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O Congresso concluiu nesta terça-feira (17) a tramitação do projeto de mais uma renegociação de dívida dos estados com a União. Para além da “bondade” de poder até zerar os juros pagos pelos entes, o programa tem inovações como uma ampla gama de possibilidades de abatimento do estoque dessa dívida, a determinação de uma regra de crescimento de gastos e a criação de um fundo para garantir operações de crédito e PPPs, o que no futuro tende a reduzir esse fardo nas costas do Tesouro Nacional.
O governo federal ficou entre o risco moral de se premiar novamente os maus pagadores e os benefícios de se tentar resolver, pelo menos por algum tempo, a situação dos estados, que novamente estavam enredados em calote de dívida e irresponsabilidade fiscal. O Propag tenta traçar uma trilha de sustentabilidade de longo prazo, mas o histórico de recorrência nos problemas na federação não autoriza muito otimismo de que “desta vez é diferente”.
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Com o programa, uma nova rodada de aumento de investimentos estaduais deverá ser estimulada, o que pode ajudar a atividade econômica nos próximos anos. É um caminho de expansão fiscal federativo bem menos acompanhada pelo mercado financeiro, que anda bastante inquieto com a trajetória das contas públicas.
A estratégia original do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que vinha sendo pressionado por governadores e parlamentares para a renegociação desde o ano passado, era fazer isso mirando o aumento dos investimentos em educação. A ideia ficou pelo caminho, residual no desenho final do programa, que foi customizado principalmente para tentar tirar Minas Gerais e Rio de Janeiro do sufoco.
A redação final consegue trazer benefícios também para estados que devem bastante, mas não estão em situação falimentar, como São Paulo, e criou o fundo de equalização para beneficiar com investimentos os estados pouco endividados, especialmente do Nordeste.
O custo fiscal em termos de subsídios da União para os entes tem potencial de ser elevado, podendo chegar a 0,5% do PIB. E, mesmo com alguns avanços em termos de regras fiscais, há poucas garantias de que, daqui a alguns anos, os governadores não voltem com o pires na mão para pedir socorro ao governo.
Quase 30 anos depois da primeira renegociação de dívida dos estados, nos anos 1990, que foi seguida de diversas repactuações, não seria o caso de o Congresso começar a pensar em rever a questão federativa de forma mais ampla, inclusive pensando em dar maior autonomia para os entes andarem com suas próprias pernas?
Em outras palavras, não seria o caso de se discutir a possibilidade de os governos estaduais emitirem títulos e ficarem sujeitos à disciplina dos mercados?
O economista Manoel Pires, ex-secretário de política econômica e um dos maiores especialistas em assuntos fiscais do país, levantou essa reflexão, com a ressalva de que ele entende que a ideia ainda precisa ser amadurecida e não seria algo para já. “A longo prazo, gosto da ideia de aumentar a autonomia federativa e organizar um mercado de emissão de dívida pública subnacional, reduzindo a participação da União no financiamento dos entes públicos”, disse.
Para ele, o que tem sido feito está caminhando na direção oposta, com uma descentralização fiscal que aumenta a dependência dos estados da União.
Pires considera ser preciso que a situação fiscal dos estados esteja mais organizada de modo a viabilizar uma revisão mais estrutural do modelo de financiamento que possa se tornar menos dependente de reestruturações e dos subsídios tão volumosos do governo federal.
Na visão dele, isso ocorrerá se a atual renegociação efetivamente ajudar que as dívidas voltem efetivamente a ser pagas, se houver uma redução do conflito distributivo nos orçamentos estaduais viabilizando espaço fiscal, ajustes mais estruturais nos estados altamente endividados forem realizados e se eliminar o risco moral que surgiu a partir do momento em que o STF concedeu liminares permitindo o não pagamento das dívidas.
Além disso, entende o economista, o espaço fiscal para endividamento deveria estar relacionado a critérios relacionados à solvência do ente.
A coluna também ouviu alguns secretários de Fazenda que enxergam a possibilidade de os estados poderem voltar a emitir títulos com bons olhos. Mas ponderam que isso só pode ocorrer se realmente houver disposição de deixar claro que se o estado ficar insolvente terá consequências, como ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, onde alguns entes já chegaram a “quebrar”.
A ideia de deixar estados emitirem dívida autonomamente não é muito bem vista na Fazenda, historicamente. A lógica é que, no fim das contas, se houver problemas, inevitavelmente sobrará para o Tesouro.
Um interlocutor da coluna aponta que o medo do Tesouro vai além disso. Também haveria risco de competição no mercado de títulos públicos, o que pode no fim das contas encarecer as emissões federais.
A hipótese de permitir a volta das vendas de títulos públicos pelos estados não está posta na mesa, mas é um tema que deveria ser efetivamente discutido pelos atores políticos. Está na hora de trabalhar para que os entes ganhem independência e parem de tratar o Tesouro como uma espécie de FMI tupiniquim, premiando a ineficiência e a irresponsabilidade.