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Com atuação nos mais diversos segmentos da saúde, o grupo Dasa se tornou um dos pioneiros do setor a utilizar modelos de Inteligência Artificial (IA) nos serviços. Segundo Leonardo Vedolin, diretor-geral Médico e de Cuidados Integrados da empresa, desde 2017 o grupo Dasa tem apostado no desenvolvimento de tecnologias baseadas em IA com o foco no aumento da qualidade e desburocratização da experiência dos pacientes.
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Na rede de diagnósticos do grupo Dasa, todos os laudos são analisados por um modelo de IA próprio. Diariamente, a aplicação baseada no modelo de Processamento de Linguagem Natural (NLP) lê entre 6 a 10 mil exames e tem capacidade de identificar ao menos 43 doenças. Quando a IA identifica alguma anomalia, o médico responsável é notificado para acompanhar o paciente.
Além disso, a Dasa também utiliza a IA para acelerar a execução dos exames de ressonância magnética. Segundo Vedolin, o modelo reduziu o tempo de espera dos resultados em 40%.
Ao defender o uso dos modelos de IA para agilizar os serviços em Saúde, Vedolin também ressalta a importância da capacitação continuada dos profissionais de saúde para a adoção de novas tecnologias.
Ao se falar em aplicações práticas da Inteligência Artificial (IA), qual segmento do setor será mais beneficiado?
A Inteligência Artificial não surgiu agora, está sendo testada com maior força, mas ela já tem, pelo menos, 50 anos de desenvolvimento. Dado esse contexto, ela vai atuar onde existirem dores para os usuários do sistema. O setor da saúde ainda é muito deficiente, com muitas fragmentações na sua jornada de cuidado. Sempre que existe isso, com uma indústria ineficiente e fragmentada, as tecnologias disruptivas encontram um campo muito fértil para se desenvolver.
Eu acho que esses dois pilares são fundamentais para entendermos onde a IA vai entrar em saúde: ineficiência do setor e fragmentação na jornada. Pelo lado econômico financeiro, temos muita ineficiência e desperdício. Pelo lado do usuário, seja ele médico ou paciente, há uma necessidade de melhorar a experiência em cuidado, tanto para quem recebe como para quem promove.
Hoje, o usuário tem dificuldade de encontrar um bom acesso ao sistema, quando encontra vai precisar seguir uma outra etapa da jornada, geralmente, fragmentada. Ou seja, ele vai ao médico num lugar, tem que fazer o exame em outro, eventualmente, se precisar de internação, é encaminhado para outro lugar. Totalmente fragmentado.
Para o médico, que no passado ficava a maior parte do seu tempo em contato com o paciente, agora fica mais da metade do tempo preenchendo papéis. Nesse sentido, a IA vai entrar com muita velocidade na questão da ineficiência, ou seja, desburocratizando processos, transformando sistemas, e empoderando pessoas para aumentar sua produtividade. Em diversas áreas: cadeia de suprimento, RH das empresas, etc.
Em relação ao uso de IA pela Dasa, a nossa jornada começa em 2017, quando a gente criou o laboratório de IA, chamado Dasa Inova. Nesse momento, atraímos pessoas de competências específicas como médicos, programadores, engenheiros de software e cientistas de dados. Ali começa uma fase que durou dois anos de muita experimentação. Primeiro, testando parceiros que tinham soluções de inteligência artificial já maduras, para saber se de fato elas poderiam gerar valor para a companhia e, ao longo do tempo, desenvolver os nossos próximos modelos dentro de casa.
E aí entramos em uma segunda fase, que é o momento em que estamos hoje. Após esse período de muita ideação, testes e hipóteses, a gente começa agora a perceber a geração de valor na prática. Isso tem acontecido com uma força muito grande nos últimos dois anos. Vou dar alguns exemplos de automatização: nós temos um modelo de NLP (Processamento de Linguagem Natural), que é um dos subtipos de IA, que durante todos os dias lê milhares de exames feitos pela Dasa, detecta problemas de saúde nas pessoas e informa o médico de que essas pessoas precisam de um cuidado mais rápido — com obediência à LGPD e toda legislação, com consentimento informado e assinado.
