos trabalhadores por conta própria, como entregadores por aplicativo. Entre as disposições da lei para empresas estão a obrigatoriedade de contratos com termos e condições, são proibidos pagamentos com atraso excessivo e devem ser criados programas de prevenção ao assédio. Também foi permitido aos trabalhadores independentes a participação em um programa especial de seguridade social.

Índia

O governo federal promulgou em 2020 o Código da Seguridade Social, que promoveu a inclusão de diversas categorias de trabalhadores independentes, incluindo trabalhadores por plataformas, para efeitos de formulação de regimes de proteção previdenciária – incluindo a possibilidade de contribuição por parte das plataformas.

Embora regras específicas para o setor ainda necessitem de regulamentação, motoristas por aplicativo já podem acessar os benefícios governamentais (aposentadoria, seguros, auxílios etc.) por meio da plataforma e-Shram, criada pelo Ministério do Trabalho.

Brasil

No Brasil, representantes das plataformas, dos trabalhadores e do governo participaram de um Grupo de Trabalho sobre o tema e chegaram a um consenso de que a relação entre motoristas parceiros e os aplicativos é uma realidade nova que não cabe na legislação trabalhista existente.

A partir dessa premissa, todos esses atores vêm concentrando esforços para a criação de uma nova regulamentação. Tecnologia e a inovação na mobilidade das pessoas trazem inúmeros benefícios à sociedade e, ao mesmo tempo, desafios regulatórios e jurídicos que precisam ser endereçados com responsabilidade – e sem tentar enquadrá-los em modelos antiquados.

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