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A garantia da ordem pública segue como o principal fundamento para a decretação da prisão preventiva no Brasil, sendo amplamente invocada pelo Ministério Público e referendada pelo Poder Judiciário. Dados indicam que essa justificativa foi utilizada em 71,6% dos pedidos de prisão preventiva pelo Ministério Público e em 76,2% das decisões judiciais que decretaram a medida[1].
Essa prevalência evidencia não apenas a centralidade da ordem pública como critério legitimador da segregação cautelar, mas também a amplitude da discricionariedade judicial na aplicação dessa fundamentação. Trata-se de um conceito de contornos vagos, cuja historicidade revela sua instrumentalização como mecanismo de controle social e de racialização da punição.
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A construção do conceito de ordem pública está historicamente vinculada a dinâmicas de gestão dos indesejáveis, consolidando-se como um instrumento de exclusão social desde o século 19. Caiuá Cardoso Al-Alam, ao analisar o policiamento e as práticas prisionais em Pelotas entre 1869 e 1889, demonstra que a prisão, nesse contexto, funcionava como um dispositivo de supressão de sujeitos que desafiavam a ordem social escravocrata, tensionavam as estruturas produtivas e representavam potenciais focos de instabilidade[2].
A criminalização seletiva, portanto, servia como um mecanismo de perpetuação da hierarquia racial e econômica, garantindo a neutralização daqueles que representavam uma ameaça à manutenção do status quo.
No Brasil pós-abolição, a ordem pública manteve sua função estrutural na administração da exclusão social. O Código Penal da República de 1890 já previa a expulsão de estrangeiros “vadios reincidentes” e de capoeiras reincidentes, consolidando uma política de higienização social que visava controlar a população negra recém-liberta e os setores populares marginalizados.
Posteriormente, o Decreto 1.641, de 7 de janeiro de 1907, conhecido como Lei Adolpho Gordo, aprofundou essa lógica ao prever a expulsão de estrangeiros que comprometessem a “segurança nacional” ou a “tranquilidade pública”. A instrumentalização da ordem pública como fundamento jurídico para a exclusão revela, portanto, sua natureza arbitrária e sua permanência como um dispositivo de contenção de grupos historicamente marginalizados.
Na contemporaneidade, a ordem pública continua a ser amplamente invocada para justificar a decretação da prisão preventiva, operando, na prática, como um critério flexível que se adequa a múltiplos contextos e necessidades repressivas. A ausência de uma definição normativa precisa permite que sua aplicação seja pautada por elementos subjetivos, muitas vezes dissociados de parâmetros concretos de risco processual.
Daiana Martil, ao examinar decisões da magistratura gaúcha sobre a concessão de prisão domiciliar a mulheres gestantes ou mães de crianças menores de 12 anos no Presídio Estadual Feminino Madre Pelletier, constatou que a garantia da ordem pública é o principal fundamento para a negativa da medida, mesmo diante da previsão expressa do artigo 318 do Código de Processo Penal e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal[3]. Esse cenário revela a ampla margem interpretativa que envolve a aplicação do conceito e a consequente manutenção de um viés seletivo e excludente na interpretação judicial.
A análise da jurisprudência do STF demonstra a ambiguidade do conceito de ordem pública onde é associada a critérios como a natureza e a quantidade da droga apreendida em crimes de tráfico (HC 238968 SP, Min. FLÁVIO DINO, 1ª turma, DJ: 07/05/2024; HC 239648 MG, Min. ANDRÉ MENDONÇA, 2ª turma, DJ: 01/07/2024), reincidência específica e maus antecedentes (HC 242772 PR, Min. EDSON FACHIN, 1ª turma, DJ: 19/08/2024; HC 241128 SP, Min. ANDRÉ MENDONÇA, 2ª turma, DJ 17/06/2024) modus operandi da conduta delitiva (HC 239314 SP, Min. CRISTIANO ZANIN, 1ª turma, DJ: 22/04/2024; HC 246190 SP, Min. NUNES MARQUES, 2ª turma, DJ: 27/11/2024), suposta periculosidade do agente (HC 241559 CE, Min. FLÁVIO DINO, 1ª turma, DJ: 19/08/2024; HC 241278 SC, Min. ANDRÉ MENDONÇA, 2ª turma, DJ: 07/08/2024) ou risco de reiteração definitiva (HC 235831 SP, Min. ANDRÉ MENDONÇA, 2ª turma, DJ: 22/04/2024).
