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O cenário econômico brasileiro tem sido marcado por importantes iniciativas governamentais que visam tanto o desenvolvimento da indústria nacional quanto a promoção das exportações. Dois marcos recentes destacam-se nesse contexto, o Decreto 11.964/2024, que estabelece critérios para emissão de debêntures de infraestrutura, e a Nova Indústria Brasil (NIB), política industrial anunciada em janeiro de 2024.
Apesar de terem abordagens distintas em temática e em modo de funcionamento, que, inclusive, se complementam em alguns aspectos, os dois marcos citados refletem a busca pelo fortalecimento de setores estratégicos da economia brasileira, que se mostram cada vez mais necessários para o crescimento da infraestrutura brasileira, corroborando com o interesse público.
No presente artigo, o Decreto 11.964/2024, que regulamentou as condições para o enquadramento de projetos de infraestrutura como prioritários para fins de emissão das novas debêntures de infraestrutura, criadas em janeiro pela Lei 14.801/2024, será abordado minuciosamente.
Promulgado no dia 27 de março, o referido decreto atualiza os parâmetros para o enquadramento de projetos de investimento cujo financiamento seria obtido mediante ofertas de debêntures incentivadas, criadas pela Lei 12.431/2011, as quais, desde junho do ano da sua edição, são responsáveis por captações que excedem, até o presente momento, o montante de R$ 200 bilhões.
Definição e enquadramento de projetos prioritários
De acordo com o Decreto 11.964/2024, tais títulos podem ser emitidos de forma exclusiva pelos titulares de projetos de infraestrutura, dentre os quais vale as concessionárias, as permissionárias, as autoritárias ou as arrendatárias e os controladores dessas mencionadas, desde que estejam estruturados na forma de sociedades por ações – caracterizadas como sociedades de propósito específico.
As diretrizes de qualificação delineadas no decreto são aplicáveis para a identificação de projetos prioritários, tanto para fins da emissão de Debêntures Incentivadas (que oferecem isenção de imposto de renda aos debenturistas), quanto para a emissão de Debêntures de Infraestrutura (que proporcionam uma dedutibilidade adicional ao emissor).
Além disso, para um mesmo projeto de investimento considerado prioritário, é possível emitir tanto Debêntures Incentivadas quanto Debêntures de Infraestrutura, contanto que o total dos recursos captados não ultrapasse o limite das despesas de capital relacionadas ao projeto (i.e., uma debênture não pode ser ao mesmo tempo “incentivada” e de “infraestrutura”).
Essa regra não deve ser confundida com a acumulação de benefícios fiscais previstos nas Leis 12.431/2011 e 14.801/24 em uma única debênture, o que é explicitamente proibido pelo decreto.
O compromisso do governo em garantir maior celeridade no enquadramento de projetos de infraestrutura foi demonstrado pela promulgação do decreto, apesar de não ter tido êxito em esclarecer completamente o funcionamento desses processos na prática.
A delimitação de setores de infraestrutura prioritários, para fins da lei que criou as debêntures incentivadas, foi estabelecida por uma inovação positiva em relação ao decreto regulamentador revogado[1], dada pela criação de um rol taxativo de setores passíveis de enquadramento na área de infraestrutura.
Esses setores são:
Os critérios e as condições complementares para enquadramento nos setores prioritários, que admitem, inclusive, a limitação do enquadramento à determinados subsetores ou tipos específicos, serão estabelecidos nas portarias ministeriais setoriais específicas de cada ministério responsável pela área classificada como prioritária.
Atração de investidores estrangeiros
Outra inovação da debênture de infraestrutura, que não era presente na emissão de debêntures incentivadas, envolve a possibilidade de realização da emissão com cláusula de variação cambial. Isso garantirá a facilitação na captação de recursos junto a investidores estrangeiros, viabilizando a atração de outros players internacionais para o mercado brasileiro, o que, por consequência, aumentará a concorrência no setor e garantirá a melhora na prestação desses serviços.
Ademais, a Lei 14.801/24 faz uma ressalva quanto à aquisição desse tipo de debênture por pessoas ligadas ao emissor, inclusive residentes ou domiciliadas no exterior, na medida em que apenas autoriza a emissão por meio de ato do Ministério da Fazenda, que certificará que a aquisição seja realizada em conexão com a emissão e a colocação no exterior de títulos a elas relacionados.
Tal fato fará com que um ministério do Executivo federal, diretamente responsável pelo auxílio na governabilidade da Presidência, ateste a conformidade da emissão na exceção prevista pelo decreto.
Por um lado, a aprovação por meio de ato do Ministério da Fazenda pode ser boa pois garante maior celeridade na autorização da hipótese de exceção. Noutro lado, pode ser alvo de duras críticas quanto à lisura do procedimento, ao passo que as alegações envolvendo o aparelhamento das empresas com a Presidência serão exploradas pelos opositores do governo, atrasando a efetivação da emissão das debêntures e dos valores arrecadados aos projetos de infraestrutura.
Já as previsões do decreto relativas à prioridade na avaliação do requerimento de registro de oferta pública pela CVM e nos trâmites para aprovação prévia dos projetos nos ministérios setoriais, apenas serão conferidas com a comprovação, por meio de relatório de avaliação técnica específica, que ele é capaz de proporcionar benefícios ambientais ou sociais relevantes no âmbito da sua realização (ou para além dessa).
Por fim, com objetivo de evitar conflitos legais envolvendo as debêntures incentivadas emitidas com base no Decreto 8.874/16, foram dispostas regras de transição, as quais estabelecem que as portarias setoriais referentes às debêntures incentivadas editadas com base no decreto revogado permanecem vigentes naquilo que não conflitarem com o disposto no novo decreto aqui mencionado.
Os projetos já aprovados por meio de portaria ministerial, que não se enquadrarem nos critérios e nas condições estabelecidas no Decreto 11.964/24, poderão ser objeto de emissão de novas debêntures incentivadas no prazo de 90 dias, contados a partir da data de publicação do decreto ora analisado.
Conclusão
Percebe-se que a edição da Lei 14.801/24, regulamentada pelo Decreto 11.964/24, é de extrema importância para as operações de financiamento de longo prazo em projetos de investimento no país, uma vez que as referidas normas não apenas modernizam as condições aplicáveis a instrumentos de captação de sucesso (tais quais as debêntures incentivadas criadas pela Lei 12.431/2011/2011), como ainda criam opções de funding para tais projetos, por meio das debêntures e bonds de infraestrutura.
Também é notável a preocupação da norma regulamentadora em assegurar a possibilidade de investimentos estrangeiros nos projetos de infraestrutura nacionais, além de tentar garantir, ao máximo, um ambiente tranquilo e seguro para as debêntures incentivadas e suas disposições feitas pelas portarias setoriais.
[1] Decreto 8.874/16