No mundo atual, a percepção das dificuldades não pode mais se dissociar do remanejamento dos quadros funcionais.
Pensando mais a longo prazo, a percepção das dificuldades possibilita uma melhor visão global dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

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Assim mesmo, a complexidade dos estudos efetuados ainda não demonstrou convincentemente que vai participar na mudança dos métodos utilizados na avaliação de resultados.

Existe uma segunda onda de extrema direita varrendo o mundo?

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Há uma segunda onda de extrema direita a varrer o mundo depois que essa tendência política parecia em declínio com a derrota de Donald Trump na campanha para reeleição como presidente dos Estados Unidos, em 2020? Ou podemos falar num novo ciclo de governos nacionalistas-populistas se a primeira onda parece não ter acabado, haja vista que o próprio Trump pode voltar à Casa Branca em novembro? 

A resposta depende da perspectiva pela qual se analisa o caso. Se estamos falando da existência de diversas autocracias ao redor do mundo, é evidente que vivenciamos uma continuidade. Esse argumento se reforça quando tomamos o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, como o modelo mais bem acabado dos autocratas contemporâneos, no cargo desde 2010. Em sua sanha pelo poder, Orbán conseguiu controlar o Judiciário, o Parlamento e a imprensa.

Porém, não apenas a derrota de Trump em 2020, mas o fim do governo Jair Bolsonaro dois anos depois, indicava que a extrema direita começava a retroceder – ao menos em países nos quais a democracia se mostrou minimamente estável.

Mesmo o Brasil, com seu histórico de golpes militares, exibiu instituições robustas o suficiente para barrar as pretensões ditatoriais bolsonaristas. Em certo sentido, o Brasil poderia ser visto como um exemplo para os Estados Unidos, pois demonstrou agilidade e habilidade para punir Bolsonaro, afastando-o por oito anos dos pleitos eleitorais, além de apertar o cerco para julgar o presidente por outros crimes ocorridos durante seu mandato. Enquanto isso, Trump pode ser preso e, ainda, assim, tornar-se novamente presidente dos EUA.

De fato, os prognósticos otimistas logo se mostraram equivocados: os bolsonaristas continuaram politicamente atuantes, principalmente através do Senado. Na Argentina, o ultradireitista Javier Milei foi eleito em 2023; em El Salvador, Nayib Bukele conseguiu controlar o Judiciário e o Congresso, aprovando uma reforma que permitiu sua reeleição em 2023. Agora, vem despontando como referência internacional para conservadores e reacionários.

Em 2022, Giorgia Meloni, uma expressa admiradora de Mussolini, foi eleita presidente do Conselho de Ministros da Itália (cargo equivalente ao de primeiro-ministro); enquanto isso, Trump vem mostrando bom desempenho nas pesquisas para a eleição presidencial americana.

Porém, a ideia de uma “segunda onda” da extrema direita não pode ser pautada apenas na continuidade de eleições ganhas por seus representantes, mas deve corresponder a uma diferença qualitativa. É neste ponto que três fatores se conjugam: a maior integração da chamada “Internacional Fascista”; a iminente ocupação do Parlamento Europeu pela extrema direita; e o provável retorno de Trump após o governo democrata de Joe Biden.  

O termo “Internacional Fascista” refere-se às articulações estabelecidas por líderes e representantes das extremas direitas, nas quais estratégias são traçadas e mecanismos de ajuda mútua são formulados. Esses encontros têm ganhado força e ocorrido com mais frequência nos últimos anos, algo completamente diferente do cenário entreguerras, quando não foi possível uma “Internacional Fascista”.

De fato, Hitler nunca incentivou a replicação do nazismo ou do fascismo em outras regiões, pois isso ia de encontro à sua mentalidade expansionista fundamentada no ultranacionalismo alemão. Em um cenário digitalizado, com fake news sendo disseminadas nas redes sociais, a “Internacional Fascista” se mostrou muito mais viável, bem como aceitável. 

Os resultados mais efetivos e imediatos dessas articulações internacionais poderão ser testemunhados nas eleições para o Parlamento Europeu, que ocorrerão entre os dias 6 e 9 de junho, quando a extrema direita deverá aumentar seu número de cadeiras.

Isso também reflete uma mudança no pensamento da extrema direita: se antes eles defendiam o enfraquecimento da União Europeia, nos últimos anos perceberam que melhor seria ocupá-la. Mesmo que esta ocupação seja gradual, não se pode ignorar uma mudança de sensibilidade política circulando na Europa Ocidental. 

Por fim, as eleições nos Estados Unidos. Caso Trump vença o pleito, tudo indica que seu segundo mandato não será uma repetição do primeiro. The Heritage Foundation, um think tank vinculado à campanha presidencial de Trump, elaborou o Project 2025, também conhecido como “Projeto de Transição Presidencial”. Trata-se de um guia para aumentar o poder de Trump caso ele seja eleito, substituindo funcionários públicos por pessoas ligadas ao movimento conservador, além de obter um maior controle sobre o Departamento de Justiça e o FBI.

Também se erradicaram políticas progressistas em prol de uma mentalidade cristã conservadora. A transformação dos Estados Unidos, uma das democracias mais estáveis da atualidade, em uma autocracia marcaria uma mudança no cenário mundial, tanto pelo exemplo que o país daria ao continente americano quanto por sua capacidade de influenciar diretamente em suas políticas.

Enfim, o prognóstico que este texto apresenta não é nada positivo para as democracias liberais ocidentais. Dito isso, é preciso estar atento às possibilidades futuras. Acredito que não se trata apenas de uma continuidade ou de um aumento no número de governantes de extrema direita, mas sim de uma mudança qualitativa em suas formas de governar.

As atuações de uma “Internacional Fascista”, o aumento de cadeiras ocupadas por seus representantes no Parlamento Europeu e a vitória de Trump podem nos colocar mais um passo diante de uma ruptura do pensamento liberal democrático. Aprendemos que ganhar eleições não basta para derrotar a extrema direita. É necessário derrotar seu zeitgeist, o espírito do tempo atual em que as massas clamam por líderes fortes sem se darem conta que, assim, enfraquecem a representação popular — ou seja, o demos e o regime no qual ele prevalece.

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