No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Impacto da reforma tributária na distribuição desproporcional de lucros

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A sociedade limitada, como forma de organização da atividade empresária, é amplamente utilizada por diversos fatores. Além de se caracterizar como tipo societário menos burocrático em comparação com as sociedades anônimas, destaca-se a maior flexibilidade de retenção de lucros para desenvolvimento de seus negócios sociais, bem como admissibilidade de distribuição de lucros aos sócios sem que seja observada a sua participação proporcional no capital social, se assim dispuser o contrato social.

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Tal faculdade, presente nas sociedades limitadas, não é permitida nas sociedades anônimas diante da restrição prevista no artigo 109, §1º da Lei das S.A., que determina que as ações de mesma classe conferirão a seus titulares os mesmos direitos ou vantagens, não sendo, portanto, admissível que ações de mesma espécie recebam dividendos desiguais.

Do ponto de vista societário, os sócios de uma sociedade limitada podem convencionar, seja no contrato social, acordo de sócios, política interna ou outro documento escrito, as regras aplicáveis às destinações dos lucros apurados ao final de cada exercício, definindo critérios e parâmetros que justifiquem eventual desproporção quando do pagamento de dividendos, desde que não haja a exclusão de nenhum sócio ao direito de participar dos lucros.

Com efeito, por força do artigo 1.008 do Código Civil[1], é vedada a supressão do direito a auferir resultados por um sócio, seja abolindo tal direito ou através do pagamento de valores irrisórios.

Sob a ótica tributária, entretanto, levantam-se discussões se tais operações podem ou não caracterizar doação para fins de incidência do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), imposto de competência estadual.

A questão, longe de ponto pacífico, é circunscrita por legislações e entendimentos diversos pelos entes da federação. Como exemplo, a Fazenda estadual paulista já emitiu respostas a consultas manifestando o entendimento de que a regular distribuição desproporcional de lucros não enseja a incidência do ITCMD[2].

Santa Catarina, por outro lado, sinalizou pela tributação quando da publicação do Decreto Estadual 1.482/2021, que previa expressamente, no artigo 1º, §4º, XII, a tributação da distribuição desproporcional dos lucros. A norma catarinense, porém, logo foi revogada pelo Decreto 1.497/2021, publicado apenas 12 dias após o primeiro.

No contexto da reforma tributária, a Emenda Constitucional 132/2023 trouxe, além de substanciais alterações quanto à tributação do consumo, relevantes mudanças também com relação ao ITCMD.

A EC 132/2023 trouxe, por exemplo, que o ITCMD “será progressivo em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação”, o que deve levar a que muitos estados, como São Paulo, devam adaptar a sua legislação, sob pena de ter a alíquota fixa considerada inconstitucional.

Além disso, a EC 132/2023 estabeleceu balizas para a definição do estado que poderá exigir o imposto nos casos de doação ou sucessão envolvendo bens no exterior, enquanto não editada lei complementar para regular a matéria, assim como alterou o estado ao qual compete o ITCMD nos casos de sucessão envolvendo bens móveis, títulos e créditos, que não mais seguirá as normas do local em que se processar o inventário, mas sim daquele onde era domiciliada a pessoa falecida (de cujus).

Nesse contexto, os projetos de lei para a regulamentação da reforma tributária, em especial o PLP 108/2024, a pretexto de adaptar a legislação a tais mudanças, também pretenderam alterar aspectos da incidência do ITCMD quanto à distribuição desproporcional de lucros, equiparando a operação à doação para fins da incidência desse imposto[3].

Felizmente, a atual versão do PLP 108/2024, enviada ao Senado em 8/11/2024, retirou a expressa previsão quanto à tributação da distribuição desproporcional de lucros, que já nasceria vocacionada a questionamentos de inúmeras ordens, sobretudo na esfera judicial.

De fato, a distribuição de lucros de forma desproporcional na sociedade limitada não pode ser, genericamente, equiparada a uma doação, já que esta pressupõe um ato de liberalidade, a intenção de dispor de patrimônio próprio em favor de outrem, o que não necessariamente ocorre quando os sócios decidem distribuir os lucros da sociedade de forma não proporcional ao capital social.

Nesse ponto, vale destacar que a sociedade limitada, ao contrário da anônima, não se limita a ser uma comunhão de recursos financeiros, podendo consistir na reunião de pessoas com características individuais consideradas essenciais na formação da sociedade.

São inúmeros os fatores negociais que podem influenciar na decisão pela distribuição desproporcional de lucros em uma sociedade limitada, podendo os sócios decidir por reconhecer, em determinado exercício, que aspectos diversos da contribuição pecuniária ao capital social geraram os resultados positivos, por exemplo: o renome dos sócios; o tempo de dedicação individual para orientação e envolvimento nos negócios sociais; os investimentos e esforços na capacitação pessoal para condução das atividades da sociedade; o comprometimento patrimonial e administrativo de cada sócio, considerando os riscos decorrentes da assunção e exercício de cargos na administração e gestão da sociedade e de seus ativos, de representação legal perante os órgãos públicos competentes (incluindo autoridades fiscais federais, estaduais e municipais), bem como riscos decorrentes de outorga de garantias pessoais em benefício da sociedade; ou ainda a contribuição direta para geração de receitas e resultados para sociedade, seja através da identificação, prospecção, apresentação e/ou desenvolvimento de oportunidades, parcerias, investimentos, projetos, operações, negócios da sociedade e de seus ativos.

Daí por que o artigo 1.007[4] do Código Civil expressamente estabelece que a distribuição dos lucros pode seguir proporção diversa da contribuição ao capital realizada por cada sócio, contanto que assim previsto no contrato social.

Como se percebe, é importante, tanto sob o ponto de vista societário quanto tributário, que haja a devida formalização acerca dos critérios utilizados na distribuição dos resultados, a fim de não se deixar margem a questionamentos que pretendam sustentar que a desproporção se deu por mera liberalidade.

De fato, além do risco de tributação pelo ITCMD, na ausência de parâmetros previamente pactuados entre os sócios e devidamente registrados por escrito, qualquer distribuição desproporcional de lucros, que não seja aprovada pela unanimidade dos sócios, poderá estar sujeita a questionamentos por qualquer dos sócios que venha a se sentir prejudicado sob alegação de que o voto da maioria teria sido proferido de forma abusiva, em conflito de interesse para benefício particular de um sócio ou um grupo de sócios.

Portanto, garantir a devida comprovação de critérios objetivos para a distribuição desproporcional de lucros, além de potencialmente reduzir a litigiosidade entre os sócios, mitiga o risco de que as autoridades fiscais tenham sucesso na pretensão de descaracterizar tais pagamentos desproporcionais a título de dividendos (que são, atualmente, isentos de IR), buscando reputá-los como doação, como remuneração por serviços prestados à sociedade ou ainda como pagamentos aos sócios sem causa, hipóteses em que a carga tributária seria bastante onerosa.


[1] “Art. 1.008. CC. É nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas”.

[2] Respostas a Consulta Tributária n°s. 20952M1/2019 e 18603/2018.

[3] O art. 164, § 5°, I, do PLP 108/2023, na versão submetida ao plenário da Câmara dos Deputados em agosto de 2024, trazia que ‘‘consideram-se, ainda, como doações, para fins da incidência do ITCMD, em transmissões entre pessoas vinculadas: I – os atos societários que resultem em benefícios desproporcionais para sócio ou acionistas praticados por liberalidade e sem justificativa negocial passível de comprovação, incluindo distribuição desproporcional de dividendos, cisão desproporcional e aumento ou redução de capital a preços diferenciados;’’

[4] “Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas.”

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