CONFIRA ESSAS EMPRESAS
SEGURO PARA MOTORISTA DE APP
COMECE HOJE MESMO
CLASSIFICADOS
ABRIR O CATÁLOGO DE MÁQUINAS
TUDO SOBRE SEGURO DE VIDAS
ALUGUEL TEMPORADA GUARAPARI PRAIA DO MORRO ES
O IMÓVEL É UMA COBERTURA NA PRAIA DO MORRO ES LINK A BAIXO VALOR DA DIÁRIA 500R$
NÚMERO DE DIÁRIAS MINIMO 3
QUERO SABER + / CONTATO DO IMÓVEL
QUERO SABER SOBRE O CAVALO COMO COMPRAR
O melhor da web
GANHE DINHEIRO NO AIRBNB
DRA LARISSA
CONFIRA O CANAL
CONFERIR PERFIL NO LinkedIn
CONFERIR
A indústria de alimentos[1] apresenta desafios próprios para a defesa da concorrência. Diante de suas dinâmicas específicas, analisar a concorrência do setor pelas lentes do direito econômico complementa as limitações do antitruste tradicional, especialmente em um contexto de cadeias globais de valor (GCVs[2]) e da crescente digitalização desse setor.
Trata-se de setor de extrema relevância para a economia brasileira, respondendo por uma parcela significativa do PIB e da geração de empregos[3]. Essa importância se reflete na atuação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que, em 2023, dedicou quase 10% de seus atos de concentração à análise de casos relacionados a alimentação e agricultura[4]. De fato, observamos no Brasil uma crescente concentração de mercado no setor agroalimentar, impulsionada por fusões e aquisições entre empresas que atuam em diferentes etapas da GVC[5]. Isso inclui desde a produção de sementes e culturas até a distribuição final de alimentos e bebidas, passando por empresas de fertilizantes, supermercados e aplicativos de entrega.
Apesar dessa vasta experiência do Cade com a análise de operações no setor agroalimentar, ainda há espaço para melhorias, em especial, para uma avaliação mais focada nos padrões de concorrência típicos desse setor.[6] As GVCs envolvem um conjunto de atividades econômicas que interagem de forma vertical, ligadas por elos. A dinâmica do setor agroalimentar, caracterizada por GVCs, indica que uma mudança em um elo da cadeia gera repercussões significativas nos outros, exigindo uma análise holística dos impactos das fusões e aquisições em todas as suas etapas, sendo possível visualizar a distribuição do valor gerado e alocado entre os elos.
Considerando que as GVCs incorporam relações econômicas e políticas que são mediadas e moldadas pelo direito, tornam-se um instrumento crucial para entender as funções do direito da concorrência na produção e distribuição de alimentos[7]. Conforme Schutter[8], a defesa da concorrência, por ser um instrumento de controle do poder econômico, deve considerar a existência dessas diversas formas de poder que existem na cadeia de valor de alimentos.
No entanto, apesar de cruciais para a compreensão das dinâmicas do setor agroalimentar de uma perspectiva de direito econômico, as GVCs nem sempre são visíveis ou explicitamente mencionadas pelo Cade nos casos concretos envolvendo temas concorrenciais. Em certa medida, o Cade considera as cadeias globais de valor como um pano de fundo das transações envolvendo o setor agroalimentar.
A autoridade ainda utiliza a definição clássica de mercado relevante[9] para analisar os potenciais efeitos anticompetitivos resultantes de um ato de concentração. O olhar da autoridade brasileira de defesa da concorrência, porém, limita-se à maneira pela qual os atores econômicos adquirem e mantêm sua posição na cadeia, bem como aos efeitos da transação de custo-benefício, focando apenas na maximização do excedente e nos aspectos de eficiência.
Embora a definição de mercado seja uma ferramenta útil, falta na “caixa de ferramentas” do direito antitruste um método para aplicar o direito de defesa da concorrência que incorpore de forma mais significativa as cadeias globais de valor nas decisões envolvendo o setor agroalimentar no Brasil. Esta ausência, combinada com a tendência à concentração nesse setor –intensificada pelas integrações verticais e pelos efeitos conglomerados – trazem preocupações concorrenciais que se acentuam ainda mais quando se considera o impacto da digitalização no setor[10], que traz consigo uma camada adicional de complexidade.
