Avanço do TSE contra plataformas impõe desafio sobre liberdade de expressão

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O avanço do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ao impor a possibilidade de responsabilização das redes sociais por conteúdos publicados durante as eleições abriu um cenário de incerteza sobre como a própria Corte e as plataformas vão equilibrar a aplicação da norma e a liberdade de expressão dos usuários.

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Aprovada sob influência do ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, a resolução prevê a possibilidade de responsabilização caso as plataformas não retirem imediatamente conteúdos antidemocráticos.

As redes sociais ainda têm o dever de garantir que anúncios políticos não divulguem informações sabidamente inverídicas ou que atentem contra as eleições.

No meio político, a avaliação é que o TSE avançou demais, o que levou a críticas ao Tribunal e, especialmente, a Moraes, acusado de censura por parlamentares bolsonaristas. O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello endossou o coro ao falar com jornalistas no Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, no início do mês passado.

“Não há como regulamentar essa matéria no TSE. Deve ser uma opção política”, afirmou. “Quando se avança, se lança um bumerangue que pode voltar contra o próprio TSE.”

Especialistas veem riscos e redes estudam modelos

Para especialistas, a nova regra impõe risco à liberdade de expressão caso o Tribunal e as plataformas não estejam em uma sintonia fina.

Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade, afirma que a proposta cria um “jogo de adivinhação”, em que a plataforma deve supor qual tipo de conteúdo pode ser enquadrado na norma e removida – papel que antes cabia ao Judiciário.

“Isso gera dois efeitos: ou as plataformas vão começar a remover conteúdo em excesso porque não querem ser responsabilizadas ou as plataformas simplesmente vão usar o argumento de que elas não conseguem adivinhar o sentimento do Tribunal sobre o que é discurso de ódio e pagar para ver”, afirma.

Para André Marsiglia, advogado especializado em direito constitucional e liberdade de expressão, se as redes optarem por uma remoção ampla, correm o risco de se indispor com usuários e serem acusadas de censura.

“O receio de censura vem do fato de que essas plataformas não estão aptas tecnicamente a identificar o que é ilícito ou não. Essa é uma tarefa do Judiciário, que é uma tarefa árdua e subjetiva”, aponta.

Integrantes do tribunal reconhecem que a medida é complexa diante das dificuldades das próprias plataformas na moderação de conteúdo – e há, dentro da Corte, quem admita que poderá haver entraves no cumprimento da nova resolução.

Embora contrariadas, representantes das plataformas informaram ao TSE que vão seguir a regra, mas ainda não detalharam como farão isso.

As plataformas evitaram explicar o que pretendem fazer para as eleições deste ano. Em nota, o Kwai informou que lançou uma biblioteca de anúncios para consulta e está trabalhando em suas políticas para seguirem as novas diretrizes do TSE.

O Google deixou de permitir anúncios políticos desde o dia 1º de maio. A medida foi tomada após a empresa considerar inviável as exigências da resolução. Em nota, a plataforma afirmou que continuará a dialogar com autoridades sobre o tema.

O X retirou o Brasil da lista de países em que permite anúncios políticos. Já a Meta — dona do Facebook, Instagram e WhatsApp —, e o TikTok não se manifestaram.

TSE busca ‘educar juízes’ com novas regras

O TSE avalia que é imprescindível capacitar magistrados de primeira instância sobre a resolução, as decisões do tribunal sobre remoção de conteúdo e como funcionam as plataformas. Serão eles quem devem tomar as decisões mais urgentes nas disputas municipais.

O tribunal também está montando um repositório virtual para consulta obrigatória dos magistrados com as principais decisões envolvendo desinformação eleitoral e retirada de conteúdo.

A preocupação do TSE é como os juízes vão lidar com a enxurrada de desinformação no pleito. Em 2022, foram mais de 43 mil queixas recebidas no sistema de combate à desinformação do TSE – 18 mil delas (41% do total) envolvendo desinformação ou conteúdo antidemocrático, segundo relatório do tribunal. Em 2020, o sistema só recebeu queixas de disparos em massa.

Há ainda o fato de que municípios menores possuem menos cobertura midiática, o que dificulta a fiscalização. “Justamente neste contexto estamos entregando a juízes de primeira instância que apliquem a resolução e que as plataformas sejam pró-ativas na retirada de conteúdo”, afirma Marsiglia.

O cenário abre risco para que juízes pouco experientes acabem punindo em excesso ou deem decisões consideradas inexequíveis pelas plataformas. Para Juliana Noda, advogada eleitoral e integrante da Abradep (Associação Brasileira de Direito Eleitoral e Político), o TSE precisa dar aos juízes condições para adotar uma postura cautelosa.

“Ao mesmo tempo que não posso deixar a desinformação percorrer, não posso restringir a liberdade de expressão sem que haja uma desinformação propriamente dita”, diz. “Isso tem que ser feito com muita cautela porque se a gente começa a restringir demais, se torna uma situação pior do que não restringir tanto. Os efeitos são piores.”

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