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Gestos em alusão ao uso de cocaína, palavrões e gritos com a plateia. Essas foram apenas algumas das peripécias de Pablo Marçal, candidato a prefeito de São Paulo pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), durante o primeiro debate da campanha na última quinta-feira (8/8), transmitido pela Band. A performance o levou ao topo das pesquisas no Google naquela noite, muito à frente dos concorrentes Ricardo Nunes (MDB), Guilherme Boulos (PSol), Tabata Amaral (PSB) e Datena (PSDB).
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Já na pesquisa de intenção de voto Datafolha mais recente, divulgada antes do debate, Marçal aparece com 14%, dividindo o terceiro lugar com o apresentador José Luiz Datena. Na pesquisa Atlas, publicada no mesmo dia, Marçal tem cerca de 11%, em empate técnico com Tabata, que está em seu segundo mandato como deputada federal. Sua posição, lado a lado com figuras mais estabelecidas na política e em meios tradicionais, surpreende aos que se perguntam quem é Pablo Marçal.
De influencer a político
Nascido em Goiânia, Pablo Marçal tem 37 anos e é um fenônemo nas redes sociais. Ele soma 12,6 milhões de seguidores no Instagram, onde iniciou atuando como coach — termo que não usa mais. Ele prefere ser chamado de mentor. Segundo sua assessoria, Marçal “é um multi-empreendedor de sucesso” que “atua como CVO (Chief Visionary Officer) de um conglomerado multibilionário, abrangendo 19 setores de atuação, como imobiliário, digital, educacional, seguros, automotivo, aviação, tecnologia, hotelaria, entre outros, formando um dos maiores ecossistemas empresariais da América Latina”.
Na internet, o empresário vende cursos e mentoria com temas que vão de empreendedorismo e marketing digital até “bloqueios mentais”, com o chamado “Método IP”, um “treinamento de inteligência emocional baseado em Programação Neurolinguística (PNL)”, segundo o blog de Marçal. “Seu trabalho educacional foca em despertar a identidade pessoal e clarificar o propósito de vida de seus seguidores e mentorados”, segundo sua assessoria.
Também se denomina cristão, e já fez discursos em diversas igrejas. Em agosto de 2022, disse na Igreja Casa, em Goiânia, que “cada cristão é um influenciador”. “É hora de vocês se levantarem e se posicionarem nesta nação. Um cristão que não tem resultado não tem respeito. E se você é cristão e não tem gente falando mal de você tem alguma coisa errada com que você está fazendo.”
Marçal decidiu ingressar na vida política em 2022, quando se lançou pré-candidato à Presidência da República pelo Partido Republicano da Ordem Social (Pros), mas o partido decidiu apoiar a candidatura do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Acabou eleito deputado federal por São Paulo, mas teve a candidatura recusada por falta de apresentação de documentos e suspensa pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Luz, câmera e conteúdo
Tanto na estética e valores quanto na capilaridade digital, Marçal tenta se aproximar de Jair Bolsonaro. Em junho, posou nas redes sociais ao lado de Bolsonaro, segurando uma medalha com o rosto do ex-presidente. Na legenda, disse que “Nunes nunca terá essa medalha”. Mas Bolsonaro formalmente apoia o atual prefeito de São Paulo, inclusive indicou o ex-coronel da Polícia Militar Ricardo de Mello Araújo para vice na chapa de Nunes.
Após o debate da Band, internautas compararam Marçal a outros políticos, com os apelidos de “Cabo Daciolo da Faria Lima” e “Padre Kelmon 2.0”, em referência à atuação dos presidenciáveis em debates em 2018 e 2022, respectivamente. O empresário viralizou também por admitir não saber o que era Operação Água Branca (projeto de desenvolvimento urbano lançado em São Paulo nos anos 1990), quando indagado por Tabata.
No entanto, nas 12 horas após o programa, Marçal postou 30 cortes de suas falas do debate, gerando 57 milhões de visualizações, segundo levantamento feito pelo Estadão. “Ele entende o debate como uma estrutura da qual você usa uma parte para o conteúdo digital, que é onde ele não tem mediação e cria essa relação de proximidade”, diz Lucas Calil, coordenador de Pesquisa Aplicada da Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas. “Ele [o debate] é só mais um ponto da discussão toda.”
