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A devolução de tributos, que já se convencionou chamar de cashback, inserida nos artigos 156-A, §5º, VIII e 195, V, §18 da Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional 132/2023, é certamente um ponto energizante nesta corrida que altera as bases normativas da tributação incidente sobre o consumo.
Do ponto de vista distributivo, o instituto se alinha ao princípio da Justiça tributária, agora expressamente previsto na Carta Constitucional, bem como observa a intenção do poder constituinte derivado de atenuar os efeitos regressivos do tributo.
A devolução do imposto, instituída por meio desse novo mecanismo, possui destinatários específicos e se realizará ao final da cadeia produtiva, de forma a atingir maior grau de eficiência em relação à já conhecida alíquota zero ou reduzida.
Quando se opta pela aplicação da alíquota zero a um produto, essa sistemática acaba por beneficiar indistintamente todos os adquirentes daquela mercadoria. Em termos absolutos, a redução da alíquota favorece os mais afortunados, tendo em vista que estes adquirem maior quantidade de produtos. Há ainda as situações em que o benefício da alíquota zero sequer alcança o consumidor final, dada a possibilidade de diluição desse benefício no processo produtivo e empresarial, de modo a não atingir o final da cadeia.
Por sua vez, na sistemática do cashback, vê-se a redução efetiva do valor a ser pago (instantaneamente ou a posteriori) e é possível discriminar, com certa precisão, aqueles que serão agraciados.
É bem verdade que a política de devolução de tributos deve vir acompanhada de um minucioso estudo acerca do impacto fiscal da medida sobre a arrecadação da União e dos entes subnacionais, conforme sugere o artigo 4º, §2º da Lei 11.936/2024. Ora, se a função primordial dos impostos é custear serviços indispensáveis à sociedade, como segurança, saúde e educação, todos necessários sobremaneira à população com baixo poder aquisitivo, é importante assegurar o recolhimento desses valores.
De toda forma, ainda neste ponto é possível encontrar os louros advindos da implantação do cashback, já que incentiva a formalidade das atividades econômicas e fortalece a consciência fiscal dos cidadãos.
O otimismo, entretanto, vem acompanhado de muitas inquietações, dado que a Constituição entregou à Lei Complementar a missão de definir os limites e os beneficiários deste instituto. De toda forma, a norma constitucional já assegura que vai haver devolução de parte dos novos tributos (IBS e CBS) à população menos favorecida economicamente em relação às operações de fornecimento de energia elétrica e de gás liquefeito de petróleo.
Neste ponto, o PLP 68/2024, embora ainda não discutido nas duas Casas do Congresso, também contribui com algumas pistas. O texto enviado pelo governo, que nomeia o instituto de “devolução personalizada do IBS e da CBS”, indica como beneficiário o responsável pela unidade familiar, de baixa renda, inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais (Lei 8.742/1993).
Questiona-se, contudo, se o sistema possui capacidade de acompanhar essas devoluções e assegurar que se destinem efetivamente às pessoas físicas de baixa renda. O risco de fraude, portanto, precisa ser considerado e, para isso, devem ser impostos limites totais e por mercadoria.
A análise e a normatização destes aspectos, caso mantida a redação proposta no PLP, ficarão a cargo da Receita Federal, no caso da CBS, e do Comitê Gestor do IBS. Nada obstante, o PLP já determina que deverão ser analisados o consumo total de produtos pelas famílias destinatárias e a compatibilidade da devolução com a renda disponível das famílias.
Quanto à forma de obtenção, são vários os mecanismos e é possível que mais de um venha a ser implementado, a depender do tipo de produto envolvido e da operação comercial. Um deles é a devolução instantânea, aquela em que o beneficiário informa o CPF ao efetuar a compra e recebe o abatimento de forma automática. No caso de pagamentos com cobrança mensal, existe a possibilidade de devolver o tributo diretamente na conta, como previsto na norma constitucional para os casos de fornecimento de energia elétrica.
O projeto do governo mais uma vez nomeia a Receita Federal do Brasil, no caso da CBS, e o Comitê Gestor do IBS como responsáveis pela definição da sistemática de pagamento dos valores devolvidos e pela adoção de ações necessárias à operacionalização da devolução.
No que toca à escolha dos produtos que serão alvo do cashback, além dos já indicados na emenda constitucional (energia elétrica e gás liquefeito de petróleo), o PLP sugere a devolução personalizada do IVA em relação aos serviços de água, esgoto e gás natural. Espera-se, ainda, que atinja componentes da cesta básica não incluídos na Cesta Básica Nacional de Alimentos.
O PLP 68/2024 confirmou algumas expectativas e trouxe nortes importantes para a implementação do instituto. Nada obstante, muitas das incertezas permanecem. Os meios específicos de mitigação de fraudes, os produtos agraciados com a devolução do imposto e o mecanismo de operacionalização do cashback são informações que o futuro trará.
Junto com o futuro, os menos entusiasmados dirão que a devolução personalizada é mero instrumento de manobra política. Se for, ao menos favorece os menos abastados e fortalece a dinâmica da justiça tributária.
É melhor abrir alas, porque o cashback vai passar.