Um caso concreto que ilustra os desafios para a análise de concorrencial no setor agroalimentar foi a notificação ao Cade da joint venture entre quatro empresas de commodities agrícolas atuantes no mercado global[11]. A joint venture foi criada para desenvolver e operar uma plataforma digital que permite que empresas da cadeia de suprimentos alimentícia e agrícola meçam seu impacto em temas de sustentabilidade, bem como permitir a transformação da cadeia de abastecimento. Nesse sentido, os processos da plataforma estariam relacionados com (i) a padronização de metodologias de medição de sustentabilidade ambiental na cadeia de valor alimentar; (ii) o gerenciamento de dados de sustentabilidade coletados pela plataforma; e (iii) a divulgação, agregação e comparação do desempenho de sustentabilidade ambiental em diferentes áreas materiais aos seus clientes e aos próprios fornecedores para obter insights sobre possíveis áreas de melhoria.
Apesar de claramente afetar diversos elos da cadeia produtiva, a análise de participação de mercado focou no mercado de softwares. As partes alegaram que não haveria integração vertical entre as atividades da joint venture e as demais atividades de seus grupos econômicos. Complementaram o argumento no sentido de que os negócios da plataforma digital não seriam necessários para a produção ou venda de commodities agrícolas ou alimentícias, mas meramente complementares.
Ao analisar a JV, o Cade alertou para o risco das partes – grandes empresas de comercialização de commodities que atuam em nível global – definirem padrões de sustentabilidade que excluam fornecedores do mercado ou alterem as dinâmicas comerciais. Também levantou preocupações com a possibilidade de utilização de vantagens decorrentes do acesso a dados de concorrentes, fornecedores e clientes utilizarem a plataforma[12]. Nesse caso, apesar da análise de poder de mercado das partes ter sido restrita ao mercado de software, o Cade identificou que os efeitos das operações poderiam ultrapassar as empresas que compõem a joint venture, gerando impactos sobre outros elos da cadeia agroalimentar.
Outro exemplo importante para o debate sobre concorrência, plataformas e setor agroalimentar é o caso do iFood. A empresa de delivery de refeições esteve envolvida em dois casos que foram objeto de análise pelo Cade[13]: um ato de concentração[14] e uma investigação de contratos de exclusividade firmados pelo iFood com grandes redes de restaurantes[15].
O ato de concentração envolvendo o iFood foi o primeiro caso analisado pelo Cade envolvendo aplicativos de entrega de comida. Durante a investigação, a autoridade recebeu informações sobre os contratos de exclusividade firmados pelo iFood com redes de restaurantes. Apesar de ter provas da posição dominante do iFood no mercado e da existência dos contratos, o Cade aprovou a transação em março de 2018.
A análise reconheceu que o iFood era uma plataforma digital, mas aplicou apenas ferramentas e métodos tradicionais de análise de mercado, não adaptados à natureza dinâmica da concorrência no setor. Como resultado, o Cade decidiu que a concentração não afetaria negativamente as dinâmicas do mercado. A autoridade também alegou que a análise do ato de concentração não abrangia a análise anticompetitiva dos contratos de exclusividade, mas que o mercado seria monitorado para identificar indícios de problemas para a concorrência.
Não há indícios de que o Cade tenha de fato monitorado o mercado. No entanto, em 2020, no contexto da pandemia, a autoridade recebeu denúncias sobre os impactos negativos à concorrência decorrentes dos contratos de exclusividade do iFood com redes de restaurantes – os mesmos que já eram do conhecimento do Cade desde o ato de concentração. Desta vez, ao examinar o mercado, autoridade mostrou uma maior abertura para incorporar teorias do dano e ferramentas de análise típicas de mercados digitais.