Expedição, investigação, condenação
Além dos apoiadores nas redes sociais, Marçal angariou 32 seguidores para uma expedição ao Pico dos Marins, no interior de São Paulo, em 2022, durante uma tempestade com ventos de mais de 100 km/hora. O grupo teve de ser resgatado pelo Corpo de Bombeiros.
Em uma live no YouTube um dia depois do episódio, Marçal afirmou que “não mandou ninguém subir” e que “cada um estava sob a própria responsabilidade”. A Polícia Civil investiga o candidato por tentativa de homicídio privilegiado por conta do caso.
Em 2010, Pablo Marçal recebeu uma condenação por furto qualificado, episódio lembrado por Guilherme Boulos durante o debate. Segundo a sentença, Marçal participou, em meados de 2005, aos 18 anos, de uma organização que invadia contas bancárias online.
Ele foi condenado pela 11ª Vara da Justiça Federal de Goiás a quatro anos e cinco meses de prisão, por levantar listas de e-mails de possíveis vítimas. No Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), contudo, foi reconhecida a prescrição do caso.
Além disso, o empresário foi alvo de operação da Polícia Federal em maio de 2023, investigado por falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita eleitoral e lavagem de dinheiro durante as eleições de 2022. Segundo a PF, Marçal e um sócio realizaram doações milionárias às campanhas que fez naquele ano – e parte desses valores foi remetido de volta às empresas das quais são sócios.
Nas redes sociais, ele afirma que a operação é “perseguição política engendrada contra a minha pessoa, […] fruto do pacote que todos estão sofrendo por terem apoiado o presidente Bolsonaro”. “Claramente existe uma tentativa de silenciar as vozes daqueles que defendem a liberdade nessa nação.”
“Azarão”
O candidato é um “azarão, alguém que corre por fora do sistema, por um partido nanico, sem alianças, um tipo de candidato que, olhando historicamente para a disputa pela prefeitura de São Paulo, tem dificuldade de se viabilizar”, diz Rogério Schmitt, cientista político da Fundação Espaço Democrático. O especialista relembra a tentativa de Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei, figura do Movimento Brasil Livre (MBL), que, com a fama oriunda das redes sociais, concorreu à Prefeitura da capital paulista em 2020, conquistando cerca de 10% dos votos.
“Marçal enfrenta o desafio de transformar a mentalidade do povo brasileiro em todas as esferas da sociedade”, diz sua assessoria em nota ao JOTA. “Ele é pré-candidato […], buscando levar sua visão de inovação e liderança para a gestão pública da maior cidade do hemisfério sul”. No início de agosto, ele anunciou a policial militar Antonia Jesus, também do PRTB, como vice.
Em seu site, o empresário lista “limpeza do Rio Tietê; o prédio mais alto do mundo para ser um novo símbolo que representará a grandiosidade da ‘São Paulo 2.0’; resolver a cracolândia; dar um fim na falta de segurança em São Paulo; apoio ao empreendedorismo e incentivo para treinamento de pessoas em todas as empresas” como prioridades, mas não detalha como pretende atingi-las.
“O discurso dele combina vários elementos do neoliberalismo e do neoconservadorismo”, diz Natasha Bachini, pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP), que estuda ciberpolítica e campanhas eleitorais. “Além disso, ele se apresenta como uma renovação política pela direita, ele é jovem e mobiliza elementos da teoria da prosperidade, com uma linguagem popular, pouco sofisticada, tentando passar essa imagem que não tem verniz da comunicação”.
Para a especialista, é importante ser popular nas redes, e a eleição de 2018 é considerada um divisor de águas que mostrou isso. “Mas têm muitas outras variáveis que influenciam uma vitória, como a taxa de rejeição e as frustrações do eleitor no momento. Nem todo seguidor se converte em eleitor”, diz Bachini. “Uma candidatura para o Executivo leva tempo para ser construída – e ele pode não ser considerado a melhor opção pelo eleitor no momento, mas isso pode mudar no futuro”.