Inclusão e proteção: o desafio de garantir saúde e segurança no trabalho informal

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A campanha Abril Verde, realizada anualmente com o propósito de conscientizar sobre a importância e a necessidade de prevenir as doenças e os acidentes relacionados ao trabalho, promovendo ambientes de trabalho saudáveis e seguros, precisa beneficiar também trabalhadores e trabalhadoras informais, pois esse é um direito fundamental de todas as pessoas que trabalham.

Para os trabalhadores e as trabalhadoras informais, geralmente marginalizados pela falta de proteção legal, esse direito assume um papel ainda mais relevante. É possível atuar na proteção da vida, da saúde e da integridade física e psíquica dessas pessoas a partir de premissas vigentes no contexto jurídico trabalhista-constitucional brasileiro.

É nesse cenário e com essa concepção que, nos dias 23 e 24 de abril, o Programa Trabalho Seguro da Justiça do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat) promovem o seminário “Democracia é inclusão: os impactos da informalidade na saúde e segurança do trabalho”. A programação abordará o trabalho informal no mundo, os impactos da ausência da previdência e da seguridade social do trabalho informal e a dimensão social da sustentabilidade.

Inicialmente, é importante registrar que defender o acesso ao direito ao trabalho seguro e saudável para os trabalhadores e as trabalhadoras informais não implica em chancelar a regularidade de contratos informais. O combate às fraudes nas relações de trabalho, assim como a defesa do meio ambiente do trabalho e da saúde do trabalhador e da trabalhadora, são atuações prioritárias do MPT, mas enquanto o processo de formalização está em curso ou para o caso dos trabalhadores cujas atividades não são formalizadas porque realmente há autonomia e não subordinação a terceiros, é fundamental garantir a vida e a saúde dessas pessoas, protegendo-as contra os riscos laborais.

Para tanto, o Poder Público deve fomentar políticas públicas que assegurem o direito ao trabalho seguro e saudável, garantindo o acesso à capacitação e às medidas de prevenção para todos os trabalhadores, incluindo os informais. Isso envolve a promoção de condições de trabalho decentes, a realização de campanhas educativas e de programas de capacitação direcionados aos trabalhadores informais e o fornecimento de informações sobre segurança e saúde no trabalho, identificação e avaliação de riscos ocupacionais e medidas preventivas.

No dia 21 de abril de 2024, foi publicado no portal g1 uma matéria sobre os vendedores ambulantes de mate nas praias do Rio de Janeiro, que foram regularizados pelo município, sendo devidamente registrados e capacitados para o exercício da profissão. Foi noticiado que o curso de boas práticas dura cerca de duas horas e os mateiros recebem orientações sobre higiene e tratamento dos clientes. Contudo, tal iniciativa evidencia que o Poder Público pode fazer mais, incluindo capacitação sobre medidas de prevenção de doenças e acidentes no trabalho.

O Poder Público também deve apoiar e fortalecer coletivos de trabalhadores informais, seja na forma de sindicatos, associações ou outros modelos que se adequem à realidade, mas que realcem a importância da luta coletiva, capacitando-os para buscar condições de trabalho mais seguras e saudáveis.

O acompanhamento da saúde dos trabalhadores e das trabalhadoras informais é responsabilidade de todos os profissionais de saúde, que são obrigados a alimentar o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde, sempre que identificarem casos de doenças e agravos que constam da lista nacional, estadual ou municipal de doenças de notificação compulsória. Essas notificações subsidiam a definição de políticas públicas de prevenção e promoção da saúde das pessoas que trabalham e devem ser exigidas pelos responsáveis pela gestão da saúde em todas as instâncias do SUS e também dos serviços médicos privados.

Independentemente do tipo de vínculo contratual, imperativo recordar que é responsabilidade do contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato, nos termos do art. 5º-A, § 3º da Lei 6.019/74. Isso significa que no âmbito de um contrato de prestação de serviços não é admissível falar em trabalhadores informais e todos devem ser protegidos contra condições de trabalho prejudiciais à sua saúde e integridade física e psíquica.

Entretanto, com base no princípio da função social que rege a ordem econômica constitucionalmente estabelecida, as empresas poderiam ir além no seu dever de proteção, disponibilizando treinamento em segurança do trabalho, fornecendo equipamentos de proteção adequados e sugerindo melhorias nas medidas de prevenção para trabalhadores informais que atuam no entorno das fábricas e dos empreendimentos, como vendedores ambulantes, catadores, guardadores de veículos, lavadores etc. Ações dessa natureza poderiam ser incentivadas por políticas governamentais que ofereçam incentivos fiscais, como redução de impostos ou créditos tributários.

O MPT desempenha um papel muito importante na defesa dos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras informais ao meio ambiente do trabalho seguro e saudável. Por meio de sua atuação investigatória e de promoção de políticas públicas, o MP trabalhista deve exigir que o Poder Público atue na defesa da saúde e da segurança das pessoas que trabalham na informalidade, com vistas a assegurar que sejam protegidas contra condições laborais precárias, insalubres e perigosas.

A Justiça do Trabalho, por sua vez, é competente para processar e julgar as ações que buscam tirar o Poder Público da inércia quando se trata da execução de políticas públicas que assegurem o direito ao meio ambiente do trabalho seguro e saudável para os trabalhadores e as trabalhadoras informais. A afirmativa decorre da semelhança da atuação proposta com as ações civis públicas ajuizadas pelo MPT para exigir que municípios elaborassem e implementassem políticas públicas de combate e erradicação do trabalho infantil, nas quais a competência da Justiça do Trabalho já foi afirmada e reafirmada pelo TST.

Por fim, na linha de premissas que sustentam o direito dos trabalhadores e das trabalhadoras informais ao trabalho seguro e saudável, é preciso ampliar o alcance do projeto Segurança e Saúde nas Escolas, atualmente executado pelo MPT em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT/MTE).

O projeto desempenha um papel central na formação de estudantes quanto ao direito ao trabalho decente, seguro e saudável, em observância à diretriz estabelecida pelo art. 14 da Convenção 155 da OIT. O fortalecimento da iniciativa, inclusive por meio da inclusão expressa da temática nos projetos pedagógicos, para alcançar todos os estudantes, é essencial para criar uma cultura de respeito aos direitos trabalhistas desde cedo, preparando futuras gerações para exigir e proteger tais direitos, muito especialmente o de trabalhar em condições saudáveis e seguras, que não adoeçam, não incapacitem e nem matem.

A consolidação do direito fundamental dos trabalhadores e das trabalhadoras informais ao meio ambiente do trabalho seguro e saudável passa pela conscientização de toda a sociedade quanto à extensão desse direito e deve ser promovido e assegurado por meio da atuação conjunta do Poder Público, do Ministério Público do Trabalho e da Justiça do Trabalho. 

Que essa seja uma semente boa lançada em solo fértil neste Abril Verde, para que produza bons frutos nos anos vindouros em termos de proteção da vida e da saúde de todas as pessoas que trabalham.

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