Diferentemente da análise da operação, que focou apenas nos mercados relevantes que as partes atuavam, a investigação referente às cláusulas de exclusividade considerou os efeitos nos vários mercados relacionados à atuação da plataforma. A análise dessa conduta demonstrou também um amadurecimento do Cade quanto aos aspectos referentes a plataformas digitais, e das dinâmicas concorrenciais especificas desse modelo de negócios, como os efeitos de rede acentuados. O caso foi encerrado por meio de um acordo entre a iFood e o Cade.[16]
De forma central, o Cade conduziu uma análise multimercado no segundo caso, que abriu caminho para a avaliação dos impactos que as práticas de uma plataforma digital poderiam gerar nos diversos elos da cadeia de valor. No caso concreto, a análise focou nos impactos que poderiam ocorrer principalmente nos aplicativos de entrega e restaurantes.
É nesse ponto que uma análise de GVCs tem o potencial de complementar de forma importante a análise antitruste. Isso é especialmente relevante em mercados onde metodologias alternativas de análise são necessárias, devido às limitações dos testes e métodos econométricos tradicionais, como no caso das plataformas digitais. Em casos que envolvem plataformas, uma análise de GVCs se destaca pela sua capacidade de considerar as relações entre diversos atores que são facilitadas pela plataforma.
Esse papel de intermediação, fundamental em tais casos, dificilmente é captado por ferramentas de análise econômica tradicionais. A análise de GVCs, por outro lado, coloca uma ênfase relevante nessas conexões, o que lhe confere o potencial de auxiliar de forma substantiva na identificação de problemas e desenho de soluções mais eficazes e condizentes com a realidade dos mercados.
A atuação recente do Cade evidencia como as dinâmicas do setor agroalimentar geram dificuldades para a análise tradicional que o órgão costuma adotar em seus casos, dificuldades essas que são agravadas quando o fator digitalização é considerado. A autoridade está se atualizando em relação a todas essas dinâmicas e mudanças, mas há também espaço para a aplicação de novas e renovadas metodologias, para que a análise antitruste seja mais adequada para o setor agroalimentar, que é tão relevante para o país, mas também outros setores nos quais as cadeias globais de valor são importantes.
[1] A regulação da indústria de alimentos ultraprocessados e in natura foi objeto de análise pelas autoras no artigo “O papel do direito nos rumos da alimentação no Brasil”, publicado nessa coluna em 21 de dezembro de 2023. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/elas-no-jota/o-papel-do-direito-nos-rumos-da-alimentacao-no-brasil-21122023
[2] Sigla comumente utilizada, em decorrência da expressão em inglês global value chains. A produção, o comércio e os investimentos internacionais estão cada vez mais organizados nas chamadas cadeias de valor globais, onde as diferentes fases do processo de produção estão localizadas em diferentes elos de produção que são interconectados e, muitas vezes, em diferentes países.
[3] A agropecuária registrou o aumento de 15,1% em 2023, acumulando um total de 39% em dez anos (IBGE, 2024).
[4] Esses números são resultado de pesquisa realizada no site do Cade com as palavras-chave “alimentos” e “sustentabilidade” / “alimento” ou “alimentos”, considerando os documentos “Votos” e “Pareceres da SG/Cade”.
[5] O Cade já havia indicado essa tendência à concentração em publicação de 2020, referente ao mercado de insumos agrícolas. Naquela época, as dez maiores empresas atuantes nesse mercado haviam se envolvido em recentes movimentos de consolidação do setor. Conforme indica o estudo “Syngenta e Adama pertencem ao mesmo grupo econômico, Basf adquiriu ativos da Bayer, Bayer incorporou a Monsanto, FMC adquiriu ativos da DuPont, DuPont e Dow se uniram, a UPL adquiriu a Arysta e o grupo japonês Sumitomo anunciou a aquisição das operações da Nufarm na América Latina”. CADE, Cadernos do Cade: Mercado de Insumos Agrícolas. Fev. 2020, p. 17. Disponível em: https://cdn.cade.gov.br/Portal/centrais-de-conteudo/publicacoes/estudos-economicos/cadernos-do-cade/mercado-de-insumos-agricolas-2020.pdf.
