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A fila de espera ocorre quando a demanda por um serviço supera a capacidade do sistema em fornecê-lo. No contexto da saúde brasileira, isso é um dos principais fatores de insatisfação com o Sistema Único de Saúde (SUS), conforme evidenciado em pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Medicina e pelo Datafolha em 2018. Esse problema foi agravado pelo represamento de serviços durante a pandemia de Covid-19, quando o sistema de saúde enfrentou o redirecionamento de recursos e esforços para combater a crise sanitária, além das restrições impostas pelo isolamento social.
Dependendo de como o Sistema de Regulação Assistencial é organizado em cada localidade do país, podem existir várias filas para o mesmo tipo de procedimento ou consulta. Essas filas nem sempre são visualizadas a partir de uma única plataforma, e muitas vezes respondem a diferentes fluxos dentro de uma mesma base de informações.
Atualmente, existe a fila de solicitações, que aguarda entrada no sistema de regulação assistencial; a fila de solicitações que foram inseridas no sistema de regulação e avaliadas por um profissional habilitado, mas não foram posicionadas em ordem de prioridade devido à falta de clareza na hipótese diagnóstica ou informações adicionais; os casos sistematizados em ordem de prioridade, com consultas ou procedimentos autorizados, mas sem vagas para agendamento disponíveis; e os casos de consultas ou procedimentos agendados, que enfrentam dificuldades em acessar informações sobre o atendimento devido a falhas de comunicação com o sistema de saúde.
Essa fragmentação contribui para o aumento do tempo de espera e da insatisfação dos usuários, que muitas vezes carecem de informações adequadas sobre o funcionamento do sistema de saúde, do processo de regulação assistencial e da sua posição real na lista de espera.
Muitos fatores podem ser atribuídos à formação e má gestão das filas. A pressão assistencial decorrente das mudanças no perfil epidemiológico da população e de cenários de baixo acesso e/ou resolutividade da Atenção Primária, que leva a encaminhamentos desnecessários para níveis de maior complexidade, são alguns desses fatores.
Outro aspecto determinante é a falta de sistemas de informação e dados interoperáveis, que impede a visualização completa da jornada do paciente e dificulta a comunicação eficiente entre usuários e profissionais, além da coordenação das agendas de atendimento. O absenteísmo e o cancelamento de consultas também contribuem para o desperdício de horários reservados.
No início de 2023, o Ministério da Saúde lançou o Programa Nacional para a Redução de Filas de Espera para consultas, exames e cirurgias. O programa, que prevê repasses financeiros aos estados e municípios para organizar e ampliar o acesso à Atenção Especializada e superar a demanda reprimida, será reformulado devido à identificação de desigualdades regionais na execução e à concentração de esforços em procedimentos de baixa complexidade. Isso aponta para uma necessidade de mapear dificuldades que as regiões estejam enfrentando na operacionalização do programa, tais como a falta de profissionais, insumos e infraestrutura.
Para responder ao desafio das filas de espera considerando o atendimento às demandas em tempo oportuno e com o menor deslocamento possível dos usuários dentro do território, o sistema de saúde precisa de eficiência na capacidade de resposta e comunicação, que pode ser potencializada com o uso estratégico de tecnologias de informação e comunicação. Embora soluções com foco em resolver represamentos sejam meritórias, o maior desafio não está apenas em reduzir as filas, mas em construir estratégias perenes que garantam que estas filas não voltem a crescer em demasia.
Além das iniciativas do governo federal, os municípios também cumprem um papel importante nesse processo. Por isso, o tema deve estar no radar das candidatas e candidatos das eleições municipais de 2024 e nas agendas políticas dos mandatos que terão início em 2025.
O Mais SUS nas Cidades, uma publicação lançada no início deste mês pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e pela Umane, aponta ações que podem colaborar com o melhor fluxo de atendimento, considerando a Atenção Primária como um nível estratégico para melhorar a oferta de serviços públicos de saúde. A informatização das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e implementação de formas alternativas de acesso, como o agendamento de modo não presencial e consultas por meio da telessaúde, são algumas das ações recomendadas na publicação.
De modo complementar ao anúncio da revisão do Programa Nacional de Redução de Filas, em junho, o Ministério da Saúde lançou o Programa Mais Acesso a Especialistas (PMAE), que promete que pacientes que necessitam de múltiplas consultas ou exames não precisarão entrar em diversas filas. Eles serão incluídos em uma única fila, com a garantia de retorno à sua Unidade de Saúde da Família de referência, para acompanhamento contínuo, quando necessário.
O PMAE propõe a adoção de três estratégias principais para aprimorar a gestão e assistência na saúde:
Contratualização da demanda a partir da lógica de Oferta de Cuidado Integrado (OCI);
Gestão do fluxo do paciente a partir do CPF como número de identificação principal;
Ampliação do serviço de telessaúde, para que profissionais da Atenção Primária consultem especialistas e realizem teleconsultas, evitando a necessidade de deslocamento dos pacientes.
Essas estratégias são indicativos de que o SUS já poderá começar obter retorno dos investimentos realizados em Saúde Digital, uma vez que pressupõem sistemas de informação interoperáveis, incentivos à qualificação do registro de informações e a definição de linhas de cuidado mediadas pelo uso de tecnologias e processos de trabalho digitalizados. Com uma abordagem que priorize a integralidade, equidade e universalidade, princípios fundamentais do SUS, poderemos transformar a experiência do cidadão, minimizando os tempos de espera e elevando a qualidade do atendimento para toda a população brasileira.