No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

A hora da virada: como 2024 se tornou o ano das bets

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Não é nenhum segredo que brasileiro é fanático por futebol. Essa paixão nacional movimenta milhares de pessoas, de todas as faixas etárias, a acompanhar semanalmente os resultados dos seus times do coração em campeonatos. A ligação profunda do brasileiro com o esporte foi um prato cheio para que os sites de apostas esportivas (as populares bets) encontrassem um mercado cativo em terras nacionais.

As apostas online tiveram um crescimento alarmante no começo dos anos 2020, especialmente durante a pandemia, o que torna premente a regulação do tema de forma mais adequada, tornando o mercado mais seguro e estruturado. Os gastos de brasileiros com jogos e apostas online atingiram cerca de US$ 11,1 bilhões entre janeiro e novembro do ano passado, o equivalente a R$ 54 bilhões.[1]

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Diante deste cenário, o governo brasileiro se viu obrigado a apresentar novas medidas de regulamentação para o crescente mercado de apostas online – um trabalho hercúleo que teve início em 2024, mas ainda tem um caminho a ser percorrido.

Com a promulgação da Lei 14.790/2023, que estabelece a regulamentação das apostas de quota fixa, a Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda (SPA/MF) divulgou, durante o ano de 2024, diversas portarias com o intuito de dar continuidade à agenda regulatória relacionada à exploração comercial desse tipo de loteria, amplamente conhecida como apostas esportivas.

As duas primeiras publicações da agenda regulatória da SPA/MF já endereçaram a seriedade do trabalho que estava sendo desenhado pelo governo federal: foram definidos de antemão os requisitos técnicos e de segurança que os sistemas deveriam apresentar aos apostadores – a começar pela obrigatoriedade de manterem o sistema de dados em terras brasileiras (como forma de facilitar o controle das operações e evitar prejuízos aos apostadores) e a obrigatoriedade de todas as plataformas serem certificadas por empresas certificadoras reconhecidas pelo governo (Portaria 722/24).

A Portaria 615/2024, por sua vez, definiu as primeiras regras gerais a serem observadas nas transações de pagamento realizadas por agentes autorizados a operar a modalidade lotérica de apostas de quota fixa em território nacional. Com esse regulamento, o Ministério da Fazenda buscou detalhar as disposições aplicáveis às atividades de pagamentos no setor das apostas online, versando sobre as estruturas de contas, meios de pagamento vedados e outros requisitos relativos ao tema.

A criação de regras mais rígidas (como a impossibilidade de empresas não autorizadas pelo Banco Central ofertarem contas transacionais para fazer aportes de apostas ou receber valores) já afunilou as operações de empresas que não atendiam as regras de compliance bancário, o que, novamente é benéfico aos apostadores que corriam o risco constante de perderem o valor de prêmios em contas oferecidas por empresas irregulares.

Em maio começaram de vez os jogos: a SPA/MF publicou a Portaria 827/2024, estabelecendo as regras e condições a serem atendidas por todas as empresas que tenham interesse na obtenção de autorização junto a SPA/MF para exploração comercial das apostas de quota fixa por agentes privados.

Considerando as regras e diretrizes gerais estabelecidas na Lei 14.790/2023, a Portaria 827 trouxe a iniciativa da SPA de não só permitir a prestação dessa modalidade lotérica por novos interessados, mas também regularizar as pessoas jurídicas que já exploravam a atividade antes da publicação da referida lei federal.

Em consonância com o que determina o parágrafo único do artigo 9º da Lei 14.790/23[2], a Portaria 827 fixou o prazo até 31 de dezembro de 2024 para que as empresas que já atuavam no setor obtenham a autorização e evitem as penalidades que passarão a existir a partir de 1º de janeiro de 2025.

Para as empresas que apresentaram o pedido de autorização nos primeiros 90 dias a contar da publicação da Portaria 827/2024, a SPA deverá emitir a autorização até 31 de dezembro de 2024, desde que sejam cumpridos todos os requisitos legais e regulamentares[3].

Após a apresentação dos requisitos formais aplicáveis a todas as empresas, o mercado entrou em polvorosa e começou a corrida em direção à adequação: empresas estrangeiras correram para regularizar operações no Brasil; empresas nacionais começaram a adequar suas operações para preencher todos os requisitos, todos contando com o prazo de adequação até o final de 2024.

A surpresa veio em setembro, com a publicação da Portaria 1.475/2024, que estabeleceu novas exigências para a participação de empresas no período de transição da regulamentação das apostas esportivas, além de determinar regras para a descontinuação das operações de empresas que não cumprirem essas condições.

A portaria dispôs que apenas as empresas em atividade que tenham protocolado o requerimento de autorização junto à SPA/MF até a data de sua publicação seriam consideradas em período de adequação – em outras palavras: foi criado um novo período de adequação.

A análise sobre o enquadramento das empresas nesse período teve início em 1º de outubro de 2024, data a partir da qual ficou proibida a exploração de apostas de quota fixa por empresas que não possuíam autorização da SPA/MF ou que não tenham solicitado essa autorização até 17 de setembro de 2024.

Essa discordância gerou um grande desconforto para diversas empresas que estavam no processo de atendimento de todas as exigências necessárias para regulamentação de suas atividades e diante da nova portaria, se viram impedidas de exercerem suas atividades até a conclusão definitiva do processo administrativo de licença.