[6] Para uma discussão sobre GVCs, o setor alimentar e a defesa da concorrência no Brasil, ver COUTINHO, DIOGO R., Diogo; KIRA, Beatriz; SAITO, Carolina; et al. Competencia en cadenas globales de valor en el sector de alimentos: un análisis del caso brasileño. Latin American Law Review, n. 11, p. 1–19, 2023. https://revistas.uniandes.edu.co/index.php/lar/article/view/1473
[7] Ibid.
[8] SCHUTTER, Oliver de. Addressing Concentration in Food Supply Chains. The Role of Competition Law in Tackling the Abuse of Buyer Power. Special Rapporteur on the right to food, 2010.
[9] Conforme definição do Guia para Análise de Concentrações Horizontais do Cade: “A delimitação do MR é o processo de identificação do conjunto de agentes econômicos (consumidores e produtores) que efetivamente reagem e limitam as decisões referentes a estratégias de preços, quantidades, qualidade (entre outras) da empresa resultante da operação. (…) Sob a ótica da demanda, a dimensão do produto do MR compreende bens e serviços considerados, pelo consumidor, substituíveis entre si devido a suas características, preços e utilização. (…) A dimensão geográfica refere-se à área em que as empresas ofertam seus produtos ou que os consumidores buscam mercadorias (bens ou serviços) dentro da qual um monopolista conseguirá, lucrativamente, impor elevações de preços significativas”. Disponível em: https://cdn.cade.gov.br/Portal/centrais-de-conteudo/publicacoes/guias-do-cade/guia-para-analise-de-atos-de-concentracao-horizontal.pdf.
[10]O termo digitalização no setor agroalimentar é utilizado de forma ampla neste. Ou seja, trata-se da ideia de utilização de tecnologias digitais em qualquer etapa da cadeia produtiva do setor agroalimentar.
[11] Ato de concentração nº 08700.009905/2022-83. Requerentes: Sustainlt Pte Ltd, Cargil Incorporated, Louis Dreyfus Company Participations B.V e ADM International Sarl. Julgado na 216ª Sessão Ordinária de Julgamento, realizada em 21/06/2023.
[12] O Cade aprovou a operação, após esclarecimentos das partes garantindo que: (i) eventuais alterações das métricas existentes seriam definidas em ambiente externo à plataforma, e (ii) após receber um protocolo antitruste garantindo um acesso transparente e não discriminatório à plataforma, bem como após esclarecimentos das partes no sentido de que haveria conformidade desde a concepção e soluções técnicas para evitar a troca de informações sensíveis.
[13] Uma análise crítica e detalhada de ambos os casos consta no artigo: KIRA, Beatriz. Is iFood Starving the Market? Antitrust Enforcement in the Market for Online Food Delivery in Brazil. World Competition, v. 46, n. 2, p. 133–162, 2023.
[14] Nasper – controladora do iFood – e Delivery Hero. Ato de concentração nº 08700.007262/2017-76. Requerentes: Naspers Ventures B. V., Rocket Internet SE e Delivery Hero AG.
[15] Inquérito Administrativo nº 08700.004588/2020-47. Representada: Ifood.com Agência de Restaurantes Online S. A.
[16] O acordo entre o CADE e a empresa iFood inclui três medidas principais para evitar práticas anticompetitivas no mercado de delivery de alimentos: (i) para que contratos de exclusividade firmados com restaurantes estratégicos (com 30 ou mais lojas) não fossem firmados e, no caso de já haver contratos com essas redes, estes deveriam ser encerrados; (ii) para os contratos de exclusividade que poderiam ser firmados, o Cade estabeleceu uma duração máxima de 2 (dois) anos, sendo necessário ficar pelo menos 1 (um) ano sem qualquer exclusividade, após esse período; e (iii) medidas para evitar exclusividades de fato não previstas contratualmente foram estabelecidas. No entanto, ainda é cedo para avaliar a efetividade do acordo.