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Uma complexa investigação policial, com inúmeras diligências documentadas em mais de oito meses de interceptações telefônicas e provas contundentes da formação de uma verdadeira organização criminosa com sede na capital potiguar. É o que consta na denúncia feita pelo Ministério Público Federal, em 393 páginas, que aponta 54 pessoas como participantes do maior esquema de tráfico de drogas da história do Rio Grande do Norte. Crimes? Remessas de pelo menos 8 toneladas de cocaína para a Europa, Ásia e África a partir dos portos de Natal e Areia Branca, no Rio Grande do Norte, e de outros terminais brasileiros, constituindo participação em organização criminosa, associação para o tráfico de entorpecentes e tráfico internacional de entorpecentes.
Com exclusividade ao Diário do RN, o procurador da República Fernando Rocha de Andrade explicou que o MPF aguarda, já para as próximas semanas, que a Justiça Federal indefira os pedidos de diligências suplementares feitos pela defesa dos suspeitos e que a denúncia seja acatada em sua integralidade, o que viabilizará o julgamento dos envolvidos ainda neste primeiro semestre. Se isso acontecer, os 54 denunciados serão levados ao banco dos réus. Em caso de condenação, a pena pode chegar a 26 anos de prisão para cada integrante, incialmente em regime fechado.
É, sim, o maior esquema de tráfico internacional de drogas envolvendo uma organização criminosa instalada em Natal, e cuja finalidade era enviar cocaína para a Europa, destacou o procurador.
No curso da investigação, além das expressivas apreensões de cocaína no Porto de Natal, também foram identificadas apreensões nos portos de Barcarena/PA, Mucuripe/CE, Salvador/BA e Santos/SP, totalizando 8 toneladas de entorpecentes. No outro extremo da rota internacional da droga, apreensões também foram registradas em portos europeus, tendo os terminais marítimos de Amsterdã e Roterdã, na Holanda, como os principais destinos.
Um galpão, dentro de uma chácara em São José de Mipibu, na Grande Natal, também era utilizado como ponto de apoio para a quadrilha. Lá, os criminosos recebiam caminhões e carretas transportando contêiners carregados de mercadorias de exportação, como frutas e legumes, e faziam a contaminação da carga. O processo era simples: violar os contêiners e rechear as mercadorias com cocaína. Isso foi feito em limões, gengibres, mangas, melões e melancias.
Depois que a droga era camuflada em meio aos produtos, os contêiners eram novamente fechados com lacres clonados. Depois, os veículos seguiam para o Porto de Natal, de onde os contêiners embarcavam para a Europa. Detalhe: os contêiners possuíam termógrafos, que são dispositivos eletrônicos capazes de medir e gravar a temperatura das mercadorias. Para que os equipamentos não registrassem alterações na temperatura da carga, os bandidos colocavam sacos de gelo sobre os aparelhos.
Ainda no RN, após a apreensão de caminhões e carretas, a quadrilha tentou diversificar o modo de operar. A ideia era utilizar uma lancha para fazer a droga chegar até os cargueiros. A pequena embarcação deveria se aproximar de um navio para que bolsas com drogas fossem arremessadas para os tripulantes, que deveriam içá-las e escondê-las em um contêiner. Não deu certo. Antes que a lancha zarpasse pelo Rio Potengi, policiais federais prenderam três homens na praia da Redinha, próximo ao antigo ponto das balsas. O trio foi flagrado com mais de 380 quilos de cocaína.
Ao mesmo tempo em que foram realizadas as apreensões no RN, a quadrilha também operou nos estados do Pará (onde drogas era enxertadas em cargas de madeira), Ceará, Salvador e São Paulo, com interceptações de cargas nos países europeus de destino, como Bélgica, França e Holanda.
À época, inclusive, a PF confirmou que já sabia da existência do transporte de drogas pelo ar – caso em que o entorpecente é levado na bagagem ou preso ao corpo de passageiros de aviões. O trajeto marítimo, no entanto, foi considerado novidade, de acordo com Delegacia Regional de Investigação e Combate ao Crime Organizado da PF no RN.
Duas grandes apreensões foram feitas em fevereiro de 2019, as primeiras da história do Porto de Natal, aberto em 1932. Nunca uma operação policial havia descoberto drogas no terminal.
Ainda segundo a Polícia Federal, o tráfico marítimo entre Natal e a Europa ocorria sempre de forma semelhante. Primeiro, a cocaína era embalada em tabletes. Depois, tudo é escondido em meio a carregamentos de frutas — que são exportadas dentro de contêineres — que por sua vez atravessam o Oceano Atlântico em navios cargueiros.
Além de desembarcarem em Amsterdã ou Roterdã, muitas vezes os contêineres também eram descarregados no Porto de Antuérpia, na Bélgica. Neste último, em 2018, a polícia local chegou a apreender 50 toneladas de drogas. Ainda não se sabe se esta droga em particular partiu da capital potiguar.
O procurador da República reforça que os criminosos em questão são traficantes internacionais. O objetivo é fazer um negócio cada vez mais lucrativo, concluiu.