O impasse, inclusive, desencadeou o ajuizamento de demandas judiciais discutindo a regulamentação e a legitimidade das alterações trazidas pela Portaria 1.475, onde algumas empresas já obtiveram, inclusive, decisões favoráveis para continuarem autorizadas a funcionar até 31 de dezembro de 2024, nos termos da Lei 14.790/23 e da Portaria 827.

Mas 2024 não foi só marcado por discussões sobre prazo e legitimidade: a Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda também publicou ao longo do ano outras portarias que buscaram abarcar todas as questões envolvidas no processo regulatório das apostas de quota fixa.

A Portaria 1.143/2024 trouxe mais um passo importante na regulamentação da exploração comercial das apostas esportivas ao definir os procedimentos e os controles internos que devem ser implementados pelos operadores de apostas para prevenir a lavagem de dinheiro, conforme previsto na Lei 9.613/1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro), além de combater o financiamento ao terrorismo, a disseminação de armas de destruição em massa (PLD/FTP) e outros crimes relacionados.

Já as Portarias 1.225/2024 e 1.233/2024 regulamentaram o monitoramento e fiscalização das apostas de quota fixa e dos agentes operadores de apostas, estabelecendo o rito dos processos administrativos sancionadores, as diretrizes das fiscalizações e demais questões envolvidas nas obrigações das empresas que pretendem atuar no ramo.

Diante do crescimento expressivo do mercado de apostas esportivas no Brasil, a regulamentação dessa atividade tornou-se indispensável não somente para assegurar transparência, controle e segurança jurídica, mas também para criar mecanismos capazes de defender os usuários do serviço – o que significa, inclusive, proteger os mais vulneráveis.

A Portaria 1.231/24 trouxe as diretrizes e regras para publicidade nas comunicações de marketing. O Conar, por sua vez, detalhou no Anexo X as regras para a publicidade de apostas, e o Supremo Tribunal Federal determinou a aplicabilidade imediata da vedação de qualquer publicidade de jogos de aposta que tenham crianças e adolescentes como público-alvo, bem como a adoção imediata de medidas que restrinjam o suo de recursos de programas sociais (como Bolsa Família) para apostas online[4].

A adequação da propaganda como forma de proteção aos menos vulneráveis não foi a única medida adotada pelo governo: a Portaria Interministerial MF/MS/MESP/Secom 37, de 6 de dezembro de 2024 criou um grupo de trabalho composto por membros dos Ministérios da Fazenda, Saúde, Esporte e Secretaria de Comunicação Social com a finalidade de formular e planejar ações de prevenção, redução de danos e assistência a pessoas e grupos sociais em situação de comportamento de jogo problemático persistente e recorrente ou vulneráveis ao problema – também conhecido como ludopatia, um sério problema de saúde pública, como tantos outros vícios.

O setor de apostas no Brasil em 2024 apresentou avanços importantes no campo da regulação e da segurança, ao mesmo tempo em que enfrentou desafios ligados à ética e ao controle social. A Lei 14.790/2023 e as portarias subsequentes da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda representam um esforço para disciplinar o setor, estabelecendo normas claras e promovendo a integridade das operações.

Apesar da maior transparência trazida pela nova regulamentação, alguns os desafios regulatórios e as discordâncias, como as trazidas pela Portaria 1.475/2024, evidenciam a complexidade desse processo e reforçam a necessidade de um equilíbrio entre a regulação eficiente e o respeito às disposições legais.

O cenário atual aponta para um amadurecimento do mercado, mas ainda há espaço para debates contínuos envolvendo a legalidade, a adequação e a aplicação das normas.

O futuro das apostas esportivas no Brasil dependerá não apenas da implementação eficaz das regras já estabelecidas, mas também do diálogo entre os agentes do setor, governo e Judiciário para resolver eventuais impasses e garantir um ambiente competitivo e sustentável que permita trazer o equilíbrio entre o crescimento econômico e a proteção dos consumidores.


[1] https://www1.folha.uol.com.br/esporte/2024/01/brasileiros-gastaram-mais-de-r-50-bilhoes-em-apostas-online-em-2023.shtml. Acesso em 13 de dezembro de 2024.

[2] Parágrafo único. O Ministério da Fazenda estabelecerá condições e prazos, não inferiores a 6 (seis) meses, para a adequação das pessoas jurídicas que estiverem em atividade às disposições desta Lei e às normas por ele estabelecidas em regulamentação específica.

[3] Art. 23. Serão assegurados às pessoas jurídicas que apresentarem o requerimento de autorização de que trata o art. 15 nos primeiros noventa dias, contados da data de publicação desta Portaria:

I – o envio da notificação de que trata o art. 16 em até cento e oitenta dias, contados da data de publicação desta Portaria, observadas as hipóteses de suspensão de prazo previstas nesta Portaria; e

II – o deferimento da autorização até 31 de dezembro de 2024, por meio de publicação de portaria no Diário Oficial da União, desde que atendidas as exigências constantes desta Portaria, incluída a apresentação dos comprovantes de que tratam os incisos I a VI do caput do art. 14.

[4] ADI’s n.º 7721 e 7723, de relatoria do Ministro Luiz Fux.

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