No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

É fundamental aprimorar regulação e tornar expansão da MMGD mais sustentável

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Atualmente, a capacidade instalada de MMGD (micro e mini geração distribuída) no setor elétrico brasileiro é de 34 GW, cerca de 15% do parque gerador, a segunda fonte em termos de potência, atrás apenas das hidrelétricas. Esta fonte foi a que mais cresceu nos últimos anos, multiplicando por 7 vezes em 4 anos, um recorde nacional!

Dentre os fatores que levaram a este cenário, vale citar a inovação de permitir ao consumidor gerar sua própria energia, a redução expressiva no custo da tecnologia e, principalmente, os subsídios associados ao modelo de net-metering.

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Estes subsídios surgiram no Brasil em 2012 através de Resolução da Aneel, na esteira da transição energética, buscando incentivar tecnologia ainda em evolução, mas acabou se estendendo muito além do necessário à luz da redução nos custos.

Essa extensão se consolidou com a aprovação, em janeiro de 2022, da Lei 14.300, que, de forma resumida, trouxe como principal benefício a determinação de que, para as usinas existentes e que solicitaram acesso até janeiro de 2023, os subsídios do net-metering permanecerão até 2045. Ou seja, para estas usinas, mesmo que a geração de MMGD ocorra em momento e em local diferente do consumo, os beneficiados não pagarão nenhum custo de uso das redes elétricas, tampouco encargos setoriais, até 2045.

Nesse contexto, a expansão da MMGD ampliou também os subsídios pagos pelos demais consumidores do país. Segundo a Aneel, estes subsídios totalizaram R$ 7 bilhões em 2023, superaram R$ 9 bilhões entre janeiro e outubro deste ano e devem fechar 2024 próximos a R$ 11 bilhões.

A partir de 2025, a expectativa é de que será ainda maior, pois há um estoque de 8 GW em projetos na fila de conexão para fazer jus ao longevo e significativo benefício, o que deve levar o subsídio à MMGD a ser o maior do setor elétrico, superando todas as outras categorias subsidiadas.

Por sua vez, há importante discussão que poderia mitigar a ampliação destes efeitos, referente à valoração dos custos e benefícios da MMGD, prevista no art. 17 da Lei 14.300. Tal dispositivo seguiu a linha do debate internacional, visando evitar subsídios cruzados insustentáveis, através de tarifas que reflitam adequadamente custos e benefícios imputados ao sistema como um todo pela MMGD.

Infelizmente, a implementação deste mecanismo está pendente de encaminhamento, com prazo bastante alongado, comparativamente ao que estabeleceu a lei, que indicou que o CNPE deveria ter publicado as diretrizes de cálculo até julho de 2022, sendo que esta publicação ocorreu apenas em maio de 2024.

A Aneel deveria, a partir dessas diretrizes, estabelecer a metodologia de cálculo para a valoração em até 18 meses, tendo incluído o item em sua agenda regulatória de 2026.

Mesmo que o tema esteja mais lento do que o desejável, entendemos que as diretrizes publicadas pelo Ministério de Minas e Energia em maio deste ano, após a Consulta Pública 129/2022, acabaram vindo, de forma geral, aderentes às melhores práticas internacionais. Resumidamente, as diretrizes indicam a necessidade de avaliar impactos nos investimentos de toda a cadeia setorial, nas perdas de energia, nos custos de operação do sistema, nos encargos setoriais, na sobrecontratação das distribuidoras, bem como os aspectos locacionais, horários e sazonais do sistema elétrico.

Utilizando os impactos da geração de energia como exemplo, cabe ressaltar que no Brasil, país com uma matriz substancialmente renovável, é intuitivo entender que a MMGD está substituindo uma geração renovável centralizada. Um exemplo disto está no fato de que a MMGD ajuda a sobreofertar o sistema, principalmente durante o dia, quando as placas solares injetam energia nas redes.

Assim, como a geração só ocorre quando há demanda, o ONS precisa cortar parte da geração centralizada solar e eólica (curtailment energético), bem como verter água dos reservatórios hidrelétricos (vertimento turbinável). Entretanto, o ONS não consegue cortar a MMGD, pois está conectada às redes de distribuição, fora da supervisão do Operador Nacional do Sistema Elétrico.