O sistema de saúde é tão fragmentado que não há nada em comum, e eu desafio vocês que já devem ter passado por isso: você vai no laboratório, faz um exame ou vai no médico pedir a consulta ou o exame alterado, e acaba ficando semanas ou até meses sem ter uma etapa do cuidado. Então, o que a Dasa faz? Todos os dias tem modelos de IA detectando 120 flags de alterações potenciais para engajar o médico, alertando-o que tem um paciente precisando deste cuidado. Esse é um exemplo de automação de processo na leitura de exame.
Outro exemplo, nós desenvolvemos um modelo de inteligência artificial que reduziu em 40% o tempo de execução de um exame de ressonância magnética. O procedimento que era feito em 40, 30 minutos, hoje ele é feito em menos de 10 minutos. Então em vez de fazer 6 exames por hora, hoje eu consigo fazer 13 exames por hora. O modelo aumentou de uma forma muito intensa a produtividade dos nossos equipamentos de ressonância magnética.
Outra área que a gente tem utilizado para a automação é a qualidade. Testamos modelos que aumentam a qualidade do sistema da companhia. Por exemplo, o médico pede uma tomografia e ele dá um relatório. Nós temos modelos de inteligência artificial que revisam esse relatório do médico e, caso tenha algum erro potencial, emite um alerta ao médico.
Como funciona essa aplicação, em quais unidades já está operando?
Os algoritmos de NLP fazem a leitura automática de todos os laudos da nossa rede de diagnósticos e identificam achados relevantes, permitindo o acionamento ágil do médico responsável pelo paciente e possibilitando maior brevidade na próxima etapa do cuidado.
Neste processo, são estabelecidas regras para análise de diversos laudos que identificam pelo menos 43 doenças. Entre 6 a 10 mil laudos em todo o Brasil são avaliados diariamente. No caso da identificação de alguma anomalia, uma equipe médica é responsável pelo contato com o médico prescritor para alertá-lo sobre o achado e, caso necessário, o auxilia na navegação do paciente dentro da rede de laboratórios e diagnósticos da Dasa.
Quando um paciente que passou pela Dasa, com um achado identificado por meio de NLP, é alertado pelo seu médico, ele consegue dar o próximo passo no tratamento, em média, depois de 7 dias. Quando ele não é alertado, o tempo é de 17 dias.
Para auxiliar os algoritmos de NLP, a Dasa criou ainda o DasaBERT. Desenvolvido por cientistas de dados, entrou em operação no início de agosto de 2023 e usa o modelo de arquitetura transformer, o mesmo do ChatGPT, para filtrar achados em laudos mais complexos.
Os relatórios gerados pela tecnologia, que passam também pelo crivo de médicos da Dasa, aceleram o início de tratamento ou a realização de exames complementares de pacientes, com impacto positivo direto no desfecho clínico.
Como é que o senhor avalia a questão de proteção de dados pessoais nesse setor? Ele deve ser centralizado por cada empresa ou compartilhado como no Open Banking?
Na Dasa sempre tivemos uma preocupação muito forte com a LGPD, que foi fundamental para nos dar segurança jurídica e legal para fazer as coisas certas. Desde o início, aderimos totalmente, desde o consentimento informado, à anonimização de dados. Por exemplo, eu não sei quem são os pacientes que a gente acessa no fundo, são dados anonimizados de pessoas que autorizaram, em aderência a legislação.
A LGPD nos deu essa segurança que existe um sistema legal que nos protege e, principalmente, protege o paciente, que não pode ter seus dados vulneráveis.
