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O problema
A competente matéria de Mirielle Carvalho no JOTA trouxe a informação: o Ministério da Previdência pôs-se a tabelar as taxas de juros dos empréstimos consignados dos aposentados e beneficiários.
Como pode atestar o bedel do inferno, familiarizado que está, em sua rotina, com tantos nobres exemplos, as intenções são boas: proteger os idosos e os desvalidos contra a tentação do superendividamento.
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O assunto chega ao STF por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7759) proposta pela Associação Brasileira de Bancos (ABBC). No centro da controvérsia encontra-se o poder regulamentar do Conselho Monetário Nacional (CMN), cuja competência para estipular as taxas de juros teria sido desrespeitada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), uma conhecida autarquia federal, e pelo Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS), um menos conhecido órgão colegiado com representantes do governo federal e da sociedade civil.
Não é a primeira vez que o STF é provocado para tratar do empréstimo consignado. Na ADI 7223, o tribunal, por unanimidade, julgou constitucional lei que ampliara a margem consignável para 45%, no caso dos aposentados, e 40%, para os beneficiários de programas federais.
Detalhes à parte, o que está em jogo no novo caso não é mais o limite de comprometimento da renda, mas a definição sobre o titular do poder de regulação econômica sobre os juros cobrados.
O enquadramento jurídico
Desde a Medida Provisória que criou o Plano Real, O CMN é um órgão colegiado sem representantes do mercado e da sociedade civil, ou seja, é 100% governamental.
Foi criado originariamente pela Lei de Reforma Bancária de 1964 (Lei 4.591/64), que deu vida também ao Banco Central, legando-nos a governança do Sistema Financeiro Nacional com esse desenho institucional de autoridade monetária e reguladora complexa hierárquica: uma instância executiva submetida a um conselho que estipula as regras e políticas.
Dotados por lei de amplas competências normativas sobre moeda, crédito, e serviços financeiros – por exemplo, limitar os juros –, CMN e BC tornaram-se alvo fácil da judicialização militante. Foram várias as tentativas de anular ou restringir o seu poder regulamentar, para subverter a nova estrutura regulatória do SFN.
Houve de tudo, especialmente ao nível microeconômico, ou seja, no tratamento dos spreads bancários: juiz estadual de primeira instância tabelando juros a pedido do Ministério Público; uso do Código do Consumidor para alterar juros contratuais; recurso à famosa Lei da Usura – na verdade, um decreto de 1933 – para limitar os juros a 12% ao ano.[1]
Seria impossível, neste curto espaço, resumir a saga que foi o processo histórico de construção institucional da regulação financeira no Brasil. É espantoso constatar, por exemplo, que o país tenha conseguido praticar uma gestão macroeconômica minimamente estruturada sem ter, até 1964, um banco central propriamente dito.
Um importante marco jurisprudencial foi a edição em 1976 da Súmula 596 do STF, consolidando o entendimento de que a Lei da Usura não se aplicava às operações realizadas por instituições que integram o SFN.
Um segundo momento importantíssimo, já após 1988, foi a ADI 4, quando o STF decidiu, por apertada maioria, que a regra da nova Constituição (o polêmico artigo 192) de limite de juros de 12% ao ano não era autoaplicável, carecendo de lei regulamentadora para produzir efeitos. Somente em 2003, viria a Emenda Constitucional 40 revogar o teto de juros.
Com a transição democrática, um conceito forte de separação dos poderes foi resgatado, e, com ele, uma concepção marcadamente liberal de legalidade e de atuação estatal na ordem econômica, expressada no artigo 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT 25), que revogava todas as leis que houvessem atribuído ou delegado a órgão do Poder Executivo competência normativa típica do Congresso Nacional.
