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Há quase um ano do início da vigência da Lei Federal nº 14.133, de 01/04/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos ou NLLC), o Poder Executivo avança na regulamentação da lei e edita o Decreto nº 12.174, de 11/09/2024, para tratar do respeito às garantias trabalhistas nos contratos administrativos, nos quais as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional sejam partes.
A edição do Decreto nº 12.174/2024 marca a preocupação do Poder Executivo em disciplinar medidas que propiciem boas práticas de sustentabilidade, respeito aos direitos trabalhistas e igualdade de gênero nas contratações com a administração pública.
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O foco do novo texto são os contratos administrativos de execução de obras e serviços de engenharia, bem como aqueles contratos de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra. O decreto regulamenta especificamente o art. 121, § 3º e art. 122, § 2º, da NLLC. O primeiro (art. 121, § 3º) trata das proteções a serem incluídas em editais de licitação e contratos administrativos visando ao cumprimento de obrigações trabalhistas por parte da empresa contratada. O segundo (art. 122, § 2º) disciplina a possibilidade de os editais restringirem, vedarem ou estabelecerem condições para a subcontratação.
O novo decreto detalhou as cláusulas que deverão constar dos futuros contratos, no que se refere ao cumprimento dos direitos trabalhistas, a exemplo (i) das normas de proteção ao trabalho relativas à segurança e à saúde; (ii) vedação a submeter trabalhadores a condições degradantes de trabalho, jornadas exaustivas, servidão por dívida ou trabalhos forçados; (iii) não utilizar qualquer trabalho realizado por menor de dezesseis anos de idade, exceto na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos de idade; (iv) não submeter o menor de dezoito anos de idade à realização de trabalho noturno e em condições perigosas e insalubres; e (v) obrigatoriedade de os contratados estabelecerem processos para recepção e tratamento de denúncias de discriminação, violência e assédio no ambiente de trabalho.
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Em 2023, já havia sido editado o Decreto nº 14.430 regulamentando os dispositivos da NLLC que tratam da exigência, em contratações públicas, de percentual mínimo de mão de obra constituída por mulheres vítimas de violência doméstica e sobre a utilização do desenvolvimento, pelo licitante, de ações de equidade entre mulheres e homens no ambiente de trabalho como critério de desempate em licitações.
Todos os dispositivos avançam sobre o que propõe a NLLC, que já buscava detalhar mecanismos voltados a exigir e fiscalizar o cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias por parte dos contratados. A lei trouxe previsões legais que não só permitem ao poder público evitar demandas trabalhistas por parte de empregados das empresas contratadas, como também engajar as licitantes no cumprimento das normas trabalhistas.
O Decreto 12.174/2024 se apresenta como instrumento normativo pioneiro em matéria trabalhista, exigindo providências para aplicação de convenções internacionais aos contratos administrativos, que se somam às garantias exigidas das empresas pela CLT. Seu conteúdo está alinhado ao Decreto nº 10.088, de 05/09/2019, que consolidada todos os dispositivos das recomendações previstos nas convenções da OIT que foram ratificadas pelo Brasil.
Legalidade
Se por um lado o Decreto nº 12.174/2024 é vanguardista, por outro, contém dispositivo que pode ter sua legalidade questionada. Trata-se de seu art. 2º, inciso IV, permitindo ao poder público incluir nos contratos administrativos cláusula que disponha sobre responsabilidade solidária à empresa contratada por atos e omissões de eventual empresa subcontratada que resultem em descumprimento da legislação trabalhista.
A NLLC, em matéria trabalhista, instituiu que “exclusivamente nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão-de-obra”, o poder público será solidariamente responsável pelos encargos previdenciários e subsidiariamente pelos encargos trabalhistas, se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado. Não há previsão na NLLC que imponha à contratada responsabilidade solidária por atos e omissões de suas subcontratadas no que se refere ao cumprimento das obrigações trabalhistas.
Tampouco há previsões instituindo essa hipótese de responsabilidade solidária na legislação trabalhista. A Lei Federal nº 13.429, de 31/03/2017 (Lei de Terceirizações) prevê responsabilidade subsidiária da contratante dos serviços, no que se refere às obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação dos serviços, bem como no tocante ao recolhimento de contribuições previdenciárias (art. 5º, § 5º).
O Código Civil estabelece que “a solidariedade não se presume, resulta da lei ou da vontade das partes” (art. 265). Por essa razão, art. 2º, inciso IV, do decreto poderá ter sua constitucionalidade questionada, por vício de legalidade, ao criar a possibilidade de o poder público incluir nos contratos administrativos cláusulas que disponham responsabilidade solidária entre contratadas e subcontratadas, sem que haja previsão em lei para tanto.
Neste caso, a responsabilidade solidária somente será válida se a contratada assim anuir, tal como prevê o art. 265 do Código Civil para os casos em que tal responsabilidade não é criada por lei. Contudo, o contrato administrativo é praticamente contrato de adesão, com pouca margem de negociação para as licitantes. A minuta do futuro contrato é anexada ao edital e, em suas propostas, as licitantes devem declarar que concordam com todos os termos e condições, sob pena de serem desclassificadas da licitação. Não há nos contratos administrativos a mesma paridade entre partes que há nos contratos privados análogos, restando prejudicada a livre e espontânea anuência entre as partes no que se refere à cláusula de responsabilidade solidária.
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Como toda norma recente, a aplicação do Decreto certamente gerará dúvidas e levará algum tempo para se consolidar. Nesse sentido, o governo federal, por meio do seu Portal de Compras, esclareceu que ainda serão elaboradas normas complementares, bem como modelos de documentos para orientar a adaptação dos órgãos e entidades da administração pública federal na aplicação do decreto. Seguiremos acompanhando este e outros decretos regulamentadores da NLLC.