Eu acredito que o futuro do Open Health é que o dado seja cada vez mais do usuário. O paciente como detentor de seus dados e da informação, com a forma que ele desejar que isso seja tratado e trabalhado, sem que as empresas o ultrapassem. Vejo isso como uma força muito grande. É óbvio que tem regulações, e eu acho que qualquer empresa como a nossa, que é uma empresa de autoridade, não pode tolerar vazamento de dados, trabalhamos com informações sensíveis. Nossa frente de segurança da informação tem uma preocupação muito alta com qualquer tipo de ataque cibernético, com um time dedicado todos os dias da semana para fazer isso de uma forma estruturada e preservada.
Em relação à regulamentação, considero que é uma barreira não só necessária, como urgente. A LGPD trouxe parte disso na questão do uso do dado, mas o que potencialmente vai acontecer é que a inteligência artificial pode acelerar mudanças de processo, por exemplo, sem que a regulação esteja clara e bem desenhada para julgar se aquilo ali faz ou não faz sentido. Essa é a camada que mais preocupa. Mas, assim, do ponto de vista institucional, existe uma expectativa muito grande de que ela aconteça. Globalmente e no Brasil, por consequência.
Então, é possível que não haja a aplicação de certas tecnologias na indústria de saúde na mesma velocidade que acontece em outras indústrias, como, por exemplo, telecom e entretenimento, onde essas questões já estão pacificadas.
Na saúde, uma indústria muito mais sensível, é possível que a ausência de regulação atrase um pouco o uso. E eu concordo com isso. Eu concordo que exista uma discussão maior e eventual atraso da incorporação da tecnologia para que a regulação aconteça. Porque o setor da saúde tem um impacto exponencialmente maior se há um erro, por exemplo, do que na mídia, no entretenimento. Um filme mal feito tem um impacto X. Um erro no processo dentro de um hospital tem outro impacto. Saúde está dentro de um grupo de empresas, como a aviação, como indústria química, que quando um erro tem um impacto muito explosivo.
O senhor acredita que a inteligência artificial pode ser uma interface segura para o atendimento direto de pacientes? Como é que fica a responsabilidade do profissional de saúde?
A responsabilidade se dá na formação profissional. Seja médico, enfermeiro, farmacêutico, enfim. É nessa trajetória inicial que inicia a sua formação de competências e perfil comportamental. Hoje, os milhares de profissionais que estão atuando no mercado de saúde foram formados numa era em que não existia uma inteligência artificial como vemos atualmente. Por exemplo, temos 500 mil médicos no Brasil que entraram no mercado de trabalho sem qualquer formação em relação a dados e uso de inteligência artificial. Por isso, se essa população toda for formada dentro de uma lógica de competência e comportamento desejáveis, eu tenho a premissa para que o cuidado certo seja feito.
Qual é o modelo de compartilhamento de dados mais adequado para o setor da saúde que, como o senhor comentou, é bastante fragmentado?
Do ponto de vista conceitual, eu sou muito favorável à ideia de que o sistema de saúde precisa levar o paciente para o centro do cuidado. Não tem mais como uma indústria como a nossa resolver os problemas que estão vigentes sem colocar o paciente no centro. Ele precisa ir ao centro do cuidado. Tem que ser feito o que é importante para ele. Não é o que é importante para a instituição.
Se o paciente está no centro, os dados que são gerados pelos episódios de cuidado dele, para que de fato haja geração de valor, eles precisam ser estudados, estruturados e armazenados com segurança. E eles precisam estar em um sistema regulado, com capacidade de monitoramento e avaliação dessa estrutura de uma forma recorrente. Porque não adianta eu ter uma lei e depois não ter capacidade de monitorar isso.
A questão que fica é a seguinte, de que forma as organizações vão garantir que esses profissionais, ao se depararem com novas tecnologias, preservem o cuidado do usuário final? É aqui que precisa da participação de dois grandes entes: o Estado, com a legislação, para dar segurança jurídica do que pode ser feito ou não; segundo, as empresas da saúde, que precisam garantir educação continuada em tecnologia para os seus trabalhadores, para que eles tenham as competências e ferramentas necessárias para usar a tecnologia.