A institucionalidade do consenso no TCU

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A criação da Secex-Consenso pelo TCU, em dezembro de 2022, foi recebida com surpresa e curiosidade pela comunidade jurídica. Isso porque não se trata de uma iniciativa que tenha aderência muito evidente às competências constitucionais e legais do órgão de controle.

Foi uma grande novidade. Afinal, a Lei de Mediação atribuiu à AGU a função de engrenar mecanismos de mediação envolvendo a Administração Pública federal, a fim de resolver ou prevenir litígios. Do controle externo, pelas leis vigentes, esperava-se fiscalização de atos e contratos administrativos, sempre a posteriori.

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O TCU estruturou a Secex-Consenso por meio de ato próprio[1], sem promover nenhum diálogo com a sociedade civil e sua potencial “clientela”. Após um ano de funcionamento, também sem nenhum debate público, removeu um dos pilares de seu modelo de governança, que era a necessidade de que todos os membros da comissão de solução consensual concordassem com eventual proposta de acordo[2].

Em julho último, o presidente do tribunal determinou a paralisação das atividades da Secex-Consenso após a publicação de Decreto que previa a participação obrigatória da AGU em todas as fases das negociações. Por lei, qualquer acordo celebrado por órgãos ou entidades federais depende de autorização do advogado-geral da União para produzir efeitos. Mesmo assim, os trabalhos só foram retomados após a revogação do ato pelo presidente da República.

A consensualidade é um consenso. Mas é importante que a governança da Secex-Consenso seja discutida de forma desimpedida. Recentemente, o TCU adotou medidas para aumentar a transparência das atividades do novo órgão e tem se mostrado aberto a críticas e sugestões de aperfeiçoamento.

Seria bem-vindo um ajuste na norma do TCU que contemplasse a tramitação da proposta de acordo pactuada na comissão de solução consensual pelas instâncias de governança dos órgãos e entidades envolvidos – públicos e privados. A estipulação de prazos razoáveis, viabilizando que os termos de negociação sejam assimilados adequadamente – e justificadas tecnicamente – pelos órgãos competentes, parece fundamental.

Na linha do que já tem sinalizado o próprio TCU, a transparência pode ser reforçada. A corte passou a divulgar informações básicas – número do processo, partes envolvidas e uma descrição muito resumida do objeto – sobre cada negociação em andamento[3], o que é positivo. Mas pensamos que outros elementos – como a solicitação em si e respectivos documentos instrutórios – poderiam ser publicizados, como regra, sem violar qualquer sigilo empresarial.

Parece necessário, ainda, delimitar de forma mais clara o âmbito de atuação do órgão: a Secex-Consenso poderia privilegiar a mediação de divergências entre a Administração Pública – com a eventual participação de parceiros privados – e as unidades técnicas do TCU, bem como ajudar a encontrar as formas mais adequadas de cumprimento de determinações do tribunal em casos complexos e sensíveis[4].

Para mediar qualquer tipo de conflito público-privado e promover controle concomitante de alterações e repactuações de contratos de concessão, como a Secex-Consenso tem feito, deve-se cogitar de reforma legal para institucionalizar e calibrar a prática. A atuação do TCU como mediador precisa estar circunscrita de forma rigorosa aos limites de suas competências.

[1] Instrução Normativa nº 91 – TCU, de 22 de dezembro de 2022.

[2] Instrução Normativa nº 97 – TCU, de 27 de março de 2024.

[3] https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/acompanhe-os-pedidos-de-solucoes-consensuais-que-chegaram-ao-tcu-desde-2023.htm

[4] Como aconteceu no TC nº 033.134/2023-5, que tratou de acordo para cumprimento de decisão do TCU, pelo BNDES e pela FAPES, homologado nos termos do Acórdão nº 1.925/2024.

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