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O governo Lula herdou um sistema complexo de regras que tratam de emendas orçamentárias. Da impositividade das emendas individuais desde 2014 até o “orçamento secreto” consagrado por Jair Bolsonaro, o Congresso Nacional tomou as rédeas do processo orçamentário no Brasil.
O Supremo Tribunal Federal (STF) interveio diante da dificuldade do governo em encontrar uma solução política para a questão das emendas orçamentárias, que enfraquece o Executivo.
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O ministro Flávio Dino liderou um acordo com a intenção de aperfeiçoar e dar mais transparência às emendas. Para isso, suspendendo a execução de emendas até a aprovação de uma nova lei. Com esse incentivo, os parlamentares aprovaram, no fim de novembro, a Lei Complementar 210/2024.
Criticada por, entre outros aspectos, não dar a transparência desejável às emendas Pix (transferências diretas a municípios e ONGs sem especificação de destino em relação à área de política pública), a nova lei falha até em aspectos que poderiam ser mais simples de resolver.
Um deles seria a individualização das emendas de bancada estadual, que hoje têm o valor de cerca de R$ 4,5 bilhões.
Criadas pela Resolução do Congresso 2/1995 (após o escândalo dos “anões do orçamento”), as emendas de bancada estadual visavam dificultar a corrupção, partindo do princípio de que esquemas ilícitos exigem a conivência de múltiplos parlamentares.
Mas a solução não funcionou a contento, como mostrou a CPI das Ambulâncias em 2006. Parlamentares, prefeitos e empresários superfaturavam a venda de ambulâncias e outros equipamentos médicos, aproveitando-se da falta de especificidade nas emendas de bancada estadual.
Elas continham, como hoje, descrições genéricas (“aquisição de equipamentos para o estado X”, por exemplo) na fase de aprovação do orçamento. Posteriormente, os parlamentares indicavam os municípios que deveriam receber as verbas, de modo informal e sem transparência.
No início dos anos 2000, como mostrou a CPI das Ambulâncias, essa opacidade facilitava licitações fraudulentas: prefeitos as direcionavam para empresas do esquema, superfaturando compras e desviando recursos.
Um exemplo emblemático, à época, foi uma emenda da bancada de Mato Grosso para “estruturação de unidades de saúde”. Sem especificar municípios ou entidades, a emenda permitiu a divisão do valor e o direcionamento a prefeituras que adquiriram ambulâncias superfaturadas.
A CPI das Ambulâncias confirmou esse nexo entre emendas genéricas e corrupção, recomendando, paradoxalmente, o fortalecimento das emendas coletivas, mas com maior especificação (plano de trabalho, objeto e custos definidos) para coibir desvios. Com a edição da Resolução do Congresso Nacional 1-2006, as normas melhoraram, mas o uso político das emendas de bancada estadual não.
A resolução definiu que as emendas de bancada estadual deveriam financiar obras ditas “estruturantes”, definidas coletivamente. Mesmo assim, ainda prevalece a individualização informal.
A impositividade de execução das emendas desse tipo, definida pela Emenda Constitucional 100/2019, agravou o problema. Parlamentares continuaram dividindo valores de emendas de bancada, agora mais altos, como se fossem individuais, sem transparência.
A indicação dos municípios beneficiados apenas na fase de execução orçamentária dificulta a fiscalização, desvirtua o propósito das emendas (financiar obras estruturantes) e sobrecarrega as despesas discricionárias do governo com obras inacabadas.
A Lei Complementar 210/24, à primeira vista, pode parecer querer resolver o problema. O artigo 2º proíbe ações para indicações individuais e a designação genérica de programação (exceto para regiões metropolitanas), exigindo especificação precisa e vedando o fracionamento excessivo (fatias menores que 10%).
Mas são medidas insuficientes.
As vedações se aplicam apenas às emendas impositivas (CF-88, Art. 166, §12º), omitindo as autorizativas acima do teto. Essa brecha possibilita emendas extratexto, não sujeitas às vedações do art. 2º.
A lei prevê atas das deliberações, mas não exige individualização dos patrocinadores, apenas o resultado. A indefinição de “obra estruturante” permite considerar qualquer obra cadastrada (CF-88, Art. 165, §15º) ou projeto “estruturante” das LDOs, ampliando a discricionariedade.
O PLP 161/2024, idealizado pelo partido Novo, propunha solução mais eficaz: listas de projetos estruturantes com obras identificadas e documentação completa, incluindo propostas dos Executivos e atas.
Infelizmente, foi outra a solução legislativa encontrada para tentar resolver o impasse entre Legislativo, Executivo e Judiciário.