No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

pensamento do dia

Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

A elegibilidade de Bolsonaro e o papel do STF

Spread the love

Terminada a eleição para as mesas diretores da Câmara dos Deputados e do Senado, as atenções agora se voltam para as relações entre o Legislativo e o Judiciário. Entre outros motivos, porque a bancada da extrema direita, antevendo que o Supremo Tribunal Federal manterá a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro no pleito de 2026, anunciou que tentará acelerar a votação de um projeto de mudança na Lei Complementar 135, mais conhecida como Lei da Ficha Limpa.

O objetivo desse projeto, que está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara e tem um deputado bolsonarista como relator, é reduzir a pena por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação de oito para dois anos.

Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias do JOTA e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email

Com isso, o ex-presidente – declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em junho de 2023 – poderia ser candidato, independentemente dessa condenação. A decisão foi tomada depois que a cúpula do bolsonarismo se conscientizou de que dificilmente a anistia aos golpistas do 8 de janeiro de 2023 – expediente para incluir Bolsonaro na lista de perdoados – será aprovada.

A tentativa de abrandar as punições da Lei da Ficha Limpa, em vigor desde 2010, foi justificada por parlamentares bolsonaristas com base no argumento de que “a inelegibilidade por dois anos seguintes ao pleito eleitoral seria uma sanção mais do que suficiente para os fins que se almeja a inelegibilidade” prevista por esse texto legal.

Essa iniciativa é mais uma demonstração do pragmatismo e do cinismo que sempre marcaram o bolsonarismo e foram o fio condutor tanto do seu desgoverno, gerando graves tensões políticas e sociais, quanto da tentativa de derrubar seu sucessor por meio de um fracassado golpe de Estado, no dia 8 de janeiro de 2023.

O desejo de alterar a regra do jogo, mediante o expediente da redução do tempo de condenação, mais uma vez deixa claro que a extrema direita brasileira continua não conseguindo jogar com as regras do jogo político estabelecidas pela Constituição. Com isso, o risco de mais problemas e crises mais uma vez reafirma o ditado de que no Brasil, em decorrência de sua histórica insegurança jurídica, até o passado é incerto.

Se o Congresso vier a aprovar o projeto de lei que permita a Bolsonaro candidatar-se em 2026, a segurança do Direito certamente estará ameaçada. Para justificar essa estratégia irresponsável, deputados e senadores da extrema direita certamente invocarão o direito de iniciativa legislativa que a Constituição lhes concede. Contudo, nada impedirá que sejam impetradas arguições de inconstitucionalidade da redução da pena no STF, a corte encarregada de zelar pela ordem constitucional do país.

Se ela cumprir com isenção e firmeza o papel que lhe cabe, derrubando a artimanha jurídico-legislativa da bancada bolsonarista, a extrema direita voltará ao que sempre fez nos últimos anos.

Em primeiro lugar, acusará a corte de exacerbar o exercício de suas funções de controle da ordem constitucional. Em segundo lugar, apresentará PECs com o objetivo de restringir competências do Supremo. Em terceiro, tentará estabelecer novas condutas passíveis de impeachment de seus 11 ministros. E, em quarto lugar, estimulará os colunistas dos jornais e as plataformas digitais que a apoiam a mobilizar a sociedade contra “a ditadura do Judiciário”.

Diante dos riscos de crise institucional advindos de um cenário como esse, é importante reler a Constituição, principalmente no seu capítulo legislativo. Preciso e objetivo, ele define os casos em que o poder constituinte derivado – as duas casas que compõem o Congresso Nacional – não pode aprovar determinadas restrições impostas pelo poder constituinte originário, ou seja, o texto produzido pela Assembleia Constituinte que foi promulgado em 1988. Este é um poder inicial, soberano e autônomo, enquanto o poder constituinte derivado é subordinado, limitado e condicionado.

Dito de outro modo, a Constituição impôs limitações e restrições com relação às possibilidades de alteração de determinados mandamentos constitucionais. Tais mandamentos não podem ser modificados, alterados ou mudados em qualquer circunstância e sob qualquer justificativa. E, em seu parágrafo 4ª, inciso III, o artigo 60 é taxativo ao afirmar que não serão objeto de deliberação pelo Congresso de PECs destinadas a abolir ou a ameaçar a separação de Poderes.

Em bom português, mesmo que a extrema direita consiga aprovar casuísmos legislativos que tornem Bolsonaro elegível no pleito de 2026, quem dará a última palavra sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade sobre eles será o próprio STF. Nas democracias consolidadas, as cortes encarregadas de promover o controle da constitucionalidade têm competência legal para declarar a inconstitucionalidade de PECs aprovadas pelo Legislativo.

Nesse sentido, desde a entrada em vigor da Carta de 1988 foram muitos os ministros do Supremo que, em seus votos:

  1. explicitaram que a Constituição é uma norma estruturante, dotada de força vinculante para os órgãos governamentais e para o próprio Legislativo;
  2. enfatizaram que, por esse motivo, as PECs têm limitação e restrições em seu poder reformador;
  3. admitiram a hipótese de declaração de inconstitucionalidade de Emendas Constitucionais aprovadas pelo Congresso; e
  4. deixaram claro que quem tem a prerrogativa zelar pelo controle de constitucionalidade das leis, e, por consequência, barrar reformas ou alterações que afrontem o processo legislativo constitucional são os 11 ministros da corte, e ninguém mais.   

Por isso, com o objetivo de tentar reduzir as penalidades da Lei da Ficha Limpa para reabilitar a participação de Bolsonaro no próximo pleito presidencial, a extrema direita nada mais está fazendo do que criar novas tensões institucionais. É só isso que o bolsonarismo sabe fazer.    

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *