No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Bets: a disputa entre a Loterj e o governo federal

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O título deste artigo aborda uma polêmica que vem se arrastando há meses e pode ser sumarizada na seguinte questão: as licenças estatuais da Loterj têm validade nacional?

Caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) responder essa pergunta, o que deverá ocorrer apenas no próximo ano.

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A questão ganha destaque principalmente pelo aspecto financeiro, dado que a outorga da Loterj tem um valor de R$ 5 milhões mais 5% do Gross Gamin Revenue[1], enquanto a licença concedida pelo governo federal custa R$ 30 milhões.

Durante o ano de 2024 foram diversas as investidas de parte a parte na defesa de seus interesses e existem argumentos favoráveis e contrários, os quais serão tratados sumariamente abaixo.

Com base em decisões do STF, mais especificamente as proferidas nas ADPF 492 e 493 e ADI 4986, entendeu-se que os estados poderiam explorar os serviços de loterias.

Em abril de 2023, a Loterj publicou o edital de credenciamento 1/2023, retificado em 27 de julho de 2023, para o credenciamento de pessoas jurídicas para exploração dos serviços públicos lotéricos, pelo período de até cinco anos, exclusivamente em meio virtual, das modalidades lotéricas: aposta esportiva de quota fixa, online e as demais previstas e autorizadas nas legislações vigentes.

Incialmente a Loterj previu em seu edital a necessidade de os operadores de apostas contarem com mecanismo de geolocalização do apostador, a fim de limitar que o serviço fosse prestado somente no estado.

Após, a Loterj retificou o edital para remover essa exigência, entendendo que “os jogadores/apostadores acessam as plataformas das empresas credenciadas e, mesmo que não estejam fisicamente no Rio de Janeiro, aceitam (afirmam que concordam) que suas apostas sejam consideradas efetivadas no estado, uma vez que utilizam plataforma credenciada pela Loterj”.

Ainda, para defender a abrangência da sua licença, a Loterj sustenta que o art. 35-A, §8º da Lei das Bets[2], preserva os efeitos das licenças estaduais concedidas a partir de credenciamentos iniciados antes da publicação da MP 1.182, de 24 de julho de 2023, lembrando que seu edital é anterior.

Já o governo federal afirma que, segundo o art. 35-A da Lei 13.756/18, as licenças emitidas por estados e municípios permitem atuação apenas dentro de seus territórios. Portanto, a atuação nacional dessas entidades é considerada ilegal.

Para o governo, a Loterj invadiu competência da União ao explorar serviço de loterias em todo o território nacional.

Ainda, segundo a Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, “se esse parâmetro de territorialidade do Rio de Janeiro fosse considerado válido em todo o Brasil, os estados concorreriam para atrair para as suas jurisdições os operadores de apostas em quota fixa e seriam induzidos a precarizar os seus padrões regulatórios e a deteriorar progressivamente a sua institucionalidade jurídica, impactando na segurança cibernética, no jogo responsável, na higidez financeira das operadoras e no combate à lavagem de dinheiro”.

O assunto ficou mais acirrado em outubro desse ano, em razão do caso da Esporte da Sorte, que patrocina diversos clubes de futebol, incluindo Corinthians, Athletico Paranaense, Náutico e Santa Cruz.

A Esportes da Sorte não foi previamente autorizada pela SPA para atuar no Brasil, conforme a lista que foi divulgada em outubro. Porém, a marca consta na lista das licenciadas no Rio de Janeiro.

Com isso, no segundo semestre quatro frentes judiciais foram abertas para discutir o assunto.

A primeira, e de modo a garantir que suas licenciadas não fossem bloqueadas pela SPA, em 30 de setembro de 2024, a Loterj impetrou o Mandado de Segurança 1077963-47.2024.4.01.3400[3] em face da SPA e da União Federal. Nestes autos, a Loterj requereu liminarmente a “suspensão dos efeitos da Portaria SPA/MF 1.225/2024, da Portaria SPA/MF 1.231/2024 e da Portaria SPA/MF 1.475/2024, nas previsões incompatíveis com o Edital de Credenciamento 001/2023/Loterj”. Ao final, requereu o reconhecimento da validade de seu edital com fulcro no art. 35-A, §8º da Lei das Bets.

A liminar foi integralmente concedida pela Justiça Federal em 1º de outubro. A União interpôs recurso de Suspensão de Tutela Antecipada[4] em face desta decisão e, em 5 de outubro, obteve decisão favorável para a suspensão dos efeitos da liminar até o julgamento do recurso de agravo de instrumento 1033389-51.2024.4.01.0000 – igualmente interposto pela União no bojo do MS[5], em 04.10.2024).

A segunda frente, agora de iniciativa da Advocacia-Geral da União (AGU) foi a propositura, em 11 de outubro, da Ação Cível Originária 3696 (ACO) em face da Loterj, requerendo que o STF declare a usurpação da competência da Loterj para legislar e credenciar, em âmbito nacional, as bets.

Como terceira frente, a Loterj, em 29 de outubro de 2014, propôs a Ação Civil Pública 1087783-90.2024.4.01.3400 em face da SPA/MF[6], requerendo, liminarmente, a suspensão da lista de bets autorizadas pela SPA/MF a operar no Brasil.

Às vésperas do recesso, a Loterj obteve uma vitória importante no TRF. O tribunal negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela AGU no MS acima mencionado, garantindo que a outorga concedida pela Loterj permanecesse tendo efeitos nacionais.

