A criação do Sistema Único de Segurança Pública

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O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, reacendeu o debate acerca da implementação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) na Constituição Federal. A proposta não é nova, e o objetivo não orbita apenas em equiparar a segurança pública à saúde, mas sim, em ter acréscimo no orçamento – hoje a previsão confere uma parcela da arrecadação com a loteria repassada pela Caixa Econômica Federal – e, a partir daí, ter outras medidas não especificadas ou detalhadas pelo ministro.

Importante destacar que não se trata da criação do SUSP, mas sim, de sua previsão constitucional. A Lei 13.675, de 11 de junho de 2018, já criou o Sistema Único de Segurança Pública no qual o integram as polícias federal, rodoviária federal, civil, militar, corpo de bombeiros militares e guardas municipais. Logo, a integração das polícias já existe, o que falta são mecanismos que propiciem uma aplicação prática da medida e, segundo o ministro Lewandowski, a solução é a constitucionalização.

A Segurança Pública é um dos assuntos que permeia o cotidiano do brasileiro, em especial, a insegurança. Assim, o Sistema Único pode produzir melhora na sensação de medo e intranquilidade da sociedade, afinal, sobre a questão, de fato, temos pontos positivos e, também, traremos pontos negativos a destacar.

A segurança pública é tema sensível para a população brasileira. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais da metade das pessoas se sente intranquila e com medo de andar sozinha à noite nas ruas. Na região Sudeste, por exemplo, o receio da insegurança motivada por roubos e furtos contribuiu para a formação da maior frota automotiva de blindados no mundo, superior a países mais violentos que o Brasil, como o México.

Números divulgados pela Associação Brasileira de Blindagem (Abrablin) demonstram que, em 2023, 29.296 veículos foram blindados, um aumento de 13% em comparação ao ano anterior. Hoje, a frota blindada estimada no Brasil é de quase 340 mil carros. O estado de São Paulo é responsável por quase 85% dos veículos blindados em 2023, com mais de 23 mil veículos blindados no período.

O ministro tem feito uma analogia entre o Sistema Único de Saúde (SUS), seus investimentos e a carência para a segurança pública. A comparação é valida e se aplica, também, em termos de recursos.

O Brasil, a 9ª economia global, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, gastou 1,6% de seu PIB em Segurança Pública em 2022, isto é R$ 171 bilhões, aparentemente um valor elevado, contudo, representa um terço do que se gasta com saúde pública.

Em 2024, o Congresso Nacional destinou, até o momento, 66% de suas Emendas parlamentares na saúde, o que implica no montante de R$21,2 bilhões. Enquanto para a segurança pública e justiça foram destinados apenas R$1,5 bilhão.

A proposta de se constitucionalizar o Sistema Único de Segurança Pública perpassa pela possibilidade de um orçamento próprio e o claro incremento de recursos para a pasta. Ademais, outros benefícios podem ser decorrentes dessa constitucionalização, desde que seja criado e desenvolvido um plano nacional de segurança pública. E aqui avultamos dois pontos sensíveis que podem e devem ser modificados: tecnologia e o déficit das polícias.

O Ministério da Justiça e da Segurança Pública tem sob sua égide as polícias  Federal e Rodoviária Federal, Federal Penal e a Força Nacional e tem sido frequentes os resultados positivos que o investimento em inteligência produz, como por exemplo: desmantelamento de operações do crime organizado transnacional, apreensão de drogas, enfrentamento ao comércio clandestino de tabaco, apreensão de armas ilegais dentre outros.

Quando se investe na prevenção e, concomitantemente, é feito um trabalho de inteligência os resultados, em geral, produzem efeitos que impactam nas atividades criminosas. No entanto, para se ampliar os efeitos se faz necessário desenvolver e melhor equipar nossas polícias com um banco de dados unificado nacional.

As polícias não têm um controle nacional preciso acerca de mandados de prisão, delitos praticados e a integração é ruim ou inexistente, o que produz distorções e problemas como, por exemplo, uma pessoa ser procurada por assassinato em um estado e não o ser em outros por desconhecimento.

O Sistema Único de Segurança Pública e a questão do banco de dados também pode propiciar o conhecimento real da população carcerária brasileira, pois, atualmente há clara disparidade entre os números do Ministério da Justiça e Segurança Pública, do Conselho Nacional de Justiça  e da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen).

Destarte que o investimento em tecnologia poderá otimizar o trabalho das polícias e aprimorar o controle do universo prisional. Mas, não só, porque também possibilita às polícias a capacidade de desenvolver e aprofundar o trabalho de inteligência, fiscalização de portos e aeroportos e obter novos instrumentos de rastreio do dinheiro do crime organizado em conjunto com outros setores da própria pasta, já que o Ministério da Justiça e Segurança Pública também é responsável pela secretaria de segurança nacional, de direitos digitais, além da realização de acordos de cooperação internacional com outros países.

No tocante ao déficit das polícias também se faz necessário corrigir a falta de material humano nas polícias federal e rodoviária federal e, por conseguinte, aprimorar e melhorar o sistema de inteligência e fiscalização nas rodovias, em especial, para minorar o roubo de carga que aflige o comércio brasileiro com perdas anuais que tem superado R$ 1 bilhão. Além disso, enfrentar problemas dela decorrentes como a sonegação de impostos, pirataria, descaminho, desvio de combustíveis, gás, dentre outros.

Após destacar os benefícios que o Sistema Único de Segurança Pública pode promover, agora, traremos as dificuldades. E a primeira delas é a necessidade de uma alteração da Constituição Federal de 1988 para que o mesmo possa ser instituído, com previsão de sua regulamentação a cargo da União. 

O artigo 144, o único que trata do tema segurança pública, confere poderes aos Estados com as Polícias Militar e Civil e aos municípios com as guardas municipais. Caso haja uma alteração, a implementação da competência caberá a União com a criação de diretrizes para a segurança pública, em conformidade com o artigo 23 da Constituição, que prevê a competência para a implementação conjunta com o Distrito Federal, estados e municípios.

Outra dificuldade é que o SUSP já existe desde 2018 e não foi criada, até o momento, uma política nacional de segurança pública. Logo, a dificuldade seria a falta de orçamento ou de interesse do governo federal? O Congresso Nacional tem endurecido frequentemente as leis penais a fim de conferir mais segurança à sociedade brasileira, porém, o tema segurança pública é de interesse nacional, estadual, municipal e é dever do Estado democrático de Direito conferir e assegurar a segurança para a população. Será que o governo federal tenta se imiscuir de sua responsabilidade e transfere para a não previsão constitucional algo que já poderia ter sido efetivamente implementado?

Claro está que o cenário da segurança pública atual é negativo e se faz premente mudanças nacionais, o Sistema Único de Segurança Pública é bem-vindo desde que acompanhado de instrumentos que o efetivem na prática, que transcendem a questão constitucional, como investimentos em tecnologia, redução no déficit das policias, trabalho na inteligência e, principalmente, na criação, elaboração e implementação do plano nacional de segurança pública para uma atuação conjunta do governo federal com os estados e municípios. 

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