Ainda no âmbito da geração, por estar substituindo potencialmente a geração renovável, a princípio se concluiria que a MMGD não estaria agregando benefícios ambientais ao setor elétrico. Entretanto, esta avaliação pode mudar quando levados em consideração cenários de estresse, diante do novo normal climático e das restrições operativas das hidrelétricas. Assim, o tema dos benefícios ambientais parece requerer uma avaliação mais profunda.

Outros aspectos relevantes a serem considerados na apuração dos benefícios e custos da MMGD são os efeitos locacional e temporal, algo ressaltado pela EPE e pela Aneel em suas contribuições à CP 129.

No caso do sinal temporal, como há abundância de energia solar quando o sol está brilhando e as placas (incluindo de MMGD) estão gerando, ocorre uma redução nos preços do mercado spot (PLD) nestes horários, reduzindo também a valoração da energia dos geradores solares de grande porte, que estão expostos ao PLD horário.

Entretanto, a MMGD não está exposta ao PLD horário, tendo sua energia valorada pela tarifa de fornecimento da distribuidora, sem qualquer sinal horário. Ou seja, a grande expansão da MMGD vivenciada no setor elétrico está impactando o PLD horário, reduzindo-o durante o dia e reduzindo também o resultado econômico de quem gera nestes horários, principalmente os geradores solares centralizados, sem que isto afete economicamente a própria MMGD.

No caso do sinal locacional, o exemplo trazido está associado à Tusd, tarifa de uso dos sistemas de distribuição, que não carrega sinal locacional. Isso significa, dentre outros aspectos, que a conexão de MMGD em locais da rede que estão saturados, que demandarão investimentos expressivos, terá a mesma Tusd de locais da rede com folga, que não demandarão novos investimentos.

Como consequência, há um volume muito maior de conexões de MMGD em locais da rede que apresentam maior atratividade em questões não associados aos seus custos (como maior insolação ou menor custo do terreno, por exemplo), levando à maior necessidade de investimentos, cujos custos são transferidos aos demais consumidores, pois os beneficiados pela MMGD não pagam pelo uso das redes, num ciclo vicioso. Por outro lado, em alguns locais das redes a MMGD poderia reduzir a necessidade de investimentos, mas a Tusd não traz o sinal econômico adequado para incentivar sua expansão nos mesmos.

Outro exemplo associado ao sinal locacional refere-se ao efeito da MMGD nas perdas técnicas das redes de distribuição e transmissão. Simulações realizadas pela PSR indicam grande variabilidade nestes efeitos, havendo redução das perdas em alguns locais e aumento em outros, a depender das condições e do fluxo das redes. Dessa forma, as análises indicam a necessidade de simular os efeitos da MMGD em cada circuito, refletindo nas tarifas os benefícios nos locais em que há redução das perdas, e vice-versa.

Em suma, a MMGD ocupa hoje posição de destaque no país, sendo a segunda maior fonte em termos de capacidade instalada. Assim, é fundamental buscar aprimoramentos regulatórios capazes de permitir sua expansão sem ameaçar a sustentabilidade do setor elétrico.

Tais aprimoramentos estão previstos na Lei 14.300, com diretrizes estabelecidas pelo CNPE em maio deste ano, através das quais será possível desenhar tarifas aplicáveis à MMGD que reflitam melhor seus efeitos sobre o sistema elétrico como um todo, com sinalização locacional e temporal, dentre outros aspectos.

Finalmente, mas não menos importante, cabe ressaltar que o desenho de tarifas aderentes aos custos e benefícios imputados ao sistema é pilar primordial a ser aplicado a todas as fontes de geração do país, incluindo as renováveis centralizadas, cujo arcabouço regulatório também demanda aprimoramentos neste sentido. Mitigar a transferência de custos e subsídios desnecessários aos consumidores e aprimorar o sinal de preço para a expansão do parque gerador do país são medidas imprescindíveis para o setor elétrico brasileiro.

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