Como contra-ataque a essa decisão, a AGU abriu uma quarta frente, solicitando mais um posicionamento do STF no tema, mas agora nas ADIs 7721 e 7723, que têm por objeto a constitucionalidade da Lei 14.790/2023.

Nessas ações, de relatoria do ministro Luiz Fux, foi concedida liminarmente a imediata suspensão de publicidades direcionadas ao público infantil pelas bets, bem como a adoção de medidas pela SPA/MF para que não sejam utilizados recursos de programas sociais e assistenciais em apostas de quota fixa.

Em face dessa decisão, a AGU opôs embargos de declaração para esclarecer se as restrições também devem ser obedecidas pelos estados, ou apenas pela União. Em outras palavras, a AGU requer que as restrições também recaiam sobre a Loterj.

Também às vésperas do recesso, no último dia 19, a Loterj sofreu uma derrota, pois foi proferida sentença nos autos da Ação Civil Pública (terceira frente), extinguindo o processo sem resolução do mérito, por indeferimento da petição inicial.

A juíza federal Edna Márcia Silva Medeiros Ramos reconheceu a relevância da matéria em discussão. Porém, entendeu que não há “elementos concretos que indiquem efetiva lesão ao patrimônio público e social”, além de a matéria não se enquadrar “nas hipóteses previstas no artigo 1º da Lei 7.347/1985”.

De todo modo, a resposta a esse disputa caberá ao STF, o que deve ocorrer somente no próximo ano.

Apesar de ainda não ter julgado as ADI’s até o momento, tampouco apreciado os pedidos liminares na ACO, a Suprema Corte já proferiu decisão favorável a Loterj na ADI 7640. Em 23 de outubro de 2024, foi disponibilizada decisão revogando provisoriamente os efeitos do art. 35-A, §2º da Lei das Bets e removendo, também de forma provisória, o termo “publicidade” do §4º do mesmo artigo[7].

Porém, nessa mesma decisão, o ministro Luiz Fux, ainda que não tenha se pronunciado expressamente sobre o tema, indicou que haveria uma vedação de que um estado comercialize serviços lotéricos a pessoas fisicamente localizadas no território de outro estado:

“Com efeito, é inerente à lógica do Estado federal que as unidades federativas não se inserem em uma disputa fratricida por recursos financeiros, de sorte que se revelam naturais e plenamente justificadas as disposições constantes do art. 35-A da Lei 13.756/2018 que impedem que um Estado comercialize serviços lotéricos a pessoas fisicamente localizadas no território de outro e que vedam a exploração multijurisdicional destes serviços. Estas restrições são claramente adequadas e necessárias à preservação do equilíbrio federativo. Transcrevo os dispositivos: (…)

(…)

Ocorre que, uma vez vedada a comercialização, tanto física quanto digital, de serviços lotéricos por um Estado a pessoas localizadas fisicamente em outra unidade da federação, não subsiste justificativa válida, a meu sentir, para que os Estados sejam alijados de adotar estratégias publicitárias que melhor lhes façam sentido, de acordo com seu planejamento de negócios”.

Até o momento, as bets credenciadas pela Loterj podem seguir operando e divulgando suas marcas em âmbito nacional.

Como se viu acima, há argumentos favoráveis a ambos os lados, argumentos esses que foram acolhidos em decisões judiciais em diferenças instâncias.

A disputa entre a licença estadual do Rio de Janeiro e a licença nacional é um reflexo das complexidades inerentes à regulamentação dos jogos e apostas no Brasil. Um equilíbrio cuidadoso deve ser encontrado para garantir que a indústria possa prosperar de maneira justa e segura, beneficiando tanto os operadores quanto os consumidores.

Agora restará aguardar o desfecho dessa disputa em 2025.


[1] Valor obtido do resultado da arrecadação bruta da operação subtraído a premiação paga aos apostadores.

[2] “Art. 35-A. Os Estados e o Distrito Federal são autorizados a explorar, no âmbito de seus territórios, apenas as modalidades lotéricas previstas na legislação federal.

  • 8º São preservadas e confirmadas em seus próprios termos todas as concessões, permissões, autorizações ou explorações diretas promovidas pelos Estados e pelo Distrito Federal a partir de procedimentos autorizativos iniciados antes da publicação da Medida Provisória nº 1.182, de 24 de julho de 2023, assim entendidos aqueles cujo primeiro edital ou chamamento público correspondente tenha sido publicado em data anterior à edição da referida Medida Provisória, independentemente da data da efetiva conclusão ou expedição da concessão, permissão ou autorização, respeitados o direito adquirido e os atos jurídicos perfeitos.”

[3] O qual tramita perante a 8ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal.

[4] Autos nº 1033391-21.2024.4.01.0000, ora em trâmite na Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

[5] Sob a relatoria do Des. Federal João Carlos Mayer do TRF1.

[6] A Ação ora tramita perante a 13ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal.

[7]§ 2º Ao mesmo grupo econômico ou pessoa jurídica será permitida apenas 1 (uma) única concessão e em apenas 1 (um) Estado ou no Distrito Federal.

  • 4º A comercialização e a publicidade de loteria pelos Estados ou pelo Distrito Federal realizadas em meio físico, eletrônico ou virtual serão restritas às pessoas fisicamente localizadas nos limites de suas circunscrições ou àquelas domiciliadas na sua territorialidade.”

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