A vagueza do conceito de ordem pública possibilita interpretações subjetivas e reforça a discricionariedade do Judiciário, permitindo que elementos como periculosidade e reiteração criminosa sejam invocados de forma genérica, sem a devida fundamentação concreta. Estudos indicam que crimes patrimoniais sem violência ou grave ameaça, como o furto, têm sido objeto de decretação de prisão preventiva sob o argumento da periculosidade e do risco de reiteração criminosa.
Na Comarca de Salvador, por exemplo, Bernardo Leão demonstra que a abstração dos argumentos sobre periculosidade opera como um meio de ocultação da persistência de estigmas raciais e sociais na identificação dos sujeitos a serem segregados[4]. A noção de periculosidade, longe de se referir a uma condição objetiva do agente, constitui, na prática, um marcador de seletividade racial que reforça a criminalização da população negra e periférica.
A introdução do § 2º no artigo 312 do Código de Processo Penal pela Lei n 13.964/2019 (Pacote Anticrime) buscou estabelecer um critério mais rígido para a decretação da prisão preventiva, determinando que “a decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada”.
No entanto, a persistência de uma interpretação amplamente subjetiva do conceito de ordem pública faz com que essa exigência normativa não tenha sido suficiente para restringir a instrumentalização da prisão preventiva como dispositivo de controle social.
A centralidade da ordem pública como fundamento para a prisão preventiva evidencia sua função estruturante na lógica de criminalização seletiva. O conceito, historicamente utilizado para legitimar práticas de exclusão, continua a ser mobilizado no sistema de justiça criminal como justificativa para a manutenção da segregação de determinados grupos sociais.
A ausência de parâmetros normativos objetivos permite que sua aplicação se mantenha pautada por fatores subjetivos, reforçando a seletividade racial e socioeconômica do sistema penal. Como resultado, a prisão preventiva, ao invés de preservar sua natureza excepcional, consolida-se como um instrumento de encarceramento em massa que atinge desproporcionalmente indivíduos negros e periféricos.
A manutenção desse cenário exige uma revisão crítica e aprofundada dos critérios que fundamentam a decretação da prisão preventiva, com especial atenção ao papel da ordem pública na legitimação de práticas de exclusão social.
A instrumentalização da prisão preventiva como ferramenta de gestão de corpos racializados precisa ser enfrentada de maneira estrutural, o que demanda tanto uma reinterpretação jurisprudencial mais restritiva quanto uma revisão normativa que elimine a vagueza conceitual que permite sua aplicação discricionária.
[1] INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA – IDDD. O fim da liberdade: a urgência de recuperar o sentido e a efetividade das audiências de custódia. Relatório Nacional, 2019.
[2] AL-ALAM, Caiuá Cardoso. Palácio das misérias: populares, delegados e carcereiros em Pelotas, 1869-1889. 2013. 274 f. Tese (Doutorado em História) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013, p. 129.
[3] MARTIL, Daiana Maturo Dias. Despachos X Escrachos: as representações sociais do encarceramento feminino. 2018. 190 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.
[4] LEÃO, Bernardo Sodré Carneiro; PRADO, Alessandra Rapacci Mascarenhas. A periculosidade na decretação de prisão preventiva por furto em Salvador: controle racial e de classe. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 7, n. 3, p. 1713-1749, set./dez. 2021.