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A reforma da tributação do consumo trazida pela Emenda Constitucional 132 prevê a extinção de PIS, Cofins, ICMS, ISS e IPI, e a criação de um IVA dual, com o IBS, de competência estadual e municipal, e a CBS, federal, além do Imposto Seletivo.
As alterações promovidas até então são apenas no plano constitucional, cabendo às leis complementares e ordinárias regulamentarem o novo sistema, inclusive a estipulação das alíquotas dos novos tributos, entre outras medidas. A EC 132 estipulou um prazo de 120 dias para a proposição dos projetos de tais leis.
Uma vez regulamentado, teremos ainda um longo período de transição de sete anos, com início de vigência do IBS e CBS em 2026 (em fase de teste), ao lado da existência conjunta de ambos os sistemas até a extinção total dos cinco tributos no final de 2032.
A EC 132/2023 também trouxe expressa previsão de reforma da legislação do Imposto de Renda e da tributação da folha de salários, por meio de projetos a serem apresentados pelo Poder Executivo em até 90 dias de sua promulgação (art. 18, incs. I e III).
É evidente, portanto, que esta reforma tributária não diz respeito apenas à tributação do consumo, mas à grande parte da atividade econômica dos contribuintes.
Por sua vez, os contratos de fornecimento de produtos e serviços preveem regras de proteção a situações extraordinárias ou supervenientes que possam implicar na onerosidade excessiva a uma das partes. Trata-se da chamada Teoria da Imprevisão, que permite à parte lesada propor a rescisão do contrato ou a revisão de seu objeto (art. 478 a 480 do Código Civil).
No âmbito tributário, é usual estipular em contratos que a precificação baseou-se no sistema tributário então vigente, e que qualquer mudança significativa poderá implicar pelo menos na revisão de suas cláusulas, de modo a restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Mas como utilizar essa cláusula em contratos que estão sendo agora firmados, em que se sabe de antemão que o sistema tributário vigente começará a mudar a partir de 2026, mas sem que ainda tenhamos condições mínimas de apurar o impacto que se terá?
Não nos parece razoável manter a redação usual dessa cláusula, porquanto já sabemos que nosso sistema atual tem prazo de validade certo e determinado, mesmo que ainda não saibamos que resultado a reforma trará para as empresas em geral. Muito ao contrário, deve-se fazer alusão expressa à iminente mudança do nosso sistema tributário nacional, e que qualquer aumento da carga fiscal gerado pelas novas regras deverá ensejar revisão contratual pelas partes.
A propósito, se considerarmos que as discussões até então mantidas projetaram uma possível alíquota do IVA entre 25% e 27%, é bem provável que a reforma implicará na elevação da carga tributária para alguns setores, notadamente prestadores de serviços.
Mas e os contratos já firmados que possuam longo prazo de vigência, como ocorre, por exemplo, nos projetos de infraestrutura e de concessão pública?
Na esfera privada, não será tarefa difícil demonstrar que a reforma mais significativa do sistema tributário nacional desde sua criação constitui elemento superveniente bastante a possibilitar uma possível revisão contratual. O problema pode residir na metodologia a ser aplicada para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, sobretudo se considerarmos que, como dito, espera-se também mudanças significativas da legislação do Imposto de Renda e da folha de salários.
Para os contratos celebrados com entidades públicas, o recente Projeto de Lei Complementar 33/2024, apresentado no último dia 21 de março, constitui uma importante iniciativa para tratar do tema.
Primeiramente porque, como desde logo estabelece em seu artigo 2º, “nos contratos administrativos, a instituição do IBS e da CBS constitui evento extraordinário de desequilíbrio econômico-financeiro cujo risco é alocado à Administração Pública”, devendo ser recomposto em favor desta ou do contratado, conforme o caso. Trata-se assim de uma importante positivação de que a reforma tributária qualifica-se sim como elemento imprevisível e extraordinário a possibilitar revisão contratual.
Além disso, esse projeto busca oferecer métodos e critérios para a almejada recomposição da parte lesada, o que, guardadas as devidas peculiaridades de cada esfera, poderá pelo menos servir de base para discussões nos contratos privados.
Enfim, neste momento em que se tem apenas uma certeza (de que a reforma tributária está posta) e muitas indefinições (qual será o impacto fiscal do novo regime), aliadas à previsão de um complexo período transitório de coexistência de dois regimes por sete anos, é mais que primordial que profissionais das áreas econômico-financeira e jurídica das empresas trabalhem em estreita sintonia, para minimizar ou neutralizar eventual onerosidade que a reforma tributária poderá trazer.