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Jornal de Santa Catarina, 1983.Pesquisa feita no Arquivo Público de Blumenau.
Na semana passada relatei o início do enfrentamento de um embaraçoso problema que encontrei na Secretaria da Administração: o pessoal que tinha cargo de confiança, mas não queria ou não podia comparecer ao local de trabalho.
Um assessor sem mesa.
Havia diversos casos de gente que constava da folha de pagamento da Secretaria, mas não desempenhava suas funções regulamentares, seja pela distância de sua moradia, seja por ter outras ocupações particulares, ou, também, porque a pessoa tinha sido designada, para o exercício de outras atividades fora da Secretaria. Muitas dessas situações eu resolvi pessoalmente, conversando com os interessados, outras (deste e muitos outros tipos) foram equacionadas pelo Secretário-Adjunto Carlos Wolowsky Mussi e pelo Assessor Especial Antônio Carlos Kieling.
Além da já relatada situação do lendário cabo eleitoral Funga-Funga, outro caso exigiu minha particular atenção: o de Roberto Biguaçu. Ele era um personagem muito conhecido em Florianópolis. Batizado com o nome de Abrão Francisco Roberto da Silva, ficou conhecido como Roberto Silva no seu tempo de vereador no município ao qual devia seu cognome. Mais tarde passou a ser chamado de “Roberto Biguaçu”.
Para todos os efeitos legais, também ele tinha um cargo em comissão na SEA. Mas, ninguém sabia onde, fisicamente, ele trabalhava. Circulava por muitos lugares do Governo, mas não, necessariamente, onde ele estava lotado.
A explicação do caso, sem rodeios.
Biguaçu com o sorrisão que abria todas as portas. Foto cedida por sua irmã, Izabela Silva.
A conversa foi muito franca. Biguaçu disse que não cumpria atribuições convencionais dentro da Secretaria da Administração. Prestava serviços ao Governador e a muitas pessoas do Governo, mas não sabia a razão pela qual fora nomeado para um cargo especificamente ali. Mas, se fosse do meu interesse, ele estava disposto a ser um assíduo e pontual assessor.
Explicou que sua especialidade era o contato pessoal com pessoas do Governo, todas, do mais simples funcionário até o Governador Esperidião Amin de quem era amigo pessoal. Privava, igualmente, do convívio de Jorge Bornhausen. Sugeriu-me, então, que ele passasse a ser um assessor exclusivo do Secretário, capaz, se necessário, de entregar pessoalmente um documento meu, uma mensagem, na mão do Governador ou de qualquer autoridade dos três poderes do Estado.
Ele não necessitava de pedidos de audiência, horários pré-determinados: iria direto ao destinatário, entraria no seu gabinete e colocaria o objeto da tarefa na mão apropriada. Sem perda de tempo. Para tanto, não precisava de mesa. Quando estivesse na Secretaria, ficaria na antessala do Secretário aguardando instruções. Em qualquer outro momento receberia as missões pelo telefone. E assim foi.
Meu adido para contatos importantes.
Roberto Biguaçu com o jornalista Cacau Menezes. Foto cedida pela irmã de Biguaçu, Izabela Silva.
Biguaçu tornou-se um imprescindível auxiliar. Cumpriu suas incumbências com presteza admirável. Tivemos uma convivência fraternal.
Na sua carreira, sempre como um colaborador especial de quem o tinha a seu ofício, ele trabalhou também com o Governador Esperidião Amim, foi Chefe de Gabinete do Deputado Estadual Júlio Garcia, e esteve a serviço de Jorge Bornhausen no Senado e na Casa Civil da Presidência da República. Roberto Biguaçu faleceu em fevereiro de 2009.
Um eficiente método de obter folgas remuneradas.
Jornal de Santa Catarina, 1983.Pesquisa feita no Arquivo Público de Blumenau.
Outro exemplo da flexibilidade das regras na Secretaria da Administração era a abundância de licenças para tratamento de saúde concedidas aos funcionários públicos do Estado. O setor de Perícia Médica da Secretaria era extremamente generoso, e certamente muito descuidado, na liberação do comparecimento ao trabalho por supostos problemas médicos.
Na avaliação que fizemos, era um assombro a quantidade de horas não trabalhadas devido à frouxidão nos critérios, se é que algum critério era levado em conta. Eram frequentes os casos em que funcionários de órgãos sediados na Capital enviavam à Perícia seus pedidos de licença para tratamento de saúde através de office-boys. E eles retornavam com a solicitação atendida, sem dificuldade. Simplesmente não havia qualquer tipo de exame.
O milagre do Dr. Cantição.
Saí, então, em busca de um novo Chefe da Perícia suficientemente rigoroso para estancar essa sangria. Pergunta daqui e de lá, afinal apareceu alguém que me parecia adequado naquela emergência. Foi-me indicado o Dr. Mário Cantição que tinha experiência pretérita em função semelhante no INSS. Quando indaguei se ele era realmente escrupuloso na avaliação de casos de licença, o interlocutor me disse que ele era bem mais do que isso, ele era inflexível. E que tinha angariado a folclórica fama de que só concedia licença “mediante apresentação do atestado de óbito”.
Pronto. Indicação aprovada, convite feito e aceito, Cantição nomeado. E, como um milagre, no mês seguinte já tinham caído para menos de 10% a quantidade das licenças concedidas.
Próximo capítulo.
Semana que vem prossigo nas agruras da correção de rumos na Secretaria. Os caroços seguintes foram no Instituto de Previdência do Estado, o IPESC, e no Departamento Estadual de Compras. Dureza. Mas, com a gente talentosa que consegui levar para a SEA, foi possível botar esses dois importantes setores nos trilhos certos.