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O planejamento de políticas públicas tem uma necessidade clara: o uso de dados representativos, desde o diagnóstico até a avaliação dos impactos de sua implementação. Especificamente na saúde, esses dados podem estar relacionados à epidemiologia da doença ou condição de interesse, aos gastos e relacionados a uma determinada enfermidade ou à estimativa da quantidade de pacientes elegíveis para uma política ou uso de uma tecnologia.
Esses dados auxiliam gestores a tomar decisões e propiciam o desenho mais acurado de políticas de saúde. Em linhas gerais, essas informações são quase todas consideradas “dados de vida real”.
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Dados de mundo real – do inglês Real World Data (RWD) – são aqueles coletados fora do ambiente de estudos clínicos controlados, ou seja, captados em ambiente de prática clínica rotineira, como anotações de prontuário médico, contas médicas, notificações de casos de doenças, aprovações de procedimentos de saúde, entre outros. Dados de mundo real provêm informações essenciais para a tomada de decisões em saúde, como a decretação de emergência em saúde por surto de alguma doença, por exemplo, vivemos em diversas regiões do Brasil por conta da dengue.
O Brasil conta com um dos maiores bancos de dados públicos de saúde do mundo, administrados pelo Departamento de Informação e Informática do Sistema Único de Saúde, o DataSUS. Essas bases fornecem informações essenciais para tomadores de decisão em saúde nos níveis municipal, estadual e federal, além de uso pela indústria e profissionais da saúde para o monitoramento de doenças, procedimentos hospitalares e mortalidade. Nas bases de dados de domínio público do DataSUS é possível encontrar informações quanto a:
Procedimentos ambulatoriais e hospitalares realizados no SUS;
Monitoramento epidemiológico de doenças de notificação compulsória, como a meningite e a dengue;
Perfil de mortalidade da população, o que nos permite avaliar o envelhecimento populacional e alteração de perfil de causas principais de morte no país;
Perfil dos nascidos vivos no país, entre outras.
Assim, a utilização de dados de mundo real no âmbito federal possibilita, por exemplo, que o órgão responsável por avaliar as terapias e outras tecnologias a serem incorporadas no SUS, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), tenha maior clareza do número de pacientes que irão utilizar tal tecnologia e, assim, calcular com maior certeza – ou menor incerteza – qual seria o custo dessa incorporação para o governo.
No âmbito estadual, informações referentes a números de procedimentos são muitas vezes utilizadas para definição de repasses financeiros, além de possíveis medidas estaduais para surtos regionais de doenças. No âmbito municipal, é possível ter um planejamento mais acurado quanto ao planejamento de estoque, o número de pacientes, a avaliação da necessidade de rede terceirizada, ou a necessidade de unidades de atenção básica, por exemplo. Nesse contexto, vale a reflexão se utilizamos suficientemente esses dados públicos – não apenas na esfera governamental, mas na comunidade acadêmica como um todo.
A atenção básica, apesar de seu importante papel de porta de entrada para o sistema de saúde, ainda é a área em que os dados públicos disponíveis são mais escassos. Hoje, existem alguns sistemas de informação referentes à atenção primária, como o Sistema de Informações de Atenção Básica (Sisab), porém com dados limitados ou poucos disponíveis de maneira aberta.
Nos últimos anos, diversas iniciativas importantes foram implementadas em dados abertos de saúde no Brasil, principalmente no âmbito federal. Destacam-se a criação da Secretaria de Informação e Saúde Digital (Seidigi), em 2023, sob a liderança de Ana Estela Haddad, além do lançamento da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), com o objetivo de promover a interoperabilidade de dados em saúde e integrar as diversas bases disponíveis no país.
Outra importante iniciativa de 2024 foi o lançamento do programa SUS Digital pela Seidigi. O programa também prevê o uso do prontuário eletrônico do paciente durante consultas, expansão da telessaúde, diagnóstico da maturidade digital das cidades e planejamento de ações regionais, com base na RNDS.
Além disso, o aplicativo Meu SUS Digital ampliou o acesso da população a informações de saúde e serviços, permitindo funcionalidades como: acompanhamento de consultas, acesso à carteira de vacinação, retirada gratuita de absorventes pelo programa Dignidade Menstrual, histórico de medicamentos dispensados pelo Farmácia Popular e avaliação da qualidade do atendimento nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Esse avanço fortalece o cuidado contínuo e proporciona aos profissionais o acesso ao prontuário unificado em toda a rede SUS.
Essas iniciativas beneficiam a saúde, a educação e o desenvolvimento econômico, além de democratizarem o acesso à informação para todos os atores da cadeia de saúde. No entanto, é essencial que iniciativas estaduais e municipais estejam alinhadas com as federais.
Considerando a capacidade de gerar benefícios para toda a população em um curto espaço de tempo, a digitalização da saúde e a abertura de dados são pontos relevantes nos programas de candidatos municipais, estaduais e federais nos âmbitos de Poder Legislativo e Executivo.
A disponibilização de dados, dentro dos parâmetros da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), também é vital para fortalecer a pesquisa científica e a inovação em saúde, com o potencial de transformar a gestão pública por meio do processamento dessas informações, com apoio de inteligência artificial.
Pensando na máxima do matemático britânico Clive Humby de que “dados são o novo petróleo”, é importante reconhecer que, assim como na indústria petroquímica, extrair bons resultados de dados brutos exige equipes multidisciplinares altamente qualificadas, investimentos em ferramentas tecnológicas para armazenamento e processamento de dados, bem como a garantia de segurança da informação.
Esse fortalecimento da ciência nacional, especialmente em áreas como economia da saúde, epidemiologia e ciência de dados, pode levar ao desenvolvimento de algoritmos preditivos para a gestão e desfechos em saúde. No futuro, o uso de inteligência artificial em saúde pode ser tão comum quanto seu uso em outras áreas, como a recomendação de músicas.