O ADCT 25 foi exaustivamente utilizado para atacar os poderes normativos do CMN e do BC no Judiciário. Prestigiosos doutrinadores propagaram a tese, que, caso vingasse, lançaria o SFN num insustentável vácuo regulatório.[2]
Com o impulso de exorcizar o espírito autoritário, a versão aggiornata da separação dos poderes de 1988 implicaria, paradoxalmente, o retorno a uma versão liberal da relação entre lei e regulamento, incompatível com a realidade econômica e social.[3]
O debate infernal (nosso amigo bedel não tem sossego) sobre o princípio da legalidade, a vedação da delegação legislativa, e os limites do poder regulamentar parte de um equívoco elementar: o vasto corpo de direito administrativo produzido para instrumentalizar a intervenção do Estado no domínio econômico é confundido com autoritarismo político.
Parte da doutrina jurídica não consegue compreender que o chamado Direito Econômico é uma irreversível dinâmica estrutural do capitalismo democrático, diante das demandas distributivas e da necessidade de estabilização do sistema,[4] sujeito a crises cíclicas endógenas.
No caso da regulação financeira, a incontornável reformulação dos cânones do Direito Público, especialmente a separação dos poderes, faz jus à provocação de Bruce Ackerman, sustentando que os regulamentos não são apenas mera execução da lei, mas inovam a ordem jurídica: “reguladores criam direito, e não gostaríamos que fosse diferente”.[5]
Aos trancos e barrancos, aprendemos a reconhecer a competência normativa do CMN e do BC sobre a matéria atinente ao SFN: moeda, crédito, juros, seguro de depósito, instrumentos de estabilidade sistêmica, criptomoedas, dentre tantos outros temas. E ela já foi testada à exaustão no STF. A essa altura do campeonato, é juridicamente insólito e economicamente disfuncional que tal competência venha ser desafiada pelo voluntarismo político do Ministério da Previdência.
As consequências práticas
Do ponto de vista estritamente jurídico, não há outro desfecho consistente para a ADI 7759 que não a reafirmação dos poderes normativos do CMN, grosseiramente usurpados no caso concreto pelo INSS e pelo CNPS.
Mas, na esfera política, como fica a proteção dos vulneráveis contra o superendividamento? Estará o STF a serviço da ganância e da usura, como certamente sugerirá um certo patrulhamento tolo?
Aqui, o debate constitucional sobre as regras de competência normativa, tão enfadonho para o leigo em Direito, revela-se valioso para a reflexão pública numa sociedade democrática: identificar juridicamente quem tem o poder é igualmente apontar quem deve ser politicamente responsabilizado.
[1] Tratei com profundidade desses e outros casos, especialmente do tema do presente artigo, que é o controle pelo STF do poder regulamentar do CMN e do Bacen, em minha tese de doutoramento na Faculdade de Direito da USP, defendida há 20 anos, em novembro de 2004: A Capacidade Normativa de Conjuntura no Direito Econômico: o déficit democrático da regulação financeira, livremente disponível para download em https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-12022015-204835/pt-br.php. A tese foi posteriormente divulgada em forma de vários artigos. Em breve, será finalmente publicada em formato de livro, totalmente revisada e atualizada.
[2] Jean Paul C. Veiga da Rocha, “Os incríveis poderes normativos do Conselho Monetário
Nacional e do Banco Central: o caso paradigmático do vácuo regulatório (STF, RE 286.963-5/MG)”, RDPE – Revista de Direito Público da Economia 48 (2014): 107-130.
[3] Jean Paul C. Veiga da Rocha, “Quem tem medo da delegação legislativa?”, RDA – Revista de Direito Administrativo 271 (2016): 193-221, https://doi.org/10.12660/rda.v271.2016.60765, livremente disponível em https://periodicos.fgv.br/rda/issue/view/3322.
[4] A crise bancária brasileira que sucedeu o Plano Real, em meados dos anos 1990, expôs dramaticamente o anacronismo da tese que limitava o poder regulamentar do CMN e do Bacen. São exemplos contundentes o caso FGC (STF, ADI 1398) e o caso PROER (ADI 1367) — ver os estudos de caso em Jean Paul C. Veiga da Rocha, A Capacidade Normativa de Conjuntura no Direito Econômico, capítulo 3.
[5] “Regulators make law, and we would not want it any other way” — ver Bruce Ackerman, “The new separation of powers”, Harvard Law Review 113 (3) (2000): 633-725, p. 693.